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Trabalho de Pesquisa MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários Protozoon-associated Hemolytic Anemia in Dogs Cristina Krauspenhar1 Rafael Almeida Fighera2 Dominguita Lühers Graça3 Krauspenhar C, Fighera RA, Graça DL. Anemia hemolítica em cães associada a protozoários. Medvep – Rev Cientif Med Vet Pequenos Anim Anim Estim 2003, Curitiba, out/dez; 1(4):273-81. São descritos onze casos de anemia hemolítica em cães associada a protozoários intracitoplasmáticos em células endoteliais, diagnosticados no Setor de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria, de 1985 a 2003. Os animais acometidos eram machos e fêmeas, com idades que variavam de 6 meses a 10 anos. Os aspectos clínicos incluíam anorexia, apatia, vômito, emagrecimento, linfadenopatia e icterícia, presente em todos os casos. Na avaliação hematológica, realizada em seis dos onze casos, havia anemia hemolítica grave, caracterizada por intensa regeneração eritróide. Uma grande quantidade de esferócitos em quatro dos seis casos revelou uma provável origem imunomediada do processo. Na necropsia, os principais achados macroscópicos eram icterícia de intensidade variável, linfadenopatia, hepatomegalia e esplenomegalia. Na histologia, em todos os casos, podiam ser notados microorganismos morfologicamente compatíveis com protozoários no citoplasma de células endoteliais. Hematopoese extramedular, necrose de coagulação centrolobular no fígado e infiltrado inflamatório linfoistioplasmocitário nos órgãos parasitados eram achados freqüentes. Os dados clínicos, hematológicos, de necropsia e histopatológicos observados nos cães deste estudo sugerem que a doença trata-se de uma anemia hemolítica, possivelmente de fundo auto-imune, associada a um protozoário com características morfológicas e biológicas compatíveis com Rangelia vitalii. PALAVRAS-CHAVE: Infecções protozoárias em animais; Anemia hemolítica; Patologia veterinária; Patologia clínica; Hematologia. 1 Médica Veterinária; Mestranda – Departamento de Patologia – UFSM. Rua André Marques 402/102 – CEP 97010-041, Santa Maria, RS; e-mail: ckrauspenhar@yahoo.com.br 2 Médico Veterinário; Mestrando – Departamento de Patologia – UFSM; e-mail: anemiaveterinaria@bol.com.br 3 Médica Veterinária; PhD; Professora Titular – Departamento de Patologia – UFSM; e-mail: dlgraca@lince.hcv.ufsm.br 274 MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários INTRODUÇÃO Desde 1985, vem sendo diagnosticada uma enfermidade em cães necropsiados no Setor de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria, caracterizada por icterícia e ane- mia. Os animais afetados desenvolvem quadros hemolíticos graves que, quando não tratados, culminam em morte. Em todos os casos necrop- siados, observaram-se, ao exame histológico ou citológico, microorganismos no citoplasma de células endoteliais de diversos órgãos. Esses microorganismos eram morfologicamente compatíveis com protozoários. Os achados clínicos e laboratoriais indicaram que a doença é uma entidade específica e que o protozoário está associado à etiopatogênese. Este trabalho descreve os achados clínicos, hematológicos, citológicos, epidemiológicos, de necropsia e histopatológicos dessa enfermidade em onze cães; relata os estudos realizados até o presente momento para estabelecer a natureza exata do agente etiológico, sugerindo sua carac- terização e apresenta dados da reprodução expe- rimental da doença em um cão jovem suscetível. MATERIAL E MÉTODOS Dados referentes à epidemiologia, sinais clí- nicos, patologia clínica, achados de necropsia e histopatológicos dos casos aqui descritos foram obtidos através de levantamento dos arquivos do Setor de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria, no período de 1985 a 2003. Os materiais armazenados em formol e blo- cos de parafina foram processados para histologia e corados pela hematoxilina e eosina. De seis cães doentes, foi colhido sangue com anticoagulante (ácido etileno- diaminotetracético [EDTA] a 10%) para realiza- ção do hemograma. Os hemogramas foram fei- tos manualmente, conforme técnicas convencio- nais, constituindo-se de 1) contagem de eritró- citos e leucócitos em câmara de Neubauer, utilizando-se, respectivamente, líquido de Hayen e líquido de Turk como diluentes; 2) determina- ção do hematócrito por centrifugação de microcapilares por cinco minutos a 7.000RPM; 3) determinação do volume corpuscular médio (VCM) e da concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) por cálculo; 4) deter- minação de hemoglobina pelo método da cianometemoglobina, utilizando reagentes co- merciais; e 5) análise de esfregaços corados por panótico rápido para a diferenciação celular, pesquisa de microorganismos e alterações morfológicas nas células. De três dos seis cães coletados, foi ainda realizada contagem de plaquetas em câmara de Neubauer, utilizando-se líquido de Rees & Ecker como diluente. De seis cães doentes, foram coletados fragmentos de linfonodo, baço, fígado e medula óssea, para confecção de imprints, a fim de se evidenciarem citologicamente os microor- ganismos. Essas lâminas foram coradas por panótico rápido. Material oriundo de blocos de parafina foi processado para imuno-histoquímica, utilizando anticorpos contra Neospora canis, Toxoplasma gondii e Leishmania donovani. Para reprodução experimental, um cão macho, cocker spaniel, de dois meses de idade, recebeu por via intravenosa 3ml de sangue oriundo de um cão (número 11) afetado pela enfermidade. Esse cão foi avaliado clinicamente de oito em oito horas, até desenvolver a doen- ça. No exame clínico eram avaliados: freqüência cardíaca, freqüência respiratória, temperatura, coloração das mucosas e estado geral. RESULTADOS Casos espontâneos Entre 1985 e 2003, foram necropsiados 11 cães com icterícia e anemia associada a microorganismos localizados no interior de cé- lulas endoteliais de diversos órgãos. Dados re- ferentes à idade, raça e sexo dos cães e à época do ano em que a doença ocorreu podem ser observados na Tabela 1. O principal sinal clínico, observado em to- dos os casos, foi icterícia de intensidade variá- vel. Outros sinais clínicos constantes, mas me- nos específicos, incluíam anorexia, apatia, vômi- to e desidratação. Sinais clínicos relatados com menor regularidade foram: diarréia com sangue (4/11), sangramento pelas orelhas (3/11), edema subcutâneo dos membros pélvicos (2/11), emagrecimento (2/11), linfadenopatia (1/11) e petéquias em mucosas (1/11). As alterações hematológicas encontradas nos seis cães estudados foram as seguintes: quatro cães apresentaram anemia macrocítica hipocrômica acentuada, com hematócritos que variavam de 13% a 22%. Outros dois cães de- senvolveram anemia normocítica normocrômica acentuada, com hematócritos que oscilavam entre 18% e 26%. Os níveis de hemoglobina e a contagem de eritrócitos eram baixos em todos os casos e os valores de volume corpuscular médio (VCM) e de concentração de hemoglobina 275 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 corpuscular média (CHCM) eram elevados (92 a 128 fentolitros) e diminuídos (26% a 29%), res- pectivamente, nos casos de anemia macrocítica hipocrômica. Nos casos de anemia normocítica normocrômica esses valores oscilavam de 61 a 72 fentolitros (VCM) e 33% a 35% (CHCM). Número Protocolo Idade Raça Sexo Mês de ocorrência 1 Vn-105-85 7 meses pastor alemão macho julho 2 Vn-076-90 10 anos pointer macho maio 3 Vn-230-90 1 ano fila brasileiro fêmea setembro 4Vn-291-91 2 anos poodle macho novembro 5 Vn-220-93 9 anos doberman macho setembro 6 Vn-133-00 8 meses boxer macho junho 7 Vn-177-01 1 ano boxer macho julho 8 Vn-261-01 4 anos SRD fêmea outubro 9 Vn-262-01 8 meses SRD macho outubro 10 Vn015-03 6 meses cocker spaniel fêmea janeiro 11 Vn034-03 6 anos pastor alemão fêmea fevereiro TABELA 1: Anemia hemolítica em cães associada a protozoário. Dados epidemiológicos dos casos espontâneos diagnosticados no Setor de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria de 1985 a 2003. No leucograma, quatro dos seis cães apre- sentavam desvio à esquerda regenerativo, dois animais apresentavam linfocitose e um desen- volveu monocitose. Dos três cães em que foram realizadas contagens de plaquetas, dois apre- sentavam trombocitopenia moderada (64.000 e 78.000 plaquetas/mm3 de sangue). Os achados hematológicos vistos nos esfregaços sangüíneos caracterizavam-se por intensa regeneração eritróide. Havia acentuada policromasia e anisocitose em todos os casos. Em quatro casos podiam ser notados muitos corpúsculos de Howell-Jolly. Metarrubricitemia leve a acentua- da, que variou de 3 a 224 metarrubrícitos para cada 100 leucócitos foi observada em todos os cães. Em dois cães pôde ser vista eritrofagocitose. Um achado característico de quatro dos seis ca- sos foi a esferocitose, que variou de leve a acen- tuada. Em três casos, havia muitas macropla- quetas nos esfregaços, dois dos quais corres- pondiam aos cães trombocitopênicos. Em todos os cães que realizaram hemograma o plasma estava intensamente ictérico. Em nenhum dos hemogramas realizados em seis cães pôde ser notado qualquer tipo de microorganismo, den- tro ou fora dos eritrócitos, leucócitos ou plaquetas circulantes. Em todos os casos, a avaliação da medula óssea por imprints realizados durante a necropsia revelou intensa hiperplasia eritróide, caracteri- zada pela inversão da relação mielóide:eritróide e pela grande quantidade de precursores eritróides em mitose. Em quatro cães foi possível visualizar agrupamentos de parasitas arredon- dados com aproximadamente 2,0 micrômetros de diâmetro cada no interior de células endoteliais. Esses parasitas apresentavam citoplasma azul-claro e núcleo violáceo. A avali- ação citológica dos outros órgãos (baço, linfonodo e fígado) não demonstrou microorganismos, apenas um infiltrado inflama- tório predominantemente linfoplasmocitário. Achados de necropsia incluíam icterícia, que era acentuada em 7 cães (cães 1, 2, 3, 4, 6, 7 e 9) (Figura 1) e leve ou moderada em quatro (cães 5, 8, 10 e 11). Todos os cães apresentavam linfonodos aumentados de volume, averme- lhados e úmidos, esplenomegalia (Figura 2) e hepatomegalia. O baço, quando cortado, demonstrava protrusão da polpa vermelha por sobre a cápsula. Notavam-se hemorragias no pulmão (8/11), epicárdio (5/11) e intestino delgado (4/11). Edema subcutâneo nos mem- bros pélvicos (2/11) e petéquias em mucosas (1/ 11) foram outras alterações anotadas irregular- mente. Os rins apresentavam coloração que va- riava de pálida a amarelo-esverdeada. Em al- guns animais foi observado, com menor freqüên- cia, edema pulmonar, tonsilas aumentadas e avermelhadas, e hidropericárdio. As lesões microscópicas foram qualitativa- mente as mesmas nos 11 animais necropsiados, variando de intensidade conforme o órgão exa- minado. Um infiltrado inflamatório constituído principalmente por linfócitos, plasmócitos e macrófagos estava presente em vários órgãos, mas mais constantemente nos rins, coração, linfonodos, baço, tonsilas e fígado. No rim, esse 276 MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários infiltrado podia ser visto entre os túbulos e no mesângio. No coração, infiltrado inflamatório multifocal era visto entre as fibras musculares. Tanto no baço quanto nos linfonodos e tonsilas, era possível notar hiperplasia linfóide, caracteri- zada pela formação de múltiplos centros germi- nativos nos folículos. Um infiltrado semelhante ao visto nos outros locais estava também presente nesses órgãos, na maior parte dos casos. protozoário (imidocarb), foram observados microorganismos arredondados ou ovalados, com aproximadamente 2,0µm de diâmetro, no interior das células endoteliais. Esses microorganismos eram melhor evidenciados em esfregaços de medula óssea corados por panótico rápido e apresentavam citoplasma cla- ro e núcleo redondo e basofílico. Os microor- ganismos foram vistos em ordem decrescente de freqüência nos rins (7/11), linfonodos (7/ 11) (Figura 3), fígado (6/11), medula óssea (4/ 11), baço (3/11), tonsilas (2/11), pulmão, encéfalo, estômago e vesícula biliar (1/11). A avaliação da prevalência quanto aos locais onde os microorganismos foram observados foi prejudicada, pois não foram coletados sempre os mesmos órgãos. Os exames imuno-histoquímicos realizados a partir de material oriundo de blocos de parafi- na, utilizando anticorpos contra Neospora canis, Toxoplasma gondii e Leishmania donovani, tiveram resultado negativo. FIGURA 1: Mucosa da cavidade oral. Observa-se acentuada icterícia. FIGURA 2: Baço, esplenomegalia. Observa-se hiperplasia dos folículos linfóides. Em seis dos 11 animais necropsiados ha- via necrose centrolobular acentuada, oriunda da hipóxia gerada pela anemia. Hematopoese extramedular no fígado foi um achado freqüen- te, ocorrendo em 8 dos 11 casos. Nas tonsilas e linfonodos de um dos 11 cães necropsiados podiam ser vistas células gigantes multinu- cleadas, por vezes fagocitando células endote- liais parasitadas. Além disso, em alguns casos havia grande quantidade de macrófagos com eritrócitos fagocitados em seu citoplasma (eritrofagocitose). Em todos os cães, com exce- ção dos animais números 10 e 11, que haviam sido tratados com medicamento anti- FIGURA 3: Linfonodo, aspecto microscópico dos protozoários no citoplasma de células endoteliais. CASO EXPERIMENTAL A doença foi reproduzida experimentalmen- te em um cão macho, cocker spaniel, de dois me- ses de idade, que recebeu por via intravenosa 3ml de sangue oriundo de um cão (número 11) afetado pela doença. O animal desenvolveu a doença após 15 dias (período de incubação) e morreu em 7 dias (evolução clínica). Os sinais clínicos observados inicialmente foram anorexia, apatia, vômito e desidratação. Diarréia com san- gue e convulsões foram observadas mais tardi- amente. Na necropsia do cão experimental, todas as mucosas estavam pálidas e o sangue era acentuadamente aquoso (anemia acentuada). Esplenomegalia era evidente e o fígado estava 277 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 aumentado e levemente amarelado. Todos os linfonodos estavam suculentos e avermelhados, havia edema pulmonar e perirrenal. Hemorragi- as podiam ser vistas no pulmão e epicárdio (Fi- gura 4); na mucosa do intestino delgado havia filamentos de sangue não-digerido (Figura 5). As alterações microscópicas consistiam de infiltrado inflamatório linfoistioplasmocitário en- tre as fibras do miocárdio. Uma grande quanti- dade de microorganismos, idênticos aos visua- lizados nos cães dos casos espontâneos, podia ser observada no citoplasma de células endo- teliais. No fígado havia discreta necrose de coa- gulação centrolobular; nos linfonodos havia edema, infiltrado inflamatório linfoistioplas- mocitário e microorganismos no citoplasma de células endoteliais. No plexo coróide do quarto ventrículo, uma grande quantidade de microor- ganismos era vista no citoplasma das células endoteliais. DISCUSSÃO Os dados clínicos, hematológicos, de necropsia e histopatológicos observados nos cães deste estudo sugerem que a doença observadaseja uma anemia hemolítica, possivelmente de fundo auto-imune, caracterizada por um protozoário com características morfológicas e biológicas compatíveis com Rangelia vitalii. No ano de 1910, o protozoologista brasi- leiro Bruno Rangel Pestana1 descreveu, pela pri- meira vez, uma doença que, segundo caçado- res da época, acometia cães em várias partes do país, principalmente em São Paulo1. Segun- do dados da população do campo, que conhe- cia essa enfermidade pelas denominações de febre amarela canina, peste do sangue e Nambi- Uvú, um nome indígena que significa “orelha que sangra”, ela ocorria apenas em cães, principal- mente nos animais novos e de caça. O pesqui- sador descreveu, a partir de casos espontâneos e experimentais, as formas clínicas da enfermi- dade, os achados de necropsia e a identificação do agente2. Muitos anos se passaram desde a desco- berta dessa importante condição clínica de cães e, durante esse período, a enfermidade passou a ser erroneamente associada a inúmeros agen- tes etiológicos. Em muitas partes do país, uma doença caracterizada por icterícia e anemia hemolítica, provavelmente transmitida pelo car- rapato, foi sendo descrita sob várias denomina- ções. Isso ocorreu em Santa Maria (RS), onde durante um período de oito anos (1985 a 1993) a doença foi interpretada como leishmaniose, dada as características morfológicas do agen- te3. Em Porto Alegre (RS), muitos casos idênticos aos aqui apresentados foram atribuídos à erliquiose (Driemeier, 2003)* e, em todo o Rio Grande do Sul, situações clínicas e laboratoriais exatamente iguais às relatadas aqui foram as- sociadas à babesiose (piroplasmose) (Barros, 2003)**. Todas essas confusões são fruto do desconhecimento sobre essa importante doença que teve suas pesquisas e descrições interrom- pidas após o ano de 1950. O Nambi-Uvú, como era conhecido na épo- ca, podia ser dividido em três formas clínicas: aguda, subaguda e crônica1. Na forma aguda – também denominada rápida, grave ou ictérica – o animal apresentava apatia, febre, fraqueza, mucosas pálidas que rapidamente se tornavam ictéricas, e morria dentro de três a cinco dias. FIGURA 4: Coração. Observa-se hemorragia difusa no miocárdio. FIGURA 5: Intestino delgado. Observam-se estrias de sangue não digerido na mucosa. *Driemeier D. Comunicação pessoal. Porto Alegre; 2003. **Barros CSL. Comunicação pessoal. Santa Maria; 2003. 278 MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários Em razão da crença, depois confirmada, de alguns populares de que ocorriam hemorragias internas, essa forma da doença era também co- nhecida por “Nambi-Uvú das tripas”1. Em todos os casos descritos neste relato, os cães apresen- tavam icterícia, que variava de leve a acentuada. Isso indica que a doença descrita no Rio Grande do Sul é predominantemente do tipo agudo. O achado clínico de icterícia é um dos principais motivos pelos quais a doença é totalmente dife- rente de leishmaniose. Na leishmaniose canina raramente (2% dos casos) ocorre icterícia. Além disso, a leishmaniose é uma enfermidade de ca- ráter crônico e depauperante e não uma doen- ça aguda4. Outro fato que distingue as duas enfermidades é que, no caso da rangeliose, exis- te um tratamento rápido e eficaz. A forma subaguda, que aparentemente era a mais comum nos casos vistos por Rangel, ca- racterizava-se por sinais clínicos semelhantes, associados a hemorragias pela boca, nariz, olhos e pele, o que acabou dando o nome à doença1. Essa forma foi observada por nós ape- nas três vezes e sempre estava associada a icte- rícia acentuada. Isso demonstra que pode ha- ver uma sobreposição das formas clínicas. A for- ma crônica, leve ou benigna, era difícil de ser diagnosticada, sendo mais bem entendida em animais experimentalmente infectados, pois exceto por alguns picos de febre, não eram evi- denciados outros sinais clínicos1. O animal infectado experimentalmente no caso aqui des- crito desenvolveu a forma aguda da doença. Rangel descreveu que, na necropsia de nove animais doentes, uma icterícia acentuada foi vista em todos os casos, principalmente na pele do abdômen2. Esse dado é muito semelhante ao encontrado nos cães deste relato, principal- mente nos casos em que a morte não é tão agu- da. Esse pesquisador ressaltara que os linfonodos cervicais, mesentéricos e inguinais estavam bas- tante aumentados, assim como o fígado e o baço2, um achado praticamente idêntico ao ve- rificado em muitos dos casos aqui descritos. Rangel descreveu que, na circulação, um raro parasita podia ser encontrado; esse microorganismo tinha aspecto piriforme, redon- do, oval ou anelar, dentro ou fora dos eritrócitos, semelhante ao Piroplasma canis, descrito em 1895 pelos pesquisadores italianos Piani e Galli- Vallerio2. Esse fato é, ao nosso ver, a principal razão pela qual a babesiose foi confundida com o Nambi-Uvú por muitos Clínicos e Patologistas clínicos. Nos casos deste relato, em que foi rea- lizado hemograma, nunca foram achados microorganismos em qualquer tipo de célula sangüínea. Na avaliação histológica de múltiplos ór- gãos, descrita por muitos autores, foram encon- trados protozoários arredondados ou ligeira- mente ovalados no interior de células endoteliais, semelhantes aos corpúsculos de Leishman. Co- rados por Giemsa ou Leishman o protoplasma era azul-claro e o núcleo vermelho violeta. Os organismos redondos mediam 2,0µm e os ova- lados 1,5 x 2,0µm1,5,6,7. A semelhança morfológica entre esse protozoário e Leishmania spp. fez com que, durante oito anos, ele fosse por nós diagnosticado erroneamente3. Uma característi- ca importante na diferenciação desses microorganismos deve-se ao fato de que Leishmania spp. prolifera apenas no interior de macrófagos, enquanto o protozoário causador do Nambi-Uvú é visto exclusivamente em células endoteliais4,5. Essa importante característica foi uma das peças chave na reavaliação dos primeiros cinco casos aqui descritos. Esse fato serve também para diferenciar esse parasita da riquétsia Ehrlichia canis, que ocorre em neutrófilos e macrófagos. Para afastar definitivamente a pos- sibilidade de que a doença aqui descrita seja leishmaniose, foi realizado exame imuno-histo- químico para Leishmania donovani, que teve resultado negativo. A constatação do parasita em todos os animais estudados por Rangel, sua semelhança com os aspectos morfológicos dos corpúsculos de Leishman descritos para leishmaniose em vá- rios órgãos e os raros achados do agente na circulação levaram esse autor a acreditar que esse fosse um protozoário novo, localizado taxonomicamente entre os gêneros Piroplasma e Leishmania. Dessa forma o agente etiológico do Nambi-Uvú foi reconhecido e recebeu a denomi- nação de Piroplasma vitalii, em homenagem ao pesquisador Vital Brazil2. Quatro anos mais tarde, em 1914, os protozoologistas Carini e Maciel5 estudaram essa mesma doença e chegaram a conclusões seme- lhantes às descritas por Rangel5. Complemen- taram o estudo revelando que um carrapato era provavelmente a fonte da infecção e, para homenagear o primeiro autor, propuseram que se criasse um novo gênero de protozoário, designado então Rangelia, mantendo-se o nome da espécie. A partir desse momento o agente do Nambi-Uvú passou a ser conhecido por Rangelia vitalii e a doença foi então chamada rangeliose5. Em alguns cães por nós necropsiados, os proprietários relatavam que os animais haviam 279 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 passado finais-de-semana em sítios na loca- lidade de Itaara (RS), de onde haviam voltado com alguns carrapatos. Após um período de uma a duas semanas, essesmesmos animais iniciavam os sinais clínicos. Esses mesmos autores avaliaram o sangue de alguns animais doentes e descreveram uma anemia grave, caracterizada por sinais de inten- sa regeneração medular, como: anisocitose, policromasia, corpúsculos de Howell-Jolly e eritrócitos nucleados. Em relação ao leucograma, descreveram leucocitose no início do quadro clí- nico e leucopenia no final, mas não relataram quais leucócitos estariam envolvidos nessas alte- rações5. Além disso, Carini e Maciel corrobora- ram a afirmação de Rangel de que o agente era visto raramente no sangue, principalmente no início da doença e durante os picos febris. Nos esfregaços de órgãos e nos cortes, os pesquisa- dores descreveram o microorganismo no interior de células endoteliais, exatamente como foi primeiramente relatado por Rangel, embora achassem apenas uma discreta semelhança com Leishmania, pois não se observara o blefaroplasto5. Os achados de Carini e Maciel relaciona- dos à hematologia são idênticos aos descritos por nós, demonstrando que a patogênese da doença está relacionada a uma condição hemolítica que culmina em icterícia. Isso acaba sendo demonstrado pela intensa regeneração eritróide8. A policromasia acentuada encontra- da em todos os seis cães corresponde direta- mente à liberação de células eritróides jovens pela medula óssea (reticulócitos)9. A metarru- bricitemia é indicativa de hematopoese extramedular intensa, principalmente no fígado, que pôde ser confirmada pela histologia. Essas alterações junto com a anisocitose e presença de corpúsculos de Howell-Jolly indicam regene- ração intensa, como a vista em muitas outras enfermidades que se caracterizam por hemólise10. O fato de dois cães terem desenvol- vido anemia normocítica normocrômica pode ser entendido pela extrema diferença de tamanho e quantidade de hemoglobina que se dá entre os pequenos e hipercrômicos esferócitos e os gran- des e hipocrômicos policromatófilos, que, em média, faz com que o VCM e o CHCM permane- çam normais8. Outra boa indicação de que a hemólise é basicamente extravascular é a presença de eritrofagocitose no sangue e nos tecidos, princi- palmente nos linfonodos e baço11. A presença de esferócitos na circulação de quatro dos seis cães em que se realizou o hemograma é bas- tante sugestiva de processo imunomediado. Os esferócitos são eritrócitos redondos, que perde- ram sua conformação discóide em decorrência da deposição de anticorpos na membrana plasmática12. Esses esferócitos, quando descri- tos em cães, são indicativos de anemia hemolítica imunomediada, principalmente auto-imune11. Várias doenças infecciosas caracterizam-se por estimular a formação de auto-anticorpos contra os eritrócitos, dentre elas anaplasmose (bovi- nos), babesiose (várias espécies), hemobar- tonelose (gatos), teileriose (bovinos), tripanos- somose (bovinos), leptospirose (bovinos e eqüinos), anemia infecciosa eqüina (eqüinos) e malária (macacos e humanos)8,10,11. Embora não tenha sido possível a realização de testes que confirmem a presença de anticorpos revestindo os eritrócitos, é provável que um mecanismo auto-imune não só esteja envolvido, como seja o principal desencadeador do processo hemolítico. O sangramento desenvolvido por alguns animais com a enfermidade aqui descrita não pode ser atribuído especificamente à trombocitopenia, pois dos dois animais com essa alteração laboratorial apenas um apresentou sangramento. Além disso, a trombocitopenia desenvolvida por esses animais não é grave o suficiente para explicar a diátese hemorrágica que alguns cães desenvolveram. O mecanismo pelo qual ocorre a trombocitopenia não é co- nhecido, mas sabe-se que aproximadamente 50% dos cães com anemia hemolítica auto-imu- ne desenvolvem trombocitopenia auto-imune, uma situação referida como síndrome de Evans, em analogia ao distúrbio descrito por esse pes- quisador em humanos13. Pode haver uma rela- ção entre a presença do microorganismo no in- terior das células endoteliais e um possível dano vascular, mesmo porque Carini descreveu em um de seus trabalhos que os locais onde havia he- morragia eram os microscopicamente mais parasitados5. Em 1935, o pesquisador Américo Braga pu- blicou um excelente trabalho comparativo para tirar todas as dúvidas sobre as diferenças entre piroplasmose (Piroplasma canis – Piani & Galli- Vallerio, 1895) e rangeliose (Rangelia vitalii – Rangel, 1910)14. Em resumo, esse trabalho de- monstra que essas duas situações clínicas, em- bora muitas vezes semelhantes, possuem acha- dos laboratoriais e histológicos completamente distintos14. Braga descreve que a piroplasmose canina, que muitos anos depois seria chamada de babesiose canina, é caracterizada por um 280 MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários processo hemolítico intravascular que invariavel- mente culmina em hemoglobinúria, ao contrário da rangeliose, que, embora também seja associada à anemia hemolítica, nunca cursa com a presença de hemoglobina na urina14. Os piroplasmas são parasitas essencialmente intra- eritrocitários e podem ser vistos rotineiramente em esfregaços sangüíneos, ao contrário de Rangelia sp., que raramente é visualizada no sangue e sempre é encontrada nos tecidos, principalmente no linfonodo, medula óssea e rim. Outra diferença bastante marcante entre as duas condições diz respeito ao quadro hemorrágico, que muitas vezes é visto na rangeliose e não é descrito na babesiose14,15. Em 1938, o pesquisador Moreira16 desen- volveu um trabalho com mais de noventa animais, a fim de entender melhor as diferenças entre a piroplasmose, agora já referida como babesiose, e a rangeliose16. Mesmo três anos após o bri- lhante e esclarecedor trabalho de Braga, Moreira chegou a algumas estranhas conclusões. Ele afir- ma, por exemplo, que Piroplasma canis, agora Babesia canis, e Rangelia vitalii seriam o mesmo protozoário. Para tentar explicar o que seriam, então, as formas leishmaniais da Rangelia, o au- tor concluiu que todos os animais poderiam estar desenvolvendo uma infecção intercorrente por Toxoplasma sp. Esse trabalho lançou confusão sobre um tema que já havia sido esclarecido16. Embora em nenhum momento pairasse qualquer dúvida sobre o fato de que a doença por nós diagnosticada pudesse estar relacionada à toxoplasmose, foi, independentemente desse fato, realizada imuno-histoquímica para Toxoplasma gondii e Neospora caninum. O resultado para ambos os protozoários foi negativo, demonstrando definitivamente que esses parasitas nada têm a ver com o quadro aqui descrito, mesmo porque a situação em que eles ocorrem e a doença que causam são totalmente distintas da descrita neste relato. Após 10 anos, em 1948, o protozoologista Carini17, através de uma publicação científica inusitada, esclarece definitivamente todas as dúvidas que ainda pudessem existir a respeito da já não tão nova espécie Rangelia vitalii17. Nesse artigo, Carini novamente descreve o agente do Nambi-Uvú e reescreve os principais eventos que culminaram na criação desse novo gênero, já aceito em vários locais do mundo. De uma maneira irônica e bastante convincente, Carini ainda ressalta seus trabalhos com outros protozoários, como Toxoplasma sp. e demonstra que seria impossível confundi-lo com as formas leishmaniais de Rangelia sp., uma crítica direta ao próprio Moreira e a seu trabalho publicado em 193817. Embora todas as diferenças sobre rangeliose e babesiose tivessem sido exaustiva- mente demonstradas, tanto por Braga como por Carini, em 1949 um trabalho de tese de douto- rado desafortunadamente confunde, uma vez mais, as duas doenças18. Esse trabalho, junta- mente com o escrito por Moreira em 1938, é, ao nosso ver, o principal responsável pelo grande obscurecimento que se estabeleceue que per- manece até hoje sobre um assunto tão simples e claro como a diferença entre essas duas enfer- midades. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os sinais clínicos, achados hematológicos, citológicos, epidemiológicos, de necropsia e histopatológicos são idênticos aos descritos por vários autores para rangeliose. Durante os últi- mos 50 anos, essa enfermidade foi esquecida e múltiplos casos dessa condição foram erronea- mente diagnosticados como leishmaniose, babesiose e erliquiose. Krauspenhar C, Fighera RA, Graça DL. Protozoon-associated hemolytic anemia in dogs. Medvep – Rev Cientif Med Vet Pequenos Anim Anim Estim 2003, Curitiba, Oct/Dec; 1(4):273-81. Eleven cases of hemolytic anemia in dogs, associated with a protozoan organism present in the cytoplasm of endothelial cells are described. The cases were diagnosed at the Laboratory of Veterinary Pathology of the Universidade Federal de Santa Maria, from 1985 to 2003. Affected dogs were of both sexes and their ages ranged from 6 months to 10 years. Clinical signs included anorexia, apathy, vomiting, loss of weight, linfadenopathy, and icterus. The latter was consistently found in every cases. Hematological assessment carried out in six of the eleven dogs revealed severe hemolytic anemia characterized by marked erythroid regeneration. A large number of spherocytes was found in the blood smears of four of the six examined dogs; this suggested a possible immunomediated cause for the anemia. Main necropsy finds included icterus of varying degrees, enlarged lymph nodes, liver and spleen. Microscopically, in every case protozoan organisms could be observed in the cytoplasm of endothelial cells. Extramedulary hematopoeisis, centrolobular coagulative necrosis of the liver, and lymphoplasmacytic inflammatory infiltrate in the parasitized organs were frequent findings. Clinical, hematological, necropsy and 281 Anemia Hemolítica em Cães Associada a Protozoários MedveP - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2003, Curitiba, 1(4):273-81 histopathological findings observed in the dogs of this report suggest that the condition observed in these dogs is an hemolytic anemia, possibly of autoimmune origin and related to the presence of a protozoon with morphological and biological characteristics of Rangelia vitalii. KEYWORDS: Protozoan infections, animal; Anemia, hemolytic; Pathology, veterinary; Pathology, clinical; Hematology. REFERÊNCIAS 1. Pestana BR. O Nambyuvú. Rev Med São Paulo 1910a; (22):423-6. 2. Pestana BR. 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Contribuição ao estudo experimental do Nambiuvú [Tese de Doutorado]. Escola de Agronomia e de Veterinária da Universidade do Rio Grande do Sul; 1949. 33p. Recebido para publicação em: 04/07/03 Enviado para análise em: 14/07/03 Aceito para publicação em: 06/08/03
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