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Aulas De Hist. do Direito Brasileiro

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A ORIGEM DO BRASIL PORTUGUÊS E O DIREITO NA COLÔNIA
 ASPECTOS GERAIS DA FORMAÇÃO DO REINO PORTUGUÊS, DA EXPANSÃO MARÍTIMA PORTUGUESA, DO PROCESSO COLONIZADOR E DA CONSTRUÇÃO DA ORDEM JURÍDICO-POLÍTICA NO BRASIL DOS SÉCULOS XVI, XVII E XVIII
Detalhe do mapa Terra Brasilis (1519), fruto da expansão marítima portuguesa
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As armas e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram...
CAMÕES, Luis de. Os Lusíadas, canto primeiro, primeira oitava.
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A FORMAÇÃO DO REINO PORTUGUÊS: DA INDEPENDÊNCIA (SÉCULO XII) À REVOLUÇÃO DE AVIS (FINAL DO SÉCULO XIV)
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A formação portuguesa encontra-se intimamente relacionada ao seu caráter militar, condição esta que se configurou a partir de uma luta desenvolvida em duas frentes:
A luta contra os mouros que deve ser considerada dentro de um movimento maior – a RECONQUISTA, levada a cabo pelos cristãos contra os muçulmanos que haviam invadido a Península Ibérica por volta de 711, na vaga expansionista do islamismo, então em plena expansão.
A luta contra os castelhanos e leoneses, de cujo reino (o reino de Leão), o Condado Portucalense (posteriormente, Reino de Portugal) se separou em 1139.
OBS: Pelo Tratado de Zamora, firmado em 1143 entre o duque de Portugal (D. Afonso Henriques de Borgonha – 1128/1185) e D. Afonso VII, imperador de Leão, determinou-se que este último deveria reconhecer a independência do antigo condado, agora, Reino de Portugal sob o comando da Dinastia de Borgonha.
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A economia portuguesa durante o período da dinastia de Borgonha caracterizou-se pela hegemonia do setor agrário dominado pela nobreza, ao mesmo tempo em que se verificava uma crescente intervenção régia em relação à PRODUÇÃO, à REGULAMENTAÇÃO DE PREÇOS E SALÁRIOS e à CONCESSÃO DE TERRAS - tal hegemonia econômica da nobreza vinha acompanhada de preeminência política.
Todavia, ao longo dos séculos XIII e XIV, desenvolveu-se uma intensa atividade comercial de “longo curso” (marítima) que passou a se articular com a agricultura, especialmente com as “novas culturas” de vinhas e de oliveiras para a produção de produtos fundamentais para a movimentação comercial portuguesa: VINHOS e AZEITE.
Características desta evolução econômica portuguesa:
 Crescimento do número de feiras e expansão da economia monetária, com conseqüente aumento de preços.
Aumento da pressão do comércio sobre as propriedades agrícolas no sentido do desenvolvimento de culturas mais rentáveis.
Empobrecimento da nobreza (por força da crise do século XIV) e enriquecimento do grupo mercantil ligado ao comércio internacional, o que levou a seu fortalecimento político.
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PRIMEIRO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
A crise do século XIV atingiu Portugal com grande intensidade, especialmente os setores da nobreza ligados à agricultura tradicional . A segunda metade deste século foi marcada por uma série crise dinástica (o final do reinado de D. Fernando – 1367/1383) e uma crise econômica igualmente grave.
A monarquia tentou recuperar alguns dos privilégios e ganhos da nobreza, diante do avanço dos setores mercantis nos diversos campos de atuação da sociedade (econômico e político), mas foi em vão.
A crise dinástica conduziria à eclosão da Revolução de Avis (1383/1385) e à reafirmação da independência portuguesa com a vitória sobre forças castelhanas na batalha de Aljubarrota (1385), inaugurando-se, com D. João I, mestre de Avis, a dinastia de Avis.
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A EXPANSÃO MARÍTIMA PORTUGUESA
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A posição geográfica de Portugal, voltada para o Atlântico e, principalmente, ao longo do século XIV, seus principais portos (Lisboa e Porto) servindo de entrepostos nas relações comerciais entre as regiões produtoras do Mediterrâneo e as do Mar do Norte/Mar Báltico.
O fortalecimento e a crescente centralização do poder monárquico levada a cabo, a partir de 1385, por D. João I, o primeiro rei da Dinastia de Avis que substituiu a Dinastia de Borgonha que governara Portugal desde sua formação em meados do século XII.
Conjugação dos interesses da nobreza na incorporação de novos territórios, com os interesses da burguesia mercantil, das principais cidades portuárias, voltados para os lucros do comércio marítimo, sob os auspícios da monarquia e da Igreja Católica.
Aquisição de conhecimentos náuticos de construção naval e de experiência organizacional na montagem de expedições marítimas – tais conhecimentos foram adquiridos, principalmente, ao longo do século XV .
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SEGUNDO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
A posição geográfica de Portugal tornou-se mais significativa durante o século XIV, quando, por força da incidências de surtos de doenças infectocontagiosas (como a PESTE NEGRA), associadas a condições climáticas adversas, más colheitas e guerras, em grande parte da Europa Ocidental e Central, as rotas comerciais terrestres entre o Mediterrâneo e as regiões situadas às margens do Mar do Norte/Mar Báltico foram, em grande parte, substituídas pelo comércio marítimo, o que favoreceu as regiões portuárias de Portugal, especialmente Lisboa, que se tornou um grande entreposto comercial nas ligações entre a área do Mediterrâneo e o Mar do Norte/Mar Báltico .
Com a ascensão da Dinastia de Avis ao comando da monarquia portuguesa a partir do fim da Revolução de Avis (ocorrida entre 1383 e 1385), verificou-se um crescente fortalecimento da centralização monárquica em Portugal, tendo seu primeiro rei, D. João I (Mestre da Ordem de Avis), atuado com grande habilidade política no sentido de conjugar os interesses da nobreza e da burguesia mercantil na consecução do ataque à cidade de Ceuta localizada no norte da África, nas proximidades do Estreito de Gibraltar (que se constitui na passagem do Mediterrâneo para o Atlântico), ataque este que é considerado como o evento inaugurador da expansão marítima portuguesa.
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TERCEIRO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
A caminhada de Portugal no sentido da Modernidade do século XVI só pode ser entendida quando devidamente associada ao processo de expansão marítima ocorrida ao longo de todo o século XV e das primeiras décadas do século XVI.
Tal expansão encontra suas origens ainda no século XIV, quando comerciantes, pescadores e técnicos em navegação se mostraram capazes de navegar em alto-mar. 
A expansão portuguesa iniciada nos primórdios do século XV desenvolveu-se por etapas, não existindo um plano inicial voltado para o atingimento das Índias.
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QUARTO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
A partir de 1460, com a morte do Infante D. Henrique, verificou-se uma interrupção no de expansão, já que o rei Afonso V manifestou interesse pelo norte da África, arrendando o monopólio do comércio africano à iniciativa privada.
Esta interrupção do processo de expansão marítima portuguesa ocorrida no reinado do rei Afonso V (1438-1481) se constituiu em um dos muitos episódios que marcaram os conflitos políticos entre a nobreza e a monarquia, mais precisamente o confronto entre a perspectiva do poder senhorial dos grandes nobres e as pretensões centralizadoras da monarquia.
Tal condição se reverteu no reinado de João II (1481-1495) que passou a tomar medidas francamente hostis à nobreza, incrementando o poder de sua burocracia e enfraquecendo o poder senhorial – com a intimidação da nobreza e com a consolidação da Monarquia, a partir de 1485 retomou-se o projeto da expansão marítima, agora com o objetivo de atingir as Indias.
A concorrência com a Espanha no Atlântico teve uma primeira solução com o Tratado de Alcáçovas (1479), através do qual Portugal reconhecia a soberania espanhola sobre as Canárias enquanto que a Espanha reconhecia a soberania portuguesa sobre as demais ilhas do Atlântico – este tratado afirmou o princípio do MARE CLAUSUM pelo qual a prioridade da descoberta dos
mares determinava sua posse, com a exclusão das demais nações cristãs.
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QUINTO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
Até 1486, Portugal conseguiu bulas papais bastante favoráveis a sua política de expansão marítima (bulas concedidas pelos papas Sisto IV e Inocêncio IV), uma vez que a disputa com os espanhóis parecia resolvida com o Tratado de Alcáçovas. 
Todavia, a partir de 1492, com a ascensão do papa Alexandre VI (que era aragonês), todas as decisões sobre a delimitação das áreas portuguesas e espanholas passaram a ser claramente favoráveis aos reis espanhóis, especialmente após a chegada de Cristóvão Colombo à América (tendo chegado às Antilhas, tomou tais ilhas como parte do continente asiático).
Com isso, os reis católicos espanhóis obtiveram do papa Alexandre VI a Bula Inter Coetera (03/05/1493) que confirmava as conquistas de Colombo em favor da Espanha, ao mesmo tempo em que dava aos reis espanhóis autoridade sobre qualquer território situado a mais de cem léguas a oeste e ao sul das ilhas portuguesas de Açores e Cabo Verde.
O rei português João II negou-se a aceitar os termos da bula de 1493 e diante da reação diplomática portuguesa em Roma e da ameaça de intervenção militar por parte de Portugal, os reis católicos concordaram em revisar os dispositivos da bula Inter Coetera e em 1494 foi firmado o Tratado de Tordesilhas (ato inaugural da diplomacia moderna, já que foi o primeiro acordo entre Estados, sem a interferência do Papa) – por este tratado, a linha de demarcação entre as áreas portuguesas e espanholas passaria a 370 léguas a oeste dos arquipélagos de Açores e Cabo Verde.
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SEXTO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
O Tratado de Tordesilhas contemplou, tal como o Tratado de Alcáçovas, o princípio do MARE CLAUSUM que seria combatido mais tarde por outro princípio, o do MARE LIBERUM, defendido pelos países que se sentiam prejudicados pelo monopólio ibérico (França, Inglaterra e Holanda);
O Tratado de Tordesilhas era impreciso demais para resolver a disputa entre portugueses e espanhóis – tal imprecisão se devia ao fato de que inexistia um procedimento científico e prático que possibilitasse a observação precisa das longitudes o que dificultava a localização exata, por exemplo, dos pontos onde o meridiano cortava o continente sul-americano. Assim, portugueses e espanhóis, obedecendo às realidades geográficas, trataram de tirar o máximo de vantagens, demonstrando pouco respeito pelas disposições do tratado.
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ALGUMAS CARACTERÍSTICAS JURÍDICO-INSTITUCIONAIS DO REINO PORTUGUÊS NOS PRIMÓRDIOS DA “ERA” MODERNA: SÉCULOS XV E INÍCIO DO SÉCULO XVI.
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No processo histórico de formação e de individualização do direito português, o período que se inicia por volta de meados do século XV foi marcado pela produção de COMPILAÇÕES de um imenso conjunto de tipos normativos que se encontravam em vigência em Portugal desde sua formação como uma monarquia independente em meados do século XII.
Estas compilações ficaram conhecidas como as ORDENAÇÕES DO REINO:
ORDENAÇÕES AFONSINAS (1446/1447);
ORDENAÇÕES MANUELINAS (1521);
Coletânea de Leis Extravagantes de Duarte Nunes de Leão (1569);
ORDENAÇÕES FILIPINAS (1603) e confirmadas por D. João IV (1643).
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Com as ORDENAÇÕES AFONSINAS buscou-se, essencialmente, sistematizar e atualizar o direito vigente à época, em Portugal, tendo sido utilizadas em sua elaboração várias espécies de fontes anteriores, tais como: leis gerais, resoluções régias, concórdias, concordatas, bulas, inquirições, costumes gerais e locais, estilos da Corte e dos tribunais superiores (ou seja, jurisprudência), preceitos de direito romano e de direito canônico.
Por possível influência das Decretais do Papa Gregório IX (coletânea de normas canônicas promulgada em 1234), as Ordenações Afonsinas foram divididas em cinco livros, cada um deles compreendendo um certo número de títulos, com rubricas indicativas de seu objeto e freqüentemente subdivididos em parágrafos;
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ESTRUTURA DAS ORDENAÇÕES AFONSINAS
O Livro I abrange 72 títulos que se ocupam dos regimentos dos diversos cargos públicos (tanto régios como municipais), compreendendo o governo, a justiça, a fazenda e o exército – este livro apresenta um conteúdo de natureza jurídico-administrativa;
O Livro II apresenta 123 títulos bastante heterogêneos, disciplinando-se os bens e privilégios da Igreja, os direitos do rei, a jurisdição dos donatários, as prerrogativas da nobreza, o estatuto dos Judeus e dos Mouros, consagrando assim providências de natureza política ou constitucional;
O Livro III, com 128 títulos, trata do processo civil, incluindo a execução, regulando-se nele extensamente os recursos, havendo, contudo alusões ao processo criminal;
O Livro IV, ao longo de 112 títulos, se ocupa do direito civil substantivo, especialmente de temas de direito das obrigações, de direito das coisas, de direito da família e de direito das sucessões, sem grande ordem sistemática; 
O Livro V contém 121 títulos sobre direito criminal e processual criminal – todavia alguns atos processuais criminais encontram-se também regulados no Livro III.
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As ORDENAÇÕES AFONSINAS assumem uma posição significativa na história do direito português, constituindo uma síntese da trajetória deste ordenamento jurídico que, desde a formação da monarquia portuguesa (meados do século XII), afirmou e consolidou a autonomia do sistema jurídico português no conjunto das formações políticas da Península Ibérica.
As ORDENAÇÕES MANUELINAS (que tiveram edição definitiva em 1521) mantiveram a estrutura básica de cinco livros, integrados por títulos e parágrafos e conservou-se a distribuição das matérias conforme o disposto nas ORDENAÇÕES AFONSINAS, ainda que nas Ordenações Manuelinas sejam verificadas algumas notáveis diferenças de conteúdo.
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Dentre estas diferenças podemos citar: a supressão dos preceitos aplicáveis a Judeus já que os mesmos foram expulsos do reino em 1496 e das normas relativas à Fazenda que passaram a compor as Ordenações da Fazenda, além da inclusão da disciplina vinculativa da lei através dos assentos da Casa de Suplicação. 
Sob a égide das Ordenações Afonsinas e Manuelinas se desenvolveu o processo de expansão marítima portuguesa e de formação de seu império colonial.
As diversas funções do Estado português (como por exemplo, segurança, ordem, gestão dos interesses financeiros, prestação de justiça), assim como suas futuras colônias (entendidas como extensões jurídico-institucionais da Metrópole), encontraram-se submetidas a uma mesma lógica administrativa – na realidade, o “espaços” administrativos coloniais passaram por adaptações que tornaram possível o projeto colonial português.
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Dentre os vários tipos de instrumentos legais (além dos decretos e das leis) que marcaram a administração metropolitana portuguesa e de suas colônias, podemos destacar:
Os Regimentos: destinavam-se a instruir os funcionários em suas áreas de atuação, estabelecendo suas atribuições, obrigações e a jurisdição dos diversos órgãos incumbidos de gerir a administração colonial;
Os Alvarás: com duração formal de um ano (podendo, muitas vezes, ter o prazo de validade dilatado) se constituíam em importantes atos jurídicos da administração colonial;
As Cartas (régias, de sesmarias, forais, patentes): destinavam-se a variadas finalidades e determinações especiais voltadas para a regulação do campo administrativo.
Este conjunto de atos legais quase nunca seguia critérios regulares, nem quanto à forma e nem quanto à periodicidade.
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Com relação aos FORAIS, estes se constituíam como uma das formas jurídicas mais antigas do direito português, tendo se constituído como fontes do direito desde as origens da monarquia portuguesa no século XII – em termos gerais, o Foral, carta foral ou carta de foro era um documento jurídico, outorgado por autoridade legítima, que se destinava a regular a vida coletiva de povoação, nova ou já existente, formada por
homens livres ou por homens que ele revestia dessa condição.
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CLASSIFICAÇÃO DOS FORAIS (SEGUNDO O ALCANCE E O CONTEÚDO)
Cartas de povoação: são os forais mais rudimentares, que contêm, apenas certo número de disposições respeitantes ao início do povoamento, para defesa ou exploração agrícola estável de uma terra erma e a habitar para cultivo.
Foro breve: documento legal em que se inserem normas de conduta local, quer originais, quer extraídas, mais ou menos livremente, de outros paradigmas de agregados habitacionais já existentes, mais evoluídos e destinados a criar ou melhorar a organização coletiva do núcleo de moradores a que se destina.
Foros extensos: são os mais desenvolvidos e pormenorizados. Seu conteúdo envolve dois elementos primordiais. O primeiro refere-se à garantia da propriedade plena de terras e casas, possuídas pelos membros da coletividade local, com direito de livre alienação, em vida ou por morte, embora, em muitos casos, com encargos ou restrições. O segundo diz respeito à determinação explícita dos tributos ou prestações que os vizinhos terão de fazer à entidade outorgante, de modo a evitar quaisquer arbitrariedades ou abusos.
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As ORDENAÇÕES FILIPINAS, que de acordo com o historiador Stuart Schwartz, se constituíram como uma “revisão” (que constou de acréscimos, cancelamentos e retificações quando necessários) das ORDENAÇÕES MANUELINAS (1521) e da COLEÇÃO DE LEIS EXTRAVAGANTES de Duarte Nunes de Leão (1569), revisão esta que ficou pronta em 1595, mas que somente foi publicada em 1603.
A elaboração das ORDENAÇÕES FILIPINAS deve ser entendida no contexto de um conjunto de reformas nas estruturas judiciais e administrativas portuguesas (reformas estas que se produziram entre 1581 e 1590) promovidas no início da UNIÃO IBÉRICA por Felipe II e Felipe III de Espanha (Felipe I e Felipe II de Portugal) e que geraram efeitos duradouros tanto em Portugal como em suas colônias (mais particularmente no Brasil).
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Durante os séculos XV e XVI, ocorreram em Portugal manifestações no sentido da implantação de uma reforma judicial que se fazia necessária em virtude dos seguintes fatores: 
complexidade da “teia normativa”; 
pouca eficácia da “lei” para os indivíduos mais poderosos que se apropriavam de postos judiciais e administrativos pela nomeação de seus empregados; 
privilégios da alta hierarquia da Igreja e dos fidalgos; 
treinamento deficiente e má vontade dos “letrados” e dos juízes com relação a seus afazeres; 
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Pelos acordos de Tomar, gerados pelas reivindicações produzidas nas Cortes de Tomar (1581), Felipe II tomou uma posição cautelosa com relação à reforma judiciária, mantendo formas e costumes portugueses e nomeando o jurista português Damião de Aguiar para a presidência da comissão que procederia a reforma.
Tal como as ordenações portuguesas anteriores, as Ordenações Filipinas também se dividiam em 05 livros.
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ESTRUTURA DAS ORDENAÇÕES FILIPINAS
LIVRO I: matérias acerca de Direito Administrativo e Organização Judiciária;
LIVRO II: disposições a respeito dos direitos dos eclesiásticos, dos fidalgos, dos privilégios do Rei, envolvendo ainda fontes de direito, jurisdição e poderes;
LIVRO III: essencialmente de caráter processual civil, contendo ainda regras gerais sobre fontes, vigência das leis que auxiliavam os juízes na tomada de decisões;
LIVRO IV: matérias de direito civil e comercial: regras de contratos (compra e venda, sociedade, aluguéis e rendas da terra), relações entre servos e amos, aforamentos, censos, sesmarias, parceria entre marido e mulher, empréstimos, mútuos, depósitos, fianças, doações)
LIVRO V: trata de crimes e do processo penal.
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A CONSTRUÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA
COLONIZAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DO APARATO JURÍDICO-ADMINISTRATIVO
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De acordo com Darcy Ribeiro, o Brasil e os brasileiros, sua gestação como povo, se produziu a partir da confluência, do entrechoque, do caldeamento do INVASOR PORTUGUÊS com ÍNDIOS SILVÍCOLAS E CAMPINEIROS e com NEGROS AFRICANOS – tanto os índios como os negros, uns e outros aliciados como ESCRAVOS;
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES INCIAIS A RESPEITO DA FORMAÇÃO COLONIAL BRASILEIRA:
Nesta confluência que se processou sob a regência dos PORTUGUESES, diferentes matrizes étnicas, distintas tradições culturais e formações sociais díspares se enfrentaram e se fundiram para dar lugar a um povo novo e a um novo modelo de organização societária;
Em seus três primeiros séculos (XVI, XVII e XVIII), a história do Brasil esteve intimamente ligada à história da EXPANSÃO COMERCIAL E COLONIAL EUROPÉIA da chamada IDADE MODERNA - como parte integrante do IMPÉRIO ULTRAMARINO PORTUGUÊS, o Brasil, durante o período colonial, refletiu os problemas e os mecanismos de conjunto que agitaram a política imperial lusitana.
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A história da expansão ultramarina e da exploração colonial portuguesa se desenrolou no amplo quadro da competição entre as várias potências, em busca do equilíbrio europeu;
É, portanto, na história do sistema geral da colonização européia moderna que devemos buscar o esquema de determinações dentro do qual se processou a organização da vida econômica e social do Brasil na primeira fase de sua história e se encaminharam os problemas políticos de que esta região foi o palco.
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A ESTRUTURA JUDICIAL-ADMINISTRATIVA DO “EMPREENDIMENTO” PORTUGUÊS NO BRASIL (ENTRE 1530 E 1580)
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“A justiça é de tão grande e particular obrigação minha, e tão necessária para a conservação e acrescentamento dos Estados, que tudo o que na administração dela encarregar será muito menos do que desejo” (trecho do Regimento de 23/01/1677 passado pelo rei de Portugal a Roque da Costa Barreto, governador geral do Estado do Brasil) 
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Caracterização inicial da estrutura judicial portuguesa na colônia americana:
Desde as primeiras etapas da colonização portuguesa na América, a aplicação da justiça foi uma das preocupações principais da Coroa – no Brasil, a implantação do aparelho judicial, além dos propósitos tradicionais (fazer cumprir a lei, evitar abusos e crimes, garantir a tranqüilidade social), trazia consigo ainda a finalidade de controlar os próprios funcionários administrativos, sobretudo aqueles relacionados à Justiça.
A expressão “justiça” no período colonial assumiu uma conotação bem mais ampla do que a atual, referindo-se não apenas à organização do aparelho judicial, mas também apresentando-se como sinônimo de lei, legislação, direito.
Visando reduzir ou mesmo evitar interferências de interesses particulares que dificultassem o exercício da justiça nas áreas coloniais, as atribuições dos diversos funcionários judiciais objetivavam uma fiscalização recíproca, ao mesmo tempo em que a montagem de uma estrutura judicial na Colônia teve como tendência a constante ampliação dos poderes concedidos aos funcionários mais diretamente ligados à Coroa.
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (I): 1530/1580
Em 1530, Martim Afonso de Sousa recebeu documento régio que lhe dava poderes quase absolutos para a aplicação da lei nos territórios que viesse a descobrir, estendendo-se sua alçada a condenações até a pena de morte, SEM POSSIBILIDADE DE APELAÇÃO, exceto no caso do acusado ser FIDALGO, quando então caberia recurso a Lisboa;
Por meio de outra carta de poderes da mesma data, era conferido a Martim Afonso o direito de criar ofícios de Justiça necessários a montagem da administração judicial na Colônia;
Apesar destes poderes iniciais concedidos a um agente da Coroa (a expedição de Martim Afonso teve caráter oficial, financiada pela Tesouro Real), a colonização, em suas etapas iniciais, se fez pela concessão de imensos poderes e ampla autonomia (EXCETO NA ÁREA FAZENDÁRIA) a todos os que se dispusessem a investir seus capitais na região - os CAPITÃES DONATÁRIOS;
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (II): 1530/1580
- No
que se refere ao funcionamento do sistema de capitanias hereditárias, este foi regulamentado pela CARTA DE DOAÇÃO e pelo FORAL (passados em 10/03 e em 24/09 de 1534 ao capitão donatário da capitania de Pernambuco – Duarte Coelho).
- Estes documentos foram fundamentais quanto à jurisdição e aos privilégios concedidos aos donatários pela Coroa, além de representar o esboço da organização de alguns aspectos administrativos na Colônia: a aplicação da lei (Justiça), a cobrança de tributos e fiscalização do comércio (Fazenda) e manutenção da ordem interna/proteção contra a concorrência externa (Defesa).
- As CARTAS DE DOAÇÃO estabeleciam as dimensões de cada uma das capitanias, declaradas hereditárias, e que por isso possuíam direitos amplos de sucessão por morte do donatário ou por outros motivos regimentais.
- Os FORAIS regulamentavam os direitos fiscais e os privilégios dos donatários, além de estabelecer os tributos régios.
- Através destes diplomas legais, os donatários obtiveram o direito de conceder sesmarias, fundar vilas, exercer monopólio da navegação fluvial, das moendas e dos engenhos;
Deveriam exercer o comando militar, fiscalizar o comércio, aplicar ou delegar o cumprimento da lei nas terras sob sua jurisdição;
Cabia-lhes também a nomeação de algumas autoridades administrativas (o OUVIDOR, para zelar pelo cumprimento da lei, os TABELIÃES para dar validade legal aos atos e os ALCAIDES-MORES, para garantir a defesa da capitania;
Tinham também a competência para presidir as eleições dos juízes ordinários (principais autoridades das câmaras municipais) e de alguns funcionários menores da administração local (os MEIRINHOS e os ESCRIVÃES).
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Quanto à arrecadação e fiscalização das rendas reais, a Coroa portuguesa revelou-se mais cautelosa, designando de um agente de sua confiança para tais funções - a nomeação do FEITOR e ALMOXARIFE, de acordo com a “lógica da vigilância” seguida pelo Reino, deveria evitar os descaminhos das rendas coloniais para as mãos de seus parceiros-donatários.
Os poderes concedidos aos donatários pela Carta de Doação e pelo Foral, davam a estes ou ao funcionário indicado na esfera judicial, o OUVIDOR, jurisdição sobre o crime e o cível – na verdade, mais do que isto, era garantida INDEPENDÊNCIA NAS QUESTÕES DE JUSTIÇA, uma vez que era vedada a entrada de qualquer autoridade judicial nas capitanias para fiscalizar a atuação dos donatários ou de seus prepostos.
Assim, entre 1530 e 1548, a administração judicial na Colônia ficou sob a DIRETA E EXCLUSIVA RESPONSABILIDADE E ARBÍTRIO dos donatários, NÃO TENDO ESTES QUALQUER ALÇADA SOBRE QUESTÕES QUE ENVOLVESSEM ECLESIÁSTICOS.
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (III): 1530/1580
Com a instituição do Governo-Geral, em 1548, não foram abolidas as capitanias hereditárias, limitando-se, todavia, o poder dos donatários, especialmente na esfera da Justiça – juntamente com o cargo de governador-geral, criou-se o de OUVIDOR-GERAL (o primeiro ocupante deste cargo foi o desembargador Pero Borges);
Apesar do desconhecimento do teor do Regimento que foi passado ao desembargador Pero Borges, tudo indica que a criação do cargo de Ouvidor-Geral trouxe limitações a atuação dos donatários na prestação jurisdicional;
 Referências a um alvará de 05/03/1557, dão conta de restrições impostas à competência dos donatários e de seus ouvidores nas questões de CONDENAÇÃO À MORTE, CRIMES DE HERESIA, SODOMIA, MOEDA FALSA E TRAIÇÃO;
 Este alvará possibilitou também a entrada de funcionários da Justiça Real nas capitanias hereditárias;
- Todavia, mais importante que a diminuição da alçada dos donatários foi a permissão de entrada do Ouvidor-Geral nas capitanias, para FAZER CORREIÇÃO, isto é, FISCALIZAR A ATUAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS RESPONSÁVEIS PELO GOVERNO E PELA JUSTIÇA;
- Isto acabou implicando um maior poder dos agentes da Coroa sobre a administração particular, e em especial, sobre o CUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO, objetivando coibir os abusos e os desmandos dos capitães donatários ou de seus ouvidores.
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A partir de 1548, organizou-se, em suas linhas básicas, o arcabouço da administração judicial na Colônia. As principais instâncias desta estrutura eram:
As povoações: localidades mais afastadas, com população entre 25 e 50 habitantes e que não constituíam um município – nelas atuava um JUIZ DE VINTENA, escolhido dentre os moradores do lugar pela Câmara Municipal mais próxima.
Os termos ou municípios: menor divisão administrativa, onde se encontravam os JUÍZES ORDINÁRIOS, eleitos pela Câmara Municipal, com alçada sobre as demandas ali acontecidas – os ocupantes destes cargos não eram LETRADOS, ou seja, não tinham formação jurídica - exerciam funções judiciais e administrativas, com jurisdição sobre as demandas locais nos âmbitos cível e criminal, sendo eleitos pelos chamados “homens bons” da comunidade (excluindo-se trabalhadores manuais e comerciantes), tais como os demais membros da Câmara Municipal. 
As comarcas: divisões judiciais das capitanias, que possuíam um OUVIDOR próprio (segundo Caio Prado Júnior, no século XVIII cada capitania possuía apenas uma comarca, com exceção de Minas Gerais e Bahia que possuiam quatro e S. Paulo e Pernambuco, três).
As capitanias: onde os OUVIDORES exerciam suas funções, sendo nomeados pelos donatários no caso das capitanias hereditárias e pelo rei, a partir do alvará de 05/03/1557, nas capitanias da Coroa – além de julgar os recursos das decisões dos juízes ordinários, os OUVIDORES conheciam processos, por AÇÃO NOVA, de questões surgidas até 10 léguas ao redor de onde estivesse.
O governo-geral: tinha como autoridade máxima da Justiça na Colônia o OUVIDOR-GERAL, subordinado administrativamente apenas ao GOVERNADOR-GERAL. O OUVIDOR-GERAL julgava os recursos vindos dos ouvidores das capitanias e dispunha de poderes para investigar a aplicação da legislação em todas as localidades.
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Havia também :
Juízes de Fora: magistrados profissionais (LETRADOS) de nomeação real cujos objetivos eram corrigir as ações dos juízes ordinários e aumentar o poder do rei – no Brasil, os juízes de fora somente foram estabelecidos no final do século XVII; 
Juízes de Órfãos: encarregados de zelar pelos órfãos e seus bens, podia ser substituído pelo Juiz Ordinário; 
Acima do Ouvidor-Geral, mas no Reino, encontrava-se a Casa de Suplicação, para onde se dirigiam as apelações e os agravos das sentenças proferidas, cabendo daí recurso ao DESEMBARGO DO PAÇO, que apresentava ao Rei a decisão final.
Cada um dos funcionários a que nos referimos anteriormente, dispunha de uma série de oficiais menores, que os auxiliavam no exercício de suas funções (MEIRINHOS, TABELIÃES, ESCRIVÃES), estendendo-se assim, a administração judicial, por todo o território colonial, tendo a Metrópole o cuidado de ocupar os cargos mais importantes com agentes diretamente ligados a ela.
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A ESTRUTURA JUDICIAL-ADMINISTRATIVA DO “EMPREENDIMENTO” PORTUGUÊS NO BRASIL (ENTRE 1580 E O FINAL DO SÉCULO XVII)
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (I): 1580/1640
Para melhor garantir o controle sobre a organização judicial da Colônia, a Coroa ibérica (1580/1640) projetou criar um tribunal na Colônia, semelhante, em sua estrutura, à Casa de Suplicação de Lisboa e formado por desembargadores designados pela Metrópole – o Regimento de 25/09/1587 regulamentou a RELAÇÃO DO ESTADO DO BRASIL, com sede em Salvador, verificando-se, todavia, sua instalação, em 1609, quando foi baixado um novo regimento similar ao anterior;
- Em 1608, foi criado um governo-geral no Sul, a REPARTIÇÃO DO SUL, sendo nomeado, junto com o governador, um OUVIDOR-GERAL DO SUL, que possuía jurisdição em questões judiciais sobre todas as capitanias da área (S. Vicente, Rio de Janeiro e Espírito Santo);
Esta ouvidoria continuou existindo mesmo após a extinção do governo-geral do Sul, em 1612;
 O primeiro Regimento baixado para
este ouvidor tem a data de 05/06/1619 e por ele, cabia ao OUVIDOR-GERAL DO SUL julgar recursos das sentenças dos juízes ordinários e dos ouvidores das capitanias do Sul, subordinando-se à RELAÇÃO DO ESTADO DO BRASIL, para onde enviava as apelações e os agravos dos feitos que julgasse;
 Outro Regimento de 31/03/1626, manteve as funções que lhe foram determinadas anteriormente, retirando somente o poder de realizar correições nas capitanias de sua jurisdição;
Neste mesmo período, existia um juízo especial referente às questões de órfãos, defuntos, ausentes, cuja instância máxima era a MESA DE CONSCIÊNCIA E ORDENS (cuidava dos bens e testamentos dos que faleciam e dos que deixavam filhos) localizada na Metrópole e que na Colônia cabia ao PROVEDOR DE DEFUNTOS E AUSENTES (que teve um primeiro Regimento em 1613 que lhe atribuía a mesma alçada dos ouvidores de capitania no tocante aos bens dos mortos).
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (II): 1580/1640
O Regimento de 07/03/1609 estabeleceu o funcionamento da RELAÇÃO DO ESTADO DO BRASIL, o qual viria garantir à Coroa maior vigilância sobre a aplicação das leis na Colônia – constituiu-se como o tribunal máximo na Colônia, recebendo recursos de todas as instâncias judiciais existentes,subordinando e fiscalizando, através das correições e “residências”, os demais funcionários e oficiais de Justiça, nomeados ou não pelos donatários;
O Tribunal da Relação era dirigido pelo próprio Governador-Geral e era formado por magistrados profissionais (um Chanceler, dois Desembargadores dos Agravos e Apelações, um Ouvidor-Geral do Cível e do Crime, um Juiz dos Feitos da Coroa, Fazenda e Fisco, um Provedor dos Defuntos e Resíduos e mais dois desembargadores extravagantes) e por oficiais menores, tornando-se assim, a Relação, passagem quase que obrigatória aos letrados que almejassem atuar nas instâncias judiciais hierarquicamente superiores localizadas na Metrópole, como a Casa de Suplicação;
O exercício do cargo de GOVERNADOR DA RELAÇÃO, por parte do GOVERNADOR-GERAL, indica a inexistência da divisão de poderes, não existindo uma percepção muito clara da diferença entre as funções judiciais e as administrativas, o que facilitava a ingerência e a vigilância de funcionários em diversas áreas da administração, resguardando-se assim a Coroa contra a formação de interesses locais ligados a seus funcionários 
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (III): 1580/1640
Diante do desagrado provocado nos proprietários e comerciantes pelo funcionamento do Tribunal e com a escassez de recursos do Tesouro Real para cobrir as despesas com pagamento de tropas em luta contra os holandeses na América, a Relação foi extinta pelo alvará de 05/04/1626 – a extinção do Tribunal da Relação do Estado do Brasil trouxe modificações na estrutura judicial da Colônia;
Através dos Regimentos de 1628 e 1630, a administração judicial ficou centralizada em três ouvidorias-gerais, independentes entre si e diretamente subordinadas à Casa de Suplicação: uma no Estado do Maranhão, outra no Estado do Brasil e uma terceira na Repartição Sul;
O estabelecimento do Estado do Maranhão, em 1621, se deu por força da conquista e da colonização da parte norte do Estado do Brasil, apesar de, desde 1619, existir um Regimento para o principal responsável pela administração judicial: o OUVIDOR-GERAL – este recebia e julgava os recursos das sentenças dos juízes ordinários e dos ouvidores das capitanias de sua jurisdição, enviando apelos e agravos de seus julgamentos para a Casa de Suplicação;
Além do Regimento de 1619, foram baixados, para o Ouvidor-Geral do Maranhão, Regimentos nos anos de 1624 e 1644 – o Regimento deste último ano ampliou a sua alçada nas causas cíveis para até cem mil-réis e passou a não receber mais recursos das decisões dos juízes ordinários, julgando apenas os recursos que saíssem dos capitães e dos ouvidores das capitanias.
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Aspectos gerais da estrutura judicial da colonização portuguesa na América (IV): 1580/1640
A Ouvidoria-Geral do Estado do Brasil foi recriada e regulamentada segundo o regimento de 1628, com as seguintes atribuições, limitações e prerrogativas:
Seu titular não poderia ser suspenso nem retirado do cargo pelo governador-geral, EXCETO POR ORDEM DO REI;
Nenhuma causa ou feito pendente em sua jurisdição poderiam ser avocados por outro juiz, a não ser por ordem expressa do Rei;
Tinha total independência em relação ao governador-geral quanto à sua autoridade em matéria judicial; 
 Apesar de poder entrar nas capitanias sob sua jurisdição para fiscalizar os demais funcionários, NÃO PROCEDERIA CONTRA O CAPITÃO DA CAPITANIA, a não ser quando alguma parte representasse contra ele;
Em 02/04/1630, um novo Regimento ampliou a alçada do Ouvidor-Geral do Estado do Brasil para cem mil-réis nas causas cíveis, além de conferir o poder para tirar residência aos capitães e ouvidores das capitanias;
Para a Ouvidoria-Geral da Repartição do Sul foi baixado um novo Regimento em 21/03/1630 – esta ouvidoria se manteve, por um longo período, como instância imediatamente superior de recurso, tanto para as sentenças dos ouvidores de capitania, quanto para as sentenças dos juízes ordinários da região sul da Colônia.
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Em 1652, restabeleceu-se, por força do Regimento de 12/09 do mesmo ano, a Relação do Estado do Brasil, voltando à situação vigente do período 1609/1626, em que o OUVIDOR-GERAL LHE ERA SUBORDINADO;
O tribunal voltou a centralizar todas as questões de Justiça, EXCETO AS OCORRIDAS NO ESTADO DO MARANHÃO, onde o Ouvidor-Geral permanecia como autoridade judicial máxima, DIRETAMENTE LIGADA À METRÓPOLE;
Com o tempo, algumas atribuições da Relação do Estado do Brasil se modificaram, sem que se atingisse sua autoridade no fundamental – duas cartas régias de 1670 proibiram os desembargadores de conhecerem as apelações e os agravos das execuções da Fazenda Real e uma outra carta régia de 1674, impediu o conhecimento de todos os agravos no tocante às questões fazendárias;
Com o objetivo de fortalecer o processo de centralização, foram enviados ao Brasil, em 1696, os JUÍZES DE FORA, funcionários letrados diretamente designados pelo Rei para servir nos municípios e, desde então, OS OFICIAIS MAIS IMPORTANTES DAS CÂMARAS – em 1731 instituiu-se, EM NÍVEL MUNICIPAL, o cargo de JUIZ DOS ÓRFÃOS, cujo responsável deveria zelar, até a maioridade, pelos interesses e bens dos menores sem pais;
Em 1751, o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro foi criado, recebendo o Regimento em 13/10, instalando-se em cerimônia solene em15/07 de 1752 – a criação da Relação do Rio de Janeiro está diretamente ligado ao movimento de centralização do poder promovido pela Coroa Portuguesa desde o final da União Ibérica e às condições econômicas relacionadas à atividade mineradora no interior da Colônia. 
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Os tribunais superiores do Império Português localizavam-se na Metrópole:
Casa de Suplicação – Tribunal Supremo de uniformização da interpretação do Direito Português – estava localizada em Lisboa;
Desembargo do Paço - encarregado de apreciar matérias sobre liberdade (graça, indulto, perdão, comutação de pena), sobre adoção, legitimação e emancipação, sobre reintegração de posse e sobre censura de livros. Originariamente fazia parte da Casa da Suplicação, para despachar as matérias reservadas ao rei, tornou-se corte autônoma em 1521; 
Mesa de Consciência e Ordem – Instância única, que tratava do provimento de benefícios, da administração de comendas e dos negócios relativos a interditos, cativos, ausentes e defuntos e de consciência do rei;

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