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TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 12 2. Engenharia e Gestão de Tráfego 2.1. Conceituação Sob o ponto de vista do modal rodoviário, a Engenharia de Tráfego é a área do conhecimento que tem como objetos o planejamento, o projeto geométrico e a operação de tráfego em vias, redes, terminais, lotes lindeiros e as relações com os outros modos de transporte. A Engenharia de Tráfego tem como objetivo propiciar o movimento seguro, eficiente e conveniente de pessoas e bens (PIGNATARO, 1973). O Instituto de Engenheiros de Transportes (ITE) dos EUA apresenta a seguinte definição: “Engenharia de tráfego é o ramo da engenharia de transportes que se relaciona com o planejamento, desenho geométrico, e com as operações de tráfego de estradas e vias urbanas, suas redes, terminais e terrenos adjacentes, inclusive com a integração de todos os modos e tipos de transportes, visando proporcionar a movimentação segura, eficiente e conveniente de pessoas e mercadorias”. O aspecto que diferencia a Engenharia de Tráfego das demais engenharias é o envolvimento de fatores “não físicos” nos problemas que são enfrentados. Estes fatores são exemplificados com grande propriedade pelo comportamento humano dos motoristas e dos pedestres e suas inter-relações com a complexidade do ambiente. Para AZEVEDO (2005), a Engenharia de Tráfego seria “uma atividade técnica, no sentido de utilizar procedimentos racionais de base matemático-física, e política, no sentido de dirigir a aplicação dessas técnicas segundo os interesses(conflitantes) dos vários usuários que realizam a circulação na cidade”. Classicamente, os sistemas de tráfego são baseados em três pilares. Estes três pilares conhecidos como 3E’s (das iniciais dos termos originalmente em inglês) compreendem: engenharia (engineering), educação (education) e fiscalização (enforcement). FIG. 2.1 - Caráter multidisciplinar do tráfego urbano Estes três pilares, conforme apresentado na FIG. 2.1, podem ser assim definidos: Tráfego Engenharia FiscalizaçãoEducação TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 13 h) Engenharia: intimamente ligada à via e ao veículo, com o objetivo de transformar vias e veículos, de modo que eles sejam cada vez mais seguros; i) Educação: uma população instruída sobre a correta técnica de circulação, causas e conseqüências de acidentes, atitudes corretas no trânsito, certamente trará mais tranqüilidade e segurança para o trânsito de forma definitiva, mas lenta. Sabe-se que os efeitos da educação são demorados, mas a preocupação com essa matéria é tão grande que o CTB trata, especificamente, de educação para o trânsito nos seus artigos 74 a 79. j) Fiscalização: fiscalizar e aplicar as penalidades previstas em lei são atividades complementares necessárias para manter a integridade do sistema. 2.2. Elementos dos Sistemas de Tráfego O Código de Trânsito Brasileiro, no art. 1o, § 1o, assim define “trânsito”: “Considera-se trânsito a utilização de vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga”. O art. 2o complementa o conceito ao definir que: “são vias terrestres urbanas e rurais as ruas, as avenidas, os logradouros, os caminhos, as passagens, as estradas e as rodovias, que terão seu uso regulamentado pelo órgão ou entidade com circunscrição sobre elas, de acordo com as peculiaridades locais e circunstâncias especiais”. No parágrafo único do mesmo artigo, acrescenta que “para os efeitos deste Código, são consideradas vias terrestres as praias abertas à circulação pública e as vias internas pertencentes aos condomínios constituídos por unidades autônomas”. Tradicionalmente, a literatura relativa à Engenharia de tráfego define três elementos componentes dos sistemas: o usuário, o veículo e a via. 2.2.1. O Usuário São usuários dos sistemas de tráfego os ocupantes dos veículos, guiando-os ou não, e os pedestres, principalmente. Uma abordagem mais ampla incluiria também as demais pessoas que de alguma forma são afetadas pela operação do tráfego. Geralmente, se destina uma atenção especial aos motoristas, que são os usuários mais ativos (e mais perigosos) do sistema. Um aspecto de significativa importância e que tem fundamental impacto sobre a segurança de todo o sistema de tráfego é o tempo de reação. O tempo de reação pode ser determinado pelo TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 14 tempo decorrido entre a ocorrência do estímulo e a materialização da reação do usuário. Este tempo de reação pode ser decomposto em quatro parcelas e conhecido pelo acrônimo PIEV, originado dos termos em inglês: percepção (perception), identificação (identification ou intellection), decisão (emotion ou judgment) e ação (volition ou reaction). Para um desempenho eficiente e seguro dos sistemas de tráfego, deve-se minimizar o tempo de PIEV do usuário e, simultaneamente, maximizar o tempo disponível para a sua reação. 2.2.2. O Veículo Os sistemas de tráfego incluem todos os tipos de veículo: automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, triciclos, bicicletas, carroças, bondes, etc.. Entretanto, é muito complexa a tarefa de estudar o veículo de uma forma tão abrangente. Para a imensa maioria dos estudos de tráfego é considerada suficiente a adoção de uma unidade veicular padrão, para a qual são convertidos os outros tipos de veículo através de fatores de conversão apropriados. Esta unidade é simbolizada por ucp (unidade de carro de passeio) que em qualquer situação corresponde ao automóvel. Por isso, os aspectos relativos ao veículo que são comentados a seguir dirão respeito basicamente ao automóvel. 2.2.3. A Via A via será entendida aqui como o espaço destinado à circulação. O conjunto estruturado de vias que servem a uma determinada região é conhecido como sistema viário e tem como funções básicas assegurar mobilidade e acessibilidade ao usuário. O sistema viário urbano, também chamado de rede viária urbana, é formado de dois grupos distintos de componentes básicos, ou sejam: os nós e as ligações. As ligações são os trechos, subtrechos ou segmentos das vias que interligam os nós (ou interseções, cruzamentos, passagem de nível, etc.), cujas características físicas, funcionais e operacionais podem ou não ser constantes ou homogêneas ao longo da sua extensão. Este grupo viário entre interseções compreende, geralmente, os seguintes elementos: pista de rolamento, canteiro central, calçadas, ciclovia, baias para ônibus e estacionamento, sendo que, cada uma destas, apresenta funções bem definidas. Os sistemas viários ocupam grande parte dos espaços urbanos não edificados, tendo TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 15 destacadas funções. Servem de base para o movimento de pedestres, ciclistas e de todas as modalidades de veículos motorizados, podem vir a criar condições para uma vida saudável, dentre inúmeras outras funções relevantes para a sociedade. Idealmente, o sistema viário urbano deveria ser um sistema organizado e bem definido, ou seja, cada via tem uma função específica. Observa-se que a função de cada via e suas características operacionais estão fortemente ligadas. Neste contexto, cada viagem é fundamentada em uma origem e um destino, tornando-a mais apropriada a certos tipos de via e exigindo a oferta de um nível de serviço mínimo, de modo a proporcionar um deslocamento rápido, seguro e econômico (ARRUDA e MOREIRA, 1991). Os sistemas viários em geral podem ser classificados segundo diversos critérios, como:? quanto ao ambiente: urbano e rural; ? quanto à esfera administrativa: federal, estadual e municipal; ? classificação físico-operacional: fluxo ininterrupto e fluxo interrompido; e, ? classificação funcional: classificação que mais interessa ao planejamento de tráfego, determina a hierarquia do sistema viário e pode ter ligeiras variações. Segundo HUTCHINSON (1979) e AASHTO (1990), hierarquia funcional entre os tipos de vias, se refere tanto às suas características físicas, como também ao tipo de uso, ou seja: ? Vias expressas: promovem ligações com rapidez e segurança entre localidades distantes de uma região, normalmente de duplo sentido de tráfego e com canteiro central, possuem grande volume de tráfego, velocidade média de operação em torno de 80km/h e com acessos controlados; ? Vias arteriais: servem de ligação entre as vias expressas e as coletoras, ou distribuem o tráfego proveniente da via expressa pela cidade ou região, com menor volume de tráfego e velocidade máxima de 60km/h; ? Vias coletoras: fazem a ligação entre as vias arteriais e localidades vizinhas a baixa velocidade, penetrando ainda mais nas zonas residenciais, com velocidade permitida de até 40km/h; e, ? Vias locais: tráfego predominantemente local, promovem o acesso residencial ou a locais de trabalho, a baixa velocidade de 30km/h (no Brasil a velocidade é de 20km/h). Naturalmente, as situações específicas determinam o grau de subdivisão necessário na classificação funcional dos sistemas viários. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 16 A FIG. 2.2 mostra a proporção dos serviços ofertados pelas três categorias funcionais de vias comumente encontrados nos meios urbanos, em termos de mobilidade e acessibilidade. Fonte: AASHTO apud SILVA (2001b) FIG. 2.2 - Proporção dos serviços oferecidos pelas categorias de vias Quanto mais alto estiver na hierarquia funcional, maior a função do sistema viário de permitir mobilidade; quanto mais baixo, maior a função de oferecer acessibilidade. A hierarquização nestas três categorias costuma ser insuficiente para classificar os sistemas viários. A complexidade destes normalmente exige a subdivisão das categorias. 2.3. Conflitos e Segurança Viária 2.3.1. Tipos de Conflitos Os conflitos existentes nos espaços urbanos podem ser classificados em: a) Físicos ? Acomodação de movimentos conflitantes, dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço. b) Sociais i. Usuário de Transporte Público X Proprietário de Automóvel: ? O primeiro necessita de transporte público eficiente, seguro e barato (tratamento prioritário para o transporte coletivo); ? O segundo deseja o máximo de mobilidade possível, dentro do seu veículo (investimentos em ampliação do sistema viário). ii. Pedestre X Motorista ? O primeiro deseja conforto e segurança na sua locomoção; ? O segundo deseja rapidez; ? Isso leva a conflitos. Ex: semáforos em áreas de grande movimento de veículos e pedestres. MOBILIDADE ACESSIBILIDADE Sistema Arterial Sistema Coletor Sistema Local TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 17 iii. Morador X Motorista ? O morador deseja uma alta qualidade de vida segurança, ausência de poluição, etc. ? O motorista quer rapidez; ? Isso gera conflito. Ex: vias residenciais que recebem tráfego de passagem. iv. Proprietário de estabelecimento comercial X motorista X passageiro de ônibus ? O primeiro deseja o máximo de acessibilidade (facilidade de estacionamento, principalmente); ? O segundo deseja fluidez nos seus deslocamentos através da eliminação de atritos (veículos estacionados, por exemplo); ? Este segundo pode ainda querer estacionar em frente à loja (coincidência com o desejo do comerciante); ? Se os clientes forem pessoas que utilizam transporte coletivo, o comerciante desejará melhor acessibilidade deste serviço; ? Existem ainda as necessidades de carga e descarga. c) Derivados v. Movimento X Qualidade de Vida ? A realização de movimentos gera poluição sonora, atmosférica, visual, dentre outras; ? Otimização do movimento através de maior velocidade podendo acarretar em problemas de segurança; ? Otimização do movimento por de caminhos mais diretos: problemas com o uso do solo. vi. Movimento X Acessibilidade ? Posições conflitantes: qualquer melhoria de uma delas, prejudica a outra, como foi o caso citado do estacionamento X circulação; ? Não é possível atender a todos ao mesmo tempo: estabelecimento de prioridades sociais (investimentos, enfoques) e de utilização do espaço (técnicas de engenharia de tráfego). 2.3.2. Natureza dos Conflitos Os conflitos surgem quando duas correntes de tráfego, em um mesmo nível, divergem, convergem ou cruzam, havendo um perigo potencial de colisões. A situação de conflito afeta a operação do tráfego, reduzindo as suas velocidades e interferindo nos aspectos de capacidade e segurança da interseção e sua área de influência. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 18 Número de conflitos é função: ? Número de ligações: aumenta muito com 5 ou mais ligações ? Tipo de operação das vias: mão dupla ou mão única ? Número de faixas nas aproximações ? Volume de tráfego ? Tipo de controle 2.3.3. Tipo e Gravidade dos Acidentes Deve-se procurar reduzir o número e a gravidade dos acidentes. A redução da gravidade é sempre mais importante. A severidade é função das diferenças nas velocidades e nos tamanhos das unidades de tráfego (veículo x veículo ou veículo x pedestre) envolvidas na colisão. No caso de acidentes entre veículos a gravidade vai ser função das diferenças de tamanho, mas também da velocidade relativa e ângulo de colisão. 2.3.4. Pólos Geradores de Tráfego Nas últimas décadas, os problemas de trânsito gerados por certas atividades ou por sua concentração, passaram a chamar a atenção da população. O aumento significativo da utilização do espaço viário público na via foi ocasionado pelo crescente número de veículos em circulação e principalmente, pela: ? verticalização de certos tipos de uso do solo (conjuntos residenciais, conjunto de escritórios, "shopping centers"); ? concentração dos mesmos tipos de uso (restaurantes, discotecas, lojas de mesmos produtos, várias escolas, etc.); ? localização inadequada de edificações (escolas, cursinhos, academias de ginástica e outros usos em vias principais ou secundárias importantes). Para ser possível uma atuação no controle do processo de transformação urbana x tráfego, é necessário que sejam estabelecidos conceitos uniformes no tratamento do assunto. Assim, pode-se considerar Pólo Gerador de Tráfego -PGT, o empreendimento, que atrai ou produz grande número de viagens de veículos e de pedestres, ocasionando alterações negativas na circulação junto a ele e, as vezes, até na região de sua influência, prejudicando sua acessibilidade, podendo criar, ainda, situações de insegurança aos veículos e pedestres. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 19 Além disso, possui a necessidade de espaço para estacionamento (na via e fora da via), carga e descarga de mercadorias (de preferência só fora da via) e embarque e desembarque de pessoas (na via e fora dela). Os principais objetivos da análise do impacto de PGTs são: ? Reduzir, o impacto ocasionado no tráfego de passagem; ? Viabilizar internamente à edificação os espaços necessários para o estacionamento, a carga e descarga de mercadorias; ? E viabilizar espaços seguros para os pedestres circulares dentro e fora da edificação. O art. 93 do CTB destaca que nenhum projetode edificação que possa transformar-se em pólo atrativo de trânsito poderá ser aprovado sem prévia anuência do órgão ou entidade com circunscrição sobre a via e sem que do projeto conste área para estacionamento e indicação das vias de acesso adequadas. Para que seja possível atender as exigências do Código, é necessária a criação de legislação específica municipal, que estabeleça os parâmetros de análise com relação a: ? Área construída ? Área de aproveitamento ? Acessos ? Recuos ? Taxa de ocupação e coeficiente de aproveitamento do lote ? Declividade e raios horizontais das rampas ? Espaço para estacionamento, inclusive especiais (motos, deficientes) ? Vias internas de circulação ? Pátios para carga e descarga de mercadorias Por outro lado, é de fundamental importância que sejam estabelecidos indicadores para a análise de: ? Largura das vias de acesso ? Intensidade do tráfego existente de veículos e pedestres, projetando para o futuro. ? Sinalização existente ? Existência de transporte coletivo ? Identificação de pontos críticos TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 20 2.4. Segurança Viária Estatísticas do DENATRAN indicam a ocorrência de cerca de 300 mil acidentes anuais, dos quais resultam cerca de 30 mil mortos e 350 mil feridos. Estudos recentes do IPEA (IPEA, ANTP, 2003), com objetivo de identificar e mensurar os custos econômicos e sociais dos acidentes de trânsito nas aglomerações urbanas, apontam um custo social da ordem de R$ 5,3 bilhões por ano. Se considerados, por projeção, também os acidentes em rodovias, estima-se um custo anual total de cerca de R$ 10 bilhões. As estatísticas de acidentes e a construção de índices são importantes para a identificação dos locais/regiões mais críticos, de forma a se priorizar recursos e investimentos visando a redução ou mesmo a eliminação dos riscos, para análise de tendências ao longo do tempo e se verificar se as ações saneadoras estão sendo eficazes, assim como para realização de estudos comparativos entre localidades, regiões e países. 2.4.1. Fatores de Segurança Desde a década de 40, que engenheiros e cientistas comportamentais tem trabalhado para compreender e aperfeiçoar o projeto de sistemas “Homem-Máquina”. As pesquisas têm ajudado os engenheiros de transportes a compreender como os seres humanos (Operadores, Passageiros ou Pedestres) interagem com os veículos e os equipamentos de transportes que utilizam. TAB. 2.1 – Fatores de segurança viária Situação / Fator Pré-impacto No impacto Pós-impacto Humano Treinamento Conhecimento Habilidade Motivações e Atitudes Dispositivos de Proteção (Capacete, Cinto e Air bag). Serviços de Primeiro Socorros Veículo Projeto do Sistema de Controle Projeto dos Sistemas de Conforto Projeto do Sistema de Informação Leis e Policiamento Sistema de Proteção ao Ocupante. Projeto do Sistema de Controle. Meio Ambiente Geometria Policiamento Sistema de Controle Clima e Luminosidade Condições da Superfície Apelo Informativo. Geometria e dispositivos de absorção de energia Geometria para facilitar o acesso de emergência. Limpeza dos estilhaços e partes dos veículos acidentados. Esquemas de tráfego e reabertura da via. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 21 O engenheiro de tráfego não deve preocupar-se com as características do usuário ou veículo “médio”, mas sondar “limites” e observá-los ao desenvolver os esquemas de aumento de fluidez e segurança. 2.4.2. Taxas comparativas de acidentes Alguns parâmetros são utilizados como indicadores da magnitude do problema de segurança. A comparação desses índices entre os diversos países e cidades vai mostrar em que estágio eles se encontram. Esses índices devem ser analisados com cautela em razão das diferenças nos volumes e tipos de tráfego, número de veículos, densidade da população e outros fatores. Portanto, a comparação deve ser feita entre comunidades de características semelhantes. Os índices mais empregados são aqueles que relacionam o número de mortes com a população, com a frota registrada e com a movimentação dos veículos. 2.4.2.1. Acidentes de Trânsito são evitáveis A maior parte da sociedade se torna dependente do veículo motorizado para se mover; e está disposta a pagar alto preço por isto. E admitido geralmente que as colisões e ferimentos são um inevitável subproduto de locomoção. Ao contrário dos acidentes aéreos e ferroviários, que ocasionam uma publicidade altamente dramática, os acidentes de trânsito mostram a mortalidade humana gradualmente, mas ocasionam maiores perdas de vida. Eles são quase sempre resultantes do comportamento humano, de uma postura que ignora a importância do desenho do veículo e de fatores ambientais que determinam as colisões e os danos físicos e materiais. É de maior importância reconhecer que os acidentes de trânsito e os danos físicos e materiais são preveníveis, não inevitáveis. O objetivo "prevenção" pode ser conseguido mais efetivamente pela integração e esforços do Governo, indústria, comunidade acadêmica e outros, como engenharia, manutenção de infra- estrutura, educação, fiscalização, cuidado com a saúde e mídia. A natureza complexa dos acidentes de trânsito determina a adoção de métodos preventivos, que são abrangentes e multidisciplinares, onde o impacto e a importância de cada ação devem ser realçados. Compreendendo a dinâmica dos acidentes de trânsito e a natureza interativa dos métodos de intervenção, poderemos melhor desenvolver uma estratégia efetiva de prevenção. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 22 2.4.2.2. Banco de Dados A coleta, organização e a divulgação de dados de acidentes de trânsito são fatores primordiais para que os esforços envidados em prol da segurança de trânsito, tanto no âmbito governamental quanto no meio social, obtenham sucesso. São esses dados que orientam as soluções de engenharia de tráfego, a implantação de inovações tecnológicas e a atuação na sensibilização e mobilização da sociedade. Assim, a informação é a base de todo o processo, sendo, portanto, necessário que se saiba como captá-la, depurá-la, organizá-la, armazená-la, controlá-la, analisá-la e divulgá-la, formando-se, então, um sistema de gerenciamento da informação. Os dados devem ser coletados rotineiramente e a base de informações conter a maior quantidade possível de detalhes. As informações mais importantes a serem coletadas são as seguintes: ? Localização; data; condições meteorológicas ? Dados geométricos; dados operacionais ? Iluminação (somente acidentes noturnos} ? Dados pessoais dos condutores; dados do veículo; dados das vítimas ? Dados sobre o acidente As informações sobre acidentes de trânsito são obtidas no registro do acidente, feito no Boletim de Ocorrência (BO); portanto, é necessário que esse boletim seja preenchido corretamente e contenha um conjunto de informações básicas coletadas de forma padronizada. O DENATRAN, por meio da Portaria n° 59, de 15 setembro de 2000, instituiu o Manual de Procedimentos do Sistema Nacional de Estatísticas de Acidentes de Trânsito -SINET com o objetivo de uniformizar o processo de coleta de dados, estabelecendo normas, procedimentos e definições que servem para orientar os usuários e possibilitam o aperfeiçoamento das estatísticas de acidentes de trânsito, definindo responsabilidade para todos os órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito. 2.4.2.3. Estratégia para prevenção e reduçãodos acidentes A elaboração de uma estratégia efetiva para prevenção e redução de acidentes requer um rigoroso entendimento dos fatores contribuintes referentes a uma comunidade específica. TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 23 É uma abordagem similar às adotadas em políticas de saúde pública. ? Primeiro: a chave para controle do acidente está na localização de suas condições necessárias e na redução ou eliminação de uma ou várias condições. ? Segundo: os programas que reduzem ou eliminam as condições do acidente sem tentar mudar o comportamento de cada indivíduo são mais bem sucedidas do que os que se dirigem ao controle do comportamento. Mesmo considerando o fato de que o erro humano é provavelmente o fator, contribuinte mais importante na maioria dos acidentes, existem poucas dúvidas que, um bom planejamento e melhores projetos influenciam o comportamento do usuário de forma levá-lo a não cometer erros e mesmo que esses erros ocorram, as conseqüências são minimizadas. Engenharia e planejamento contribuem para a melhoria da segurança viária de duas formas distintas: ? Prevenção de acidentes: resultados de alto padrão de projeto e bom planejamento de novos sistemas viários e, ? Redução de acidentes: resultado de medidas corretivas para os problemas encontrados nas vias existentes. 2.4.2.4. Auditoria de Segurança Viária Em qualquer cidade podem ser mencionados exemplos recentes de intervenções no sistema viário existente e, abertura de novas vias, que requerem imediata ação no sentido de minimizar os problemas de segurança criados. Esse trabalho posterior poderia perfeitamente ser economizado, em sentido amplo, se uma análise apurada fosse feita na fase de planejamento, geração de idéias e desenvolvimento do projeto. Correções posteriores de geometria, iluminação, drenagem, pontos de travessia de pedestres, localização de obstáculos laterais, má visibilidade, tem custo financeiro muito maior, além da possibilidade de ocorrência de acidentes enquanto durar o problema. Um procedimento importante na avaliação geral da segurança de trânsito é a realização da "auditoria" de segurança viária. Auditoria de Segurança Viária é um termo técnico para um procedimento formal de se checar propostas que afetem o desempenho da via no que se refere ao seu potencial de acidentes. Genericamente, a Auditoria de Segurança Viária é definida como "... Um método sistemático de se checar os aspectos de segurança nos novos projetos referentes ao sistema viário". TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 24 A Norma Britânica HD 19/90 define Auditoria de Segurança Viária como sendo "... A avaliação dos elementos físicos e suas interações que possuem relação direta com o usuário da via, bem como a de outros que serão envolvidos com a execução do projeto, de modo a prever e detectar potenciais de risco à segurança após a abertura da nova via ao tráfego". 2.4.3. Princípios Gerais de Segurança ? Eliminar o maior número possível de movimentos conflitantes ? Facilitar a tomada de decisão do usuário ? Minimizar a possibilidade dos usuários assumirem riscos ? Reduzir o tempo que os usuários ficam expostos ao perigo ? Induzir manobras segundo velocidades e ângulos favoráveis ? Separar tráfegos com características e necessidades diferentes 2.4.3.1. Segurança – Controle de Velocidade O controle da velocidade nas vias e interseções urbanas não semaforizadas tem o objetivo principal de melhorar a segurança, reduzindo a ocorrência de acidentes. A importância deste controle no Brasil justifica-se pelos elevados índices de acidentes de trânsito, sendo o excesso de velocidade uma das causas principais. O problema é tão grave que nas grandes cidades os pedestres correspondem a 60 a 80% dos mortos no trânsito (ANTP, 1997). Em áreas com grande quantidade de acidentes, quando não é possível fazer a fiscalização, faz- se necessário adotar outra solução. Esta pode ser alteração física da via (tipo de pavimento, alinhamento vertical ou horizontal) ou a instalação de dispositivos eletrônicos de controle de velocidade. Com os dispositivos de controle de velocidade procura-se adaptar a velocidade dos veículos às condições do ambiente nos quais circulam, já que a velocidade que os motoristas escolhem depende principalmente das condições da pista e da fiscalização. Quando esta última for deficiente, pistas muito largas e confortáveis incitarão altas velocidades, normalmente incompatíveis com a segurança dos pedestres e demais usuários. Estes dispositivos são especialmente importantes nas proximidades de locais de travessia de pedestres – escolas, hospitais, centros de compras, devido a grande incidência de conflitos TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 25 nestes locais, além de pontos onde, comprovadamente, exista grande número de incidentes provocados pelo excesso de velocidade. É de suma importância que se promovam programas de segurança de trânsito, com o envolvimento de todos usuários. Este envolvimento é essencial para vencer as resistências iniciais, que identificam o controle de velocidade com abuso de autoridade e cerceamento da liberdade de circulação.Maiores informações a cerca dos dispositivos eletrônicos de controle de velocidade no item 4.4, página 67. 2.4.4. Medidas de Segurança Muitas experiências mostram que é perfeitamente possível levar os índices de segurança para níveis aceitáveis. Ações eficazes e permanentes, concentradas nos grupos de risco, nas infrações mais freqüentes e nos locais de maior risco, constituem-se no caminho a ser percorrido. Um bom programa de segurança pode ser elaborado com medidas apresentadas em seguida: a) Gerenciamento de Velocidade: A quantidade e conseqüência dos acidentes estão diretamente ligados ao padrão de velocidade adotado pelos usuários. O excesso de velocidade deve ser inibido com rigor. Técnicas de fiscalização devem ser empregadas com escolha de locais e horários adequados. A maior parte do esforço de fiscalização deve ser empregado no controle da velocidade. A comunidade deve estar informada dos motivos desse trabalho e dos resultados. b) Respeito ao Semáforo: Os acidentes em cruzamentos semaforizados podem ser sensivelmente reduzidos inibindo o desrespeito ao semáforo através de fiscalização. Câmeras Fotográficas podem ser utilizadas eficazmente. c) Utilização dos dispositivos de segurança: Fiscalizar a utilização do cinto de segurança pelos ocupantes de veículos e dá capacete pelos motociclistas contribui para redução significativa da gravidade dos acidentes. Essa fiscalização deve ser acompanhada de permanente medidas de conscientização e informação. d) Controlar conflitos em Interseções: O risco de acidentes em uma interseção aumenta com o crescimento do volume que por ela passa. É fundamental que a preferência de passagem esteja definida (PARE). A semaforização deve ser criteriosa e o dimensionamento dos ciclos o mais apropriado possível. A implantação de "mini rotatórias" tem sido utilizada com excelentes resultados. e) Remoção e Proteção de Obstáculos Lindeiros: Os acidentes fatais envolvendo apenas um veículo são relativamente muito numerosos. Os choques com objetos fixos como colunas, TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 26 postes, árvores, muros e outros contribuem com quase 30% dos acidentes fatais com ocupantes de veículos. A remoção ou proteção desses obstáculos constituem- se em medidas salutares de redução de acidentes. f) Proteção aos Pedestres: Os atropelamentos são observados emtodas grandes cidades do Brasil. Constituem-se no maior problema de segurança viária dos grandes centros urbanos brasileiros. As estatísticas referentes a esses acidentes já destacam o pedestre, vítima de atropelamento como o elemento mais vulnerável no trânsito. Existem locais onde a incidência de atropelamentos é maior que são o "entorno" dos pólos geradores de pedestres tais como: centro de compras, terminais de transportes, pontos de ônibus, hospitais e templos religiosos. A travessia é extremamente difícil em vias largas que possibilitam velocidades altas. No entanto, a queda de um pedestre na calçada ou na própria via, sem a participação direta ou indireta de um veículo, não é considerada como um acidente de trânsito, ainda que a queda tenha ocorrido em razão de um defeito na calçada ou na via. Segundo pesquisas origem-destino realizadas em algumas cidades brasileiras, mais de 30% dos deslocamentos realizados em área urbana são feitos a pé. A fim de conhecer a importância desse fenômeno, o estudo feito pelo IPEA (2GO3) realizou pesquisa domiciliar em 354 domicílios da aglomeração urbana de São Paulo, totalizando 1426 moradores entrevistados para identificar a freqüência das quedas e os seus custos. A pesquisa realizada na Aglomeração Urbana de São Paulo revelou 9 quedas por grupo de mil habitantes, a um custo médio em torno de R$2,5 mil por queda. Embora os valores encontrados estejam sujeitos a variações significativas, dado o pequeno número de casos identificados, a pesquisa mostra a importância da formulação específica de políticas e projetos voltados para a segurança de pedestres, principais vítimas dos acidentes de trânsito -tanto por atropelamentos como por quedas -através da melhoria de calçadas, da sinalização, implantação de passarelas e faixas de travessia. g) Travessia de Escolares: A criação de brigadas voluntárias com apoio e incentivo dos órgãos de trânsito contribuem para redução do risco na travessia dos escolares como também na formação da cultura de segurança. h) Locais Críticos: Denominam-se locais críticos aqueles da malha viária que, em comparação com um critério estabelecido, apresentam padrões de acidentes iguais ou superiores à referência indicada. Os locais mais críticos são corretamente denominados de "pontos- negros". A seguir, serão apresentadas algumas considerações adicionais para a identificação dos locais críticos de acidentes de trânsito: Pode-se associar a um local um alto padrão de risco devido às suas características geométricas e operacionais sem que haja ocorrências em número e/ou severidade correspondentes a essa expectativa. Este fenômeno é atribuído TRÁFEGO URBANO – Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia – UFMG 27 ao comportamento cauteloso dos usuários diante do conhecimento dos riscos a que estão expostos; Em áreas urbanas, a maioria dos acidentes ocorre em interseções; É possível dividir uma lista de locais críticos em locais "fáceis" e locais "complexos", em função do porte da intervenção requerida. Correntemente, os locais "fáceis" demandam soluções de engenharia simples e de baixo custo e apresentam elevado retorno econômico, enquanto os locais "complexos" normalmente exigem soluções de alto custo com retorno econômico quase sempre reduzido. A análise de locais com incidência de acidentes pode, com medidas de baixo custo, reduzir significativamente o número de acidentes. Mas deve-se observar que, no tratamento de um tipo de acidente, determinada medida de engenharia pode produzir os efeitos esperados num dado local e em outro nem tanto, ou mesmo nenhum resultado. i) Iluminação: A quantidade de acidentes noturnos pode ser reduzida em até 30% com melhoria da iluminação. j) Iluminação das faixas de Travessia de pedestres: Os picos de atropelamentos em São Paulo ocorrem no período noturno. Esta concentração de atropelamentos a noite é facilitada pela deficiência de iluminação pública, já que os pedestres ficam menos visíveis para os motoristas. E a existência de uma faixa bem iluminada na via faz co,m que as pessoas naturalmente a utilizem, concentrando assim os trajetos de travessia em um único lugar, mais seguro. Após a implantação da iluminação de diversas faixas de pedestres foi realizada uma análise estatística da redução do número de atropelamentos antes/depois da implantação. E o que se verificou foi que os resultados foram extremamente positivos. Houve 28 atropelamentos noturnos durante o ano anterior à iluminação e apenas 14 no ano posterior, representando uma expressiva redução de 50% (ANTP, 1997). k) I) Comunicação e Informação: Os objetivos e benefícios a serem conseguidos precisam ser informados à comunidade para reduzir as resistências à mudanças de comportamento, aceitação. das penalidades e colabora,ção na implantação de medidas para melhoria da segurança.
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