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Aula 7 - Crescimento Intrauterino e Classificação do RN

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DEPARTAMENTO DE PEDIATRIA SAÚDE DA CRIANÇA I 
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Material para estudo Profa. Clarice Bissani 
Obs.: Este material não é original, mas resumo das referências indicadas. 
 
FATORES INTERVENIENTES NO CRESCIMENTO FETAL E PÓS-NATAL 
 
I. INTRODUÇÃO 
 
Um dos indicadores de bem estar nos períodos fetal e neonatal é o padrão normal de 
crescimento. Quando os parâmetros que nós empregamos para avaliar o crescimento, principalmente 
o peso, o comprimento e o perímetro craniano, estão dentro da faixa esperada, há alguma segurança 
da criança ser saudável1. 
Em condições normais, existe uma relação harmoniosa entre o ambiente externo, a 
homeostase e fisiologia maternas, a integridade da placenta (incluindo seu metabolismo, a síntese de 
hormônios e a transferência de nutrientes) e a fisiologia fetal. 
Da concepção até o período neonatal, o crescimento segue um padrão determinado por 
fatores genéticos e ambientais. Distúrbios no crescimento podem ser proporcionais ou 
desproporcionais em seus efeitos. Em fetos cujo peso é desproporcionalmente mais baixo do que o 
comprimento e o perímetro craniano, identifica-se um padrão de crescimento assimétrico. 
Para avaliar o crescimento fetal, as medidas do diâmetro bi-parietal, da circunferência do tórax 
e do abdome e do comprimento do fêmur são verificadas pela ultra-sonografia. Para cada uma das 
medidas há gráficos, permitindo a extrapolação do crescimento fetal. 
 
A gestação no ser humano dura em média 266 dias, ou 9 meses e meio, contados a partir do 
dia da fertilização. O início da gestação é determinado clinicamente a partir do primeiro dia do último 
período menstrual (DUM). Desta forma, dura em média 288 dias, ou 10 meses lunares. 
 
O período fetal se caracteriza por rápido crescimento do peso e do tamanho do concepto como 
um todo. 
 
II. FASES DO CRESCIMENTO FETAL 
 
O crescimento fetal é caracterizado por uma fase inicial de organização e diferenciação 
tecidual, associada a uma intensa proliferação celular. E no último trimestre, predomina o aumento do 
tamanho das células. 
 
 
Adaptações metabólicas e nutricionais (Fig. 1): 
 
1a fase – anabólica materna e fetal – até a 27a semana 
 armazenamento de gordura 
 consumo energético basicamente da glicose 
 
2a fase – catabólica materna e anabólica fetal 
 crescimento fetal máximo 
 aumenta a passagem de glicose 
 mobilização das reservas de gordura da mãe 
 
 
 
 
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 Figura 1 – Fases do metabolismo materno e fetal. 
 
Fases do crescimento fetal 
 
- Fase de hiperplasia celular: aumento rápido do número de células durante as 1as 16 semanas. 
- Fase de hiperplasia e hipertrofia concomitantes: da 16a à 32a semana, ocorre progressivo 
decréscimo na taxa de divisão celular, com aumento progressivo do tamanho celular. 
- Fase de hipertrofia celular: da 32a ao termo, com aumento do tamanho celular, acúmulo dos 
tecidos adiposo, muscular e conjuntivo. 
 
III. FATORES QUE REGULAM O CRESCIMENTO FETAL 
 
 
Fatores genéticos, suprimentos transplacentários de oxigênio e de substratos, além da ação 
endócrina de produção de hormônios produzidos pelo feto, pela placenta e pela mãe, são os principais 
moduladores do crescimento fetal. O ambiente vai facilitar a manifestação de alguns genes, mas não 
de outros. Algumas respostas às influências ambientais podem ser determinadas geneticamente. 
 
O pico da velocidade de ganho de comprimento e de peso ocorrem em fases diferentes. A 
velocidade do crescimento do comprimento varia de 5 cm/mês durante o 3o mês de gestação até 10 
cm/mês entre o 4o e 5o mês. Uma fase posterior é caracterizada por um crescimento menor (2 a 3 
cm/mês) e intenso ganho de peso (Fig. 2). 
 
 
 
 
 
 
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Figura 2 – Gráficos da velocidade de ganho de peso e do comprimento no feto. 
 
 
Os principais fatores que interferem com o crescimento fetal são listados na tabela 1: 
 
Tabela 1 – Fatores que interferem no crescimento intra-uterino 
 
Fatores genéticos e fetais 
Potencial genético Anomalias cromossômicas 
Malformações congênitas Infecções (rubéola, sífilis, toxoplasmose, citomegalovírus) 
Gestação múltipla Erros inatos do metabolismo 
 
Fatores maternos e ambientais 
Nível socioeconômico baixo Idade inferior a 15 e superior a 35 anos 
Baixa estatura Baixo peso antes da gestação (< 41 kg) 
Desnutrição grave Pequeno ganho ponderal durante a gestação 
História prévia de filhos com restrição do crescimento intra-uterino (RCIU) 
Multiparidade 
Tabagismo Uso de drogas 
Doenças crônicas (cardiopatias, nefropatias, diabetes, pneumopatias, etc.) 
Doença hipertensiva específica da gestação 
 
Fatores placentários 
Infartos Hemangiomas 
Trombose de vasos fetais Artéria umbilical única 
Inserção placentária anormal Descolamentos 
Neoplasias Inflamações das vilosidades 
 
O feto é dependente da mãe em relação aos nutrientes, mas independente em relação aos 
hormônios. 
 Nenhum hormônio peptídeo materno é transportado ao feto. Os hormônios maternos e 
placentários afetam o crescimento fetal indiretamente, regulando a captação e o transporte placentário 
de nutrientes. 
O controle hormonal do crescimento fetal é exercido por hormônios de origem placentária e de 
origem fetal. A regulação pode ser indireta, por modular o crescimento e o fluxo sangüíneo 
placentário, ou direta, pela transferência de hormônios placentários ao feto. 
O hormônio do crescimento já está presente no feto no 3o mês da gestação, e entre 4o e 5o 
mês apresenta níveis elevados. A importância do GH no crescimento intra-uterino é menor que a 
observada no período pós-natal. Recém-nascidos com deficiência congênita de GH apresentam peso 
e estatura normais. 
As somatomedinas ou fatores de crescimento insulina-like (IGFs) são fatores determinantes no 
crescimento celular e importantes nas transformações durante a embriogênese. 
A insulina é essencial para o crescimento fetal, principalmente durante o 3o trimestre da 
gestação. Controla a nutrição fetal e a mitogênese durante o período embrionário. 
 
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Os hormônios tireoidianos são importantes no crescimento e maturação cerebral. 
Aparentemente têm pouca importância no crescimento estatural intra-uterino. 
 
A condição nutricional materna pré-gestacional reflete-se no crescimento intra-uterino. A 
influência da nutrição materna se estende por todo o ciclo reprodutivo, incluindo a preparação para a 
lactação. 
No 1o trimestre da gestação, a influência da nutrição materna é pequena em relação ao 2o e 3o 
trimestre, mas é difícil avaliar as repercussões sobre o embrião. O comprometimento da nutrição fetal 
em fase avançada da gestação pode ser decorrente de insuficiência de aporte materno-placentário de 
nutrientes bem mais precoce na gestação. 
No 2o trimestre, um ganho de peso insuficiente provoca maior risco de baixo peso de 
nascimento. 
Estudos sobre efeitos da nutrição sobre o embrião revelaram teratogênese ou morte do 
embrião por carência de vitaminas, ferro e excesso de glicose. RN com baixo peso denascimento e 
RN com restrição do crescimento tem maior risco de doenças crônicas. 
 
 
 
Desnutrição e obesidade não são separadas e opostas, são ligadas e causadas por condição 
nutricional adversa no início da vida (hipótese de Barker). Mães mais leves e mais baixas têm maior 
risco de ter RN de baixo peso. 
A partir da 2a metade da gestação e mais proeminentemente no 3o trimestre, as repercussões 
da nutrição materna são mais enfatizadas, devido ao maior valor absoluto do ganho de peso fetal. 
 
O grau de gravidade do prejuízo varia se a desnutrição materna for prolongada ou se é 
desnutrição aguda em um trimestre da gestação. 
No cerco da Holanda (1944-45), as mães com desnutrição aguda no 3o trimestre tiveram bebês 
com 300 g a menos em média. Mães que passaram a ter melhor ingesta no 3o trimestre tiveram bebês 
com peso normal. Quando a fome foi no início da gestação, houve aumento do tamanho da placenta. 
No caso da Holanda, as meninas com peso abaixo do esperado por privação nutricional no 3o 
trimestre vieram a ter maior risco de ter filhos de baixo peso. 
Mães que nasceram com peso abaixo do esperado para a idade gestacional (pequenos para a 
idade gestacional = PIGs) têm maior risco de terem bebês PIGs e prematuros. Já mães que nasceram 
prematuras não apresentam maior risco. 
O útero de meninas que sofreram RCIU pode chegar a 20% a menos do seu tamanho. 
 
Déficits nutricionais específicos, principalmente de ácido fólico e de ferro também podem gerar 
problemas de malformação e de crescimento intra-uterino deficiente. 
O ácido fólico é necessário para a produção das hemácias e formação do tubo neural. Pela 
deficiência de ácido fólico podem ocorrer defeitos sérios na medula espinhal e no cérebro, com 
formação e fechamento do tubo neural incompleta. 
Como o ácido fólico é necessário antes da concepção e os defeitos do tubo neural ocorrem 
bem no início da gestação. Mas a grande maioria das gestações não são planejadas. 
A prevalência de defeitos do tubo neural caiu 25% nos EU com aumento do ácido fólico na 
alimentação fortificada. 
 
Os fatores de risco para o crescimento intra-uterino refletem diversas alterações que implicam 
em menor aquisição e incorporação de nutrientes pelo feto2. 
O monóxido de carbono em fumantes interfere com a oxigenação tecidual a desloca o oxigênio 
de sua ligação com a hemoglobina no sangue arterial e reduz a capacidade de transporte do oxigênio. 
Ocorre comprometimento da circulação útero-placentária como resultado da vasoconstrição 
provocada pela nicotina. 
 
O tabagismo está relacionado com nascimento pré-termo, baixo peso de nascimento, 
problemas respiratórios, freqüência cardíaca anormal, fissura lábio-palatal, perímetro craniano 
reduzido, risco maior de óbito, problemas de aprendizado. 
 
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O tabagismo na gravidez responde por 20 a 30% dos RN de baixo peso e 14% dos partos 
prematuros. 
O álcool ingerido pela gestante está relacionado com a síndrome alcoólico fetal, anormalidades 
faciais, risco de malformações maiores, QI mais baixo, problemas cardíacos, retardo no 
desenvolvimento, déficit de atenção. O comprometimento depende do estágio do desenvolvimento. É 
prevenível, mas não curável. 
O consumo de maconha leva a comprometimento do SNC, restrição do crescimento fetal, 
nascimento pré-termo, baixo peso de nascimento, morte fetal ou pós-natal, dificuldade para linguagem 
e déficit de memória. 
O feto é mais vulnerável nos estágios iniciais. Quanto mais freqüente a exposição e maiores as 
doses, mais grave o dano. Nutrição pobre, falta de cuidado pré-natal, presença de teratógenos podem 
piorar os efeitos. 
 
IV. AVALIAÇÃO DO CRESCIMENTO INTRA-UTERINO 
 
 Durante a gestação a avaliação do feto é indireta. A medida da altura uterina é um meio fácil 
de acompanhar o crescimento e sempre deve ser aferida. No entanto, é pouco sensível para detectar 
os fetos com crescimento insuficiente, somente identificando-os em 30% dos casos. A forma mais 
utilizada para estimar o crescimento fetal é a ultra-sonografia. São obtidas medidas do diâmetro bi-
parietal, da circunferência abdominal e do comprimento do fêmur do feto. Estas medidas são 
extrapoladas para curvas de crescimento adequado para cada semana da gestação. 
 Após o nascimento, com o exame físico do recém-nascido fica mais fácil a avaliação do estado 
nutricional. Obtém-se as medidas de peso, comprimento e perímetro craniano. Estes parâmetros são 
comparados aos esperados para cada idade gestacional com a utilização de uma curva de 
crescimento intra-uterino. Esta curva é empregada logo após o nascimento, não vai ser utilizada para 
acompanhar o crescimento pós-natal. Apesar de algumas limitações, a curva mais utilizada é a de 
Lubchenco (1963) (Fig. 3). Os recém-nascidos com peso entre os percentis 10 e 90 são considerados 
com peso adequado para a idade gestacional. Os RNs com peso acima do percentil 90 são grandes 
para a idade gestacional e os com peso abaixo do percentil 10, pequenos para a idade gestacional. 
 
 
Figura 3 - Curva de crescimento intra-uterino. 
 Fonte: Lubchenco, LO et al. Pediatrics 1963;32:793. 
 
 
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Com o peso isolado sendo inferior a 2500 g, tem-se um RN de baixo peso. Este menor peso 
pode ter ocorrido por ser um RN prematuro e não por ter crescido menos para a idade gestacional. Ou 
pode ter peso inferior por algum ou mais fatores associados que comprometeram seu crescimento 
intra-uterino, caracterizando um RN com restrição do crescimento intra-uterino (RCIU). 
 Aplicando-se o cálculo do índice ponderal de Rohrer, pode-se definir o tipo de restrição de 
crescimento, com prejuízo no início da gestação ou no final da gestação (Fig. 4). 
 
 
 
RN com RCIU simétrico = PIG simétrico 
 desde o início da gestação 
 menor número de células 
 todos os parâmetros de crescimento são comprometidos – RN curto e magro 
 pode recuperar ou não 
 desempenho neuromotor prejudicado 
 
 
RN com RCIU assimétrico = PIG assimétrico 
3o trimestre da gestação 
mantém número de células 
PC e comprimento preservados 
baixo peso = comprido e magro 
geralmente recuperam no 1o ano 
geralmente não compromete DNPM 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Figura 4 – Percentis do crescimento intra-uterino do peso, do comprimento, 
da circunferência craniana e da relação peso-comprimento 
(índice ponderal de Rohrer). 
 
 
Referências bibliográficas: 
1. Longui, CA. Crescimento normal. In: ........pg.3-10. 
2. Falcão MC; Cardoso LEMB. Avaliação e monitorização nutricional. In: Feferbaum R; Falcão MC. Nutrição do 
recém-nascido. São Paulo: Atheneu; 2003, pg. 55-66. 
3. Lubchenco LO; Hansman C; Boyd E. Intrauterine growth in length and head circunference as estimated from 
live births at gestational ages from 26 to 42 weeks. Pediatrics 1966; 37(3)403-8.

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