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ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 53Medgrupo - CiClo 2: M.E.D bordaremos a partir de agora um tema bastante nebuloso da formação médica: a terapia de substituição renal. Assunto previamente restrito às reuniões entre nefrologistas, vem se tornando um tema mais comum entre os médicos, independentemente da especialidade, devido ao crescimento do número de renais crônicos. Falando num português bem claro, seria simplesmente substituir o rim quando ele não mais consegue manter suas funções mínimas, para a manutenção do equilíbrio do meio interno do paciente. Sendo ainda mais direto: consiste em realizar diálise e/ou transplante renal. Vamos ver os principais aspectos dessas modalidades terapêuticas! A Dr. Willem Kolf (“pai da diálise”) e a primeira diálise em pacientes pelo rim artificial rotatório (1943). TeRaPia de suBsTiTuição RenaL 53 o que eu Preciso Saber Sobre Diálise? INDICAÇÕES 1) Lesão renal aguda ou doença renal crônica agudizada: a diálise de urgência deve ser prontamente realizada na síndrome urêmica aguda, caracterizada por pelo menos um dos seguintes achados: Acidose metabólica, hipercalemia e hiper- volemia graves e refratárias. Síndrome urêmica franca (encefalopatia, pericardite). Algumas intoxicações (metanol, etilenogli- col, salicilatos). 2) Na DRC não agudizada: na presença dos primeiros sinais e sintomas da síndrome urêmica, associados a um clearance de cre- atinina abaixo de 10 ml/min ou 15 ml/min em situações especiais (ex: DM). PRINCIPAIS MÉTODOS DIALÍTICOS: Hemodiálise (HD): contínua e intermitente; arteriovenosa ou venovenosa. Diálise Peritoneal (DP): intermitente, ambulatorial contínua (CAPD) e automatizada. Instabilidade hemodinâmica: preferência para a HD contínua. Diálise peritoneal seria uma opção. Complicações da HD: Agudas - instabilidade hemodinâmica, SCA, embolia gasosa, hemorragias, reação anafi- lática, febre, leucopenia. Crônicas - anemia, trombose da fístula AV, infecção da fístula AV (endarterite), infecção do cateter de duplo lúmen, amiloidose. Complicações da DP: mecânicas, clínicas e infecciosas. ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 54Medgrupo - CiClo 2: M.E.D introdução Diálise significa “passar através” e o trata- mento dialítico baseia-se na transferência de solutos e líquidos através de membranas se- mipermeáveis naturais (peritôneo) ou artificiais (dialisadores). Deste modo, a diálise pode remover solutos anormalmente elevados e corrigir distúrbios hidroeletrolíticos e acidobase. Este transporte de solutos ocorre por difusão (passagem do soluto do compartimento mais concentrado para o menos concentrado – res- ponsável pela retirada de 90% dos solutos na hemodiálise convencional), convecção (gera- ção de gradiente pressórico sobre a superfície dialisadora), e adsorção (depende de locais de ligação nas membranas, por afinidade). Os métodos dialíticos revolucionaram a medici- na, salvando milhões de vidas. Antes do advento da diálise, muitos pacientes com IRA e pratica- mente todos com DRC morriam de hipercalemia, edema agudo de pulmão, encefalopatia, acidose metabólica, tamponamento cardíaco ou hemor- ragias incontroláveis. Hoje, estas complicações não matam mais (ou, pelo menos, não deveriam matar!!) os pacientes com insuficiência renal, pois são totalmente corrigidas com a diálise. Veremos, no entanto, que apesar de ainda essencial no tratamento de suporte da IRA e da DRC avançada, o melhor método de substi- tuição renal não é a diálise, mas o Transplante renal. Estudos recentes demonstraram que o transplante apresenta excelentes resultados, superando a diálise tanto em sobrevida quanto em qualidade de vida. Mas é óbvio que os pacientes nefropatas não deixaram de morrer ou ter complicações... O programa de diálise, ao aumentar a sobrevi- da deste grupo de pacientes, acabou por reve- lar outras complicações da síndrome urêmica, que não eram (e não são) corrigidas e nem amenizadas pela diálise, como aterosclerose acelerada (angina, IAM precoce), osteodistro- fia renal e prurido. indicações Muitos carregam a ideia de que insuficiência renal (aguda ou crônica) seja sinônimo de terapia dialítica. O QUE NÃO É VERDADE! O tratamento inicial, inclusive, é conservador sempre que possível restando aos quadros mais acentuados ou progressivos a indicação de terapia dialítica. Confira a seguir as princi- pais indicações para o procedimento: Observe que existem dois momentos distintos para dialisar um paciente: agudo e crônico. Na fase aguda, a indicação é de urgência, sen- do solicitada ao nefrologista no plantão, diante de situações não revertidas clinicamente. Na fase crônica, a indicação já é mais progra- mada... Inicialmente todo paciente com TFG < 30 ml/min deve ser encaminhado ao nefro- logista para avaliação e preparo da terapia de substituição renal (TSR). O encaminhamento precoce traz benefícios sobre morbimortalida- de e custos do tratamento. Nesse momento, são apresentadas as modalidades de TSR, podendo a escolha ser definida pelo paciente. Geralmente, a TSR é estabelecida quando a TFG < 10 ml/min. Contudo, a instalação do acesso vascular ou peritoneal para realização da diálise deve ocorrer um pouco antes (TFG 20-25 ml/min). No caso de acesso venoso, a fístula arteriovenosa (preferencialmente radio- cefálica) deve ser realizada 2-4 meses antes, no antebraço não dominante do paciente. A maturação leva em torno de 30 dias. Para a instalação de diálise peritoneal, este período é menor, sendo de 30 dias antes do procedi- mento. Existem algumas situações de exceção em que a diálise é iniciada mais precocemente (TFG 15 ml/min), como no caso do diabetes, ICC ou nos pacientes com sinais evidentes de desnutrição (IMC baixo, hipoalbuminemia). Cabe lembrar que a TSR também inclui o transplante renal, que pode ser realizado de forma “direta”, sem passar por diálise prévia. Essa particularidade vem do fato de que a maioria desses transplantes é originária de doadores vivos. O preparo para a cirurgia tam- bém deve ser precoce, logo que a TFG esteja abaixo de 30 ml/min. indicações de Diálise 1- LRA ou DRC agudizada A diálise de urgência deve ser prontamente realizada na síndrome urêmica aguda, ca- racterizada por, pelo menos, um dos seguin- tes achados: • Acidose metabólica, hipercalemia e hiper- volemia graves e refratárias. • Síndrome urêmica franca (encefalopatia, pericardite). • Algumas intoxicações (metanol, etilenogli- col, salicilatos). 2- Na DRC não agudizada • Sinais e sintomas da síndrome urêmica. • Clearance de creatinina < 10 ml/min ou 15 ml/min em situações especiais (ex.: DM). ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 55Medgrupo - CiClo 2: M.E.D RESIDÊNCIA MÉDICA – 2015 SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE DO ESTADO DE PERNAMBUCO – PE Qual dos pacientes abaixo citados deve pro- gramar confecção de fístula arteriovenosa nesse momento para terapia renal substitutiva? a) Homem de 45 anos, portador de rins poli- císticos com Creatinina (Cr) de 2.5 mg/dl e Taxa de Filtração Glomerular estimada (TFGe) de 35 ml/min/1.73 m². b) Mulher de 60 anos, diabética há 15 anos, mal controlada com proteinúria 1+ e Cr de 3.2 mg/dl e TFGe de 17 ml/min/1.73 m². c) Mulher de 30 anos que iniciou tratamento recente para hipertensão com enalapril e tem Cr de 4.0 mg/dl e TFGe de 14 ml/min/1.73 m². d) Mulher de 25 anos, com uma glomerulone- frite rapidamente progressiva, realizando pul- soterapia com Cr de 5.0 mg/dl e TFGe de 11 ml/min/1.73 m². e) Homem de 35 anos, internado em UTI, com choque séptico, realizando sessões de hemo- diálise há três semanas. A hemodiálise é uma terapia substitutiva renal que pode ser realizada através de uma Fístula Arteriovenosa (FAV), geralmente localizada no antebraço, ou deum cateter venoso duplo lúmen instalado em veia de grande calibre. Nos casos de doença renal crônica, para conforto do pa- ciente, além de menor risco de infecção, opta-se pela confecção de FAV. Nos casos de insuficiên- cia renal aguda, a escolha recai sobre o cateter, que pode ser retirado depois sem maiores pre- juízos para o paciente. Esta é a situação dos pacientes C (que provavelmente apresenta IRA induzida pelo IECA), D (portadora de GNRP, que pode ou não evoluir para rins terminais) e E (que apresenta IRA, provavelmente por necrose tu- bular aguda). Dentre os pacientes A e B, porta- dores de doença renal crônica, aquele que mais se beneficiaria de uma FAV, no momento, é a paciente B, que está em estágio mais avançado e deve precisar de terapia substitutiva em breve. Resposta: letra B. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2012 HOSPITAL DAS CLÍNICAS DE GOIÁS Uma paciente do sexo feminino, de 52 anos, portadora de diabetes tipo 2 há 15 anos, com retinopatia diabética, é encaminhada ao ne- frologista devido à filtração glomerular estima- da de 18 ml/min. A classificação de doença renal crônica e o plano de ação a ser instituí- do para essa paciente são, respectivamente: a) Estágio 2: tratar as complicações e reduzir a progressão. b) Estágio 3: reduzir o fator de risco cardio- vascular. c) Estágio 4: preparar para terapia renal subs- titutiva. d) Estágio 5: iniciar terapia renal substitutiva. Com uma TFG de 18 ml/min, esta paciente encaixa-se no estágio IV de DRC, fase em que se recomenda dar início ao preparo para a terapia de substituição renal (ex.: confecção da fístula arteriovenosa). Resposta: C. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2011 UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS – UFPEL Na Insuficiência Renal Aguda, todas as abaixo são indicações de diálise, EXCETO: a) Hiperpotassemia. b) Sinais de uremia. c) Níveis de creatinina persistentemente ele- vados. d) Hipervolemia. e) Acidose intratável. Vamos lembrar sempre que níveis isolados de ureia e creatinina não constituem indicação per se de diálise. Embora hiperpotassemia e hipervolemia por si só não indiquem diálise (apenas o são quando graves e refratárias ou recorrentes), a melhor opção de resposta continua sendo a letra C. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2011 FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA UNICAMP – SP Homem, 65a, foi submetido à correção cirúrgi- ca de aneurisma de aorta abdominal. A partir do 3º dia de pós-operatório apresentou oligúria progressiva e elevação dos níveis de ureia e creatinina, sem resposta ao tratamento clínico. QUAL É A INDICAÇÃO DE TRATAMENTO DIALÍTICO DE URGÊNCIA? a) Elevação da ureia sanguínea para níveis superiores a 150 mg/dl. b) Elevação da creatinina sanguínea para ní- veis superiores a 7 mg/dl. c) Edema agudo pulmonar na fase oligúrica de insuficiência renal. d) Acidose metabólica com HCO3= 12 mEq/L e potássio sérico de 5,5 mEq/L. Mesma ideia, atenção apenas para o fato de acidose e hipercalemia serem indicações quando graves e refratárias ou recorrentes. Resposta: C. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO – UFES Homem 60 anos, 70 kg, diabético há 15 anos, relata nucalgia há 02 meses e pro- curou atendimento em Unidade Básica de Saúde. Ao exame físico apresentava: pali- dez cutânea acentuada, edema de membros inferiores, amputação de quarto e quinto pododáctilos à esquerda, auscultas cardía- ca e pulmonar normais e pressão arterial de 200/100 mmHg. Os exames mostravam: hemoglobina de 8 g/L, hematócrito de 24 %, creatinina de 2 mg/dl, ureia de 120 mg/dl, potássio de 6 mEq/L, glicemia de jejum de 240 mg/dl, fósforo de 6 mg/dl, ferritina de 98 ng/ml, índice de saturação de transferrina de 17% e bicarbonato sérico de 16 mgE- q/L. A urina de 24 horas apresenta volume de 2.000 ml e proteinúria de 1,8 g. A ultras- sonografia mostra rins de tamanho normal. Este paciente: a) Deve ser controlado clinicamente sem diá- ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 56Medgrupo - CiClo 2: M.E.D lise; iniciar dieta com restrição de potássio, fósforo e proteína; controle da hipertensão e do diabetes; iniciar uso de agentes estimula- dores da eritropoiese e de ferro endovenoso. b) Deve iniciar tratamento conservador para Doença Renal Crônica e ser submetido à bióp- sia renal após compensação clínica. c) Apresenta Doença Renal Crônica e deve ser submetido à confecção de fístula arte- riovenosa. d) Apresenta Doença Renal Crônica e deve iniciar terapia renal substitutiva imediatamente devido à hipercalemia. e) Apresenta Insuficiência Renal Aguda e deve iniciar terapia renal substitutiva imedia- tamente, devido hipercalemia. Temos aqui um paciente hipertenso e dia- bético (distúrbios estes não controlados) que se apresenta com anemia e disfunção renal. Contudo, não se trata de uma falência renal avançada, já que o bicarbonato apesar de baixo ainda é satisfatório e o volume urinário também. Pela presença de anemia, pode- ríamos subentender que este paciente seja portador de doença renal crônica e tem cau- sas suficientes para isso (HAS/DM), sem que seja necessário fazer biópsia no momento. O rim de tamanho normal afastaria um pou- co esta hipótese, embora o rim do diabético por hiperfluxo faça doença renal com rim de tamanho acima do normal, o que atrapalha esta análise. Prosseguindo, o clearance de creatinina estimado é de 39 ml/min, o que o coloca no estágio 3 da DRC e, checando a tabela que vimos anteriormente, observamos que não há indicação de diálise no momen- to. O tratamento seria inicialmente clínico. É claro que a atenção estaria voltada em grande parte para o potássio sérico, que já se encontra elevado. A correção da anemia, a começar pela reposição de ferro, também está indicada. Opção A correta. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 PROCESSO SELETIVO UNIFICADO – MG Aproximadamente 3 dias após esforço inusi- tado, homem diabético, de 56 anos, buscou assistência médica queixando-se de fortes dores musculares no dorso e nos membros inferiores que praticamente o impediam de deambular sem ajuda e que não cederam após uso de anti-inflamatórios não hormonais. Nas últimas horas, passou a apresentar também urina mais escura, dispneia, náuseas e alguns episódios de vômitos. Ao exame clínico, o paciente mostrava-se um pouco agitado, ta- quipneico, tinha os dados vitais dentro dos valores normais, perfundia bem as extremida- des e apresentava crepitações teleinspirató- rias no terço inferior de ambos os hemitórax. A palpação dos músculos do dorso e dos membros inferiores era muito dolorosa. Exa- mes laboratoriais: hemoglobina = 11,5 mg/dl, glicemia = 204 mg/dl, creatinina = 16 mg/dl, ureia = 180 mg/dl, pH = 7,25, HCO3 = 12 mE- q/L, Na+ = 128 mEq/L e K+ = 8,3 mEq/L. O plasma estava turvo e avermelhado, mas, após centrifugação, mostrou-se amarelado pálido. O exame da urina, pela fita reagente, evidenciou presença de sangue (+++/4) e gli- cose (++/4) e a sedimentoscopia mostrou raros leucócitos e eritrócitos. A fração de excreção de sódio foi de 5%. A intervenção imediata mais apropriada é: a) Administração de NaHCO3, por via intrave- nosa, para correção da acidose metabólica. b) Diálise para correção da hipervolemia e da hiperpotassemia. c) Administração, por via intravenosa, de so- lução salina hipertônica para correção da hi- ponatremia. d) Administração rápida de volume e insulina regular contínua para controle da cetoacidose diabética. A descrição do quadro clínico é nada menos que o clássico da rabdomiólise e, para falar a verdade, não há outro diagnóstico para este paciente! Veja: ele tem queixas de fortes do- res musculares desencadeadas após esforço físico extremo nos 3 dias antecedentes, as quais se acompanham de: 1.Insuficiência Renal Aguda com padrão de necrose tubular (FENa > 1%); 2.Acidose metabólica e hipercalemia muitoimportante; 3.Mioglobinúria – urina avermelhada com dipstick fortemente positivo para a presença de grupamentos heme, na ausência de eri- trócitos no sedimento. Além disso, ele ainda diz que o plasma ficou translúcido após cen- trifugação (o que descarta hemoglobinúria). A história de uso recente de anti-inflamatórios não hormonais também deve ser valorizada, uma vez que estes fármacos potencializam o desenvolvimento de IRA em qualquer situação, e aqui, certamente, aumentaram a nefrotoxi- cidade da mioglobina. Neste exato momento, o paciente oferece alguns indícios de síndrome urêmica, além de se mostrar hipervolêmico: náuseas + vômitos + agitação (encefalopatia urêmica) e dispneia + estertores bibasais (con- gestão pulmonar). Em suma, podemos afirmar que estamos diante de uma insuficiência renal aguda grave, que se apresenta com franca uremia. Qual é a conduta diante desse qua- dro? Vejam, até poderíamos lançar mão de uma série de medidas clínicas de suporte (ex.: gluconato de cálcio, glicoinsulinoterapia, ne- bulização com beta2-agonistas, resinas de troca, restrição hídrica, teste terapêutico com diuréticos de alça, enfim). Mas o fato é que tais medidas seriam apenas contemporizado- ras, enquanto providenciaríamos os meios para o que paciente fosse dialisado o mais rapidamente possível! O ideal é empreender a diálise mais precocemente, antes que com- plicações urêmicas ainda mais graves apare- çam (ex.: convulsões, edema agudo de pul- mão, arritmias ventriculares malignas, pericar- dite e tamponamento cardíaco). Mesmo que as medidas contemporizadoras consigam estabilizar o paciente num primeiro momento, a história natural da rabdomiólise grave é a ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 57Medgrupo - CiClo 2: M.E.D evolução para um estado de refratariedade, o que indicaria, de qualquer forma, a diálise de urgência. Logo, a medida mais importante a ser tomada neste caso, sem dúvida nenhuma, é a TERAPIA DE SUBSTITUIÇÃO RENAL. Resposta: letra B. Principais Métodos dialíticos Existem basicamente dois tipos de diálise: hemodiálise e diálise peritoneal. Vejamos as características básicas de cada um deles. 1- Hemodiálise A hemodiálise foi o primeiro método criado com o objetivo de depurar as substâncias tóxicas que contribuem para os sintomas potencialmente fatais da síndrome urêmica. Observem o seu fundamento... São 3 os componentes principais: (1) Sangue do paciente (contendo toxinas, excesso de H+ e K+ etc.) (2) Dialisador (“filtros da diálise”) (3) Dialisado (“solução de diálise” ou “banho de diálise”) O sangue inicialmente entra no circuito da diálise... Lá encontra um filtro especial, com centenas de “capilares” compostos de uma substância semipermeável (ex.: celofane, cuprofane, materiais sintéticos), através da qual irá fluir o sangue do paciente. Em vol- ta dos “capilares”, há um espaço por onde passa um fluido sem toxinas, a solução (ou banho) de diálise. Esta solução deve estar isenta de contaminantes químicos e conter uma concentração de sódio semelhante à do plasma (136-138 mEq/L). Lembre-se de que o sódio é uma substância osmoticamen- te ativa e não podemos levar o paciente à instabilidade hemodinâmica... A concentra- ção de potássio pode variar de acordo com a programação da diálise (0-3,5 mEq/l). É recomendável também que contenha bi- carbonato (32-35 mEq/L) para correção de acidose metabólica. Outros componentes seriam cloro, magnésio, cálcio e glicose. O sangue do paciente, ao passar pelo filtro de hemodiálise, se desfaz de qualquer toxina de tamanho menor que os poros dos “capilares” e os eletrólitos se equilibram com a concentra- ção da solução de diálise, passando do lado mais para o menos concentrado (FIGURA 1). Moléculas maiores como proteínas, patóge- nos e elementos figurados do sangue não são capazes de atraves sar. Este processo é res- ponsável pela maior parte (90%) da remoção de solutos e recebe o nome de difusão. Figura 1 A água também é filtrada, de acordo com um gradiente pressórico, chamado “pressão de fil- tração dialítica”, que pode ser programada pelo nefrologista. O processo de retirada de fluidos do paciente por diálise é chamado de ultrafiltração. Por conta disso, outro mecanismo para o transporte de solutos seria a realização de um gradiente de pressão transmembrana elevado entre um lado e outro. O resultado seria a pas- sagem de água carregando consigo solutos, num processo conhecido como convecção. Apesar de ser efetiva na remoção de grandes moléculas de soluto, não é tão útil na retirada de pequenas moléculas. Alguns termos importantes: ULTRAFILTRAÇÃO = retirada de fluidos por gradiente de pressão. DIFUSÃO = transporte de solutos por gra- diente de concentração. CONVECÇÃO = solutos arrastados por conta da ultrafiltração. Perceberam como a ideia é muito simples??? O filtro é como se fosse um intermediador das trocas, buscando ou armazenando na solução de diálise aquilo que esteja faltando ou sobrando na circulação. E como se dá o acesso ao sangue do pa- ciente? Opção 1: Cateter de duplo lúmen intro- duzido numa veia profunda (subclávia, femoral, jugular). O sangue é retirado do paciente pelo lúmen “arterial” e devolvido pelo lúmen “venoso”. Opção 2: Fístula arteriovenosa nati- va criada no antebraço por um cirurgião vascular. Após cerca de 30 dias (período de maturação da fístula), o sangue sob pressão arterial ganha veias antecubitais, que se tornam progressivamente mais calibrosas e de parede mais espessa. ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 58Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Estas veias “neoformadas” são visíveis e a sua palpação faz sentir a vibração da passagem sanguínea (“frêmito”). Durante a sessão de hemodiálise, o nefrologista utiliza agulhas especiais para puncionar as veias de fístula AV, permitindo um fluxo adequado para o procedimento dialítico. Opção 3: Enxerto arteriovenoso, que consiste na interposição de material pro- tético, em geral politetrafluoroetileno, entre uma artéria e uma veia. Uma vez estabelecido o acesso vascular, o sangue do paciente é retirado e passa por um circuito plástico (“lado arterial”), dragado pela “bomba de fluxo” da máquina de hemodiálise. Este sangue é levado a passar pelo filtro e de- pois retornar ao paciente pelo lado “venoso” do circuito. Enquanto isso, a solução de diálise é programada para fluir na câmara externa do filtro em sentido contrário (contracorrente) ao fluxo de sangue (FIGURA 3). É fundamental que o circuito seja heparinizado, para não ocorrer coagulação em seu interior. A dose de heparina é alta e acaba alcançando a corrente sanguínea do paciente, com risco de com- plicações hemorrágicas. No entanto, alguns pacientes com risco elevado de sangramentos podem dialisar sem heparina no circuito... Figura 2 - Filtro – O Intermediador. 1 – “Parte arterial” 2 – Bomba sanguínea 3 – Heparina 4 – Filtro de hemodiálise 5 – Entrada da solução de diálise 6 – Saída do dialisador 7 – Manômetro 8 – Detector de bolhas 9 – “Parte venosa” Figura 3 1 – “Parte arterial” 2 – Bomba sanguínea (estabelece o fluxo) 3 – Heparina 4 – Filtro de hemofiltração 5 – Saída do hemofiltrado 6 – Solução de reposição 7 – Detector de bolhas 8 – “Parte venosa” *Repare que não existe solução de diálise para troca por difusão. Existe apenas o filtro para reter as moléculas de soluto. Figura 4 E como é realizado o programa de hemo- diálise? O paciente vai até o centro de diálise (já com a sua fístula AV maturada ou um acesso venoso profundo provisório) e realiza uma sessão de hemodiálise durante, em média, 4h. Após o término, o paciente é liberado para casa. Ele precisa fazer o procedimento no mínimo três vezes por semana. Em casos de agudizaçãoda síndrome urêmica (“paciente mal dialisa- do”), as sessões passam a ser diárias. Assim como qualquer terapia, a diálise tam- bém é prescrita e sua “dose” pode ser cal- culada. Contudo, para os médicos das mais diversas especialidades, mais importante do que conhecer a “dose de diálise” seria definir se ela foi eficaz ou não. Isso se faz pelo cálculo de um índice: Kt/V. Sem entrar em muitos detalhes, seria neces- sário apenas conhecer os seguintes dados: (K) = depuração do dialisador (ml/min) (t) = tempo de tratamento (em min) (V) = volume de distribuição no organismo de determinado soluto-marcador a ser re- movido (em ml – no caso da ureia, equivale a 60% do peso do paciente) (Upré) = ureia antes da diálise (Upós) = ureia após a diálise Esse índice deve ficar acima de 1,2. Valores menores estão associados à piora da anemia, osteodistrofia, desnutrição e menor sobrevida. E o que significa a Terapia de Substituição Renal Contínua (tSRC)? É uma diálise mais longa que a diálise intermi- tente (12-24 horas), que apresenta vantagens hemodinâmicas, pois a retirada de solutos e ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 59Medgrupo - CiClo 2: M.E.D líquidos ocorre de modo mais lento. Os pa- cientes da UTI em choque ou sepse grave não costumam tolerar o alto fluxo “puxado” pela máquina de hemodiálise, desenvolvendo instabilidade hemodinâmica durante o procedi- mento, o que muitas vezes leva à necessidade de interrupção da diálise. Para resolver esta questão, os métodos hemodialíticos contínuos foram desenvolvidos. Utilizando filtros apro- priados, a diálise pode ser executada com fluxos bem mais baixos, mantidos por períodos prolongados. E os acessos? Bom, os circuitos podem ser ar- teriovenosos ou venovenosos... Estes últimos exigem uma bomba venosa acoplada, mas são os de primeira escolha, pois dispensam a canulação arterial e suas consequências desagradáveis. No caso dos circuitos arte- riovenosos, o sangue sai através da artéria, alcança o circuito e é devolvido na veia. Por outro lado, nos circuitos venovenosos, a entra- da e a saída ocorrem através da mesma via, com um cateter duplo lúmen. Ok, tudo parece funcionar perfeitamente... Mas não se enganem! Existem muitas com- plicações: 1- agudas Instabilidade hemodinâmica (hipotensão arte- rial), mas hipertensão também pode ocorrer. Síndrome coronariana aguda. Embolia gasosa (bastante rara nas máquinas modernas de hemodiálise, que possuem de- tectores de bolha automáticos). Hemorragias (efeito da heparina) e hemólise. Reação anafilática (contato do sangue com o material do filtro). Febre, convulsão, leucopenia. 2- CRôniCas Anemia por deficiência de ferro ou vitaminas. Trombose da fístula AV. Infecção da fístula AV (endarterite): geral- mente causada pelo Staphylococcus aureus, frequentemente do tipo MRSA. Infecção do cateter de duplo lúmen: indica a retirada e a substituição do cateter. Existe o risco de endocardite infecciosa (complicação temida). O germe mais comum é o S. aureus (também MRSA). Amiloidose pelo acúmulo da beta2-microglo- bulina: manifesta-se com síndrome do túnel do carpo, artropatia, entre outros comemo- rativos. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2013 PROVA UNIFICADA DE SANTA CATARINA – SC Os pacientes “novatos” na hemodiálise estão mais sujeitos às reações à membrana de he- modiálise. A chamada “reação Tipo A” eral- mente começa logo nos primeiros minutos de hemodiálise. Sintomas leves incluem comi- chão, ardor no local de acesso, urticária, ver- melhidão, dor, tosse, espirros, respiração ofegante, cólicas abdominais, diarreia, cefa- leia, dorsalgia, dor no peito, náuseas, vômitos, febre e calafrios. Assinale a alternativa mais adequada em relação ao tratamento dessa reação: a) Essa reação tipo A ocorre nos pacientes dialisados com membranas celulósicas novas e são causadas pelo óxido de etileno residual da esterilização. O tratamento é tipicamente de suporte, uma vez que os sintomas carac- teristicamente melhoram se a hemodiálise é continuada. b) Nesse caso, podem ocorrer, em seguida, reações mais graves, como dispneia, sensa- ção de morte iminente, e hipotensão, poten- cialmente resultando em parada cardíaca e morte. Deve-se parar a hemodiálise imediata- mente sem retornar o sangue ao paciente quando se suspeita de reação tipo A. Outras terapias que podem ser usadas incluem os anti-histamínicos, esteroides, epinefrina e broncodilatadores, dependendo da gravidade dos sintomas. c) Essa reação tipo A ocorre nos pacientes dialisados com membranas celulósicas novas e são causadas pela contaminação com pep- tídeos bacterianos devido à falha na esterili- zação. O tratamento é tipicamente de suporte, uma vez que os sintomas caracteristicamente melhoram se a hemodiálise é continuada. d) Essa reação tipo A ocorre nos pacientes dialisados com membranas celulósicas novas e pode ser evitada administrando um inibidor da ECA duas horas antes da hemodiálise. O tratamento é tipicamente de suporte, uma vez que os sintomas caracteristicamente melho- ram se a hemodiálise é continuada. e) Essa reação tipo A ocorre nos pacientes dialisados com membranas celulósicas novas e pode ser evitada administrando vitamina C 1000 mg uma hora antes da hemodiálise. O tratamento é tipicamente de suporte, uma vez que os sintomas caracteristicamente melho- ram se a hemodiálise é continuada. A “síndrome do primeiro uso” dos pacientes em hemodiálise engloba reações anafiláticas e reações adversas não tão bem definidas, de etiopatogenia desconhecida. Elas são assim chamadas porque acometem mais os pacien- tes nas primeiras sessões de hemodiálise e apresentam-se numa frequência muito maior quando são empregados dialisadores novos, nunca utilizados (comparando-se com os reu- tilizados). Tais reações parecem ser de dois tipos: um tipo anafilático (tipo A) e outro ines- pecífico (tipo B). Os sintomas geralmente começam durante os primeiros minutos de diálise e podem demorar mais de 30 minutos para começar. Particularmente no tratamento do tipo A, o mais seguro é interromper a diá- lise imediatamente, fechando as linhas san- guíneas e desprezando o dialisador e todo o circuito, sem reinfundir o sangue que se en- contra nesses espaços. Pode ser necessário suporte cardiorrespiratório imediato. Depen- dendo da gravidade da reação, pode-se iniciar tratamento com anti-histamínicos IV, corticoi- ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 60Medgrupo - CiClo 2: M.E.D des e adrenalina, como acontece em qualquer reação anafilática. Resposta: B. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2013 HOSPITAL ESCOLA LUIZ GIOSEFFI JANNU- ZZI – RJ Paulo, 54 anos, é portador de insuficiência renal crônica estágio IV, secundária à hiper- tensão arterial sistêmica, em tratamento con- servador. Entrou na emergência do HE após acidente automobilístico, com perda sanguí- nea importante e pressão sistólica de 60 mmHg. Na abordagem deste paciente, a me- dida a ser evitada é: a) Punção venosa profunda. b) Reposição salina. c) Uso de drogas vasopressoras. d) Dissecção venosa. Todo paciente sabidamente nefropata avan- çado (como é o caso do Sr. Paulo, que já está no estágio IV de DRC) deve tomar extremo cuidado com suas veias periféricas! O motivo é muito fácil de entender: é muito provável que tais indivíduos logo precisem dessas veias para a confecção de fístulas arteriovenosas para hemodiálise! No caso em tela, é óbvio que temos que ministrar solução salina intra- venosa e, provavelmente, precisaremos lançar mão também da reposição de hemoderivados e drogas vasopressoras. Tudo isso poderá ser feito tranquilamente através de um acesso central calibroso, obtida por punção venosa profunda. A dissecção venosa (reservada para os casos de real impossibilidade de punção profunda) seria problemática nestecaso por aniquilar a possibilidade de utilização da veia dissecada para a confecção de uma fístula no futuro. Resposta: D. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ – CE Paciente de 52 anos, tabagista, diabético, hi- pertenso, evoluindo com insuficiência renal rapidamente progressiva e indicação de trata- mento dialítico, necessitando de acesso vas- cular para hemodiálise. Qual das opções abaixo é a mais correta? a) Implante de cateter de curta permanência para hemodiálise em veia subclávia direita. b) Implante de cateter de longa permanência em veia jugular esquerda. c) Realização de fístula arteriovenosa com enxerto de PTFE braquioaxilar no membro superior não dominante. d) Implante de cateter de curta permanência para hemodiálise em veia jugular interna. e) Realização de fístula arteriovenosa radio- cefálica. Vamos marcar alguns conceitos com essa questão! O tipo de acesso vascular para he- modiálise depende da urgência do procedi- mento. Em pacientes com IRA rapidamente progressiva, como o da questão, o acesso de escolha, inicialmente, é feito com um cateter de Dupla Luz (CDL), que pode ser instalado nas veias femoral, subclávia ou jugular interna. Neste, uma luz (“parte arterial”) é utilizada para retirar o sangue do paciente para o circuito, e a outra (“parte venosa”) para devolvê-lo. O objetivo é que tal acesso seja sempre utilizado por curtos períodos (15-21 dias), pois ou a IRA será revertida (e a diálise não mais será ne- cessária), ou haverá evolução para a fase de rins em estado terminal, com necessidade de terapia de substituição renal permanente (que se for hemodiálise deverá ser feita com Fístu- la Arteriovenosa (FAV), pela sua maior dura- bilidade, conforto e segurança para o pacien- te). O transplante renal também é uma alter- nativa. Lembre-se que a FAV não pode ser uma alternativa na IRA: leva certo tempo até que a fístula “mature”, alcançando um calibre satisfatoriamente grande para ser puncionada (de 1 a 3 meses). Agora, perceba como só citamos veias profundas de grosso calibre. É importante atentar para o fato de que uma das grandes complicações do implante em veias centrais é a estenose vascular. Das três op- ções citadas, aquela que oferece as melhores condições para o implante de um CDL é a jugular interna! A taxa de estenose vascular neste local gira em torno de 10% após 2 se- manas, enquanto na subclávia, por outro lado, a taxa de estenose alcança até 50% no mes- mo período (o que, inclusive, prejudica a con- fecção de fístulas arteriovenosas daquele lado)! O acesso na veia femoral é normalmen- te a última escolha, dado o potencial de con- taminação e infecção do cateter que a região inguinal oferece. Vale lembrar que mesmo na subclávia e jugular interna o risco de infecção também não é pequeno. Após 15-21 dias, a taxa de infecção passa a aumentar progressi- vamente, e dificilmente um cateter consegue permanecer estéril por mais tempo do que isso. Resposta: letra D. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SP Nos pacientes que serão submetidos à hemo- diálise, a primeira opção de acesso vascular central deve ser a veia: a) Subclávia direita. b) Femoral. c) Jugular interna direita. d) Jugular interna esquerda. e) Subclávia esquerda. Entenda mais este importante conceito: a veia de escolha para a implantação de um cateter duplo lúmen para hemodiálise (o cha- mado “CDL” ou “cateter de diálise”), é a ju- gular interna, de preferência a direita. O mo- tivo para optarmos por este lado vem de um detalhe estatístico: na maioria das pessoas, a jugular interna direita é mais calibrosa que a jugular interna esquerda. Além do fato de não haver possibilidade de lesão do ducto torácico (o que pode ocorrer à esquerda). Quanto à veia femoral, mais uma vez o pro- blema é a maior probabilidade (pelo menos teórica) de contaminação e infecção pela própria microbiota da pele do indivíduo. Tam- bém existe argumento contra a implantação do CDL na subclávia. A taxa de estenose ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 61Medgrupo - CiClo 2: M.E.D vascular após 15 dias é próxima a 50% e a ocorrência de estenose desta veia dificulta muito a confecção de fístulas arteriovenosas no lado ipsilateral. Portanto, este acesso também deve ser evitado. Pacientes com previsão de acesso prolongado (ou perma- nente) para hemodiálise devem ser maneja- dos com a confecção de fístulas arterioveno- sas, implante de próteses de PTFE ou cate- teres tunelizados. Resposta: letra C. 2 - Diálise peritoneal Método revolucionário na Nefrologia e o prin- cípio ainda é mais simples e “natural”... Em vez de utilizar o filtro (dialisador), o peri- tônio servirá como a própria membrana se- mipermeável da diálise. Lembre-se de que peritônio é um tecido ricamente vascularizado e seus capilares recebem uma grande quan- tidade de sangue, cujas toxinas podem ser depuradas por difusão passiva em direção à cavidade peritoneal, onde é infundida a solução de diálise. Esta solução é renovada diversas vezes. Por exemplo: são infundidos 2.000 ml de solução dialítica na cavidade peritoneal do paciente; após um pequeno período de permanência, todo o líquido é retirado. Este líquido está cheio de toxinas depuradas do sangue do paciente. O banho de diálise peritoneal contém glicose, que age como agente osmótico para retirar líquido do paciente (ultrafiltração). A quantidade ultrafiltrada depende da concen- tração de glicose do banho (o que pode ser selecionado pelo nefrologista). A diálise peri- toneal é realizada através da instalação de um cateter peritoneal provisório ou permanente tunelizado (cateter de Tenckhoff). A grande vantagem da DP é a sua fácil insta- lação e execução e o menor risco de compli- cações hemodinâmicas, cardiovasculares e hemorrágicas (a DP não utiliza heparina). As desvantagens incluem o risco (não raro) de peritonite bacteriana (ou mesmo fúngica), menor eficiência na remoção de solutos que na hemodiálise e falha mais precoce do método a médio e longo prazos. Existem poucas contraindicações absolutas à diálise peritoneal, e as principais são: 1. Fibrose e obliteração da cavidade abdomi- nal por cirurgia prévia 2. Clearance peritoneal inadequado 3. Defeito anatômico no diafragma As principais contraindicações relativas ao procedimento são: 1. Insuficiência respiratória após infusão do “banho” de diálise 2. Grandes hérnias abdominais 3. Câncer (primário ou secundário) no peritônio. E como pode ser feita a diálise peritoneal? Acabamos de ver que a hemodiálise pode ser intermitente ou contínua. A diálise peritoneal também pode ser feita de formas distintas, entre elas: DP intermitente: mais antiga, requer 20-40 trocas de solução em 24 horas, por método manual ou máquina cicladora. DP ambulatorial contínua (CAPD): presen- ça contínua de solução na cavidade, com renovação a cada 4-8h (3-5 trocas/dia). De- pende da colocação do cateter de Tenckhoff para infusão da solução, mas permite maior mobilidade do paciente. Diálise peritoneal automatizada: seme- lhante à CAPD, só que utilizando máquinas cicladoras para trocar as soluções enquanto paciente dorme. Pode ser realizada no do- micílio do paciente. Vamos analisar algumas complicações deste procedimento... Mecânicas: lesão inadvertida de víscera abdominal, formação de hérnias. Clínicas: hiper-hidratação, hipovolemia, hipernatremias, hiperglicemia, perda pro- teica, atelectasias. Figura 5 - Cateter de Tenkhoff para diálise peritonal e seu posicionamento. ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 62Medgrupo - CiClo 2: M.E.D Infecções: A peritonite bacteriana é a prin- cipal complicação. O paciente apresenta dor abdominal, sinais de irritação peritoneal, alteração do aspecto do filtrado peritoneal (torna-seturvo) e por vezes febre. O germe mais comum é o S. aureus, seguido por outros Gram-positivos (ex.: estreptococo) e depois os Gram-negativos entéricos (E. coli, Klebsiella, etc.). A peritonite por P. aeruginosa pode ocorrer, assim como peritonite fúngica (Candida sp.). Neste caso, a conduta é co- lher o líquido peritoneal para Gram e cultura. Iniciar tratamento empírico com antibióticos intraperitoneais 1x/dia, com cobertura para Gram-positivo e Gram-negativo: Vancomicina associada à aminoglicosídeo ou a cefalospo- rina de terceira geração. A vancomicina só precisa ser injetada a cada 7 dias. A peritonite por P. aeruginosa ou fúngica indica sempre a retirada do cateter de Tenckhoff, além da antibioticoterapia específica. Na presença de falha terapêutica (que indica a existência de biofilme na superfície do cateter) ou na infec- ção do “túnel subcutâneo”, o cateter também deve ser sempre retirado. Figura 6 ser tratado clinicamente até que se faça diáli- se após a realização de fístula arteriovenosa e tem depuração da creatina < 10 ml/min. d) Apresenta insuficiência renal crônica, tem indicação absoluta de diálise e depuração da creatina < 10 ml/min. Paciente francamente urêmica, história de HAS e rins pequenos com perda da relação corticomedular à USG (sugerindo doença renal crônica). O cálculo do clearance de creatina evidencia DRC estágio V (rins terminais), com ClCr = 5 ml/min (30x2400/10x1440 = 72000/14400). Paciente sem dúvida tem indi- cação de diálise, mas será que deve ser de urgência ou a paciente pode se submeter à confecção de fístula AV e esperá-la “maturar”? Ou será ainda que ela poderia se candidatar à diálise peritoneal? A importância dessa ques- tão é reconhecer a gravidade do quadro apre- sentado: esta apresenta distúrbios acidobási- cos e hidroeletrolíticos, que poderiam até ser tratados clinicamente, inicialmente. Contudo, ela apresenta também sinais inquestionáveis de uremia, como náusea, vômito e principal- mente asterix (encefalopatia urêmica), o que indica urgência dialítica neste caso. A forma mais rápida de proceder a esta diálise é atra- vés de punção venosa profunda, com instala- ção de cateter para diálise. Resposta: D. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE – RJ Nos pacientes em quem se pensa realizar uma diálise peritoneal ambulatorial contínua, de- vemos lembrar que existem contraindicações absolutas ao procedimento, sendo certo incluir nestas a do tipo: a) Ausência de integridade do diafragma. b) Hérnias abdominais volumosas. c) Instabilidade cardiovascular. d) Insuficiência respiratória. Existem poucas contraindicações absolutas à diálise peritoneal, e as principais são: 1. Fibrose e obliteração da cavidade abdominal por cirurgia prévia; 2. Clearance peritoneal inadequado; 3. Defeito anatômico no diafragma. As principais contraindicações relativas ao procedimento são: 1. Insuficiência respiratória após infusão do “banho” de diálise; 2. Grandes hérnias abdo- minais; 3. Câncer (primário ou secundário) no peritôneo. No paciente com IRA + instabilidade hemodinâmica (ex.: choque séptico) podemos optar pela HD ou pela DP. Entretanto, vale res- saltar que a HD convencional (intermitente) é mal tolerada, por retirar líquido do intravascular de forma muito rápida (com potencial de agra- var o desequilíbrio cardiovascular). A DP, por sua vez, apesar de não estar contraindicada, também não representa uma boa escolha, pois o peritônio costuma estar mal perfundido nes- ses casos, comprometendo sua eficácia como membrana de diálise. Atualmente, o método escolhido é a HD contínua (CAVHD ou CVVHD) ou outros métodos contínuos semelhantes à HD, como a hemofiltração contínua (CAVH ou CVVH) e a hemodiafiltração contínua (CAVHDF ou CVVHDF). Assim, resposta: letra A. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2011 INSTITUTO FERNANDES FIGUEIRA – IFF Uma mulher de 66 anos, com hipertensão ar- terial sistêmica há 22 anos, é internada com pressão arterial de 220 x 120 mmHg, palidez intensa de pele e mucosas, náuseas, vômitos, edema de membros inferiores, hálito urêmico e asterix. Foram realizados os seguintes exa- mes complementares: Sangue: Hematócrito = 24%, ureia = 200 mg/dl, creatina = 10 mg/dl, Na+ = 128 Eq/L, K+= 6,0 mEq/L, cálcio = 7,8 mg/ dl, fósforo= 7,2 mg/dl, HCO3=15 mEq/L. A urina de 24 horas tem volume 2.400 ml, creatina = 30 mg/dl e proteinúria= 1,0 g. Ultrassonografia: rins de tamanho diminuído e perda da relação corticomedular. Assinale a afirmativa correta em relação à paciente. a) Apresenta insuficiência renal a esclarecer, deve ser controlado clinicamente sem diálise e, posteriormente, submetido à biópsia renal e tem depuração da creatina < 5 ml/min. b) Apresenta hipertensão renovascular, deve- -se evitar inibidor de ECA e tem depuração da creatinina de aproximadamente 20 ml/min. c) Apresenta insuficiência renal crônica, deve ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 63Medgrupo - CiClo 2: M.E.D RESIDÊNCIA MÉDICA – 2010 SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE DE SANTA CATARINA – SC Considere uma paciente de 40 anos, femi- nina, hipertensão arterial de difícil controle, evoluindo para insuficiência renal crônica, optando por Diálise Peritoneal Crônica Am- bulatorial (CAPD), colocado cateter de diálise sem intercorrências. Após 6 meses em diálise peritoneal, evoluiu com dor abdominal, febre e o líquido do dialisado estava turvo. Qual das condutas abaixo é mais apropriada como conduta inicial ao caso citado? a) Peritonite, interromper diálise. b) Peritonite, laparotomia exploradora. c) Peritonite, passar cateter central e iniciar hemodiálise. d) Cateter de diálise infectado, remoção ime- diata. e) Provavelmente se trata de peritonite asso- ciada ao cateter de diálise peritoneal; coletar culturas, iniciar antibioticoterapia. A principal complicação da DP é a peritonite infecciosa. Sua incidência gira em torno de 20-80%. Os principais germes responsáveis são: Staphylococcus aureus, Streptococcus sp. e Gram-negativos entéricos, em geral oriundos da pele adjacente ao orifício do cateter. A suspeita clínica vem do quadro de dor abdominal (com ou sem sinais de ir- ritação peritoneal) associado à presença de dialisado turvo. Geralmente, há celularidade > 100 leucócitos/mm3 no líquido peritoneal, com predomínio de neutrófilos. Diante da menor suspeita clínica, está indicada a cul- tura do dialisado! O tratamento é feito com antibióticos colocados no “banho de diálise”, em geral, aminoglicosídeo + vancomicina. Um esquema comumente empregado é: vancomicina 1 g IV de 7/7dias + amicacina 2 mg/kg no “banho de diálise” noturno da CAPD durante 2 semanas. Este tratamento deve ser modificado de acordo com o germe e seu perfil de resistência. Mas aí vem a per- gunta: devemos retirar o cateter de diálise no paciente com peritonite? Nem sempre. Nos casos de peritonite fúngica, geralmente por Candida sp., é MANDATÓRIA a retirada do cateter de Tenckhoff. Na presença de falha terapêutica (que indica a existência de biofil- me na superfície do cateter) ou infecção do “túnel subcutâneo”, o cateter também deve ser sempre retirado. Resposta: letra E. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2007 HOSPITAL NAVAL MARCÍLIO DIAS – HNMD De qual agente etiológico deve-se suspeitar em um paciente submetido à diálise peritoneal e evoluindo com peritonite? a) Pseudomonas aeruginosa. b) Bacterioides fragilis. c) Staphylococcus epidermidis. d) Escherichia coli. e) Fusobacterium spp. O achado laboratorial mais comum da peritonite em pacientes submetidos à diáli- se peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) consiste em aumento dos leucócitos no líqui- do peritoneal. Geralmente uma celularidade maior do que 100 células/mm3 (normal < 8) com predomínio neutrofílico (50% ou mais) é encontrada. O predomínio de mononuclear está presentena peritonite fúngica ou por mi- cobactéria. Quanto à microbiologia da perito- nite, cerca de 50% das vezes é causada por Gram-positivos e aproximadamente 15%, por Gram-negativos. Os fungos são responsáveis por menos de 2%. Dos Gram-positivos, Sta- phylococcus coagulase negativo (epidermidis) e S. aureus são os principais micro-organis- mos envolvidos. Resposta C. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2007 FUNDAÇÃO JOÃO GOULART – RJ O esquema antimicrobiano mais adequado para um paciente com peritonite secundária e insuficiência renal é: a) Imipenem e fluconazol. b) Ceftriaxone e metronidazol. c) Levofloxacina e cloranfenicol. d) Clindamicina, gentamicina e metronidazol. A princípio, poderíamos nos distrair e achar que o enunciado está nos perguntando a res- peito da peritonite complicando uma diálise pe- ritoneal ambulatorial contínua (CAPD). Mas não é nada disso! A peritonite secundária é aquela que resulta de complicação de processos in- tra-abdominais, como apendicite complicada, diverticulite perfurada etc. Nesses casos, temos obrigação de instituir um esquema que cubra Gram-negativos e anaeróbios. A única opção possível inclui ceftriaxone e metronidazol - op- ção B. O primeiro é uma cefalosporina de 3ª geração que cobre alguns micro-organismos Gram-negativos. Apresenta eliminação hepá- tica e renal. Na presença de IR, a droga não sofre acúmulo, pois o fígado elimina o exces- so. O metronidazol é um antimicrobiano com atividade anaerobicida; apresenta metaboliza- ção hepática e excreção renal. Atenção! Sua dose deve ser reajustada na presença de IR avançada. A letra A apresenta um antifúngico; a opção C inclui o cloranfenicol, um antimicro- biano que tem indicações restritas (infecções por Rickettsia, abscesso cerebral, droga alter- nativa para Salmonella typhi, etc.) e raramente é empregado nos dias de hoje; a alternativa D contém um aminoglicosídeo, uma classe de drogas classicamente nefrotóxica. Resposta B. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2006 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ – UFPR Qual é o método dialítico mais indicado para pacientes com instabilidade hemodinâmica, hipercatabolismo e hipervolemia? a) Diálise peritoneal. b) Hemodiafiltração arteriovenosa contínua. c) Hemofiltração. d) Hemodiafiltração venovenosa contínua. e) Hemodiálise intermitente. Questão difícil!!! Em muitos pacientes com insuficiência renal aguda que precisam ClíniCa MédiCa - VoluMe 18 64Medgrupo - CiClo 2: M.E.D de diálise, temos as opções de hemodiálise intermitente, hemodiálise contínua ou diáli- se peritoneal. Entretanto, há casos em que surgem indicações específicas para cada um desses métodos. Vejamos os exemplos: 1- Paciente hipercatabólico e com hipervole- mia grave: a hemodiálise é preferida sobre a diálise peritoneal. 2- Paciente com problemas abdominais (ex.: hérnia, cirurgia prévia): a hemodiálise é preferida sobre a diálise peritoneal. 3- Paciente com instabilidade hemodinâmi- ca: a diálise peritoneal e a “hemodiálise contínua” são métodos preferidos em relação à hemodiálise intermitente. Como você pode perceber, o melhor método é a “hemodiálise contínua”. A hemodiálise é a esco- lhida devido ao hipercatabolismo e hipervolemia (a diálise peritoneal é menos eficiente nestes pa- cientes); o método contínuo é escolhido devido à instabilidade hemodinâmica (estes pacientes não toleram o alto fluxo da hemodiálise intermitente). E, como vimos acima, o acesso venovenoso é preferível ao arteriovenoso. Opção D correta. Apenas para acrescentarmos: qual é a dife- rença entre os termos hemodiálise, hemofil- tração, hemodiafiltração? - Hemodiálise: foi o que acabamos de escre- ver! Um processo que utiliza solução de diá- lise para trocas de solutos com o sangue por difusão, ultrafiltração e convecção. - Hemofiltração: aqui não se utiliza a solução de diálise, apenas um dialisador bastante permeável à água de alto fluxo, ocorrendo somente a ultrafiltração e convecção. A reti- rada de líquido é muito maior (30-50 litros versus 3-5 litros do anterior). - Hemodiafiltração: Hemodiálise (solução dia- lítica) + Hemofiltração (dialisador de alto fluxo). o que eu Preciso Saber Sobre transplante Renal? Como vimos logo no início do capítulo, o trans- plante renal é o melhor método de substitui- ção renal. E, por isso mesmo, trata-se de um tópico que vem aparecendo cada vez mais nas provas. Inicialmente é preciso quebrar alguns tabus sobre o transplante renal, reco- nhecendo alguns conceitos fundamentais: O transplante renal bem-sucedido propor- ciona ao paciente a melhor qualidade de vida. Conseguem visualizar isso na práti- ca??? Os pacientes transplantados ficam livres das restrições de líquido e potássio, podem viajar e trabalhar normalmente, a função renal é restaurada e a anemia cor- rigida. Quando comparado à hemodiálise, o transplante renal também melhora a so- brevida a longo prazo! Existem poucas contraindicações absolutas ao transplante renal. O procedimento é relativamente não invasivo, pois o órgão é geralmente implantado sem entrar na cavidade peritoneal. Sendo assim, dedicamos uma sessão toda especial ao transplante renal e que você já conhece bem a essa altura: o Boletim Opera- tório! Com ele, já teremos visto 4 transplantes (já vimos hepático, pancreático e pulmonar). Ainda veremos este ano o de medula óssea e cardíaco também... Mesmo que você tenha interrompido sua leitura hoje por aqui, não dei- xe de ler o Boletim disponível na área restrita depois!!! Você encontrará questões que podem fazer um diferencial na sua prova.
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