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O Amadís de Gaula e as novelas de cavalaria

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O Amadís de Gaula e as novelas de cavalaria
A marcante presença dos relatos protagonizados por cavaleiros andantes na literatura espanhola do século XVI significa um forte anacronismo que cabe explicar levando em conta o fato de que a Espanha (Castela, em particular) viveu, até o fim do século XV, num clima de aventura bélica, decorrente do processo de formação nacional. Este processo esteve marcado, de longa data, entre os espanhóis cristãos, pela consciência da necessidade de recuperar um território das mãos dos muçulmanos. Essa consciência, que chegou a ter um sentido de verdadeira cruzada nos séculos XII e XIII, foi renovada quando os Reis Católicos decidiram dar um passo decisivo para a unificação político-ideológica da Península ao atacar o reino mouro de Granada. A atividade dos cavaleiros medievais que lutaram pela causa cristã ficava, assim, atualizada, criando-se um espaço propício à difusão de relatos que, embora carentes de um sentido histórico nacional, exaltavam o tipo social que a luta final contra os mouros consagrara. Simultaneamente à conclusão dessa luta, no mesmo ano em que Granada se rendeu, Colombo, ao chegar à América, abriu um novo e quase que infinito espaço para a continuidade da aventura. Neste caso, além de se tratar de ocupar um território de novos infiéis que deviam ser cristianizados, os aspectos fabulosos do território americano (sua natureza, seu mistério geográfico e suas riquezas) outorgavam ao “novo mundo” uma dimensão em concordância com os cenários irreais das novelas de cavalaria. Pode-se dizer que a América outorgou aos livros de cavalaria o estatuto de verdade que lhes faltava; e, ao mesmo tempo, os conquistadores vieram à América, em muitos casos, mentalmente predispostos pela leitura daqueles; a tal ponto que, mais de uma vez, topônimos para a designação dos territórios conquistados foram tomados desses relatos, como nos casos de “California”, “Patagonia” e “Amazonas”. Nesse sentido, é sabido que, embora Carlos V tivesse proibido que se levassem livros de cavalaria à América, isso não foi cumprido, o que permitiu que essas leituras continuassem a alimentar o imaginário dos conquistadores.
Não deixa de ser interessante o fato de que o gênero narrativo dominante no momento em que a Espanha inicia sua expansão imperial tivesse de nacional apenas o processo de transformação final de uma literatura tomada do estrangeiro. Em boa medida, isso pode ser explicado pelo fato de que o enorme distanciamento da realidade histórica que esse fenômeno significava estava facilitando o processo de idealização da própria aventura. De fato, a América não seria ocupada pela Espanha com base num pensamento racionalista, mais afim ao ideário burguês, porém como espaço para a consolidação de um sistema feudal de domínio que se exerceu mediante a conquista militar. Se, por um lado, Espanha entende que a América passa a ser uma continuação do seu próprio território, pela mesma razão sente-se autorizada a extrair dela, pela força, as riquezas que, em última instância, iriam servir para financiar a continuidade da defesa de uma ideologia e de um sistema próprios da Idade Média: o cristianismo e o feudalismo, cujo campeão era, na ficção, o cavaleiro andante.
Não deixa de ser sintomático, nessa aproximação da novela de cavalaria com a conquista da América, o fato de que um gênero, cuja existência na Idade Média está provada, só se desenvolvesse de maneira mais do que considerável após a viagem de Colombo. Mais ainda, quando um escritor como Garci Rodríguez de Montalvo retomar uma das manifestações medievais do gênero, exatamente por volta de 1492, ficará evidente, nos acréscimos que ele faz ao texto original, a influência das crônicas americanas e, concretamente, o aparecimento de um maior número de ilhas, imagem própria da geografia inicial das terras encontradas. A designação arcaizante das ilhas como “ínsulas” e seu sentido irreal serão parodiados por Cervantes, em Dom Quijote de la Mancha, quando o cavaleiro promete ao seu escudeiro recompensá-lo fazendo dele o governador de alguma “ínsula”.
As origens da novela de cavalaria
A novela de cavalaria terá como base a evocação de um passado de aventuras próprio da épica, centrado em heróis modelares – que se tornam um tipo repetido até a exaustão –, porém transformado pelo refinamento próprio da corte; nesse refinamento há um especial destaque para o sentimento amoroso, centrado na mulher, vista à luz da doutrina do amor cortês.
O cavaleiro andante ficcional teve origem na penetração, na Península Ibérica, das lendas relativas ao imperador Carlos Magno, à antigüidade greco-latina (Alexandre Magno, a Guerra de Tróia, a Eneida, etc.) e, especialmente, à “matéria de Bretanha” (o rei Artur, o Graal, os cavaleiros da Távola Redonda, Parsifal, o mago Merlim, Tristão e Isolda, etc.) lendas essas que influenciaram obras como La gran conquista de ultramar, produzida no fim do século XIII. No início do século seguinte, El caballero Zifar pode ser visto como uma primeira amostra da futura novela de cavalaria, quando a definitiva penetração da chamada “matéria de Bretanha” seria o elemento detonador do gênero.
Dentro da "matéria de Bretanha", destaca-se a chamada "literatura artúrica", com suas personagens iniciais mais importantes: o mítico rei celta do país de Gales, Artur (Artús ou Arturo em castelhano, conhecido na Península já no século XII) e o mago Merlim. Essa literatura tem seu ponto de partida na Historia Regum Britanniae (que incorpora as Prophetiae Merlini, texto anterior), escrita em latim por Geoffrey de Monmouth entre 1130 e 1136. Nela, deforma-se e falsifica-se a história, com a incorporação do rei Artur; este é apresentado encabeçando a resistência dos celtas, cristãos, contra os invasores saxões, pagãos, no século VI. O assunto passou à obra de Chrétien de Troyes (c.1135-1190), escrita em francês na segunda metade do século XII, e desta a de Robert de Boron, escritor da Borgonha que, entre 1191 e 1212, retoma o tema artúrico. Na obra deste autor, incorpora-se a lenda de José de Arimatéia e é retomada a do mago Merlim. A partir dela é composto, entre 1221 e 1225, o Grã Graal ou Lancelot-Graal ou Vulgata, cuja posterior refundição é traduzida para o português e para o castelhano, no século XIV.
A lenda de Tristão e Isolda, que também integra a "matéria de Bretanha” foi recolhida por Chrétien de Troyes num texto hoje perdido, que, desenvolvido por diversos poetas levou a um relato traduzido ao castelhano no século XIV.
Em decorrência da penetração da "matéria de Bretanha", escrevem-se o Libro de Josep Abarimatía, a Estoria de Merlim, o Lançarote (todos eles antes de 1313) e um Tristán, do qual se conserva um fragmento, e que seria anterior ao Libro de Buen Amor, do Arcipreste de Hita (1343), que se refere a ele.
O desenvolvimento do tipo do cavaleiro andante como protagonista de narrativas ficcionais teria, possivelmente, algumas mínimas conexões com a realidade histórica. É possível que o tipo se inspirasse na existência de cavaleiros carentes de riquezas, por não serem primogênitos ou serem nascidos dos amores clandestinos que a doutrina do amor cortês registra; em ambos os casos, deveriam se valer das próprias forças para se firmarem socialmente. Nesse sentido, será mais interessante ainda analisá-los a partir da perspectiva que a paródia de seu heroísmo será desenvolvida, mais tarde, pelo romance picaresco e, mais explicitamente, em Don Quijote de la Mancha, de Cervantes. Também é possível que, nesses casos, a opção desses cavaleiros pela defesa do sistema tenha se firmado por contraposição à existência de outros, mais próximos do bandido que assaltava viajantes ou outros seres carentes de proteção.
Garci Rodríguez de Montalvo e o Amadís de Gaula
As origens da novela de cavalaria têm uma existência pouco documentada em língua castelhana, embora essa língua seja a que permitiu o desenvolvimento do gênero. A primeira amostra – o Amadís de Gaula, publicadoem Saragoça, em 1508 – é excessivamente tardia como prova da existência de textos estritamente medievais. Nessa edição, aparece como seu autor Garci Rodríguez de Montalvo. Este, no entanto, parece ter sido apenas o refundidor de uma obra precedente. No prólogo à obra, ele próprio afirma ter corrigido três livros preexistentes, ter anexado a estes um quarto, e ter escrito o quinto dos livros, que acrescenta aos anteriores e que, assim, tem uma certa autonomia até no título: Las Sergas de Esplandián. Nele narra as aventuras do filho de Amadís. Os quatro livros de Amadís de Gaula foram objeto, em 1991, de excelente edição, realizada por Juan Manuel Cacho Blecua, cuja extensa e detalhada “Introducción” será a fonte de muitos dados abaixo mencionados. Em boa medida também a aproveitaremos em nosso resumo das características das novelas de cavalaria, mesmo que, às vezes, possam ficar claras algumas discrepâncias.
De Montalvo sabemos relativamente pouco. No início do livro I do Amadís de Gaula, é dito que foi edil em Medina del Campo. Teria nascido por volta de 1450 e, com certeza, morreu antes de 1505. A família de Montalvo pertenceria à nobreza, porém não à aristocracia. Nos prólogos que escreve para os livros I a III do Amadís de Gaula e para as Sergas de Esplandián, elogia os Reis Católicos.
Essas referências nos permitem situar a composição do Amadís de Gaula por Montalvo. Ele teria realizado seu trabalho possivelmente ao longo de um extenso período. Certos textos, que parecem aludir ao reinado de Enrique IV, teriam sido escritos antes da morte desse rei, em 1474. Por sua vez, o prólogo aos livros I a III se refere à guerra de Granada como concluída e à expulsão dos judeus, (os quais considera uma lepra), fatos que indicam ser ele posterior a 1492, porém anterior a 1504, ano da morte de Isabel, já que fala dos Reis Católicos como ainda vivos. O prólogo ao livro IV é posterior, já que se refere ao prólogo anterior, além de citar o livro Quedas de príncipes, de Boccaccio, impresso em 1495.
Até chegar ao refundidor de 1508, Amadís de Gaula parecer ter realizado um longo percurso, objeto de muitas polêmicas. A obra é mencionada, por diversas vezes, ao longo dos séculos XIV e XV, o que comprova sua difusão. A menção mais antiga é de Juan de Castrojeriz, nas glosas à sua tradução de De regime principum, realizada entre 1345 e 1350. Por sua vez, Pero López de Ayala, na estrofe 163 do seu Rimado de Palacio, escrito entre 1378 e 1403, lamenta ter perdido seu tempo lendo livros de ficção, e cita como tais Amadís de Gaula e Lancelote. No Cancionero de Baena, por último, o poeta Pedro Ferrús (da época do rei Enrique II, 1369-1379, ou do rei Juan II, 1379-1390) menciona um Amadís de Gaula em três livros, como o que teria corrigido Montalvo. Pedro Ferrús, além de mencionar um Amadís de Gaula em três livros, dá a entender que o herói morria no fim de sua história, naquela versão. María Rosa Lida de Malkiel (apud Cacho Blecua) entende que, na versão primitiva, Amadís morria pelas mãos do seu filho Espandián e que, posteriormente, Oriana se suicidava, no que acompanharia uma tradição registrada tanto na matéria artúrica como na matéria troiana. Montalvo mudaria esse final para estender a história no livro IV, acrescentado por ele. 
Outros autores, como Francisco Micer Imperial (poeta do Cancionero de Baena, de 1445), Fernán Pérez de Guzmán (1376?-1460?) e Alfonso Álvarez de Villasandino (?-1424?), referem-se também à existência dessa versão do Amadís de Gaula anterior a Montalvo.
Uma hipótese sustenta a existência de uma versão original, em português, atribuída a Vasco de Lobeira (1350?-1404). Com efeito, no capítulo LXIII da Chrónica do Conde dom Pedro de Menezes (1454), de Gomes Eanes de Zurara, identifica-se Vasco de Lobeira, da corte do rei dom Fernando (1367-1383), como a autor do “Libro d’ Amadís”. Mais tarde, o doutor João de Barros, em 1549, no Livro das Antigüidades e Coisas Notáveis de Entre Douro e Minho, atribui a Vasco de Lobeira os quatro livros do Amadís de Gaula e diz que os castelhanos o traduziram e dele se apropriaram. Por último, em 1598, numa nota em Poemas Lusitanos, de Antônio Ferreira, diz-se que a história dos amores de Amadís e Briolanja fora composta por Vasco de Lobeira, natural do Porto. Outros autores, castelhanos, também atribuem o Amadís de Gaula a Vasco de Lobeira: Antonio Agustín, em 1586, nos seu Diálogos de medallas, e Nicolás Antonio, em seu Bibliotheca Hispania Vetus, de 1696.
O problema para atribuir o Amadís de Gaula a Vasco de Lobeira consiste em que a obra aparece mencionada em data anterior ou muito próxima à do nascimento de Vasco de Lobeira. Uma solução tem sido buscada, apontando João de Lobeira (poeta cuja existência entre 1258 e 1285, bem como sua morte antes de 1305 estão documentadas) como o verdadeiro autor do Amadís de Gaula; isso com apoio no fato de que no cancioneiro de Colocci-Brancuti aparece um poema em português, atribuído ao mencionado poeta, cuja tradução está no capítulo LIV do livro II do Amadís de Gaula. Assim, Vasco de Lobeira teria apenas retomado uma obra composta por um antepassado seu. As objeções a essa teoria apontam para o fato de que o poema (que, no Amadís de Gaula, tem uma estrofe a mais, bem diferente) pode não ser da autoria de João de Lobeira; e, mesmo que fosse, o fato não obriga a atribuir-lhe o Amadís. Pelo contrário, pareceria mais provável que o autor do Amadís de Gaula utilizasse o poema atribuído a Lobeira e lhe acrescentasse uma estrofe de sua autoria.
Por último, Antônio Ferreira, nos seu Poemas lusitanos, acima mencionados, inclui dois sonetos relativos aos amores de Amadís e Briolanja e diz terem sido compostos pelo seu pai na época do rei de Portugal dom Diniz (1261-1325), em nome do filho deste, o infante dom Afonso (1290-1357) que, assim, se identificaria com o “señor don Alfonso de Portugal”, mencionado no capítulo XL do livro I do Amadís de Gaula, como alguém que teria mandado escrever de outra maneira a história desses amores. Essa personagem também poderia ser identificada com o irmão do rei dom Diniz, desse nome, que viveu entre 1263/65 e 1312, coetâneo, assim, de João de Lobeira. Mas também caberia pensar em que se tratasse do bastardo Afonso Sanches (1282-1329). Ou poderia se tratar de um contemporâneo de Montalvo, dom Afonso de Portugal, que, em 1490, casou-se com Isabel, filha dos Reis Católicos e que morreria depois numa queda do cavalo, embora nesta caso se tratasse de um príncipe e não apenas de um infante, como menciona Antônio Ferreira.
Em síntese, apesar das diversas menções, falta um texto do Amadís de Gaula em português para que a tese de sua origem portuguesa seja provada. Pode ter existido, mas o maior obstáculo para aceitar sua existência é o da data, dada a antigüidade das menções castelhanas, o que permite supor, até, que o texto português de Vasco de Lobeira fosse uma tradução ou refundição de um original castelhano. Isso pareceria mais provável ainda, se levarmos em conta o fato de que no Amadís de Gaula não se registram lusitanismos que permitam pensar numa redação anterior em português.
Se, no caso da teoria portuguesa falta um texto, no caso da atribuição castelhana dispõe-se de um fragmento manuscrito de quatro folhas que registra um texto pertencente ao livro III, onde já aparece a personagem Esplandián, o filho de Amadís. Pela escritura e pela linguagem (igualmente carente de lusitanismos e com arcaísmos e dialetalismos que reaparecerão em Montalvo), deduz-se que o manuscrito é de por volta de 1420, o que significa que, no início do século XV existia um texto do Amadís de Gaula, que, encontrado, confirma as mencionadas referências a ele feitas por Castrojeriz, López de Ayala e Pedro Ferrús. Mais ainda, a análise dos arcaísmos conservados em Montalvo permite fixar o texto original em meados do século XIV, coincidindo assim com os registros de alusões à existência da versão primitiva. Nada obsta, no entanto, para que se possa pensar numa versão mais antiga – anterior àquelaem três livros, mencionada por Ferrús – que poderia ser de fins do século XIII ou começos do XIV, a época da tradução da refundição francesa da Vulgata (a do pseudo-Boron) ao castelhano.
O gênero do Amadís
Em espanhol, a designação genérica do Amadís de Gaula é problemática, em função da falta de um termo que equivalha, por exemplo, ao romance inglês, sendo que o problema deverá estender-se a todas as narrativas ficcionais longas em prosa que não possam ser entendidas como romances. No prólogo aos três primeiros livros do Amadís de Gaula, Montalvo distingue: a história como tal, como a que escreve Tito Lívio; as histórias que, apoiadas na verdade, incorporam elementos inverossímeis, como na épica; e aquelas que, por apoiar-se apenas na esteira da verdade devem ser chamadas antes de “patrañas” do que de crônicas e que estão marcadas pelo caráter ficcional e a presença do sobrenatural. Nesse último gênero se inscreveria o Amadís de Gaula.
Ou seja, há diversos graus de relação com a verdade, mas esta não deixa nunca de estar presente, mesmo nas histórias fingidas, já que estas estão no rastro da verdade. E, de fato, logo depois Montalvo deixa entender que sobre o ficcional é possível apoiar a doutrina que leve à salvação da alma, o que, em alguma medida, parece justificar a ficção. Montalvo não estabelece uma oposição verdade = historia vs. ficção = mentira; antes, pareceria entender que a ficção trata a verdade com maior liberdade e, assim, sem tê-la por objetivo e sequer fundamentar-se nela, constrói no seu rastro.
É interessante essa concepção da relação história-ficção que pareceria adiantar-se ao menosprezo de que será objeto a ficção, na medida em que não está regida pela busca da verdade de maneira direta. Sua obra pertence, assim, a um grupo menos nobre com relação à história. Mas a ficção permite embasar o elemento didático, o que a justificaria, como o próprio Montalvo sustenta no prólogo. Ele não tem, no entanto, como designar este tipo de narrativas. Sua proposta no sentido de chamá-la de “patraña” seria válida se o sentido de ficcional presente nesse termo não tivesse sofrido a superposição daquele de “mentira”, decorrente da noção de “não-verdadeiro”, subjacente à ficção. Esse valor de “patraña” pareceria subjazer a El Patrañuelo, publicado por Juan de Timoneda, em 1567, onde se reúne uma coleção de novelas curtas, de tradição formal italiana. Assim, antes de se impor o termo “novela”, em espanhol, para designar toda narração ficcional extensa em prosa, a designação “libros de caballerías” serviria durante séculos para designar o gênero criado pelo Amadís de Gaula. Cabe levar em conta que, nessa designação, em espanhol, o plural “caballerías” evita confundir esses relatos de cavaleiros andantes com narrativas a respeito da instituição medieval da ordem de cavalaria.
O Amadís de Gaula apresenta, já no início, um elemento que liberaria seu autor de um compromisso com a verdade: a declaração de que os fatos que narra aconteceram pouco depois da morte de Cristo; ou seja, o distanciamento temporal leva a que o narrador não seja testemunha presencial dos fatos e, assim, está livre de ser responsável pela veracidade de sua narração. A necessidade de uma testemunha, no entanto, leva a que se faça de uma personagem do livro III, o mestre Elisabad, o narrador das Sergas de Esplandián, de acordo com o capítulo XVIII deste último livro. A existência do livro, por sua vez, deve-se ao fato de o manuscrito original ter sido encontrado num túmulo embaixo de uma ermida, perto de Constantinopla, e depois trazido por um mercador até a Espanha e traduzido, segundo sustenta Montalvo no prólogo. Ou seja, o leitor, mesmo que indiretamente, é levado a acreditar na narrativa de Montalvo, já que uma personagem dela é o historiador-narrador �presencial de um segmento. Assim, mesmo que desacreditando teoricamente os livros de “patrañas”, o próprio Montalvo pretende fazer crer, na prática, que sua história esteja baseada na verdade. Esse tipo de contradições, em que se justifica a diluição da verdade narrada por um historiador mediante a mediação de um tradutor e um narrador do que estes narraram, e que será um tópico das novelas de cavalaria, seria um dos aspectos mais diretamente parodiados por Cervantes em Don Quijote de la Mancha. Apesar desse relativismo, o narrador do Amadís de Gaula é um narrador onisciente que raras vezes se permite mais de uma versão dos fatos, ficando longe ainda do perspectivismo narrativo que seria a pedra fundamental do romance na mencionada obra de Cervantes.
Assunto do Amadís
O fundamental da narrativa de Montalvo é a aventura marcada pelo seu caráter maravilhoso, isto é, alheio à ordem natural. A aventura supõe o enfrentamento do perigo – do perigo da vida, habitualmente – e serve como prova das qualidades do cavaleiro colocadas a serviço da sociedade. A história se inicia com o abandono de Amadís nas águas do rio, por ser filho dos amores clandestinos de Perión, rei de Gaula, e Elisena, filha de Garínter, rei da Bretanha. O herói será criado pelo escudeiro Gandales de Escócia. O posterior reconhecimento de Amadís o integra na corte de Lisuarte, rei da Grã Bretanha, onde é armado cavaleiro. Amadís e a filha de Lisuarte, Oriana, apaixonam-se mutuamente. Com esse amor como pano de fundo, desenvolvem-se as infindáveis aventuras do herói, tais como seu encantamento e desencantamento no palácio de Arcaláus; o combate com seu irmão Galaor sem que ambos se reconheçam; o episódio do arco dos leais amadores que testava a fidelidade dos amantes, a penitência de Amadís na Penha Pobre, seu combate com o Endriago na ilha do Diabo, até o casamento do cavaleiro com Oriana. E a história se fecha, após o sequestro do rei Lisuarte por encantadores, com Esplandián, o filho de Amadís e Oriana, sendo armado cavaleiro para retomar as aventuras que seu pai nesse instante abandona. Todo esse eixo central do livro está permeado por aventuras vividas por outras personagens em episódios secundários.
O motivo que subjaz às aventuras é o amor, conceito que se apóia na doutrina do amor cortês. Fica ausente, no entanto, o adultério, motivo recorrente nessa doutrina. As relações sexuais entre solteiros, porém, são habituais, já que são canonizadas mediante o matrimônio secreto que as legitima. A expectativa da legalização deste pelo casamento público serve como motivo que mantém o suspense ao longo da narrativa. Assim sendo, o amor impulsiona o herói à realização de suas façanhas, e, por conseguinte, ao desenvolvimento de todas suas virtudes.
Deixando de lado Las Sergas de Esplandián, que é, na verdade um livro independente, os quatro livros do Amadís de Gaula têm o mesmo protagonista, que dá título ao conjunto da obra. Amadís é, além de protagonista, o protótipo do herói, isto é, da personagem que se realiza mediante ações voltadas para o bem comum e que, nelas, empenha todos os seus recursos expondo sua própria vida. Nele, e nos seus assemelhados de outras novelas de cavalaria, culmina, na literatura chamada ocidental, um mito que tem suas raízes na cultura greco-latina. As paródias que, logo depois, a modernidade produzirá significarão o início da relativização do heroísmo ao serem reduzidos os protagonistas do romance à categoria de seres humanos.
O Amadís como padrão das novelas de cavalaria
No Amadís de Gaula e nas novelas de cavalaria que proliferarão no século XVI, no entanto, ainda sobreviverão os heróis que, dotados de qualidades excepcionais, serão modelares, tanto no sentido do gênero literário quanto no sentido de suas ações. O caráter heróico, no entanto, não estará limitado ao protagonista. Sempre haverá outros cavaleiros que, mesmo que menos salientes, reproduzirão o tipo vivendo suas próprias aventuras. Cada um desses heróis costuma estar caracterizado por um traço que o define. No Amadís de Gaula, se Amadís é caracterizado pela fidelidade amorosa, haverá outros, como Agrajes, caracterizado pela sua impetuosidade, ou Galaor, definido pela sua tendência às aventurassexuais. Como correspondência a esses heróis, haverá personagens femininas marcadas também pelo caráter modelar e igualmente caracterizadas: assim, Oriana, chamada “la sin par” e caracterizada pelos seus ciúmes, do mesmo modo que Mabilia é o protótipo da discrição.
Os heróis das novelas de cavalaria reiteram habitualmente um percurso narrativo que já vemos em Amadís de Gaula: o nascimento clandestino de Amadís; seu abandono às águas protegido por sinais que o identifiquem; o seu resgate, adoção e educação; a investidura como cavaleiro; o posterior reconhecimento e a conseguinte aquisição de linhagem em função da qual e para a qual ele irá desenvolver suas aventuras, em diante.
Nessas aventuras vemos aparecer duas outras categorias de personagens que igualmente se reiteram nas novelas de cavalaria: os antagonistas e os ajudantes. Os primeiros significam, basicamente, a perturbação da ordem que caracteriza a sociedade feudal, quer seja pelo fato de não atenderem às normas da cavalaria e da conduta cortesã, quer seja por serem inimigos do cristianismo. O protótipo de antagonista de Amadís é Arcaláus, apelidado de “el encantador”. Outros antagonistas secundários são Abiés e Dardán. Todos eles, embora dotados de qualidades guerreiras excepcionais, são a negação das virtudes que caracterizam o cavaleiro.
Como contrapartida dos antagonistas, temos as personagens que auxiliam o cavaleiro. Normalmente, outros cavaleiros atuam nesse sentido. Há, no entanto, uma figura auxiliar central que é a maga Urganda, apelidada de “la desconocida”. Seus poderes mágicos irão se contrapor diretamente aos malefícios de Arcaláus.
Como aponta Cacho Blecua, é importante observar que, em Amadís de Gaula, com relação ao precedente artúrico, são invertidos os sexos dos mais importantes antagonista e ajudante do cavaleiro. Na corte do rei Artur, o auxiliar era o mago Merlim e a antagonista, a fada Morgana. A inversão corresponderia ao desejo do autor de colocar um guerreiro como contrincante do cavaleiro e de aproximar a função de ajuda do universo feminino, de acordo com o universo cortesão que a obra recria.
Outras categorias de personagens, identificáveis já em Amadís de Gaula, são os destinatários da ação benéfica dos cavaleiros. Genericamente, o rei é o mais importante deles, como símbolo da comunidade; mas há o segmento dos despossuídos: órfãos, viúvas e donzelas desamparadas, ou seja, aqueles que carecem de proteção familiar na sociedade, proteção que cabe ao cavaleiro exercer.
Por último, é necessário que as façanhas do cavaleiro sejam registradas, já que a fama é indispensável para sua realização. Assim sendo, é necessário que haja testemuhas que possam levar até o espaço da corte o registro das aventuras do herói, já que estas, normalmente, acontecem longe dela. Às vezes, no caso de Amadís, a testemunha poderá ser Gandalín, seu escudeiro. Mas o mais freqüente é que personagens acidentalmente encontradas pelo caminho desempenhem essa função.
Dois outros aspectos fundamentais caracterizam as novelas de cavalaria e podem ser analisados no Amadís de Gaula, que é o seu protótipo: o espaço e o tempo. O espaço é completamente convencional. Em se tratando de protagonistas caracterizados não apenas como cavaleiros, porém, basicamente, como “andantes”, a geografia tem, nesses relatos, uma função fundamental. Embora muitos lugares tenham existência real (como Londres) ou seus nomes sejam deformações de lugares reais (Bristoya = Bristol; Vindisolora = Windsor), há outros, a começar por Gaula, cuja localização é problemática. Mas o que interessa é que a novela carece da intenção de se estabelecer uma geografia real; a realidade é a narrativa e o espaço está subordinado à sua função de cenário da aventura; assim, a geografia aparece desprendida de verismo e, especialmente, situada em domínios que, quando identificáveis, são totalmente alheios ao leitor espanhol.
O tratamento do espaço, em Amadís de Gaula, opõe os espaços povoados, normalmente cenário do repouso, e os espaços não povoados, normalmente cenário da aventura. O espaço povoado fundamental é a corte do rei, lugar de reunião dos cavaleiros e ao qual estes sempre tenderão; esse espaço inclui a namorada do cavaleiro, vinculada, por sua vez, ao espaço amoroso, o locus amoenus. Os espaços não povoados, os da aventura, podem ser: a) terrestres, identificados especialmente com a floresta (carente de limitações) ou com os lugares de passagem (pontes, encruzilhadas, etc.) e de reunião (como as fontes), que facilitam os encontros e desencadeamento de aventuras; b) marítimos, onde o mar é um espaço de viagens marcadas pelo perigo e que levam a encontros e desencontros e, até, cenário de batalhas; c) as ilhas, ou espaços terrestres isolados pelo mar que, assim, permitem localizá-las à margem de precisões geográficas e imaginá-las como cenário da aventura; há uma correspondência entre as ilhas, no mar, com a floresta, na terra.
Quanto ao tratamento do tempo, o tempo do enunciado é fixado num período pouco posterior à morte de Cristo, já no início do texto; o tempo da enunciação, no entanto, é claramente determinado por referências do autor à guerra de Granada. Assim sendo, a enorme distância temporal que separaria os fatos de sua narração permite aceitar o caráter fantástico que é impresso àqueles.
A antigüidade dos acontecimentos, no entanto, não implica o correspondente distanciamento cronológico. Pelo contrário, tudo é narrado como se acontecesse no fim da Idade Média, embora deva observar-se que personagens, armas e costumes às vezes podem parecer anacrônicas à época da reelaboração do texto por Montalvo. O falso distanciamento cronológico permite idealizar o universo da cavalaria a partir da atemporalidade histórica em que, na prática, os fatos são localizados.
Esse tratamento a-histórico do tempo será comum aos livros de cavalaria e lhes permitirá reiterar esquemas semelhantes para sucessivas gerações de cavaleiros, até se chegar ao esgotamento do gênero que, não oferecendo maiores possibilidades de ser transgredido irá sofrer as conseqüências da reiteração.
A mesma dose de falsidade nas referências temporais está presente nas indicações da cronologia interna do relato. Embora essas indicações sejam freqüentes, mostram-se vazias, na medida em que nada significam nem permitem uma determinação do tempo transcorrido.
Da mesma maneira, há uma falsificação do tempo no que diz respeito à sucessão das estações do ano, já que não apenas é eliminado o mau tempo mas também o inverno é omitido ou, se se faz presente, leva o cavaleiro a buscar uma outra região de clima mais ameno.
Um outro aspecto de peculiar interesse é o fato de que o desenvolvimento linear da narração das aventuras simultâneas de diferentes personagens leva à pratica do entrelaçamento narrativo, isto é, à interrupção da narração de uma aventura para expor uma outra relativa a uma outra personagem, a qual, por sua vez, deverá ser interrompida para que a narração de uma terceira possa ser iniciada até esta ser interrompida para se voltar à primeira, etc.
O tempo que interessa ao narrador é basicamente o da aventura. Os períodos de repouso de um cavaleiro não interessam e servem apenas para permitir a narração das aventuras de outras personagens. Isso, mesmo quando esses períodos não aventureiros possam significar a culminação de processos amorosos.
Com relação ao tempo existencial dos cavaleiros, a obra de Montalvo se centra na juventude, aberta com a investidura como cavaleiro e fechada pelo matrimônio público. A infância é, assim, muito brevemente resenhada e a maturidade significa o momento de deixar o espaço a novos cavaleiros. O tempo, no entanto, não muda as personagens que, assim, são absolutamente planas.
Com relação à língua utilizada por Montalvo, ela se caracteriza pela freqüência dos arcaísmos que bem podem ser um resíduo da língua do texto original refeito por Montalvo como podem ser uma opção deste último para caracterizar seu texto. Como quer que seja, o sentidoarcaizante do Amadís de Gaula será parte da receita que, como modelo do gênero, passará aos livros de cavalaria e um dos aspectos explicitamente parodiados por Cervantes em Dom Quixote de la Mancha.
Um outro aspecto do estilo a ser observado é a sua uniformidade. Não apenas só aparecem personagens nobres e, assim, só temos a fala dessa classe, como também não há registros diferenciadores de uma personagem para a outra; todos eles falam da mesma maneira, num estilo que não se diferencia daquele do narrador, habitualmente carregado de retórica e que merecerá também a paródia cervantina. O sentido dessa linguagem é também a de estabelecer um modelo de fala, compatível com o modelo de conduta que o cavaleiro significava. Essas características estilísticas se estenderão, igualmente, a todas as posteriores manifestações do gênero cavaleiresco.
Sucesso e ocaso das novelas de cavalaria
O texto de Montalvo não apenas teria um enorme sucesso imediato, mas, como já foi dito, desencadearia a existência de uma avalanche de obras nele inspiradas e que configurariam um gênero aparentemente fora de hora e de lugar. A obra de Montalvo, como tal, seria objeto de, no mínimo, 19 edições entre 1508 e 1586, sendo que, alguma delas, como a de Sevilha, de 1552, sofreu 14 reimpressões. Na segunda metade do século já haveria uma diminuição no interesse pelos relatos de cavalaria, em função da concorrência de novos gêneros, como a novela pastoril ou a épica culta, além do fato de que a América (substrato inegável do sucesso da novela de cavalaria na primeira metade do século) passa a ser uma realidade melhor conhecida e que, assim, cada vez deixa menos espaço para a fabulação. Por outro lado, o fracasso da quixotesca aventura que significou a expedição da “Armada Invencível”, em 1588, sem dúvida contribuiu para arrefecer o interesse pelo gênero. No entanto, até essa época, consta que os livros de cavalaria foram consumidos por indivíduos de todas as classes sociais, quer seja na leitura privada, quer seja mediante as leituras públicas, como a registrada por Cervantes em Don Quijote de la Mancha (I, XXXII). Isso levou a uma proliferação de obras que, imitando o modelo estabelecido pelo Amadís de Gaula, nem sempre mantiveram sua qualidade literária. Uns cinqüenta títulos seriam publicados nos cem anos posteriores à publicação deste, muitas vezes como continuações de uma obra precedente, dando lugar a verdadeiras linhagens. Com as sucessivas reedições e reimpressões teremos que, sem se contar as traduções, houve umas trezentas edições de livros de cavalaria no mencionado período. Leitura favorita dos conquistadores da América (apesar da proibição de levá-los para o outro lado do Atlântico), sem dúvida facilitaram, em alguma medida, a compreensão da empresa por eles levada adiante como própria do universo fantástico dessas narrativas. Por sua vez, a Igreja Católica os condenaria fundamentalmente porque estabeleciam um universo onde ela, como instituição, assim como muitos dos seus preceitos ficavam ausentes, embora o cavaleiro aparecesse sempre atuando em defesa da fé. O universo libertário do cavaleiro andante não podia ser tolerado pela hierarquia eclesiástica, mesmo que nela não faltassem leitores de suas aventuras.
A reiteração do modelo, essencialmente impossível de ser recriado ou transformado à época, levou o gênero a uma falência que já era evidente quando Cervantes os parodia em seu Dom Quixote. Os livros de cavalaria constituem hoje leitura quase que exclusiva de especialistas. O próprio Amadís de Gaula deixou de ser publicado a partir de 1586 até 1837. O interesse que, no entanto, o gênero hoje suscita se atrela, em boa medida, ao fato de que nas suas paródias (a mencionada obra prima de Cervantes e o anônimo Lazarillo de Tormes) se apóia o romance moderno. Assim sendo, torna-se indispensável o conhecimento do modelo parodiado para a correta compreensão dessas paródias e da mudança que, desse modo, significam na história da literatura.
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�Artificio de Montalvo para fazer crer que sua história esteja baseada na verdade.

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