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Universidade regional do noroeste do estado do rio grande do sUl – UnijUí vice-reitoria de gradUação – vrg coordenadoria de edUcação a distância – cead coleção educação a distância série livro-texto ijuí, rio grande do sul, Brasil 2014 vera lúcia trennepohl (organizadora) formação e desenvolvimento da sociedade Brasileira 2014, editora Unijuí rua do comércio, 1364 98700-000 - ijuí - rs - Brasil fone: (0__55) 3332-0217 fax: (0__55) 3332-0216 e-mail: editora@unijui.edu.br Http://www.editoraunijui.com.br editor: gilmar antonio Bedin editor-adjunto: joel corso capa: elias ricardo schüssler designer educacional: jociane dal molin Berbaum responsabilidade editorial, gráfica e administrativa: editora Unijuí da Universidade regional do noroeste do estado do rio grande do sul (Unijuí; ijuí, rs, Brasil) catalogação na Publicação: Biblioteca Universitária mario osorio marques – Unijuí f724 formação e desenvolvimento da sociedade brasileira / organizadora vera lúcia trennepohl. – ijuí : ed. Unijuí, 2014. – 130 p. – (coleção educação a distância. série livro-texto). on-line isBn 978-85-419-0101-7 1. Brasil - desenvolvimento. 2. sociedade brasileira - desenvolvimento. 3. sociedade brasileira - História. 4. sociedade brasileira - Política. 5. desenvolvimento industrial. i. trennepohl, vera lúcia (org.). ii. título. iii. série. cdU : 338 338(81) 3 Sumário CONHECENDO OS PROFESSORES .................................................................................................................................................... 5 APRESENTAÇÃO ..................................................................................................................................................................................... 9 UNIDADE 1 – O ESTUDO DA SOCIEDADE BRASILEIRA ............................................................................................................13 Seção 1.1 – Brasil: Que País é Este? ...............................................................................................................................................13 Seção 1.2 – A Complexidade da Sociedade Brasileira ............................................................................................................15 UNIDADE 2 – CARACTERÍSTICAS DO TERRITÓRIO BRASILEIRO ............................................................................................23 Seção 2.1 – O Processo de Conquista e Delimitação do Território Brasileiro. .................................................................24 Seção 2.2 – As Características Naturais do Território Brasileiro............................................................................................29 Seção 2.3 – A Ocupação do Território e as Desigualdades Sociais e Regionais .............................................................36 Seção 2. 4 – Os Desafios ao Desenvolvimento ..........................................................................................................................41 UNIDADE 3 – A FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO ................................................................................................................43 Seção 3.1 – A Contribuição dos Diversos Grupos Étnicos .....................................................................................................44 Seção 3.2 – Relações Étnico-Raciais ...............................................................................................................................................47 Seção 3.3 – Características Sociais .................................................................................................................................................50 Seção 3.4 – Indicadores Sociais: Educação, Desigualdade e Saúde. ..................................................................................51 3.4.1 – Educação .......................................................................................................................................................................52 3.4.2 – Desigualdade ...............................................................................................................................................................54 3.4.3 – A Saúde: o Papel do Sistema Único de Saúde – SUS .....................................................................................57 UNIDADE 4 – ESTRUTURA ECONÔMICA E DESENVOLVIMENTO BRASILEIRO .................................................................61 Seção 4.1 – A Formação e Desenvolvimento da Agropecuária Brasileira ........................................................................62 4.1.1 – A Constituição do Modelo Primário-Exportador ............................................................................................63 4.1.2 – Agricultura Familiar: Minifúndio, Trabalho Familiar e Policultura .............................................................65 4.1.3 – Modernização da Agricultura ................................................................................................................................67 Seção 4.2 – Formação e Desenvolvimento da Indústria Brasileira .....................................................................................70 4.2.1 – Getúlio Vargas e a Industrialização – 1930 a 1945 .........................................................................................73 4.2.2 – Industrialização Entre 1945 e 1964 ......................................................................................................................75 4.2.3 – O Contexto Econômico no Regime Militar .......................................................................................................78 Seção 4.3 – Formação e Desenvolvimento do Setor Terciário .............................................................................................81 Seção 4.4 – A Crise do Modelo e os Esforços pela Estabilização Econômica ..................................................................82 4.4.1 – Desafios e Dilemas do Século 21 ..........................................................................................................................84 Seção 4.5 – Globalização, Desafios e Perspectivas para o Século 21 .................................................................................92 UNIDADE 5 – ORGANIZAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA BRASILEIRA ........................................................................................ 101 Seção 5.1 – Formação do Estado Nacional, Sociedade Civil e Políticas Públicas ....................................................... 101 UNIDADE 6 – PROBLEMAS ATUAIS E DESAFIOS DO FUTURO ............................................................................................ 125 Seção 6.1 – Diagnóstico e perspectiva de desenvolvimento ............................................................................................ 125 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................................................................... 127 5 Conhecendo os Professores vera l. trennepohl Iniciou em 1987 o curso de Estudos Sociais (Licenciatura Curta) na Unijuí. No decorrer do curso transferiu residência para o Nordeste, concluindo esta etapa de formação profissional na Universidade Estadual da Paraíba – Campina Grande – em 1990. Nesse mesmo ano ingressou no curso de História (Licencia- tura Plena) na UEPB, concluindo o curso de História na Unijuí, em 1993. Em 1995 iniciou o Mestrado em Educação nas Ciências,na Unijuí, concluindo em 1997 com a dissertação intitulada “O Ensino de História em Questão: os caminhos de uma experiência”, publicada na Coleção Trabalhos Acadêmico-Científicos, Série Dissertações de Mestrado. Como professora da Unijuí iniciou suas atividades em 1994, atuando em diversos cursos de Graduação da Universidade, especialmente nas disciplinas: Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira; História do Brasil; História Contemporânea, Civilizações Clássicas, dentre outras. Na dis- ciplina Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira tem assumindo mais turmas, produzindo com os demais colegas este texto, como também o livro Agricultura Brasileira: Formação, Desenvolvimento e Perspectiva, produzido em conjunto com o professor Argemiro J. Brum. dilson trennepohl Possui formação de Técnico em Agropecuária pelo Instituto Municipal de Educação Assis Brasil – Imeab de Ijuí (1978), de tecnólogo em Administração Rural pela Unijuí (1981), de bacharel em Administração pela Unijuí (1987), de mestre em Economia, pela Universidade Federal da Paraíba, em Campina Grande (1991) e doutor em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc (2010). É professor efetivo 40 horas do Departamento de Ciências Administrativas, Contábeis, Econômicas e da Comunicação da Unijuí – Universi- dade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – desde 1983. Tem experiência docente nas áreas de Desenvolvimento, Economia e Administração nos cursos de Graduação e Pós-Graduação e experiência em Gestão Universitária. Atuou como Pró-reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão (dois mandatos) e como vice-reitor de Administração da Unijuí e Diretor Executivo da Fidene (dois mandatos). Atualmente atua como docente-pesquisador nas áreas de Economia, Administração, desenvolvimento, finanças, mercado de capitais, agronegócios e planejamento. Integra o grupo de docentes responsável pelo componente curricular Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira. EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 6 joão afonso frantz Graduação em Estudos Sociais – Licenciatura Curta – pela Unijuí (1988). Graduação em História – Licenciatura Plena – pela Unijuí (1990). Especialização em Pós Graduação Lato Sensu pela Unijuí (1997) e Mestrado em Educação nas Ciências pela Unijuí (2002). Atualmente professor do Departamento de Huma- nidades e Educação/Unijuí – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Trabalhou também como professor da rede pública Estadual no Ensino Básico (1995-2000). romualdo Kohler Graduação em Administração de Empresas pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (1982), em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade de Cruz Alta (1983), em Ciências Econômicas pela Universidade de Cruz Alta (1992), Especialização em Teoria Econômica e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Cruz Alta (1991), Mestrado em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2002) e Doutorado em Adminis- tração pela Universidad Nacional de Misiones, Posadas, Argentina (2009). Desde 1998 atua como professor na Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Tem experiência nas áreas de Economia e Administração, com ênfase em Economia Regional e Urbana, Gestão da Economia Local e Consultoria Empresarial, investigando principalmente os seguintes temas: planejamento local/regional, contabilidade social, gestão da economia local e consultoria econômica empresarial. fátima marlise marroni rosa lopes Possui Graduação em Estudos Sociais pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (1978), Graduação em História pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Palmas – PR (1986), Graduação em Sociologia – Bacharelado – pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (2011) Especialização lato-sensu pela Universidade Regio- nal Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI. Mestrado em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos – Estudos Históricos Latino- Americanos. Área de Concentração: Ideias e Movimentos Sociais na América Latina (2002) e Doutorado em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos – Estudos Históricos Latino– Americanos. Área de Concentra- ção: Ideias e Movimentos Sociais na América Latina (2009). Foi professora da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI – Campus Frederico Westphalen, por um período de nove anos (1999 a 2008). É professora colaboradora da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí há 12 anos. Tem experiência na área de História, tendo atuado principalmente nos seguintes temas: História do Brasil, História da Educação, História do Direito, Sociedade, Política e Cultura, Realidade Brasileira, Formação e Desenvolvimento Brasileiro, Ciência Política e Teoria do Estado, Sociologia Ge- ral, Sociologia da Educação, Sociologia Brasileira, Pesquisa Social, Antropologia, Filosofia e Metodologia da Pesquisa. EaD 7 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira suimar joão Bressan Possui Graduação em Agronomia pela Universidade Federal de Santa Maria (1974) e Mestrado em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1979). Atualmente é secretário municipal de Planejamento da prefeitura de Ijuí e professor titular da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociologia do Conhecimento, atuando principalmente nos seguintes temas: Sociologia, sociedade, cidadania, teoria sociológica, teoria do Estado e ciência política. 9 Apresentação A disciplina Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira tem por objetivo possibilitar aos estudantes universitários o conhecimento sobre a realidade em que vivem, onde irão atuar como profissionais e a compreensão sobre a história de seu país e sua inserção mundial, capacitando-os para se posicionar e atuarem crítica e construtivamente no contexto socioeconômico e cultural. Este país apresenta enormes contradições, que se constituem em desa- fios postos a todos e a cada um, particularmente para os estudantes do ensino superior. Integrante do rol das disciplinas da Formação Geral e Humanística da Unijuí, também contribui para o atendimento das Diretrizes Curriculares Nacio- nais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e a qualificação dos estudantes nas dimensões exigidas pelo Enade, em relação a todos os cursos oferecidos pela universidade. O mundo do pós-guerra, a partir de meados do século 20, vive um pro- cesso de aceleração histórica, com grande velocidade das transformações tec- nológicas, econômicas, sociais e culturais, tanto no plano internacional quanto no âmbito de cada país, em especial no Brasil. Intensifica-se, por todos os meios, o debate sobre os problemas da humanidade e os rumos de desenvolvimento de cada país ou região. Um forte anseio de aprofundar o conhecimento da rea- lidade, entender as mudanças e participar da construção do futuro perpassa a sociedade e contagia principalmente a juventude. Como bem ressalta Argemiro Jacob Brum, nesse contexto, os estudantes universitários brasileiros reivindicaram, já na década de 50, a inclusão de uma disciplina que possibilitasse o estudo e a construção de uma visão mais ampla e um conhecimento mais aprofundado a respeito da sociedade e do seu país, no contexto da globalização, que será o “palco” concreto de suas futuras atuações como profissionais e como cidadãos. Atendendo a essa demanda, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ijuí – Fafi – decidiu incluir no currículo de todos os seus cursos, a partir de 1967, a disciplinade Cultura Brasileira, ministrada em dois semestres letivos (120 horas-aula). Em 1972, por exigência legal, mas mantendo sua proposta original e a equipe básica de professores, a disciplina passou a ser ministrada com a denominação de Estudos de Problemas Brasileiros (EPB). Em 2000 a Unijuí, ao rediscutir suas diretrizes de ensino e substituir o Ciclo Básico pela Formação Geral e Humanística, manteve a proposta deste compo- nente curricular sob a denominação de Formação e Desenvolvimento Brasileiro (FDB). No momento atual ocorre um esforço que busca aperfeiçoar a proposta, incorporando também experiências de outras disciplinas, especialmente da área EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 10 da Sociologia, quando assume a denominação de Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira. Assim, incorporou e busca dar continuidade à trajetória e experiência desenvolvida até o momento. A sociedade brasileira, cada vez mais integrada ao contexto mundial, complexificou-se ainda mais nas últimas décadas, desafiando pessoas, institui- ções e profissionais, a pensar e assumir as responsabilidades da construção deste país. Os conteúdos abordados, a metodologia utilizada, as pesquisas e o amplo debate realizado em sala de aula contribuem para que os estudantes percebam a dinâmica da sociedade em que vivem e se situem como parte integrante de uma realidade, como sujeitos constituintes de um país. Estes são elementos que têm marcado fortemente o perfil da formação no âmbito da Fafi/Fidene/Unijuí e que se constitui, historicamente, num referencial dentro do cenário universitário brasileiro. A disciplina Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira tem mui- to a contribuir na formação do aluno com este diferencial, tendo como foco a formação geral, abrangente, do ser humano, do cidadão e do profissional. Uma sociedade pluralista e cada vez mais democrática requer maior conhecimento sobre a realidade do país (que país é este?), sobre a sociedade em que se vive e em que se pretende exercer a profissão, para poder fazer, de forma consciente e responsável, as escolhas mais adequadas em cada área e a cada momento. A reflexão e o debate no coletivo poderão contribuir para superar o senso comum ou mesmo as posturas preconceituosas e desenvolver a capacidade de estabelecer relações respeitosas e construtivas, percebendo-se como sujeito desse processo com direitos e responsabilidades. O Brasil é um país em construção, em que pessoas e profissionais deve- rão desenvolver competências, que a partir de uma visão ampla da realidade sempre mutante, poderão assumir com consciência as suas responsabilidades, saber do local e global, contribuindo na construção de uma sociedade mais justa, valorizando a vida. Na Resolução n. 1 de 17/06/2004, que estabelece as Diretrizes Curricu- lares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais, encontram-se as orientações para esse estudo, que tem como “objetivo a divulgação e produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem ci- dadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira”. Estas questões poderão ser compreendidas em profundidade se estuda- das no contexto da realidade atual em perspectiva histórica de uma sociedade complexa, heterogênea, com pouca experiência de democracia e transparência em suas relações. Esta disciplina contribui decisivamente para que os alunos dos diversos cursos da Unijuí tenham mais conhecimento e melhores condições para res- ponder às questões de avaliação propostas pelo Enade, na medida em que este EaD 11 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira se propõe a “[...] avaliar o desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares, às habilidades e competências para a atualização permanente e aos conhecimentos sobre a realidade brasileira, mundial e sobre outras áreas do conhecimento”. As atividades são pensadas e desenvolvidas por uma equipe interdeparta- mental e interdisciplinar. Essa equipe de docentes é responsável pela sustentação e eficácia de um trabalho compartilhado, realizando reuniões periódicas para planejamento, programação, estudo, troca de experiências, seleção e produção de material didático a ser usado em sala de aula, análise de conjuntura, avaliação de desempenho, organização de seminários, etc., no intuito de uma permanente atualização. Assim sendo, estão diretamente envolvidos nesse processo profes- sores do DHE, do DACEC e do DCJS. Atenciosamente, Grupo de professores da disciplina Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira 13 o estUdo da sociedade Brasileira vera l. trennepohl oBjetivos desta Unidade Tematizar o estudo da sociedade em que vivem os estudantes visando • à apropriação de conceitos e categorias de análise que lhes permitam entender a realidade brasileira em sua complexidade, posicionar-se criticamente e agir, projetando ações de intervenção no desenvolvi- mento do Brasil. as seçÕes desta Unidade Seção 1.1 – Brasil: Que País é Este? Seção 1.2 – A Complexidade da Sociedade Brasileira O Brasil ainda é um país muito jovem, com uma sociedade em formação. Os cerca de 500 anos transcorridos desde o descobrimento oficial deste território pelos portugueses é um tempo relativamente curto para a vida de um país e a construção de uma sociedade. O resgate da história anterior a 1500 tem sido pouco frutífero em virtude da escassez de registros representativos e da falta de interesse dos “civilizadores” por considerar que os povos primitivos destas terras viviam em estágio cultural pouco relevante para seus interesses. seção 1.1 Brasil: Que País é este? Trata-se de um país grande e muito diversificado. A começar pela extensão de seu território, a diversidade de suas características naturais, a pluralidade de povos que integram a sua população e a heterogeneidade das circunstâncias que condicionaram sua inserção na sociedade brasileira é pos- sível perceber a amplitude do rol de situações sociais, econômicas e culturais abrangidas. Considerando o tamanho absoluto, o Brasil figura entre os maiores países do mundo em diversos critérios de análise. A extensão territorial coloca Unidade 1 EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 14 vários desafios em relação a sua organização e integração nacional, principal- mente quanto à soberania. Quando o olhar se volta para a homogeneidade o país figura frequentemente entre os mais desiguais, mesmo tendo melhorado nas últimas décadas. Percebe-se uma dívida social que não será resolvida de uma hora para a outra. Sua juventude, seu tamanho e sua diversidade contribuem decisiva- mente para a configuração de uma dinâmica de transformação acelerada da sociedade brasileira. Em pouco tempo abrigou relações sociais pré-capitalistas (escravistas, semifeudais ou mercantis), desenvolveu relações de produção típicas da revolução industrial e passou o ter também características das sociedades pós-industriais. As instituições sociais e as organizações públicas e privadas ainda não estão consolidadas como em outros locais do planeta. Mesmo assim, esse início do século 21 está marcado por transformações rápidas e aceleradas, significando que devemos estar atentos às mudanças em curso para, diante delas, poder fazer as melhores escolhas. Lembrando que são essas pequenas ações que podem fazer a diferença num país em construção. As características de seu processo de desenvolvimento têm raízes his-tóricas profundas. Muitas delas remontam ao processo de descobrimento e ocupação do território, enquanto outras foram forjadas em períodos de exercício do poder por grupos ou segmentos sociais específicos que conseguiram instituir suas perspectivas de sociedade. No processo inicial o Brasil estava organizado numa lógica e segundo os interesses da Coroa Portuguesa, internamente ficou sob a influência das oligarquias agrárias e já na segunda metade do século 20 ficamos sob poder e organização dos militares. Só mais recentemente avançamos no processo de- mocrático, em que políticas sociais de inclusão social, por exemplo, colocam-se como necessárias e importantes. Ressalta-se que em 2013 completamos 25 anos da promulgação da Constituição Brasileira e 28 anos da instituição da democracia. Mesmo tendo sérios problemas, a Constituição Cidadã trouxe várias conquistas para o povo brasileiro. Ainda assim, existem inúmeras formas de articulação com sociedades de outros países e uma crescente participação do Brasil no debate e definição de questões relevantes ao desenvolvimento em escala mundial. Ao longo do tempo a relação internacional foi assumindo novas características. Nos primeiros quatro séculos estabeleceu relação com Portugal, atendendo à demanda desse país. Em âmbito interno, no período colonial, isso foi possibilitado devido à influência, participação e poder dos grandes proprietários e importantes comerciantes, que estavam ligados à exportação e importação. A economia brasileira funcionou predominantemente em função de interesses externos, produzindo o que tinha maior aceitação no exterior. EaD 15 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira Após esses três primeiros séculos, percebe-se a superação da fase mer- cantil, em que o comércio era a atividade mais rentável, ocasião em que ocorre o avanço industrial, puxado pela Inglaterra – que estava ávida por mercado para os seus produtos –, há mais tempo uma potência militar. O Brasil vinculou-se, de forma dependente, a essa nova potência e nessa posição manteve-se por cerca de um século, desde a Independência (1822) até a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Após a Primeira Guerra Mundial, e com maior força depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos assumiram a liderança do mundo, levando o Brasil a se vincular à nova potência hegemônica. O primeiro empréstimo bus- cado nos EUA ocorreu em 1922. O mundo pode ser dividido em antes e após a Segunda Guerra Mundial, quando se estabeleceu uma nova ordem mundial, marcado pela guerra fria. Esse confronto político-ideológico será marcado por uma corrida armamentista, mantendo, em razão disso, em funcionamento o complexo industrial, como também investiu-se na reconstrução da Europa (Plano Marshall) e no Japão (Plano Dodge). Os EUA consolidam sua posição de única superpotência do mundo, com a derrocada da União Soviética e do socialismo de inspiração marxista, garan- tindo sua hegemonia em todos os campos da sociedade moderna – política, econômica, militar, financeira, cultural, científica, tecnológica, de informação, etc. Nesses campos, a presença brasileira é modesta, com algumas mudanças nas primeira década do século. Não tem assumido postura de forma tão subalterna em relação aos demais países. Por essa razão, somos atingidos de forma positiva ou negativa pelos acontecimentos mundiais. O desafio do Brasil é investir em educação, garantindo, dessa forma, um maior desenvolvimento científico e tecnológico. seção 1.2 a complexidade da sociedade Brasileira Estes e outros aspectos caracterizam a complexidade da sociedade bra- sileira e a importância de estudá-la em profundidade, o que requer grande e continuado esforço para sua efetivação. É preciso compreender o processo de formação e desenvolvimento das estruturas de produção da vida material, bem como das relações sociais, políticas e culturais decorrentes. Assim, torna-se possível identificar possibilidades e limites em relação às perspectivas de futuro que se apresentam e visualizar alternativas de ação ou de intervenção no processo em curso. Também é importante visualizar entre os segmentos que compõem a sociedade as bases em que definem seus interes- ses ou objetivos e as possibilidades de articulação de forças para impulsionar o desenvolvimento em determinado sentido. EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 16 Todo esse esforço de leitura da realidade e de entendimento da di- nâmica social em que está inserido é necessário para todos os brasileiros que desejam exercer sua cidadania. Esse conhecimento torna-se fundamental para os profissionais de todas as áreas do conhecimento, em especial os que tiveram acesso ao ensino superior, pois o exercício profissional se dará num contexto cada vez mais importante para a realização de seus objetivos e a efetividade de seus resultados. Mais que uma necessidade individual, o autoconhecimento é um desa- fio de qualquer sociedade que pretenda construir uma identidade cultural e desenvolver uma consciência histórica que lhe permita decidir sobre os rumos que pretende seguir. O grande desafio parece situar-se no campo metodológico. Como se deve proceder para conhecer melhor a sociedade em que se vive? Alguns apontamen- tos certamente ajudam nesta perspectiva. Destaca-se que para compreender a sociedade em sua complexidade e dinamicidade torna-se necessário percebê-la em constante transformação, significando que não é uma questão de transmi- tir um conjunto de informações, mas desenvolver a capacidade de pesquisa e análise de temáticas que estão desafiando a sociedade brasileira, dando-lhes algum sentido. Qual é a nossa leitura sobre o Brasil? É necessário qualificar ou não essa compreensão? Inicialmente é preciso compreender a sociedade como algo vivo, em movimento, cuja dinâmica é indeterminada. A sociedade está em constante transformação e o desafio é compreendê-la nessa complexidade, que muda constantemente, de forma muito rápida. Assim, torna-se necessário fazer refle- xões que construam entendimentos sobre as condições sociais, econômicas, políticas e culturais do nosso tempo histórico, como um contexto em constante transformação, fruto de uma construção histórica. Na linha que nos coloca Thompson (1987, p. 58), “o conhecimento histórico ajuda-nos a conhecer quem somos, por que estamos aqui, que possibilidades humanas se manifestam, e tudo quanto saber sobre a lógica e as formas de processo social”. Vivemos num determinado lugar e num determinado tempo, que é fruto da construção de nossos antepassados. A realidade enfrentada pelos nossos pais era diferente das questões com as quais estamos nos debatendo no momento atual. É nos espaços formais de aprendizagem, portanto, que temos a oportunidade de conhecer e de dialogar sobre essa complexidade brasileira, no coletivo. Uma melhor compreensão da sociedade brasileira pode ser buscada na sua economia política. Na perspectiva do que observa Marx (1983, p. 24), “o modo de produção da vida material condiciona o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral”. Diante disso, torna-se necessário a organização social, econômica, política e cultural. EaD 17 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira Ao longo dos séculos ocorreram mudanças na sociedade brasileira, na qual várias leituras são possíveis. A definição pode variar, dependendo da visão de mundo do pesquisador, Mesmo assim, ela é composta, no caso do Brasil, pela diversidade cultural, processo ainda em andamento, como também composta por aspectos econômicos e políticos. A economia atinge diretamente a vida das pessoas, das empresas e dopaís. Assim sendo, o Brasil possui uma estrutura de produção grande e complexa, que evolui e apresenta a cada momento novas exigências. Isso porque qual- quer país precisa garantir os bens necessários para sua população. A estrutura econômica compreende: 1) o processo de produção, 2) de distribuição e 3) de consumo de bens e serviços. A política assume um papel central no processo de organização e funcio- namento da sociedade, não podendo ser confundida pura e simplesmente com política partidária. Para compreender a organização política brasileira torna-se necessário identificar algumas de suas principais características. Primeiro aspecto a ser considerado, também encontrado na Constituição Brasileira, diz respeito a sua constituição enquanto uma República Federativa, composta por vários Estados (26), Distrito federal (Brasília) e municípios (mais de 5 mil). Todos estão vinculados à União, tendo como responsabilidade também garantir a soberania do país. Constituído dessa forma, significa que o Estado não pode ser gerido por uma pessoa, mas por uma estrutura constituída pelos poderes Legislativo, Exe- cutivo e Judiciário. Vale destacar que o poder Legislativo é organizado por um sistema bicameral e exercido pelo Congresso Nacional, composto por senadores e deputados. Quem eles representam? No aspecto político a sociedade brasileira tornou-se uma estrutura com- plexa, lembrando que Estado é diferente de governo. O que entendemos por Estado e governo? Estado é mais estável e contribui para a organização geral do país. Por exemplo, as estradas são vias públicas, mas imaginem se não fosse: Como fazer para escoar a produção? Assim sendo, ele é enorme e constituído por diversas instituições como: o governo, as Forças Armadas, os órgãos policiais, as Assembleias Parlamentares, a Constituição, etc. O Brasil é uma República. Ressaltando novamente que o poder não se encontra na mão de uma pessoa, requer também o envolvimento das pessoas, da sociedade brasileira. Elas assumem um papel central no processo de escolha e fiscalização dos seus representantes, num período democrático. Na Constitui- ção vamos encontrar a legislação eleitoral, em que as eleições são diretas e com a possibilidade de dois turnos para presidente, governadores e prefeitos em municípios com mais de 200 mil eleitores. O voto é obrigatório para brasileiros maiores de 18 anos e facultativo para maiores de 70 anos e jovens entre 16 e 18 anos. Os analfabetos e menores de 18 anos não podem se candidatar. O que é ser analfabeto? Muito a refletir sobre EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 18 esse questionamento! Assim, numa democracia, os membros do Executivo e do Legislativo são eleitos pela população brasileira, já os membros do Judiciário são nomeados. A política possibilita, portanto, a organização das relações em sociedade. Assim sendo, as opções de um podem afetar a vida do outro, sabendo que temos direitos e deveres. No momento atual a política partidária está desacreditada, pois alguns representantes legislam segundo os seus interesses. Também é importante compreender o desenvolvimento enquanto processo histórico, resultante da interação de múltiplas condicionantes, repleto de conflitos e contradições, que se configuram em circunstâncias imprevisíveis. Esse tema entrou no debate após a Segunda Guerra Mundial, recebendo, num primeiro momento, maior atenção dos economistas. Nas décadas seguintes recebe também atenção de pesquisadores das demais áreas. Mesmo assim, percebe-se que os países desenvolvidos são os que mais agridem o meio ambiente, como também contribuem com o agravamento da exclusão social. Brum (2006, p. 22-23) chega a se referir a uma crise planetária, em que [...] o planeta Terra não terá possibilidade de fornecer em abundância todos os recursos naturais de que os seres humanos necessitam, se continuarem a viger por muito tempo ainda os padrões de produção, consumo e desperdício atualmente dominantes. Por outro lado, não há como realizar a aspiração de desenvolvimento para todos os povos e para a humanidade inteira, dentro de tais padrões, altamente agressivos contra a natureza. Mesmo assim, percebe-se um aprofundamento da consciência ecológica e da consciência social, em que são fundamentais as ações do Estado, pressionado e acompanhado pela sociedade. Essa construção está marcada pela busca de um desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável rejeita o desenvolvimento predatório, que visa a resultados econômicos, sem compromisso com a realidade social e ambiental. Tem como fundamento o respeito ao homem e à natureza. Busca uma nova ética, comprometida com a humanidade toda e cada um de seus membros e com a natureza e o futuro. Esse novo padrão de desenvolvimento busca conciliar, nos quadros da democracia, a eficiência econômica, justiça social, equilíbrio ambiental. É um desafio para a humanidade e para a socieda- de brasileira. É, provavelmente, a única saída para a humanidade neste novo século e novo milênio (Brum, 2006, p. 23). Nas últimas décadas várias conferências e encontros realizados demons- tram certa preocupação com o desenvolvimento predatório que está ocorrendo, no Brasil, desde o seu descobrimento oficial. Mudanças são perceptíveis desde a Conferência Ecológica Internacional – a ECO 92 –, realizada no Rio de Janeiro em 1992. Ela contou com a participação de 179 países, como também Organi- EaD 19 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira zações Não Governamentais (ONGs), resultando na Agenda 21. Outro evento a ser destacado foi a Rio+20,1 que refletiu a continuidade do desenvolvimento sustentável. Quais são as repercussões disso no Brasil? O desenvolvimento nesta perspectiva requer um envolvimento do cole- tivo, como defende Brum (2006, p. 24): Um projeto de desenvolvimento é mais do que um problema técnico. Exige participação coletiva. Só se desenvolve o povo que estiver decidido a desen- volver-se. De outra parte, só há desenvolvimento, centrado no ser humano. É ele o agente e o destinatário do desenvolvimento. O sujeito e o objeto. Sem o engajamento do povo num projeto nacional não haverá desenvolvimento. A responsabilidade coletiva é fundamental. Ela só se verifica em clima de confiança recíproca entre governo e povo. Dessa forma, é necessário estudar a dinâmica de evolução e transforma- ção da sociedade, no contexto em que ela está inserida, identificando e consi- derando os distintos fenômenos que atuam no sentido de acelerar, retardar ou redirecionar os seus movimentos. Identificar as correlações de forças (internas ou externas) existentes e as alternativas que surgem ou são propostas em cada momento histórico. Assim, para contribuir no estudo da sociedade brasileira são apresentados os principais elementos que a compõem e determinam suas especificidades. Questão essas que serão analisadas e retomadas nas próximas unidades. Na Unidade 2 pretende-se problematizar conquista, formação e ocupação do território brasileiro. O Brasil foi “descoberto” no contexto das grandes nave- gações européias, impulsionado pela busca de especiarias, o comércio, ou mais precisamente os lucros que ele poderia proporcionar. Os portugueses, como não encontraram muita riqueza, se demoraram em nosso país, para dar atenção à “nova” terra. A partir de 1530 percebem que tinha chegado o momento de defender a colônia dos interesses dos demais países da Europa. Portugal não dispunha de muitos recursos para custear o processo de ocupação, passando a tarefa para a iniciativa privada. A partir dessa preocupação várias ações foram encaminhadas para garantir a posse da terra, questões estas que serãoanalisadas na próxima Unidade. Na Unidade seguinte estaremos analisando o povo brasileiro, que resulta de um processo de miscigenação, em que pessoas receberam tratamento diferen- ciado. O estudo da constituição desse povo contribuiu para percebamos alguns problemas e contradições, que são fruto de uma construção histórica. Estas questões nos darão mais elementos para compreendermos se é necessário, ou não, a elaboração de políticas públicas ou ações afirmativas, que busquem garantir uma maior qualidade de vida para as pessoas. Vale ressaltar que 1 Disponível em: <http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/03/Rio+20_Futuro_que_queremos_guia.pdf>. Acesso em: 16 dez. 2013. EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 20 uma das características do Brasil é a diversidade cultural. Essa rica diversidade se transfunde em identidade e brasilidade, em momentos de mobilizações sociais, por exemplo a campanha das “Diretas Já”. Na Unidade 4 estaremos estudando a estrutura econômica brasileira na sua complexidade. O Brasil está organizado na perspectiva capitalista, marcado pela busca incessante pelo lucro. Ao analisar a sua consolidação e expansão percebemos que ora o Estado intervém mais, ora menos. Mesmo assim, a análi- se de alguns indicadores econômicos nos ajudam para melhor entender o seu desempenho, em épocas diferentes, como o Produto Interno Bruto (PIB). Sabemos também que para garantir o seu avanço necessitamos de recur- sos, que ao longo do tempo contribuíram para o nosso endividamento externo, logo também, para o endividamento interno. Para tanto, torna-se necessário lançar um olhar sobre as escolhas realizadas ao longo do século 20, que atingi- ram a vida das pessoas, das empresas, dos agricultores, dos industriais, em que alguns conseguiram acompanhar e outras nem tanto. Lembrando também que ao longo desse processo enfrentamos várias crises econômica, próprias de um sistema capitalista. A organização social e política brasileira nesses mais de 500 anos passou por várias transformações. De forma sucinta pode ser analisada considerando três grandes fases. No período colonial foi dependente de Portugal, governado pelo rei português, que detinha o poder, apoiado por uma pequena elite interna. Após a Independência (1822) transformou-se em Império, sob o comando de um imperador (D. Pedro I e depois D. Pedro II). Já em 1889, com a Proclamação da República, novas perspectivas políticas são encaminhadas. Os mais de cem anos de República foram intercalados por períodos autoritários e outros democráticos, em que várias Constituições foram aprovadas, visando a respaldar as ações dos governantes, mas quando isso não era suficiente recorriam a Atos Institucionais, decretos, medidas provisórias. Essas questões serão problematizadas e retomadas na Unidade 5. Certamente, vários são os desafios do desenvolvimento brasileiro, que serão analisados na última unidade, quando será necessário retomar questões debatidas nas unidades anteriores, pois, de certa forma, em cada uma foram expostos alguns desafios, que podem contribuir para pensar um projeto para o Brasil. Que Brasil estou querendo? Onde buscar os recursos? De quem são as responsabilidades? Assim, é verdade que precisamos conquistar os benefícios da civilização material, frutos do desenvolvimento da ciência e da tecnologia modernas. Preci- samos aumentar a renda per capita e a produção e consumo de bens e serviços, mas precisamos, também, garantir o acesso efetivo a esses bens e serviços a todos os membros da coletividade brasileira. Precisamos aprofundar e explicitar a nossa autenticidade histórica, nossa identidade nacional, as características de nosso povo, o ser brasileiro. Brum (2006, p. 31) recomenda o EaD 21 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira [...] exame retrospectivo, o ontem sempre poderia ter sido melhor. Mas o passado não se muda; só o futuro se constrói. O primeiro pode ser reinterpre- tado à luz do presente e do projeto e desafios para o amanhã. A pluralidade desse contributo é fermento e riqueza – e pode ser ainda mais. A atitude mais adequada não é lamentar ou renegar o passado; conhecê-lo melhor, sim. Principalmente para assumir com mais consciência e determinação o que somos e construir o que podemos, devemos e desejamos ser. Para avançar ainda mais no nosso entendimento sobre o Brasil vamos nas unidades seguintes retomar alguns aspectos da trajetória histórica do país, que contribuíram com a definição da realidade brasileira. Para pensar o Projeto de Desenvolvimento para o Brasil precisamos conhecer a realidade atual do país, como o seu processo histórico, considerando o que disso ainda é válido hoje. Ou mesmo, para não propormos o velho achando que é o novo. síntese da Unidade 1 Nesta Unidade introdutória estudamos a te- mática geral da disciplina com o objetivo de problematizar as questões relevantes sobre a Formação e o Desenvolvimento da Sociedade Brasileira. A realidade precisa ser apreendida em sua complexidade, considerando sua dinâmica histórica, suas contradições e a pluralidade de perspectivas. Apesar das dificuldades, o esforço de estudo e compreensão do contexto social, econômico, político e cultural em que estão inse- ridos os estudantes brasileiros é compensador na perspectiva de formar profissionais qualificados e responsáveis. 23 características do territÓrio Brasileiro dilson trennepohl oBjetivos desta Unidade Estudar as principais características do território brasileiro e refletir • sobre as possibilidades e os limites que elas representam para o desenvolvimento da sociedade brasileira. as seçÕes desta Unidade Seção 2.1 – O Processo de Conquista E Delimitação do Território Brasileiro Seção 2.2 – As Características Naturais do Território Brasileiro Seção 2.3 – A Ocupação do Território e as Desigualdades Sociais e Regionais Um dos condicionantes fundamentais do desenvolvimento de uma so- ciedade é o espaço que ela ocupa ou o território em que pode planejar e realizar suas ações. A maior parte das condições naturais, vantagens e desvantagens, potencialidades e limites, está associada às características do território de que se dispõe e das formas de sua ocupação ou utilização socioeconômica. O território brasileiro, a começar por sua vasta dimensão de 8,5 milhões de Km2, sua localização privilegiada, sua diversidade climática, vegetal, animal e mineral, até suas configurações socioeconômicas, representa enorme potencial de diferenciação do desenvolvimento nacional em comparação com os demais países do mundo. Grande parte das potencialidades permanece inexplorada, mas poderá ser incorporada à dinâmica social e econômica no futuro. Em contrapartida, sua utilização implica responsabilidade redobrada por se tratar de recursos escassos, inexistentes em outros locais do planeta, como é o caso da Amazônia. Uma comparação superficial do Brasil com o Uruguai, com o Japão ou com a Rússia já seria suficiente para explicitar a importância de características como extensão, localização e diversidade do território nacional como condicio- nantes das estratégias de desenvolvimento possíveis ou necessárias em cada Unidade 2 EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 24 país. Assim sendo, o esforço de estudo sobre as características de um território riquíssimo como o brasileiro representa um desafio a ser realizado e aprofundado permanentemente. seção 2.1 o Processo de conquista e delimitação do território Brasileiro A conformação territorial do Brasil é resultado de longo e complexo pro- cesso de conquista, demarcação e ocupação realizado ao longo de cinco séculos de História. Refletir sobre essa trajetóriaé importante para recuperar elementos que possibilitem entender os caminhos trilhados, as possibilidades que persistem no presente e as alternativas disponíveis para o futuro. Celso Furtado em sua obra clássica, Formação Econômica do Brasil, analisa o processo de ocupação das terras americanas no contexto da expansão comercial europeia da época. Inicialmente considerada de menor importância, a descoberta deste vasto continente tornou-se relevante com o transcorrer do tempo. O início da ocupação econômica do território brasileiro é em boa medida uma conseqüência da pressão política exercida sobre Portugal e Espanha pelas demais nações européias. Nestas últimas prevalecia o princípio de que espa- nhóis e portugueses não tinham direito senão àquelas terras que houvessem efetivamente ocupado. Dessa forma, quando, por motivos religiosos, mas com apoio governamental, os franceses organizam sua primeira expedição para criar uma colônia de povoamento nas novas terras – aliás a primeira colônia de povoamento do continente –, é para a costa setentrional do Brasil que voltam as vistas. Os portugueses acompanhavam de perto esses movimentos e até pelo suborno atuaram na corte francesa para desviar as atenções do Brasil. Contudo tornava-se cada dia mais claro que se perderiam as terras americanas a menos que fosse realizado um esforço de monta para ocupá-las permanen- temente. Esse esforço significava desviar recursos de empresas muito mais produtivas no Oriente. A miragem do ouro que existia no interior das terras do Brasil – à qual não era estranha a pressão crescente dos franceses – pesou seguramente na decisão tomada de realizar um esforço relativamente grande para conservar as terras americanas (Furtado, 1987, p. 6). EaD 25 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira Figura 1 – Mapa sobre o processo de construção do território brasileiro Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://brasil500a- nos.ibge.gov.br/>. Acesso em: jan. 2014. Enquanto a Espanha optou por concentrar seus esforços em manter sob seus domínios os territórios em que encontraram maior disponibilidade de metais preciosos (ouro e prata) e ceder à pressão dos invasores em parte das terras que lhe cabiam pelo Tratado de Tordesilhas, Portugal teve de adotar outra estratégia. O desafio de maior importância do primeiro século da história americana era de encontrar uma maneira de viabilizar a efetiva ocupação das terras de escassa ou nenhuma utilização econômica imediata. Coube a Portugal a tarefa de encontrar uma forma de utilização econômica das terras americanas que não fosse a fácil extração de metais preciosos. Somente assim seria possível cobrir os gastos de defesa dessas terras. (...) Das medidas políticas que então foram tomadas resultou o início da exploração agrícola das terras brasileiras, acontecimento de enorme importância na história americana. De simples empresa espoliativa e extrativa – idêntica à que na mesma época estava sendo empreendida na costa da África e nas Índias Orientais – a América passa a constituir parte integrante da economia reprodutiva européia, cuja técnica e capitais nela se aplicam para criar de forma permanente um fluxo de bens destinados ao mercado europeu (Furtado, 1987, p. 7) EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 26 No século 16 a exploração econômica dessas terras era considerada algo completamente inviável. Nenhum produto agrícola era objeto de comércio em grande escala na Europa e o principal deles – o trigo – dispunha de produção local. Os fretes eram caríssimos e somente os produtos manufaturados e as espe- ciarias do Oriente podiam comportá-los, entretanto, premidos pela necessidade e beneficiados por circunstâncias favoráveis, os portugueses tiveram êxito em sua estratégia. Um conjunto de fatores particularmente favoráveis tornou possível o êxito dessa primeira grande empresa colonial agrícola européia. Os portugue- ses haviam já iniciado há algumas dezenas de anos a produção, em escala relativamente grande, nas ilhas do Atlântico, de uma das especiarias mais apreciadas no mercado europeu: o açúcar. Essa experiência resultou ser de enorme importância, pois, demais de permitir a solução dos problemas téc- nicos relacionados com a produção do açúcar, fomentou o desenvolvimento em Portugal da indústria de equipamentos para os engenhos açucareiros. Se se têm em conta as dificuldades que se enfrentavam na época para conhecer qualquer técnica de produção e as proibições que havia para exportação de equipamentos, compreende-se facilmente que, sem o relativo avanço técnico de Portugal nesse setor, o êxito da empresa brasileira teria sido mais difícil ou mais remoto (Furtado, 1987, p. 9). A experiência portuguesa nas ilhas do Atlântico foi importante também no campo comercial. Inicialmente o açúcar português entrou nos canais tradicionais controlados pelos comerciantes das cidades italianas, especialmente Veneza, mas muito cedo o governo português procurou outros parceiros comerciais para seu produto. A partir de 1550 a produção de açúcar passa a ser cada vez mais um empreendimento comum entre portugueses e flamengos (principalmente os holandeses). Os flamengos compravam o produto oriundo das colônias portu- guesas, refinavam e comercializavam-no em toda a Europa. Especializados no comércio intraeuropeu, os holandeses eram nessa época os únicos que possuíam suficiente organização comercial para criar um mercado de grandes dimensões para um produto novo, como era o açúcar. Foi uma parceria decisiva para viabi- lizar a expansão do mercado do açúcar, o que constitui um fator fundamental do êxito da colonização do Brasil (Furtado, 1987, p. 10). A identificação de uma atividade econômica que poderia constituir a base econômica do processo de conquista e ocupação do território brasileiro era um primeiro passo importante, mas não suficiente. Surgiu o desafio de organizar o processo produtivo da cana e de extração do açúcar, bem como de seu trans- porte para a Europa. A experiência técnica dos portugueses na fase produtiva e a capacidade comercial dos holandeses foram importantes para demonstrar o potencial de rentabilidade do negócio e atraíram os investimentos de poderosos grupos fi- nanceiros privados interessados na expansão de seus negócios. Era necessário, porém, solucionar o problema da força de trabalho. Mais uma vez a parceria com os flamengos foi decisiva. EaD 27 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira Parte substancial dos capitais requeridos pela empresa açucareira viera dos Países Baixos. Existem indícios abundantes de que os capitalistas holandeses não se limitaram a financiar a refinação e comercialização do produto. Tudo indica que capitais flamengos participaram no financiamento das instalações produtivas no Brasil bem como no da importação da mão-de-obra escrava (Furtado, 1987, p. 11). O problema da mão de obra para o cultivo da cana e a operação dos engenhos foi algo de importância vital. As tentativas de recrutá-la localmente e contar com os indígenas foram majoritariamente frustradas. Transportá-la da Europa era inviável pois, considerando a escassez de oferta de mão de obra que prevalecia em Portugal, seria necessário um investimento enorme e o pagamen- to de salários bem mais elevados para atrair interessados dessa região, o que tornaria antieconômica toda e qualquer empresa. A possibilidade de retribuir com terras o trabalho que os colonos realizassem durante algum tempo não era atrativa, pois as terras, amplamente disponíveis, praticamente não tinham valor econômico. Sem embargo, também neste caso uma circunstância veio facilitar enorme- mente a solução do problema. Por essa época os portugueseseram já senhores de um completo conhecimento do mercado africano de escravos. As operações de guerra para captura de negros pagãos, iniciadas quase um século antes nos tempos de Dom Henrique, haviam evoluído num bem organizado e lucrativo escambo que abastecia certas regiões da Europa de mão-de-obra escrava. Mediante recursos suficientes, seria possível ampliar esse negócio e organizar a transferência para a nova colônia agrícola da mão-de-obra barata, sem a qual ela seria economicamente inviável (Furtado, 1987, p. 11-12). A efetiva ocupação portuguesa do território brasileiro teve início com a criação do regime de capitanias hereditárias por D. João III, em 1532. Até então, a exploração restringia-se ao litoral, era esparsa e individual, a exemplo da donataria concedida pelo rei D. Manuel a Fernando de Noronha visando ao arrendamento do comércio de pau-brasil. Foi por meio desse sistema de capitanias que os pri- meiros núcleos de ocupação e colonização foram estabelecidos, a exemplo de São Vicente, concedida a Martim Afonso de Sousa, em 1532, e de Pernambuco, outorgada a Duarte Coelho, em 1534. Cada um dos problemas referidos – técnica de produção, criação de merca- do, financiamento, mão-de-obra – pôde ser resolvido no tempo oportuno, independentemente da existência de um plano geral preestabelecido. O que importa ter em conta é que houve um conjunto de circunstâncias favoráveis sem o qual a empresa não teria conhecido o enorme êxito que alcançou. Não há dúvida que por trás de tudo estavam o desejo e o empenho do governo português de conservar a parte que lhe cabia das terras da América, das quais sempre se esperava que um dia sairia o ouro em grande escala. Sem embargo, esse desejo só poderia transformar-se em política atuante se encontrasse algo concreto em que se apoiar. Caso a defesa das novas terras houvesse permanecido por muito tempo como uma carga financeira para o pequeno reino, seria de esperar que tendesse a relaxar-se. O êxito da grande empresa EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 28 agrícola do século XVI – única na época – constituiu, portanto, a razão de ser da continuidade da presença dos portugueses em uma grande extensão das terras americanas. No século seguinte, quando se modifica a relação de forças na Europa com o predomínio das nações excluídas da América pelo tratado de Tordesilhas, Portugal já havia avançado enormemente na ocupação efetiva da parte que lhe coubera (Furtado, 1987, p. 12). A União Ibérica, que se estendeu de 1580 a 1640, cumpriu um importante papel na construção do território brasileiro ao se diluir as fronteiras estabelecidas pelo Tratado de Tordesilhas. Permitiu expandir os limites territoriais para o norte, com a conquista do Maranhão e para o sul, alcançando a região platina. Teve início nesse período a expansão territorial para o interior através da organização das primeiras expedições dos bandeirantes em São Paulo. Data de 1585 a primeira grande bandeira para captura e escravização de índios no sertão dos Carijós, luta que levaria à ocupação gradativa do interior do Brasil e ao alargamento da faixa litorânea ocupada pelos portugueses no início do século 16. São referências também deste processo a conquista do território da Paraíba em 1584, os violentos conflitos com os índios do norte da Bahia em 1589, as primeiras incursões dos bandeirantes para Goiás em 1592, Minas Gerais em 1596 e para a região do baixo Paraná em 1604 com o objetivo de obter força de trabalho escrava. O quadro político-econômico dentro do qual nasceu e progrediu de forma surpreendente a empresa agrícola, em que assentou a colonização do Brasil, foi profundamente modificado pela absorção de Portugal na Espanha. A guerra que contra este último país promoveu a Holanda, durante esse período, repercutiu profundamente na colônia portuguesa da América. No começo do século XVII, os holandeses controlavam praticamente todo o comércio dos países europeus realizado por mar. Distribuir o açúcar pela Europa sem a cooperação dos comer- ciantes holandeses evidentemente era impraticável. Por outro lado, estes de nenhuma maneira pretendiam renunciar à parte substancial que tinham nesse importante negócio, cujo êxito fora em boa parte obra sua. A luta pelo controle do açúcar torna-se, destarte, uma das razões de ser da guerra sem quartel que promovem os holandeses contra a Espanha. E um dos episódios dessa guerra foi a ocupação pelos batavos, durante um quarto de século, de grande parte da região produtora de açúcar no Brasil (Furtado, 1987, p. 17). A descoberta do ouro na região de Minas Gerais, no final do século 17, modificou radicalmente o processo de expansão territorial e a estratégia de ocupação dos espaços conquistados. O fluxo de portugueses intensificou-se e o movimento de interiorização de núcleos urbanos alcançou novos patamares. A necessidade crescente de mão de obra (escravos), animais de trabalho (mulas) e de gêneros alimentícios para o abastecimento da região das minas contribuiu para a expansão do Brasil em direção ao Rio Grande do Sul, fomen- tando a apreensão de índios, a criação de gado de todo o tipo. O processo de expansão territorial, de conquista de novas áreas, está repleto de conflitos e atos de violência entre os povos nativos e os bandeirantes. Sua consolidação exige a expulsão, submissão ou eliminação dos primitivos e a concessão de títulos de posse ou propriedade aos conquistadores. EaD 29 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira A expansão das fronteiras do território brasileiro foi sendo consagrada em diversos tratados, dentre os principais destacam-se: a. O Tratado de Tordesilhas (1494) definiu as áreas de domínio do mundo ex- traeuropeu. b. O Tratado de Lisboa (1681) tratou da devolução da Colônia do Sacramento, ocupada pelos espanhóis no ano de sua fundação. O apoio da Inglaterra foi decisivo para Portugal conseguir essa vitória diplomática. A saída das forças espanholas só se dá efetivamente em 1683. c. O primeiro Tratado de Utrecht entre Portugal e França (1713) estabeleceu as fronteiras portuguesas do norte do Brasil: o Rio Oiapoque foi reconhecido como limite natural entre a Guiana e a Capitania do Cabo do Norte. d. O segundo Tratado de Utrecht entre Portugal e Espanha (1715) tratou da se- gunda devolução da Colônia de Sacramento a Portugal. e. O Tratado de Madri (1750) redefiniu as fronteiras entre as Américas Portugue- sa e Espanhola, anulando o estabelecido no Tratado de Tordesilhas: Portugal garantia o controle da maior parte da Bacia Amazônica, enquanto que a Espa- nha controlava a maior parte da Bacia do Prata. Nesse Tratado o princípio do usucapião (uti possidetis), que quer dizer a terra pertence a quem a ocupa, foi levado em consideração pela primeira vez. f. O Tratado de Santo Ildefonso (1777) confirmou o Tratado de Madri e devolveu a Portugal a ilha de Santa Catarina, ficando com a Espanha a Colônia de Sacra- mento e a região dos Sete Povos. g. O Tratado de Badajós entre Portugal e Espanha (1801) incorporou definitiva- mente os Sete Povos das Missões ao Brasil. h. O Tratado de Petrópolis (1903), negociado pelo Barão do Rio Branco com a Bolívia, incorporou ao Brasil, como território, a região do Acre. A forma predominante de garantir a ocupação do território foi a concessão de títulos de posse ou propriedade de grandes extensões de terras (capitanias hereditárias, sesmarias, etc.) aos responsáveis pela sua conquista. Apesar das características conflituosas do processo de conquista do território e da extensão dos limites de fronteira com diversos países, já não existem mais pendências ou disputas em relação à demarcação com os vizinhos. seção 2.2 as características naturais do território Brasileiro Localizado no continente americano,o território brasileiro ocupa a parte centro-oriental da América do Sul. Com uma área de 8.514.876,599 Km2, configura-se como o maior país do continente sul-americano e o quinto maior do mundo, superado somente por Rússia, Canadá, China e Estados Unidos. EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 30 O território brasileiro possui uma forma triangular, com sua base voltada para o norte e os pontos extremos, praticamente equidistantes, medem 4.394,7 km no sentido Norte-Sul e 4.319,4 km no sentido Leste-Oeste. Cerca de 90% de sua área territorial está situada na faixa entre as linhas do Equador e do trópico de Capricórnio, nas latitudes mais baixas do globo, o que lhe confere as carac- terísticas de país tropical. Seus limites de fronteira totalizam 23.086 Km, dos quais 15.719 Km cor- respondem à linha divisória em relação a dez países da América do Sul, pois apenas o Chile e o Equador não fazem fronteira com o Brasil. O outros 7.367 Km de extensão correspondem à costa brasileira banhada pelo Oceano Atlântico numa linha costeira sem acidentes geográficos de expressão. Em seu interior o território brasileiro apresenta grande diversidade de situações que podem ser visualizadas nos distintos biomas ou conjuntos de ecossistemas que funcionam de forma estável. Um bioma é caracterizado por um tipo principal de vegetação, apesar de existirem diversos tipos de vegetação num mesmo bioma. Os seres vivos de cada bioma interagem com as condições existentes na natureza, como temperatura, umidade, frequência e regularidade das chuvas, ventos, etc., adaptando-se e evoluindo com o meio. Os biomas brasileiros pos- suem grande diversidade de animais e vegetais (biodiversidade) e podem ser caracterizados como sendo Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal. Figura 2 – Mapa com os principais biomas do Brasil Fonte: Brasil. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Disponível em: <http://www.biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014. EaD 31 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira O Bioma Amazônia compreende uma área de 4 milhões de quilômetros quadrados, em que vivem aproximadamente 2 milhões de espécies animais e vegetais. Na floresta amazônica existem cerca de 200 espécies diferentes de ár- vores por hectare e seu território corresponde a um terço das florestas tropicais do mundo. Tudo é superlativo nesse vasto espaço, que constitui a maior área selvagem tropical do planeta. A Amazônia ocupa a porção norte do Brasil e apesar de ser considerado um bioma único, é composta por diferentes paisagens. Uma classificação resumida permite dividir a floresta em três grandes categorias: áreas alagadas pelas águas pretas, os igapós; áreas que se inundam nas cheias com águas brancas, as várzeas e áreas constantemente livres de inundação, a mata de terra firme. Ela tem ainda enclaves de vegetações não florestais, como savanas, campinas e campinaranas. A Amazônia está envolvida na regulação climática de todo o planeta, seja por meio da retenção de carbono atmosférico, seja por meio da evapotranspiração e dispersão de chuvas para todo o continente sul- americano. A floresta acompanha em grande medida os principais rios da Bacia do Amazonas, desde o sopé dos Andes até o Atlântico. O clima predominante é quente e úmido, com frequentes e volumosas chuvas que caem pelo menos 130 dias por ano. Seu relevo é majoritariamente plano, com solo formado pelo sedimento trazido pelos rios. A despeito de seu valor mundial, a floresta sofre com o desmatamento e o conflito com a pecuária e agricultura. O grande desafio do desenvolvimento neste território é de aproveitar as potencialidades oferecidas pela natureza sem destruir seus complexos sistemas de reprodução e renovação das condições existentes (Disponível em: <http://www.biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014). O Bioma Mata Atlântica constitui o ambiente em que o Brasil começou historicamente. Foi em sua porção baiana que a esquadra de Cabral aportou. Foi nela que o pau-brasil, árvore que dá nome ao país, foi explorado. Na zona da mata nordestina a cana-de-açúcar foi introduzida e na porção mineira desse mesmo bioma o ouro começou a ser extraído. Também foi no território da Mata Atlântica que o café foi plantado e desenvolveu todo seu potencial. A Mata Atlântica acompanha boa parte do litoral brasileiro, nas encostas da Serra do Mar. Já chegou a ter 1.200.000 km² de floresta de grande porte, mas que foram sendo reduzidos gradativamente e representam atualmente cerca de 7% da cobertura original. Sua distribuição original ocupava uma faixa contínua, desde o Rio Grande do Norte e Ceará, no Nordeste brasileiro, até o Rio Grande do Sul. A Mata Atlântica abriga perto de 200 espécies de aves endêmicas, 120 delas ameaçadas de extinção. Ela também tem papel fundamental na estabilização do relevo litorâneo, mantendo no lugar as encostas dos morros e prevenindo deslizamentos. Seu relevo é acidentado e o solo, raso, frequentemente ocorrendo o afloramento das rochas. Uma floresta tão exuberante é sustentada pela alta umidade trazida do oceano e deixada na Serra do Mar. Devido à grande variação de altitude e latitude, a Mata Atlântica expressa-se em diferentes formações e paisagens. A mais marcante é a Floresta Ombrófila Densa, uma luxuriante e biodiversa formação florística existente próxima ao mar. Mais para o interior do país, a floresta apresenta formações que perdem parcialmente as folhas, a EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 32 Mata Atlântica de Planalto. Em adição, nos Estados do sul do país (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) parte da Mata Atlântica assume a feição de Mata de Araucária. Charles Darwin escreveu após sua visita a esse bioma: “Aqui vi pela primeira vez uma floresta tropical em toda sua sublime grandiosidade – nada além da realidade pode dar idéia de quão maravilhosa e magnificente é essa cena.” O processo histórico de ocupação do território brasileiro fez com que grande parte das atividades humanas se desenvolvessem neste espaço. Setenta por cento da população brasileira concentram-se em cidades situadas numa faixa de até 200 km da costa, especialmente as capitais dos Estados, e disputam espaço com os demais elementos desse bioma. O processo de intensa ocupação, que remonta aos principais ciclos econômicos, desafia as políticas públicas a gerar soluções de planejamento urbano e instituição de infraestruturas de transporte para mo- bilidade das pessoas e abastecimento das grandes metrópoles, de saneamento básico e destinação de resíduos gerados, bem como de ordenamentos relativos à ocupação de terrenos menos propícios às edificações ou necessários à preser- vação permanente de parcelas da Mata Atlântica (Disponível em: <http://www. biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014). O Bioma Cerrado, também conhecido como a savana brasileira, varia quanto a sua fisionomia em relação à cobertura arbórea, indo desde os campos limpos, nos quais só ocorrem gramíneas nativas, até o cerradão, formação predo- minantemente arbórea e densa. O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro, distribuindo-se por todo o Brasil central, com uma área original de 2 milhões de quilômetros quadrados, aproximadamente 20% do território do país. No Cerrado vive um grande número de espécies que só ocorrem ali, as chamadas espécies endêmicas. Os Cerrados ocupam áreas elevadas do Planalto Central Brasileiro, sobre solo ácido e rico em alumínio, considerado de pouca utilidade econômica até meados do século 20. Durante seis meses o Cerrado torna-se verdejante devido às frequentes chuvas que vão de outubro a abril, e nos meses restantes torna-se pronunciadamente seco, suscetível a queimadas. O Cerrado possui alta densidade de nascentes que alimentam ao norte a Bacia Amazônica, ao sul aBacia Platina e a leste a Bacia do São Francisco. É preciso sensibilidade para se deixar encantar por essa paisagem brasileira tão diferente de biomas celebrados como a Amazônia ou Mata Atlântica, mas não menos importante. Devido a sua formação aberta, sua topografia propícia à mecanização, o Cerrado foi vorazmente incorporado ao processo de expansão do agronegócio brasileiro, tornando-se um grande fornecedor de soja, milho, algodão, cana, carne e leite para o mercado mundial. Conciliar o uso econômico com a conservação é um desafio notoriamente exposto no Cerrado. Essa ávida ocupação pela agricultura modernizada, altamente consumidora de fertilizantes e agrotóxicos, além das frequentes queimadas propositais e da existência de poucas áreas protegidas em reservas, fez com que grande parte da vegetação nativa fosse perdida, levando o Cerrado à lista de hotspots, uma das 25 regiões prioritárias para a conserva- ção em todo o mundo. O sucesso econômico do agronegócio nesta fronteira agrícola estimulou a migração de enormes contingentes populacionais para a região e proporcionou o surgimento de inúmeros núcleos urbanos e a expansão EaD 33 Formação e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira dos já existentes. Existem grandes demandas por infraestrutura de transporte e armazenagem de grãos ou por processamento dos insumos necessários ou das matérias-primas produzidas (Disponível em: <http://www.biomasdobrasil. com/>. Acesso em: jan. 2014). A Caatinga é o bioma mais árido do Brasil, palco de numerosas histórias peculiares, como a Revolta de Canudos e o cangaço. Esse bioma com aproxi- madamente 840.000 km2, cobre cerca de 10% do território nacional e ocorre no interior do Nordeste brasileiro. Caatinga em tupi quer dizer “mata branca”, resultado da vegetação que perde a folhagem e frequentemente é coberta com a poeira branca do solo argiloso e seco levada pelo vento. A Caatinga é o único bioma exclusivamente incluso em território nacional. Apesar do clima semiárido predominante na região, a paisagem da Caatinga é variada e abriga formações diversas. A vegetação da região é classificada como savana estépica e suas plantas desenvolveram adaptações únicas para enfrentar a aridez da re- gião. As árvores decíduas perdem todas as folhas durante a seca e são comuns as cactáceas e bromélias. Cortada por dois grandes rios caudalosos e perenes (o Parnaíba e o São Francisco) e outros rios menores temporários, grande parte da água usada pelas pessoas que habitam a Caatinga vem de açudes. Isso é importante especialmente porque ali chove menos de 600 mm anuais, em geral nos meses iniciais do ano. Os solos pobres e pedregosos fazem da Caatinga um bioma frágil. A mineração tem resultado em destruição em ritmo tão acelerado quanto ao da Amazônia. Historicamente tem sido palco das mais variadas políticas públicas com objetivo de combater ou mitigar os efeitos da seca ou de atender aos habitantes do sertão nordestino, como é o caso das ações promovidas pela Sudene, por exemplo. Recentemente tornou-se foco de um dos maiores e mais polêmicos projetos de desenvolvimento regional e integração nacional, que é o Projeto de Transposição de parte das águas do Rio São Francisco para a região do semiárido com o objetivo de gerar soluções perenes e alternativas inovado- ras para o desenvolvimento da população local (Disponível em: <http://www. biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014). O Bioma Pampa compreende grandes extensões de campos suavemente ondulados cobertos de capim verde, entremeadas por manchas de solo mais fértil que sustentam uma vegetação mais alta contendo principalmente espinilho e pés de erva-mate. Esse bioma com visual de estepe ocupa o extremo sul do país estendendo-se por mais de 170.000 km². Os Pampas, ou Campos Sulinos, estão adaptados ao clima mais frio do Brasil, com temperaturas eventuais abaixo de zero durante o inverno. Estima-se a existência de 3 mil espécies vegetais, das quais cerca de 400 seriam de gramíneas, com aptidão para alimentação de pecuária. No litoral, o banhado do Taim e as lagoas costeiras (como a Lagoa dos Patos) formam ambientes salobros, únicos no país. Esses banhados e lagoas abrigam espécies endêmicas e populações expressivas de aves aquáticas ou migratórias. A pecuária extensiva surgiu por circunstâncias históricas diretamente sobre os campos, ricos em gramíneas nativas. Posteriormente, o aperfeiçoamento da ati- EaD Vera Lúcia Trennepohl (Organizadora) 34 vidade exigiu a introdução de novas práticas de manejo do gado, contribuindo para que capins de outros países fossem introduzidos para servir de alimento ao gado e ali se estabelecessem, competindo por espaço com a vegetação nativa. O uso agrícola, especialmente pelo binômio trigo-soja no planalto e das lavouras de arroz nas várzeas da depressão central do Rio Grande do Sul, reduziu consideravelmente a área ocupada por esse bioma e, nas manchas de vegetação arbórea foi a exploração da madeira a principal causa de degradação. As unidades de conservação, em número reduzido no bioma, são o reduto final da paisagem há décadas cantada pelo gaúcho da campanha em seu folclore. A existência de projetos de desenvolvimento de grande porte e impactos relevantes no bioma foi motivo de forte polêmica nos anos recentes, como é o caso dos projetos de reflorestamento para produção de celulose. (Disponível em: <http://www. biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014). No Bioma Pantanal é onde fica mais evidente que a água é a base para toda a vida. A maior área continental periodicamente alagável do planeta, com cerca de 140.000 km², estende-se pelo território nacional, mas também pela Bolívia e Paraguai. O Pantanal é um imenso reservatório de água, passagem obrigatória de grande parte do fluxo que percorre a Bacia do Prata. O lento ciclo das cheias e vazantes, conhecido como pulso de inundação, cria um variado mosaico de paisagens. Baías, assim denominadas as lagoas pantaneiras, são os elementos mais peculiares da região. Elas compõem a paisagem com rios tortuosos, campos alagáveis, matas ciliares, capões de matas, salinas e riachos da planície (corixos), os quais formam os diferentes hábitats pantaneiros. Toda essa variedade de ambientes dominada pela água sustenta uma diversificada fauna de peixes, aves e mamíferos. O Pantanal também é importante ponto de parada de espécies de aves migratórias, como marrecos e maçaricos. Todos os habitantes do Pantanal têm sua vida marcada pelo eterno ciclo das águas, desde o dourado, um peixe de escamas, até o ribeirinho. Cheia de outubro a abril e seca no restante do ano forma um ciclo previsível com alto potencial turístico. O Pantanal é cercado por uma série de serras, é isso que o torna um reservatório de água a temperaturas quentes, uma concentração de vida, no entanto toda essa água chega ao Pantanal depois de transitar desde nascentes por toda a sua volta, especialmente as localizadas no Cerrado. Se não houver cuidados em relação a essas nascentes situadas a quilômetros de distância, a contaminação das águas por fertilizantes, agrotóxicos, esgotos urbanos, resíduos industriais ou outras formas, colocará em risco todo o ecossistema do Pantanal (Disponível em: <http://www.biomasdobrasil.com/>. Acesso em: jan. 2014). Existem ainda os Ambientes Costeiros. Esse conjunto de paisagens não recebe a designação de bioma por suas variadas características ecológicas, mas certamente merece atenção. Na faixa brasileira que acompanha os 8 mil qui- lômetros de litoral existem diversas paisagens, compondo os assim chamados Ambientes Costeiros, com praias, costões rochosos, recifes de coral, falésias, EaD 35 Formação e Desenvolvimento
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