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CONSTITUCIONALIDADE OU SUPRALEGALIDADE A QUESTAO DO DEPOSITARIO INFIEL A LUZ DO PACTO DE SAO JOSE DA COSTA RICA E DA EC N 45

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MATHEWS FRANCISCO RODRIGUES DE SOUZA DO AMARAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONSTITUCIONALIDADE OU SUPRALEGALIDADE? 
A QUESTÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL À LUZ DO 
PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA E DA EC N.º 45. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada como requisito 
para a conclusão do curso de bacharelado 
em Direito do Centro Universitário de 
Brasília (UniCEUB) 
 Professora: Carolina Lisboa 
 
 
 
 
 
BRASÍLIA 
2010
 
 
 
MATHEWS FRANCISCO RODRIGUES DE SOUZA DO AMARAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CONSTITUCIONALIDADE OU SUPRALEGALIDADE? 
A QUESTÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL À LUZ DO 
PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA E DA EC N.º 45. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BRASÍLIA 
2010
SUMÁRIO 
 
 
 
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................5 
1. HIERARQUIA DA ORDEM NORMATIVA.................................................................6 
1.1 O sistema hierarquizado da ordem normativa, proposto por Hans 
Kelsen.....................................................................................................................................6 
1.2 A posição do direito internacional no escalonamento normativo proposto por 
Kelsen.................................................................................................................................16 
1.3 Teorias atuais relacionadas à solução de eventuais conflitos que se estabeleçam entre 
o direito internacional e o direito interno........................................................................17 
1.4 O posicionamento da sociedade internacional e o posicionamento individual dos 
estados.............................................................................................................................20 
1.5 Os procedimentos que vinculam o Estado brasileiro aos tratados............................27 
1.6 A inovação trazida pela Emenda Constitucional n.º 45...........................................30 
2. SUPRALEGALIDADE OU CONSTITUCIONALIDADE DOS TRATADOS QUE 
VERSEM SOBRE DIREITOS HUMANOS.....................................................................33 
2.1 O posicionamento brasileiro sobre a incorporação dos tratados e a sua hierarquia no 
ordenamento jurídico interno................................................................................................33 
2.2 O caso concreto que modificou o paradigma jurisprudencial com relação à prisão do 
depositário infiel...................................................................................................................37 
2.3 A supralegalidade dos tratados que versam sobre direitos humanos..........................40 
2.4 A constitucionalidade dos tratados que versam sobre direitos humanos...................46 
2.5 A inaplicabilidade da prisão civil do depositário infiel.............................................50 
3. CONCLUSÃO.................................................................................................................54 
REFERÊNCIAS .................................................................................................................61 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
O presente trabalho objetiva um maior aprofundamento nas questões que 
circunscrevem a temática constitucional atual e a sua relação com o direito internacional 
público e as matérias relacionadas aos Direito Humanos. Em 2008 a Suprema Corte 
brasileira se manifestou sobre uma questão que vinha sendo discutida tanto por 
constitucionalistas quanto por internacionalistas: haveria a impossibilidade de prisão 
civil do depositário infiel calcada na aplicabilidade do Pacto de São José da Costa Rica? 
O posicionamento foi no sentido de que não mais seria admissível tal medida constritiva 
de liberdade, ainda que prevista no próprio corpo da Carta Magna. O entendimento foi o 
de que, ao ser incorporada ao ordenamento interno, a norma internacional que afastava a 
possibilidade dessa prisão civil adquiriria patamar de norma supralegal. Todavia, 
parcela do Supremo Tribunal Federal enxerga nos tratados de direitos humanos que não 
tenham sido aprovados pelo quorum qualificado previsto no §3º do artigo 5º da 
Constituição Federal um outro status, ou seja, o de norma constitucional. Este estudo, 
portanto, tem por objetivo um aprofundamento na discussão sobre o nível hierárquico 
dessas normas internacionais. A metodologia utilizada foi a corrente de pensamento 
dialética e o método monográfico de pesquisa com a análise do Recurso Extraordinário 
466.343/SP, de registros e posicionamentos do Supremo Tribunal Federal e outros 
Tribunais, o estudo de artigos publicados em meio eletrônico, e, especialmente, de 
material doutrinário de juristas e especialistas em Direito Constitucional e Internacional 
Público. 
 
Palavras-chave: supralegal, Emenda constitucional n.º 45 de 2004, tratados sobre 
Direitos Humanos, constitucional. 
 
 
 
5
INTRODUÇÃO. 
 
 Atualmente, o Estado brasileiro é parte em diversos tratados, acordos ou 
convenções internacionais, que compõem o que se costuma chamar de instrumentos 
internacionais, seja ratificando-os ou simplesmente aderindo a eles. 
 
 Conforme o entendimento vigente, em regra, para a incorporação de um desses 
instrumentos à ordem jurídica interna do país, deverão se submeter a um processo no 
qual haja a ratificação e a promulgação mediante decreto editado pelo Chefe do Poder 
Executivo Federal. O corrente pensamento jurisprudencial atribui a esses instrumentos, 
uma vez incorporados, força de lei comum. 
 
Como exceção a essa regra, os tratados e acordos internacionais que apresentem 
tema de direitos humanos e que se submetam ao processo previsto no §3º do art. 5º da 
Constituição Federal equiparar-se-ão às emendas constitucionais, por atenderem à forma 
prevista na própria Constituição. 
 
Esses instrumentos, todavia, não existem isoladamente, mas coexistem com 
outras normas jurídicas, advindas da legislação interna. Diante desse fato, é preciso 
limitar a extensão de cada norma, fixando a sua situação perante as demais. O presente 
trabalho busca, dessa forma, o estudo dos patamares normativos tanto das normas 
internacionais que tratem de assuntos de Direitos Humanos que atenderam ao quorum 
qualificado previsto no art. 5º, §3º da Constituição quanto daquelas que foram 
incorporadas sem atender a essas exigências formais. 
 
 
 
6
1. HIERARQUIA DA ORDEM NORMATIVA 
 
 
1.1 – O sistema hierarquizado da ordem normativa, proposto por Hans Kelsen. 
 
 Dentre as muitas contribuições para o estudo do Direito, Kelsen defendeu a tese 
de que o Direito regula a sua própria criação, já que uma norma jurídica só poderia 
existir quando outra norma assim determinasse, podendo estabelecer, em muitos casos, 
o próprio conteúdo da norma a ser criada.1 
 
Assim, sempre haveria uma “norma superior” que fixaria a criação de uma 
“norma inferior”, estando a criação dessa norma superior condicionada a uma norma 
ainda mais superior, constituindo o que definiu como um regressus até a chamada 
norma fundamental, que fundamenta a validade de todo o ordenamento jurídico.2 
 
Segundo esse entendimento, “a ordem jurídica, especialmente a ordem jurídica 
cuja personificação é o Estado, é, portanto, não um sistema de normas coordenadas 
entre si, que se acham, por assim dizer, lado a lado, no mesmo nível, mas uma 
hierarquia de diferentes níveis de normas”.3 
 
Como nível mais elevado dessa hierarquia,encontraríamos a constituição 
material de um país, partindo da premissa de que ela reflete a idéia de norma 
 
1
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de J. 
Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.103. 
2
 Ibidem, p. 103. 
3KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3ª Ed. São Paulo. 
Martins Fontes. 2000, p. 181. 
 
 
7
fundamental. É a constituição em seu sentido material4, i.e., “as regras que regulam a 
criação das normas jurídicas gerais, em particular a criação de estatutos”, determinando 
os órgãos, o processo de legislação e até o conteúdo (positivo ou negativo, ou seja, que 
deve ou não deve ter certo conteúdo) das leis a serem formuladas, e não em seu sentido 
formal, ou seja, o documento solene que traduz um grupo de normas jurídicas 
modificável ante a observância de prescrições especiais que objetivam dificultar essa 
modificação normativa.5 
 
Para ele, a constituição no seu sentido formal não é indispensável, ou seja, 
aquela forma especial conferida às leis constitucionais, a forma constitucional é 
prescindível. Por outro lado, as normas que regulam a criação de normas gerais e, para o 
Direito moderno, as normas que determinam os órgãos e o processo de legislação, ou 
seja, o conjunto normativo que compõe a chamada constituição material se apresenta 
como um elemento essencial a todas as ordens jurídicas.6 
 
Entende, ainda, só ser possível a existência da constituição formal (em especial 
os dispositivos pelos quais a modificação da constituição se torna mais difícil que a 
modificação de leis ordinárias) se houver uma constituição escrita, se houver uma 
constituição com caráter estatutário. Assim, não há que se falar em constituição formal 
nos casos em que haja constituição material com caráter de Direito consuetudinário.7 
 
 
4
 Para José Afonso da Silva, por materiais entendem-se as normas costumeiras ou escritas que regulam a 
organização dos órgãos e a estrutura do Estado, bem como os direitos fundamentais. Nesse sentido, v. 
Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª Ed. São Paulo. Malheiros editores LTDA. 2005, p. 40 e 41. 
5
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de J. 
Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.103 e KELSEN, Hans. 
Teoria geral do direito e do Estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3ª Ed. São Paulo. Martins Fontes, 
2000, p. 182. 
6
 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3ª Ed. São Paulo. 
Martins Fontes. 2000, p. 182. 
7
 Ibidem, p. 183. 
 
 
8
No nível imediatamente inferior ao ocupado pela Constituição material estariam 
as normas gerais criadas pelo costume e pelo processo legislativo. São normas aplicadas 
tanto pelos magistrados quanto pelas autoridades administrativas quando do exercício 
de sua competência ou atribuições e que têm o escopo de determinar os órgãos que 
aplicarão o Direito, bem como o processo que eles deverão observar quando dessa 
aplicação, além de determinar os atos judiciais e administrativos desses mesmos órgãos, 
de modo a criarem as normas individuais que regularão as situações que se 
apresentarem no caso concreto.8 
 
Nos casos daqueles ordenamentos jurídicos não consuetudinários, aqueles que 
adotam a lei escrita, positiva, cuja origem histórica remonta o Civil Law, de tradição 
romanística, enquanto à Constituição restaria regular o procedimento de criação das leis, 
pouco se manifestando acerca do conteúdo que nelas se encerram, à legislação restaria a 
produção e o conteúdo dos atos judiciais e jurídicos.9 
 
Isso se conclui quando diz que a ordem jurídica não é 
 
um sistema de normas de Direito coordenadas, colocadas ao lado umas das 
outras, por assim dizer, mas uma série escalonada de diferentes zonas 
normativas, que, em esquema, podemos apresentar da forma seguinte: o grau 
supremo de uma ordem jurídica estatal é formado pela Constituição, cuja 
função essencial consiste em determinar os órgãos e o processo da criação 
das normas jurídicas gerais, quer dizer, da legislação. O grau imediato é 
constituído pelas normas gerais criadas pelo processo legislativo, cuja 
função consiste não só em determinar os órgãos e o processo, mas também, 
em essência, o conteúdo das normas individuais, criadas ordinariamente 
pelos tribunais e autoridades administrativas. 10 
 
 
8
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de J. 
Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.104. 
9
 Ibidem, p.104. 
10
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de Fernando de Miranda. São Paulo: Acadêmica, 
1939, p.67, apud, HORTA, Raul Machado. Direito constitucional. 4ª Ed. Ver. e atual. Belo Horizonte: 
Del Rey, 2003, p. 132-133. 
 
 
9
No caso brasileiro, em regra, a elaboração das leis é de atribuição do Poder 
Legislativo, com sanção pelo Executivo. Em se tratando de matéria federal, compete ao 
Congresso Nacional essa feitura, com suas duas Casas, quais sejam, Câmara dos 
Deputados e Senado Federal, além da sanção do Presidente da República. Em se 
tratando de matéria a ser regulada pelos Estados, caberão às Assembléias Legislativas e, 
em se tratando do Distrito Federal, da Câmara Legislativa, com respectiva sanção pelo 
governador do Estado ou do Distrito Federal. Sendo matéria relativa ao processo 
legislativo municipal, caberá às Câmaras dos Vereadores essa função, cuja sanção 
deverá ser de responsabilidade do prefeito municipal. 
 
Nos termos da atual Carta Constitucional (art. 59), como resultantes do processo 
legislativo se entendem as emendas à Constituição, as leis complementares, as leis 
ordinárias, as leis delegadas, as medidas provisórias (embora com severas críticas 
quanto à sua alocação, haja vista não resultar do processo legislativo em si, mas de 
edição pelo Presidente da República)11, decretos legislativos e resoluções. 
 
O nível hierárquico subseqüente ao que se encontra a legislação e o costume 
apresenta as decisões judiciais e os atos jurídicos. Ao decidir judicialmente, o 
magistrado não apenas aplica a norma geral trazida pela legislação ou pelo costume, 
mas cria uma norma individual que regulará aquele caso concreto. Não só aplica, mas 
também cria Direito.12 
 
 
11
 Neste sentido, José Afonso da Silva em seu Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª Ed. São 
Paulo. Malheiros editores LTDA. 2005, p. 524. 
12
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.106-107. 
 
 
10
Da mesma forma, os atos jurídicos criam e aplicam o direito sempre observando 
as normas gerais que os tornam possíveis. Por ato jurídico se entende o termo genérico 
que, no âmbito do direito privado, tem como característica essencial ser um ato volitivo, 
apto a gerar efeitos no mundo jurídico. Nas palavras de Washington de Barros 
Monteiro, “adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, eis, em 
poucas palavras, em toda a sua extensão e profundidade, o vasto alcance dos atos 
jurídicos”13. Mesmo que porventura não se alcance o objeto (adquirir, resguardar, 
transferir, modificar ou extinguir direitos), isto não descaracteriza o ato jurídico, já que 
o seu núcleo consistena manifestação de vontade naquele sentido, e não na 
concretização de sua especificidade.14 
 
Como espécie do gênero “ato jurídico” temos o negócio jurídico, cuja idéia 
primordial “reside na declaração de vontade dirigida no sentido da obtenção de um 
resultado perseguido pelo emitente”15, diferente do que ocorre com o ato jurídico, cuja 
noção é a simples idéia de que a manifestação da vontade está de acordo com o 
ordenamento jurídico. É a conseqüência jurídica buscada pela parte que os distingue, 
estando ausente em um e presente no outro. 
 
Outra espécie de ato jurídico é o ato administrativo, i.e., “a exteriorização da 
vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, 
que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de 
 
13
 Curso de Direito Civil, vol. I, p.175, apud, CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito 
Administrativo. 16ª Ed. Rio de Janeiro. Editora Lúmen Júris. 2006. 
14
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.107-108. 
15
 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª Ed. Rio de Janeiro. 
Editora Lúmen Júris. 2006, p. 87. 
 
 
11
atender ao interesse público”16, que não se confunde com o negócio jurídico porque a 
vontade aqui emitida decorre de lei. O agente da Administração emite a vontade de 
acordo com a lei, e não com anseios pessoais no sentido de que se alcance ou não o fim 
a que se destina tal emissão. 
 
Diante desse escalonamento, enxergamos que as normas jurídicas que se 
encontram num nível superior ao de outras serão fontes do Direito para estas. Toda 
norma jurídica que esteja num nível superior ao de outras será fonte para elas, já que 
poderá determinar tanto o órgão e o processo adotado por esse órgão para que crie a 
norma tida como inferior quanto o próprio conteúdo da norma a ser criada.17 
 
Destarte, os costumes e a legislação terão como fonte de Direito a Constituição 
nacional; as decisões judiciais e atos jurídicos terão como fonte os costumes, a 
legislação e a própria Constituição (por ser fonte de Direito dos costumes e da 
legislação); e o dever que se impõem à parte mediante decisão judicial ou ato jurídico 
terá como fonte a Constituição, os costumes ou a legislação e a decisão judicial ou ato 
jurídico.18 
 
Conclui-se, postas essas premissas, que o Direito não encontra em algo externo, 
independente de si mesmo, a sua fonte. A fonte do Direito é sempre o próprio Direito, 
conforme o pensamento kelseniano, e não normas morais, princípios políticos, doutrinas 
jurídicas, etc, por não terem estas idéias força de obrigatoriedade. Portanto, fonte de 
 
16
 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª Ed. Rio de Janeiro. 
Editora Lúmen Júris. 2006, p. 87. 
17
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.105. 
18
 Ibidem, p. 105-106. 
 
 
12
Direito de uma norma jurídica será a norma jurídica que se encontre num nível superior 
segundo o escalonamento proposto. 
 
Mas nem sempre isso é observado e é possível que as normas que estejam em 
níveis hierárquicos distintos conflitem entre si. Uma norma de grau inferior poderá estar 
em dissonância com o determinado por uma norma de grau superior quanto ao seu 
processo de formação ou quanto ao seu conteúdo. 
 
É a norma inferior que vai de encontro à norma superior, o que resulta numa 
contradição lógica e que põe em questão a unidade do sistema normativo lógico e 
fechado quando tanto a norma superior quanto a norma inferior contraditória àquela são 
consideradas válidas. Para ser considerado válido um estatuto ou uma regra de Direito 
consuetudinário, o único fundamento de validade exigido é ter sido criado em 
conformidade com o processo previsto pela Constituição.19 
 
Deste modo, quando se fala em “lei inconstitucional”, por exemplo, pretende-se 
dizer que aquela lei, anulável ordinariamente por outro estatuto (atendendo ao princípio 
lex posterior derogat priori), poderá ser anulada de outra forma que não a ordinária. 
Quando essa lei tida como inconstitucional tiver conteúdo diferente do prescrito pela 
Constituição ou criada de forma distinta da prevista, deverá ser considerada válida 
desde o momento de sua edição até o momento em que for anulada (segundo processo 
regulado pela própria Constituição) pelo órgão competente, como um Tribunal 
 
19
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.102-103; 109-110. 
 
 
13
Constitucional, de última instância ou Suprema Corte. Não será considerada nula, mas 
seus efeitos se estenderão, como norma válida que é, até o momento de sua anulação.20 
 
Cumpre ressaltar, no que concerne ao conteúdo da lei, que não é a contradição 
lógica de per se, existente entre a Constituição e a norma inferior desconforme àquela, 
que se denominará “inconstitucionalidade”. A inconstitucionalidade só será assim 
admitida quando condição estabelecida pela preliminar de um processo, processo este 
de revogação da lei ou de punição de determinado órgão (nos termos do que se segue).21 
 
A unidade formada pelos preceitos constitucionais relativos à criação e ao 
conteúdo das leis encontra neles um caráter de prescrições alternativas, cujas partes 
alternativas (produção legislativa e conteúdo das leis) são valoradas desigualmente. Ou 
seja, aquilo que a Constituição dispõe como processo de elaboração das leis e conteúdo 
legal é visto como partes de uma mesma unidade. Porém, essas partes recebem uma 
valoração distinta, desigual, quando comparadas entre si. Não podem ser igualmente 
valoradas.22 
 
Esta desigualdade reside na desqualificação do conteúdo das leis em face da 
produção normativa, porque a lei que carrega em si um conteúdo desconforme à norma 
superior, embora tenha atendido a produção legislativa prevista, será considerada 
anulável pela Carta Constitucional (para os casos dos ordenamentos que não prevêem a 
revogação das leis inconstitucionais, se contentando com a responsabilização pessoal 
dos órgãos competentes pela aprovação de tais leis sem cessar a validade delas, ao invés 
 
20
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 110. 
21
 Ibidem, p 110. 
22
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.111. 
 
 
14
de considerar anulável a norma inferior em contradição, será esta “declarada punível por 
causa de um órgão”).23 
 
Nesse sentido, ao se referir aos preceitos constitucionais relativos à produção e 
ao conteúdo das leis, considerando que ambos os preceitos formam uma unidade e que 
tais preceitos relativos à legislação constitucional revelam o caráter de prescrições 
alternativas, Kelsen leciona que 
 
a diferenciação acontece no sentido de uma desqualificação da segunda 
alternativa diante da primeira. E essa desqualificação se traduz pelo fato de 
que a lei correspondentenão ao primeiro mas ao segundo preceito 
alternativo, justamente por causa dessa sua qualificação, é considerada 
anulável pela Constituição ou declarada punível por causa de um órgão. 
Nisso, porque a norma ‘antinormativa’ possa ser revogada, ou porque um 
órgão seja punido por causa dela, reside aquilo que se designa melhor como 
‘antinormatividade’ (‘inconstitucionalidade’, ‘ilegalidade’), ou como a 
‘falta’ ou “deficiência’ da norma”.24 
 
 Em se tratando de atos judiciais e jurídicos que vão de encontro ao disposto pela 
legislação, o mesmo entendimento deverá ser aplicado. Ao invés de se falar em 
inconstitucionalidade, passa-se a falar em ilegalidade. Assim como a Constituição 
determina a produção e o conteúdo das leis, a lei determina o modo de criação e o 
conteúdo dos atos judiciais e jurídicos, bem como estipula que um ato judicial ou 
jurídico produzido de forma destoante à prevista por ela ou com conteúdo diverso 
deverá manter a sua validade até que seja anulada pela instância competente, 
obedecendo-se ao processo devido.25 
 
 
23
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.111. 
24
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.111. 
25
 Ibidem. 
 
 
15
 Este processo a ser observado quando da anulação do ato judicial ou jurídico, em 
não havendo sua previsão ou se estiver se esgotado, implicará o crescimento em força 
jurídica da norma inferior ante a norma superior, ou seja, permanecerá válida, mesmo 
tendo conteúdo que afronta a lei, por ter se operado o chamado instituto da coisa 
julgada.26 
 
 Só se pode afirmar a contradição de uma norma inferior em face de outra 
superior quando da sua anulação por quem competente. A antinormatividade, citada por 
Kelsen, de uma norma supostamente válida, se manifesta pela sua revogação, pela sua 
anulação mediante a edição de outro ato judicial ou jurídico ou pela negação como 
norma validamente reconhecida, expurgando a sua aparência de norma juridicamente 
válida.27 
 
 O que não se permite é que haja uma contradição entre duas normas de níveis 
distintos do escalonamento proposto. Não se cogita qualquer contradição lógica que 
venha a comprometer a unidade no escalonamento do ordenamento jurídico. Para tal, 
utiliza-se de meios que possibilitem a anulação ou nulidade (nos casos em que haja tal 
previsão) dessas normas eivadas de inconstitucionalidade ou ilegalidade, como se 
depreende do que se segue: 
 
a “inconstitucionalidade” ou ‘ilegalidade’ de uma norma que, por um motivo 
ou outro, tem de ser pressuposta como válida significa, assim, ou a 
possibilidade de esta ser anulada (do modo ordinário, se for uma decisão 
judicial, de outro modo, que não o ordinário, se for um estatuto), ou a 
possibilidade de ser nula. Sua nulidade significa a negação da sua existência 
pela cognição jurídica.28 
 
26
 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Tradução de 
J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.111. 
27
 Ibidem, p. 112. 
28
 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3ª Ed. São 
Paulo. Martins Fontes. 2000, p.233. 
 
 
16
1.2 - A posição do direito internacional no escalonamento normativo proposto por 
Kelsen. 
 
 Utilizando-se de uma análise de proporções mundiais, conclui-se pela existência 
de tantos ordenamentos jurídicos quantos sejam os Estados soberanos. Verificando-se a 
não existência de um único ordenamento jurídico vigente em escala global, mas uma 
multiplicidade deles que coexistem respeitando certas condutas que têm como 
fundamento viabilizar essa coexistência coordenada, atribui-se ao direito internacional a 
coadunação desses ordenamentos, delimitando de forma recíproca a validade jurídica de 
cada um deles. 
 
 Nesses termos, o jurista aloca o direito internacional em um nível hierárquico, 
dentro do escalonamento normativo, acima dos ordenamentos jurídicos nacionais, ou 
seja, acima das próprias constituições dos países soberanos, por considerar o direito 
internacional como reflexo de uma comunidade jurídica universal. 
 
Defende, em sua “Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do 
direito”29 , que 
 
se se aceitar que não existe apenas um único ordenamento jurídico estatal, 
mas que existe uma pluralidade deles, coordenados e com a validade 
juridicamente delimitada, em plena vigência, reconhece-se – o que será 
mostrado adiante – que é o direito internacional positivo que realiza essa 
coordenação dos ordenamentos jurídicos únicos e a delimitação recíproca de 
seus âmbitos de validade, então deve-se conceber o direito internacional 
como acima dos ordenamentos jurídicos pertencentes a uma comunidade 
jurídica universal; com isso, a unidade de todo o direito é assegurada num 
sistema escalonado consecutivo. 
 
 
 
29
 Tradução de J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.109. 
 
 
17
1.3 - Teorias atuais relacionadas à solução de eventuais conflitos que se 
estabeleçam entre o direito internacional e o direito interno. 
 
Embora perfilhada por muitos países e defendida por muitos adeptos, a teoria 
kelseniana que aloca o direito internacional com primazia sobre os ordenamentos 
nacionais não se revela de unânime aplicação pelos Estados soberanos. 
 
 Buscando solucionar a questão apresentada quando normas de direito 
internacional e de direito interno se chocam, duas teorias se sobressaíram, sendo de 
corrente estudo ante a sua larga utilização e importância. 
 
 A teoria dualista (ou dualismo) prega a independência entre o direito 
internacional e o direito interno. Seriam ordens jurídicas distintas e separadas, que de 
forma alguma se confundem. De um lado, a relação é entre os Estados. O direito 
internacional é a manifestação coletiva de vontade dos seus sujeitos de direito, ou seja, 
os Estados, sem que haja um órgão que lhes seja superior, seguindo essa ótica. De outro, 
a regulamentação é da relação entre indivíduos. O direito interno encerra a vontade 
unilateral do Estado, que se apresenta como algo superior aos indivíduos, sujeitos 
daquele direito.30 
 
Em face dessa dicotomia que se apresenta, segundo esse entendimento, o direito 
internacional só se torna fonte de obrigações para os indivíduos quando suas normas se 
transformam em direito interno. O direito interno não encontra aplicação direta na 
ordem internacional. O mesmo ocorre com o direito internacional, que, por si só, não se 
 
30
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 211 e JO, Hee Moon. 
Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 161. 
 
 
18
aplica imediatamente aos ordenamentos internos dos países, de forma direta, mas 
deverá, para que haja a sua aplicabilidade, ser recebido conforme o estabelecido pelos 
procedimentos legais adotados pelos Estados. A internalização do direito internacional 
na ordem nacional atenderá à formula que prevê não apenas a sua introdução, mas 
também a sua transformação nos termos trazidos pelos procedimentos legais 
nacionais.31Com a transformação do direito internacional em direito interno, as normas 
internacionais passam a ser normas internas e, portanto, passíveis de revogação por uma 
lei interna posterior ou de hierarquia superior. Esse raciocínio implica dizer que não se 
pode falar em conflito entre normas internacionais e internas, mas de normas internas 
com normas originadas no direito internacional e que se transformaram em normas 
internas. O conflito que se estabelece, no fim das contas, é entre norma interna e norma 
interna.32 
 
 Por serem ambas normas internas, uma norma originariamente interna posterior 
ou de escalão hierárquico mais elevado não poderia ser anulada por ser contraditória à 
norma interna que tenha origem no direito internacional, remanescendo, para o Estado 
que não obedeceu ao compromisso internacional ao qual se dignou apenas a sua 
responsabilização internacional.33 
 
 Diferentemente, a teoria monista (ou monismo) refuta a tese de que existem duas 
ordens jurídicas distintas e independentes, quais sejam, direito internacional e direito 
 
31
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 211 e JO, Hee Moon. 
Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 161. 
32
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 161-162. 
33
 Ibidem, p. 162. 
 
 
19
interno. Concebe a idéia de que há um único direito, sem distinguir sua origem como 
internacional ou interna.34 
 
 Partindo dessa premissa, dois alinhamentos surgiram: um apregoa que o direito 
interno prevalece ante o direito internacional, o outro apregoa a posição de 
superioridade do direito internacional em face do direito interno. A esses dois 
alinhamentos denominaram-se, respectivamente, tese do primado do direito interno e 
tese do primado do direito internacional.35 
 
 A idéia central da tese do primado do direito interno é a de que os Estados são 
independentes e detentores de soberania absoluta e, por isso, o direito internacional é 
meramente uma parte, a ser utilizada nas relações internacionais, que integra o direito 
interno.36 
 
Já a tese do primado do direito internacional tem como cerne a idéia de que o 
direito internacional representa um fundamento jurídico de elevação superior que regula 
a relação de convivência entre os Estados independentes e soberanos, devendo, 
portanto, em casos de conflito, prevalecer em relação ao direito interno. Esta tese 
encontra inspiração primeira nas explanações kelsenianas acerca do tema, como se 
depreende do defendido em seu Teoria pura do direito: introdução à problemática 
científica do direito, como já mencionado em momento pretérito (item 1.2).37 
 
 
34
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 211 
35
 Ibidem. 
36
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 162. 
37
 Ibidem. 
 
 
20
1.4 - O posicionamento da sociedade internacional e o posicionamento individual 
dos estados. 
 
 A tese encabeçada por Kelsen sobre a primazia do direito internacional tem sido 
adotada pelas Cortes internacionais, não se atrelando às disposições constitucionais que 
cada Estado nacional propõe38. Se no âmbito interno o Estado, por meio de seus órgãos 
competentes, declara a inconstitucionalidade ou a revogação do Tratado por lei 
superveniente, esse ato só repercutirá internamente. Não revogará o Tratado em si, 
apenas acarretando efeitos domésticos, sem prejuízo de sua responsabilização 
internacional, quando o Estado que se sentir lesado poderá, pelos devidos meios 
internacionais, pleitear a reparação dos prejuízos decorrentes do inadimplemento das 
obrigações não cumpridas, a ser fixada na exata medida dos impactos sofridos em seu 
território nacional. 
 
 Essa tomada de posição visa manter e proteger as bases de convivência 
internacional e tem se manifestado em diferentes momentos no decorrer do tempo. A 
Declaração de Direitos e Deveres dos Estados (de 1949) traz em seu 13º artigo que 
“todos os Estados devem cumprir, de boa-fé, as obrigações oriundas de tratados e de 
outras fontes do direito internacional, e não podem recorrer à Constituição ou às leis 
para se livrar da execução das obrigações internacionais”. 
 
 A Convenção de Viena sobre o direito dos tratados (1969) traz disposições no 
sentido de que todo tratado haverá de ser cumprido de boa-fé pelos Estados-partes (art. 
 
38
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 164. 
 
 
21
26)39, de que esses mesmos Estados não podem invocar as disposições de seu direito 
interno para justificarem o não cumprimento do tratado a que se obrigaram (art. 27)40 e 
excepciona a regra de direito interno de importância fundamental como única causa de 
nulidade a ser invocada em face de tratado ao qual tenha aderido o Estado (art. 46)41. 
 
 Em parecer datado de 1930, a Corte Permanente de Justiça Internacional propôs 
o seguinte preceito: “é princípio geralmente reconhecido, do direito internacional, que, 
nas relações entre potências contratantes de tratado, as disposições de lei interna não 
podem prevalecer sobre as do tratado”42. Seguindo essa linha de raciocínio, um Estado 
não poder se valer de uma norma ou lacuna do seu direito interno para se escusar de 
cumprir suas obrigações internacionais. 
 
 Esse posicionamento, todavia, não implica a automática invalidação da norma 
ou decisão interna contrária ao direito internacional. Pelo contrário, poderá manter a sua 
validade e vigência dentro do território nacional, o que não significa que sanções não 
serão impostas ao Estado que as edite ou prolate, pois a hipótese do não reconhecimento 
da validade dessas normas ou decisões pelos outros Estados será acompanhada da 
possibilidade de responsabilização internacional.43 
 
39
 Art.26: “Pacta sunt servanda - Todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser cumprido por elas de 
boa fé”, disponível em meio eletrônico em http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm, acessado em 
13/04/2010. 
40
 Art. 27: “Direito Interno e Observância de Tratados – uma parte não pode invocar as disposições de seu 
direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado. Esta regra não prejudica o art. 46.”, 
disponível em meio eletrônico em http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm, acessado em 13/04/2010. 
41
 Art. 46: “Disposições do Direito Interno sobre Competência para Concluir Tratados - 1. Um Estado não 
pode invocar o fato de que seu consentimento em obrigar-se por um tratado foi expresso em violação de 
uma disposição de seu direito interno sobre competência para concluir tratados, a não ser que essa 
violação fosse manifesta e dissesse respeito a uma norma de seu direito interno de importância 
fundamental. 2. Uma violação é manifesta se for objetivamente evidente para qualquer Estado que 
proceda, na matéria, de conformidade com a prática normal e de boa fé”, disponível em meio eletrônico 
em http://www2.mre.gov.br/dai/dtrat.htm, acessado em 13/04/2010. 
42
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva. 2008, p. 211. 
43
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p.108. 
 
 
22
 
 Conquanto assim entenda a sociedade internacional genericamente considerada, 
faticamente se vislumbra uma desparametrização na adoção pelos Estados 
individualmente. A Holanda, por exemplo, traz expressamente a superioridade do 
direito internacional ante a ordem interna (no caso deste país, equipara os tratados à 
própria Constituição. O sistema constitucional daquele Estado possibilita que a 
vinculação a um instrumento internacional acarrete a modificação da própria 
Constituição)44. Outros países, como a Alemanha, a França e a Itália, encontram no bojo 
de suas Constituições que o direito internacional haverá de ser aplicado com status 
inferior ao constitucional45. Além deles, há ainda aqueles países que não encontram em 
suas cartas constitucionais qualquer manifestação acerca do tema, restando como uma 
incógnita. 
 
 Como se não bastasse, ainda se pode observar que muitos Estados misturam os 
conceitos das teorias monista e dualista em suas formas puras, criando um misto entre 
elas, limitando e alargando alcances e adequando aos seus anseios como Estados 
soberanos. Como comenta Hee Moon Jo, “algumas obrigações internacionais entram 
em vigor no território nacional sem o processo de implementação específica, e outras 
obrigações internacionais exigem a implementação via legislação nacional”.46 
 
 A lógica aqui aplicada, a sua prima ratio, é a de que os Estados logram defender 
os interesses nacionais como uma unidade centralizada juridicamente reconhecida, não 
necessariamente buscando a solução teórica ou acadêmica mais adequada. 
 
 
44
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 33 
45
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 175. 
46
 Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p.163. 
 
 
23
 A filiação a uma ou outra corrente, em suas formas puras ou a uma modalidade 
mista, não refutará a possibilidade de situações em que haja conflito entre tratados e a 
Constituição nacional, ou entre tratados e lei ordinária. 
 
 Havendo conflito entre tratado e Constituição, caberá ao órgão nacional 
competente, seja Tribunal ou juiz singular, resolver a lide verificada no caso concreto 
em conformidade com o sistema constitucional do Estado a que pertence. É nele, 
sistema constitucional nacional, que constará a opção pela superioridade do tratado em 
face da Carta Constitucional e conseqüente revogação das disposições contrárias àquele, 
a sua equiparação no mesmo nível de hierarquia ou a assunção do tratado como situado 
num patamar hierárquico inferior a ela e, portanto, submisso aos seus ditames. É 
questão a ser tratada internamente pelo próprio Estado e que enseja uma pluralidade de 
posições a serem seguidas. 
 
 Embora reconhecidas as considerações supramencionadas, no que tange ao 
entendimento das cortes internacionais, qualquer conflito que envolva tratados 
celebrados, seja com a Constituição ou com a lei, surtirá o mesmo efeito de 
responsabilização internacional se houver o descumprimento das obrigações trazidas 
pelo tratado pactuado. Não se pode afastar a inteligência da disposição da Convenção de 
Viena sobre o direito dos tratados que impede os Estados de se utilizarem de suas 
normas internas para se escusarem pelo inadimplemento das obrigações internacionais 
às quais se comprometeram.47 
 
 
47
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 173. 
 
 
24
 O possível conflito a ser criado entre tratado e Constituição encontra em certas 
Constituições a sua previsão, bem como a busca por solucionar a eventual situação 
conflituosa. É o caso da Constituição holandesa, que traz em seu art. 91, §3º que 
nenhum preceito de tratado que conflite com a Constituição ou que leve a conflitos com 
ela será aprovado pela Câmara do Parlamento, salvo se aprovado por pelo menos dois 
terços de votos a seu favor.48 
 
 Também a Constituição francesa, em seu art. 54, diz que se o Conselho 
Constitucional determinar que um acordo internacional contém uma cláusula contrária à 
Constituição, a ratificação ou aprovação desse acordo não poderá ser autorizada até que 
a Constituição seja revista.49 
 
 O problema surge quando a Constituição é omissa quanto à questão, ou seja, 
quando não explica a posição hierárquica do tratado no escalonamento jurídico daquela 
determinada ordem. Objetivando evitar esse tipo de situação, os Estados devem apurar a 
constitucionalidade da norma internacional antes de sua introdução no ordenamento 
nacional. Assim, recomendável se revela a atuação dos Poderes Executivo e Legislativo 
antes de se decidir pela vigência do tratado internamente.50 
 
 Se o conflito se der não entre tratado e Constituição, mas entre tratado e lei, não 
menos diversificadas se encontram as posições aderidas pelos Estados. Em determinado 
 
48
 “Any provisions of a treaty that conflict with the Constitution or wich lead to conflicts with it may be 
approved by the Chambers of the Parliament only if at least two-thirds of the votes cast are in favor”, 
disponível em meio eletrônico em http://www.servat.unibe.ch/icl/nl00000_.html, acessado em 
13/08/2009. 
49
 “If, upon the demand of the President of the Republic, the Prime Minister or the President of one or 
other Assembly or sixty deputies or sixty senators, the Constitutional Council has ruled that an 
international agreement contains a clause contrary to the Constitution, the ratification or approval of this 
agreement shall not be authorized until the Constitution has been revised”, disponível em meio eletrônico 
em http://www.servat.unibe.ch/icl/fr00000_.html, acessado em 13/08/2009. 
50
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 174. 
 
 
25
momento, prevaleceu o entendimento de que tratado e lei interna receberiam tratamento 
similar. Tratado com vigência superveniente a lei nacional a revogaria, atendendo ao 
princípio de que lei posterior revoga anterior (lex posterior derogat priori), não 
ocorrendo o mesmo com lei posterior a tratado, pois o princípio de que os Estados 
cumprirão aquilo a que se obrigaram (pacta sunt servanda) seria invocado de modo a 
garantir que um impacto internacional viesse a ser ocasionado.51 
 
 Atualmente, há Estados que conferem aos tratados um nível de inferioridade em 
relação às suas leis, onde haveria a primazia da regra interna sobre o direito 
internacional, alinhando-se à tese do primado do direito interno. O direito internacional 
é aplicado subsidiariamente à lei nacional e apenas quando não conflite com ela. É o 
que ocorre nos Estados Unidos da América com relação aos chamados “acordos 
executivos” (executive agreements), ou seja, os acordos celebrados fora do processo 
constitucional, que são entendidos como acordos não auto-executáveis, precisando de 
lei nacional que venha a executar o seu conteúdo52. Diferente dos acordos celebrados 
conforme o processo constitucional, esses acordos não são hierarquicamente situados no 
mesmo patamar das leis federais, mas abaixo delas, não estando no rol ilustrativo da “lei 
suprema do país”53. 
 
 Existem Estados que equiparam a força dos preceitos contidos nos tratados à dos 
trazidos pelas leis nacionais. Partindo dessa premissa de que tratado é igual a lei interna, 
aplicam o princípio de que lei posterior revoga pretérita. É o que os Estados Unidos 
 
51
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional.2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 175. 
52
 Ibidem, p. 177. 
53
 O art. 6º da Constituição estadunidense aduz que a “Constituição e as leis dos Estados Unidos que se 
façam em seu cumprimento e todos os tratados celebrados ou que se celebrem sob a autoridade dos 
Estados Unidos serão a lei suprema do país, e os juízes em cada um dos Estados estarão sujeitos a ela, 
sendo nulas as leis de cada um dos Estados ou as suas Constituições que, em qualquer caso, sejam 
contrárias a eles”. 
 
 
26
aplicam quando os acordos que são celebrados em consonância com o processo 
constitucional estão em situação de conflito com a lei nacional (lá conhecido como 
later-in-time statute principle).54 
 
 Há, ainda, os Estados que entendem pela primazia do direito internacional sobre 
o direito interno, salvo a Constituição nacional. Tratados são, conforme esse 
alinhamento, superiores hierarquicamente às leis nacionais, mas inferiores 
hierarquicamente à Constituição. Essa é a posição de Estados europeus como o alemão e 
o italiano, entre outros. Nesse sentido, expõe a Constituição italiana, em seu artigo 10, 
que o sistema legal italiano se conforma, se adéqua, aos princípios reconhecidos pelo 
direito internacional e que a situação legal dos estrangeiros é regulada pela lei em 
conformidade com as regras internacionais e tratados55. Dentre os países sul 
americanos, a Constituição argentina traz em seu artigo 75 que tratados e acordos têm 
uma hierarquia maior que as leis56, salvo aqueles taxativamente discriminados pelo seu 
inciso XXII, que terão hierarquia constitucional. 
 
54
 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2ª Ed. São Paulo. LTR, 2004, p. 176. 
55
 “Art. 10. [International Law] 
(1) The legal system of italy conforms to the generally recognized principles of international law. 
(2) Legal regulation of the status of foreigners conforms to international rules and treaties.”, disponível 
em meio eletrônico em http://www.servat.unibe.ch/icl/it00000_.html, acessado em 13/08/2009. 
56
 “Art. 75.- Corresponde al Congreso: 
22. Aprobar o desechar tratados concluidos con las demás naciones y con las organizaciones 
internacionales y los concordatos con la Santa Sede. Los tratados y concordatos tienen jerarquía superior 
a las leys. La Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre; la Declaración Universal de 
Derechos Humanos; la Convención Americana sobre Derechos Humanos; el Pacto Internacional de 
Derechos Económicos, Sociales y Culturales; el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos y su 
Protocolo Facultativo; la Convención sobre la Prevención y la Sanción del Delito de Genocidio; la 
Convención Internacional sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación Racial; la 
Convención sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminación contra la Mujer; la Convención 
contra la Tortura y otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes; la Convención sobre los 
Derechos del Niño; en las condiciones de su vigencia, tienen jerarquía constitucional, no derogan artículo 
alguno de la primera parte de esta Constitución y deben entenderse complementarios de los derechos y 
garantías por ella reconocidos. Sólo podrán ser denunciados, en su caso, por el Poder Ejecutivo nacional, 
previa aprobación de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara. 
Los demás tratados y convenciones sobre derechos humanos, luego de ser aprobados por el Congreso, 
requerirán del voto de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara para gozar 
de la jerarquía constitucional.”, disponível em meio eletrônico em 
http://www.senado.gov.ar/web/interes/constitucion/cuerpo1.php, acessado em 13/08/2009. 
 
 
27
 Postas essas considerações, afere-se a distinção qualitativa dada aos tratados e 
acordos internacionais pelos Estados nacionais, que não necessariamente apresentam 
qualquer subsunção ao trazido pela Convenção de Viena sobre o direito dos tratados, de 
1969. 
 
1.5 - Os procedimentos que vinculam o Estado brasileiro aos tratados. 
 
 O caminho perseguido para que haja a vinculação do Estado brasileiro a tratados 
e acordos internacionais requer, como condição inerente e indispensável, a atuação 
conjunta de dois Poderes, senão Executivo e Legislativo. 
 
 Simbolizando os dois Poderes em âmbito federal, institui a Constituição como 
competência privativa do Presidente da República “celebrar tratados, convenções e atos 
internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional” (art. 84, VIII) e como 
competência exclusiva do Congresso Nacional “resolver definitivamente sobre tratados, 
acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao 
patrimônio nacional” (art. 49, I). 
 
 Valendo-se da discricionariedade atribuída ao caso, ou seja, fazendo um juízo 
quanto à conveniência oportuna de celebração daquele tratado, é atribuído ao Presidente 
da República, que, na qualidade de chefe de Estado, está investido dos poderes que 
conduzem a manutenção das relações internacionais, a iniciativa do processo legislativo 
de apreciação do tratado internamente. 
 
 
 
28
 Essa iniciativa se manifesta quando do envio de mensagem ao Congresso 
Nacional, submetendo à apreciação de suas Casas e integrantes os textos dos tratados 
por ele celebrados em nome do Estado, dos tratados multilaterais que ele julgue merecer 
apreciação legislativa para possível adesão (mesmo que sem a participação do Brasil no 
ato inicial de sua celebração) e dos tratados advindos de organizações internacionais.57 
 
 Submetido o tratado ao Congresso Nacional, a sua aprovação se materializará 
mediante a edição de decreto legislativo, que representa a autorização para a ratificação 
ou adesão ao tratado pelo Presidente da República. A diferença entre ratificação e 
adesão está no fato de que enquanto a ratificação decorre da participação formal do 
Estado no trâmite que envolve a feitura do tratado, cuja solenidade se manifesta quando 
da sua assinatura, na adesão o Estado não presta esse apoio formal, não apõe sua 
assinatura ao tratado, não confirmando nenhum ato anterior ocorrido na gênese do 
tratado.58 
 
 A aprovação pelo Congresso Nacional se fará tendo em observância a adoção de 
quorum de maioria simples (também conhecida como maioria relativa), ou seja, cada 
uma das Casas do Congresso Nacional deverá aprovar o tratado pelos votos da maioria 
dos parlamentares presentes nas sessões deliberativas designadas, desde que os 
presentes totalizem, pelo menos, a maioria dos integrantes da respectiva Casa. É a 
“maioria da maioria absoluta”. Importante se mostra ressaltar o fato de que o quorum de 
aprovação é o mesmo utilizado para a aprovação de projeto de lei ordinária, nos termos 
do art. 47 da Constituição Federal, diferente do utilizado para a aprovação de projeto de 
lei complementar, que, à luz do art. 69, será aprovado por maioria absoluta. 
 
57
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 89. 
58
 Ibidem, p. 90. 
 
 
29
 A aprovação pelo Congresso Nacional viabiliza a consumação da relação 
surgida em âmbito externo, já que habilita o Chefe do Executivo federal a realizar o ato 
de ratificação ou adesão. Essa ratificação ou adesão será instrumentalizada por 
correspondência oficial a ser endereçada e enviada ao Estado ou organização 
internacional responsável, i.e., o incumbido na condição de depositário do texto 
pactuado pelos Estados.59 
 
Finalizado esse procedimento interno com posterior ratificação ou adesão e já 
estando o texto convencional em vigor internacionalmente,o Presidente da República 
procederá à promulgação do texto objeto de acordo internacional por meio de decreto, 
que será o instrumento apto à produção de efeitos na ordem interna.60 
 
 Resumindo esquematicamente esse processo, Cachapuz de Medeiros leciona que 
 
pode transcorrer de duas formas: a) inicia com a negociação e a adoção do 
texto, prossegue com a avaliação interna de suas vantagens ou 
inconvenientes e, no caso de ser aprovado, ocorre a manifestação da vontade 
do Estado em obrigar-se pelo tratado, o aperfeiçoamento jurídico-
internacional dessa vontade e a incorporação do texto do tratado à ordem 
jurídica interna (negociação – assinatura – mensagem ao Congresso 
Nacional – aprovação parlamentar – ratificação – promulgação); b) o 
Executivo solicita ao Congresso autorização para aderir a um tratado. 
Concedida a autorização, é remetido o instrumento de adesão à autoridade 
depositária do tratado, que leva ao conhecimento das partes a decisão do 
Brasil de também assumir as obrigações do tratado. Entrando o ato de 
adesão em vigor no plano internacional, o tratado é incorporado à ordem 
jurídica interna (mensagem ao Congresso – autorização parlamentar – 
adesão – promulgação).61 
 
 No que concerne à promulgação, embora ainda resista algum entendimento em 
contrário, é majoritário o de que a publicação de seu decreto presidencial induz à 
 
59
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 90.. 
60
 Ibidem. 
61
 MEDEIROS, Antônio Paulo Cachapuz de. O poder de celebrar tratados – competência dos poderes 
constituídos para a celebração de tratados, à luz do direito internacional, do direito comparado e do 
direito constitucional brasileiro. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, Editor. 1995, p. 458, apud DALLARI, 
Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva. 2003, p.91 
 
 
30
vigência do tratado na ordem interna, tendo o seu início na data de publicação ou na que 
constar expressamente em seu texto, se houver disposição nesse sentido. Independente 
de haver ou não essa publicação pós-ratificação ou adesão, o Estado permanece 
responsável internacionalmente pelo seu cumprimento.62 
 
Não se confunde a impossibilidade da exigibilidade das normas no plano 
interno, trazida pela não publicação do decreto presidencial de promulgação, com a 
obrigação trazida pela ratificação ou adesão do tratado. O Estado que ratificou ou aderiu 
ao tratado só se livra de tal responsabilização quando se vale do meio institucional apto 
à extinção do contrato, senão a sua denúncia.63 
 
1.6- A inovação trazida pela Emenda Constitucional n.º 45. 
 
 No ano de 2004, a Emenda Constitucional n.º 45 – também conhecida como a 
Emenda da “reforma do Judiciário” – acrescentou ao art. 5º (que trata dos direitos e 
deveres individuais e coletivos) o seu parágrafo 3º, cuja redação assim trouxe que “os 
tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos aprovados, em cada Casa 
do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos 
membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. 
 
 Essa inovação seguiu a tendência global de atribuir às matérias versadas nos 
tratados sobre direitos humanos uma diferenciação em relação às outras, devido à sua 
importância. Não apenas os Estados passaram a trazer em suas Constituições essa maior 
 
62
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 97-98. 
63
 Ibidem, p. 100. 
 
 
31
preocupação com relação a esses tratados como a doutrina, que já vinha apelando por 
comportamentos nesse sentido, celebrou esse novo posicionamento. 
 
 No Brasil, Antônio Augusto Cançado Trindade, que há muito advogava a idéia 
de conferir aos tratados internacionais sobre direitos humanos um status de 
superioridade em relação aos demais, já ensinava que 
 
os tratados de direitos humanos beneficiam diretamente os indivíduos e 
grupos protegidos. Cobrem relações (dos indivíduos frente ao poder público) 
cuja regulamentação era outrora apanágio do direito constitucional. E 
diversas das Constituições modernas, a seu turno, remetem expressamente 
aos direitos consagrados nos tratados de direitos humanos (cf. supra), a um 
tempo revelando nova postura ante a questão clássica da hierarquia 
normativa dos tratados internacionais vigentes assim como concebendo um 
tratamento especial ou diferenciado também no plano do direito interno aos 
direitos e garantias individuais internacionalmente consagrados (cf. supra). 
Regendo a mesma gama de relações, dos indivíduos ante o Estado, o direito 
internacional e o direito interno apontam aqui na mesma direção, 
coincidindo no propósito básico e último de ambos da proteção do ser 
humano.64 
 
 Portanto, passou a existir uma nova classe de tratados, erigida ao nível 
constitucional. Sua cessação de efeitos internos não mais se dá por meio de denúncia, 
mas mediante a edição de nova emenda constitucional que, por sua vez, se torna 
inviabilizada por violar cláusula pétrea, conforme previsão exposta no art. 60, §4º, IV 
da Constituição.65 
 
Entretanto, a referida Emenda nada mencionou quanto àqueles tratados adotados 
pelo Brasil antes de sua edição, restando omissivamente inerte a solucionar a questão 
que se travou acerca do status que teriam tais tratados. 
 
 
64
 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, 
volume I. Porto Alegre. Sérgio Antônio Fabris Editor. 2003 (2ª. Ed.), p. 542. 
65
 O primeiro tratado aprovado pelo Congresso Nacional mediante procedimento previsto no §3º do art. 5º 
da Constituição Federal foi a Convenção sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, no ano de 2008. 
 
 
32
 Manteriam eles o nível de lei ordinária, como até então era o entendimento 
prevalecente no país, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal? Haveria equiparação 
entre os tratados internalizados anteriormente à edição da Emenda e os tratados que 
atendessem ao processo previsto pela Constituição a partir do ano de 2004? Também 
teriam força constitucional? 
 
 Outras incógnitas também restaram sem solução prevista pela Emenda. Como 
ficaria a questão da promulgação pelo Presidente da República prevista no processo de 
adoção de tratado, haja vista a edição de Emenda Constitucional prescindir tal ato pelo 
Executivo? No caso de Emenda Constitucional, o Poder competente para a promulgação 
é o Legislativo, nos termos do art. 60, §3º, da CF. 
 
Como já foi dito anteriormente, a aprovação parlamentar autoriza a ratificação 
ou adesão ao tratado, promovendo-se, após isso, a sua promulgação pelo Presidente da 
República (essa é a regra, como já explicado no item I.v, de questionável aplicação no 
caso de Emenda Constitucional, já que a promulgação é feita pelo próprio Legislativo, 
nos termos do art. 60, §§2º e 3º, da Constituição Federal). É a ratificação que determina 
o início da vigência do tratado e vinculação do Estado brasileiro no plano internacional. 
Essa comunicação aos demais Estados pactuantes sobre a aceitação interna é de 
competência do Chefe do Executivo federal, constituindo-se uma afronta ao sistema de 
separação de Poderes repassá-la ao Poder Legislativo, para um grupo de autores. 
 
Sobre o tema, dizem ACCIOLY, NASCIMENTO E SILVA e CASELLA : 
 
a questão da promulgação é outro ponto de interrogação, uma vez que as 
emendas constitucionais não são promulgadas pelo Chefe do Executivo, mas 
 
 
33
pelo Congresso. Ante a ausência da promulgação, resta saber como o Chefe 
do Executivoprocederá à ratificação do tratado. 
A ratificação constitui ato imprescindível para determinar o início da 
vigência, vinculando o Estado brasileiro no plano internacional. Somente o 
Presidente da República tem o poder de celebrar tratados, de forma que se 
inclui a comunicação aos demais países da aceitação interna. Não se 
coaduna com a separação dos poderes, essencial em estado de direito, passar 
essa função ao Congresso, que não mantém relações diplomáticas nem 
representa o País no exterior. Constata-se que a EC n. 45 deixou esse ponto 
em aberto. 66 
 
 Somente com a apreciação do caso concreto é que o Judiciário poderá se 
manifestar sobre o tema e uma solução se apresentar à problemática ora instaurada. 
Progressivamente essas questões serão levantadas e respostas até então não dadas pela 
Emenda serão aventadas. 
 
2. SUPRALEGALIDADE OU CONSTITUCIONALIDADE 
DOS TRATADOS QUE VERSEM SOBRE DIREITOS 
HUMANOS. 
 
 
2.1 - O posicionamento brasileiro sobre a incorporação dos tratados e a sua 
hierarquia no ordenamento jurídico interno. 
 
 No caso brasileiro, não se pode falar que houve aplicação das doutrinas monista 
ou dualista em sua forma natural, pura. Novas interpretações lhes foram conferidas, 
amoldando-se à realidade e aos anseios de nossa experiência jurídica. 
 
 Dessa forma, novas expressões foram criadas para indicar a diferença dessas 
doutrinas enxergadas em sua forma pura e as suas novas modalidades. O dualismo puro 
passou a ser chamado dualismo radical pela doutrina brasileira, mantendo em sua 
essência a necessidade de edição de lei específica que permita a incorporação do tratado 
ao ordenamento nacional, como encabeçado originariamente pelos teóricos do dualismo 
 
66
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 222. 
 
 
34
puro, enquanto a sua forma modificada, derivada, foi chamada dualismo moderado, 
segundo a qual não se mostra necessária a edição de lei para a incorporação do tratado, 
sendo bastante um procedimento complexo caracterizado pela aprovação do Congresso 
Nacional acompanhada da promulgação pelo Executivo federal.67 
 
 Ao monismo puro foi conferida a classificação de “radical”, mantendo a sua 
característica de defender a superioridade do tratado ante o ordenamento interno, ao 
passo que a sua forma modificada, derivada, recebeu a classificação de “moderada”, por 
equiparar hierarquicamente o tratado à lei ordinária, subordinando-se à Constituição e 
perdendo a sua efetividade por norma superveniente.68 
 
 A discussão gerada sobre a relação entre normas internas e internacionais 
ensejou a sua análise em duas partes. A primeira parte, cuja apreciação é requisito para 
a da segunda (hierarquia dos tratados), diz respeito à incorporação dos tratados à ordem 
interna. A incorporação, que se efetiva no momento da publicação do decreto 
presidencial de promulgação do tratado, é que permite às normas originariamente 
internacionais produzirem efeitos na ordem interna, criando direitos e deveres aos 
particulares. 69 
 
Ao prescindir de lei específica para incorporar tratado, mas procedimento 
complexo que envolve o decreto legislativo que autoriza o Presidente da República a 
ratificá-lo ou aderi-lo, o Brasil se filia ao chamado dualismo moderado (para uma 
 
67
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 212. 
68
 Ibidem, p. 213. 
69
 DALLARI, Pedro B. A. Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 102. Nesse 
sentido, ainda leciona que a incorporação não se confunde com o início da vigência do tratado no 
território do Estado, que poderá ocorrer na data da publicação do decreto presidencial de promulgação ou 
em data posterior trazida no próprio texto desse instrumento. 
 
 
35
parcela da doutrina, como Hildebrando Accioly, Nascimento e Silva e Paulo Borba 
Casella)70. Esses dois momentos distintos, incorporação e posição hierárquica dos 
tratados, foram abordados pelo Supremo Tribunal Federal nos idos da década de 1970, 
quando da decisão proferida no RE 71.15471, onde se concluiu pela discussão da 
hierarquia do tratado em face de lei nacional somente após a sua internalização. A 
própria noção de dualismo moderado foi primeiramente abordada pelo Ministro Celso 
de Mello na Carta Rogatória 8.279 baseando-se naquele acórdão.72 
 
 A segunda parte, como já mencionado anteriormente, trata da hierarquia dos 
tratados em face de lei nacional. Ainda na década de 1970, mais precisamente em 1º de 
junho de 1977, com a decisão proferida no RE 80.004, cuja matéria se tratava de 
conflito entre a Lei Uniforme de Genebra sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias 
(LUG) e o Decreto-Lei 427/69, o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no 
sentido da recepção plena de tratado internacional sem lhe atribuir status superior ao de 
lei nacional. Esse entendimento foi classificado como de monismo moderado pela 
doutrina, como ensina Accioly, Nascimento e Silva e Casella: 
 
o STF, ao decidir o RE 80.004, teve esse julgado, classificado pela doutrina, 
como exemplo de monismo moderado, momento, inclusive, do surgimento 
dessa terminologia. Nesse caso, decidiu o STF que lei interna superveniente 
 
70
 Existe uma corrente doutrinária que prega que, por não terem natureza jurídica de lei em sentido estrito, 
decretos presidenciais não podem criar direitos e obrigações. Apenas tratados podem instituí-los quando 
equiparados às leis nacionais, no caso brasileiro. Para essa corrente, só poderia ser entendido como 
dualista a sua forma pura, com a promulgação de tratado mediante lei, e não decreto presidencial, 
ignorando a existência do chamado “dualismo moderado”. Assim expõe Pedro B. A. Dallari 
(Constituição e tratados internacionais. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 107). 
71
 Na ementa, consta que “(...) Aprovada essa Convenção pelo Congresso Nacional, e regularmente 
promulgada, suas normas têm aplicação imediata, inclusive naquilo em que modificarem a legislação 
interna. (...)”,disponível em meio eletrônico em http://www.stf.jus.br, acessado em 13/08/2009. 
72
 “Sob tal perspectiva, o sistema constitucional brasileiro – que não exige a edição de lei para efeito de 
incorporação do ato internacional ao direito interno (visão dualista extremada) – satisfaz-se, para efeito de 
executoriedade doméstica dos tratados internacionais, com a adoção de iter procedimental que 
compreende a aprovação congressional e a promulgação executiva do texto convencional (visão dualista 
moderada).”, fls. 14 e 15 do voto em apreço, disponível em meio eletrônico em http://www.stf.jus.br, 
acessado em 13/08/2009. 
 
 
36
poderá afetar tratado em vigor, com exceção daqueles referentes a matéria 
tributária, em face do que dispõe o art. 98 do CTN. Passando o tratado a 
integrar a legislação interna, depois de sua incorporação, encontra-se este 
em igualdade de condições às demais leis, e todas as incoerências que 
apresentar serão analisadas da mesma forma que aquelas surgidas em 
relação às demais leis.73 
 
 Encontrando-se o tratado nesse patamar hierárquico, subordina-se tanto ao 
critério de temporalidade (norma mais recente) quanto ao de especialidade. Dessa 
maneira, tratado que seja dotado de especialidade se sobrepõe à lei interna que trate de 
matéria geral. Se o contrário se perfizer, i.e., se o tratado é que dispuser sobre matéria 
de abrangência gerale lei interna sobre matéria especial, esta prevalece em face 
daquele. Tratando da mesma matéria, a norma superveniente (seja tratado ou lei interna) 
prevalece em face da outra, respeitando o critério de temporalidade. 
 
 Possuindo natureza jurídica de contrato, onde os Estados celebrantes atuam 
como partes, não se cogita da revogação do tratado por lei interna superveniente, mas do 
afastamento da sua efetividade por esta lei. Embora soe estranha à lógica do Direito 
Internacional, que não admite a sobreposição de norma interna sobre internacional, essa 
foi a teoria adotada pela Corte Suprema brasileira, tendo em observância a incapacidade 
de tratado sofrer revogação. 
 
 Essa foi a regra aplicada até que se fez urgente resolver a questão dos tratados 
que versam sobre Direitos Humanos, ainda mais após a edição, em 2004, da Emenda n.º 
45. Como exceção a essa regra de que lei interna superveniente se sobrepõe a tratado em 
vigor só era atribuída aos tratados que versassem sobre matéria tributária essa 
prerrogativa, em face do trazido pelo art. 98 do Código Tributário Nacional.74 
 
73
 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, Paulo Borba. Manual de 
direito internacional público.16 ed. rev., atual e ampl. São Paulo. Saraiva, 2008, p. 213. 
74
 “Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e 
serão observados pela que lhes sobrevenha”. BRASIL. Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe 
 
 
37
2.2 - O caso concreto que modificou o paradigma jurisprudencial com relação à 
prisão do depositário infiel. 
 
 No fim de 2008, o Supremo Tribunal Federal se pronunciou pela 
impossibilidade da prisão civil do depositário infiel, contrariando a jurisprudência 
reiterada da maioria dos tribunais brasileiros (dentre os quais o Tribunal de Justiça do 
Distrito Federal e Territórios), que admitia essa espécie de constrição pessoal. O caso 
concreto que possibilitou essa reorientação da Suprema Corte surgiu em São Paulo, nos 
termos do que se segue. 
 
 O Banco Bradesco ajuizou ação de busca e apreensão em face de um cliente com 
quem havia celebrado contrato de financiamento para aquisição de bens garantido por 
alienação fiduciária, onde se comprometeu ao empréstimo de quantias em benefício do 
requerido, com as quais adquiriu um veículo automotor. Ocorre que este transferiu o 
carro objeto do contrato, deixando também de adimplir com as prestações a que se 
obrigara e incorrendo em mora, nos termos do parágrafo 2º do art. 2º do Decreto-Lei 
911/69. 
 
 Convertida a ação em depósito após restar infrutífera a busca e apreensão até 
então ajuizada, requereu o banco a entrega do bem ou seu depósito em juízo no prazo de 
24 horas, sob pena de prisão. O requerido nada disse, incorrendo em revelia. 
 
 Deferido o pedido de depósito sem que, contudo, houvesse manifestação judicial 
no sentido da prisão civil do requerido, foram opostos embargos de declaração de modo 
 
sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, 
Estados e Municípios. Brasília, 1996 disponível em meio eletrônico em 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm, acessado em 13/04/2010. 
 
 
38
a suprir tal omissão, ocasião em que aquele juiz de primeiro grau se justificou no 
sentido de que aquele caso não se configurava como de depositário infiel, mas de 
mutuário em contrato de alienação fiduciária, i.e., não pagou dívida de verdadeiro 
contrato de empréstimo bancário. Já havia entendimento dos Tribunais nesse sentido, 
inclusive do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, quando classificou a 
prisão do devedor em contrato de mútuo, mesmo que garantida pela cláusula de 
alienação fiduciária, como ilegal.75 
 
 O requerente apelou ao até então 2º Tribunal de Alçada Cível de São Paulo em 
03/12/2002, de modo que fosse reformada a decisão do juízo a quo, decretando a prisão 
civil do requerido. Para tal, utilizou-se de julgado que representava a jurisprudência 
dominante da Suprema Corte e que respaldava o pretendido, qual seja, o RE 235.879-2-
SP. 
 
 Até aquele momento, tendo em vista a equiparação dos tratados às leis ordinárias 
e o critério da especialidade, mesmo já tendo sido celebrada a Convenção Americana de 
Direitos Humanos (Declaração de San José sobre Direitos Humanos76 ou também 
conhecido “Pacto de San José da Costa Rica”), que previa em seu artigo 7º apenas a 
admissibilidade da prisão civil do alimentante que não adimplisse com a sua obrigação 
de forma voluntária e inescusável, prevalecia o entendimento de que “a referida 
disposição de que só é admissível a prisão do alimentante, embora, incorporada ao 
 
75TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. 2ª Turma Criminal. Habeas 
Corpus n.º 89.492, Relator: Desembargador Costa Carvalho. Brasília/DF: 13 de setembro de 1996. Diário 
de Justiça de 20 de novembro de 1996. 
76
 A Declaração enfatiza os direitos humanos, democracia e o desenvolvimento em seus muitos aspectos, 
atendo-se principalmente aos grupos vulneráveis (em especial as crianças, a condição da mulher, dos 
portadores de deficiência, dos idosos, dos enfermos terminais, dos povos indígenas, dos trabalhadores 
migrantes), à identificação dos obstáculos aos direitos humanos, reafirmando a interdependência e 
indivisibilidade de todos os direitos humanos, com atenção especial ao domínio econômico e social, ao 
fortalecimento da democracia e do Estado de Direito e à prevenção de violações maciças e sistemáticas de 
direitos humanos. 
 
 
39
direito interno, não revogou a norma especial da nossa legislação, que admite a prisão 
civil do depositário remisso”77 e “Pacto de São José da Costa Rica não revogou a 
possibilidade de se decretar a prisão civil do depositário infiel”.78 
 
 Na segunda instância, novamente restaram sem êxito os apelos do requerente, 
quando a decisão prolatada direcionou-se no sentido de que ao se interpretar a 
autorização que a Constituição Federal traz no artigo 5º em relação à prisão civil do 
depositário infiel deverá se fazer de forma restrita, em seu sentido próprio, não se 
estendendo a casos alheios àqueles em que alguém recebe de outrem objeto móvel para 
guardá-lo e que, instado a devolvê-lo, não o faz ou não se justifica adequadamente. 
 
 Ainda irresignada, a parte autora recorreu ao Supremo Tribunal Federal, 
originando o RE 466.343-SP, sendo a presidente a Ministra Ellen Gracie, o que 
desencadeou profunda discussão acerca do status que teriam as normas trazidas pelos 
tratados que versem sobre direitos humanos, além da impossibilidade de prisão civil do 
depositário infiel. Por aquela Corte foi decidido que os tratados que tenham esse tipo 
conteúdo (direitos humanos) possuem hierarquia supralegal e que não mais seria 
possível decretar a prisão civil baseada no descumprimento de uma obrigação de 
depósito. 
 
 
77
 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Primeira Turma. Recurso Extraordinário n.º 235.879-2/SP. 
Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília/DF: 03 de novembro de 1998. Diário de Justiça de 26 de março 
de 1999. 
78
 “HABEAS CORPUS. DEPOSITÁRIO JUDICIAL. DESCUMPRIMENTO DE MUNUS PÚBLICO. 
PRISÃO CIVIL. Descumprido, de forma voluntária, o dever de guarda e conservação dos bens arrolados, 
caracteriza-se a infidelidade, o que legitima a prisão civil. Quem se nega a devolver bem penhorado de 
que é depositário pode

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