Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL 3ª SEMANA LUZIANE KLITZEKE DE OLIVEIRA 2 ALFABETIZANDO Quem se responsabiliza pelas crianças que estão na escola e não estão aprendendo? Vivemos um momento importante na educação brasileira, porque de mudança, e não sem tempo. Hoje, os esforços de todos os bem-intencionados organizam-se da maneira que podem para combater uma cultura que no último meio século dizimou milhões de crianças brasileiras: a cultura da repetência. Mas enfrentamos, como em todos os grandes movimentos de mudança, armadilhas que, se não forem percebidas, atrasarão o avanço que estamos tentando fazer em direção a uma educação eficiente e de boa qualidade para todos. Uma dessas armadilhas consiste em acreditar que, engajados na nova e boa palavra de ordem – “o aluno não deve ser reprovado”, os professores passarão a aprová-lo, enviando-o para a série seguinte munido de todas as competências necessárias para cursá-la com sucesso. Como se até então não o fizessem simplesmente por descaso com seu próprio trabalho, ou por acreditarem que professor bom é o que reprova. Essa situação costuma ser mais dramática 3 no contexto das primeiras séries do Ensino Fundamental, que é quando são tomadas decisões de importância vital: se o aluno aprende a ler e a escrever nos dois primeiros anos e será promovido, ou se ficará retido ali, ano após ano, até desistir da escola; se, mesmo sem aprender, será promovido e engrossará o número dos que, cada vez mais, chegam analfabetos à 4ª série; se, mesmo precariamente alfabetizados e sem nenhuma competência para compreender textos mais complexos, classes inteiras de 4ª série iniciarão o segmento da 5ª à 8ª séries para fracassar diante da necessidade de aprender por meio da leitura. Vemos, hoje, a enorme dificuldade que os professores têm de verificar o que os alunos já sabem e o que não sabem. Há alunos que produzem escritas silábico-alfabéticas e alfabéticas na 1ª série, no início do ano, e que poderiam perfeitamente acompanhar uma 2ª série, pois podem ler e escrever, ainda que com precariedade, mas ficam retidos porque os professores não tiveram condições de avaliá-los adequadamente e acabaram utilizando indicadores como “letra bonita” ou “caderno bem- feito”. Quando o professor trabalha com esse tipo de indicador, 4 até mesmo avanços na aprendizagem acabam prejudicando o aluno. Por exemplo, quando o aluno aprende a ler, é comum que ele comece a “errar” na cópia. Isto é, deixa de copiar letra por letra e começa a ler e a escrever grandes blocos de palavras, em geral unidades de sentido, o que faz com que cometa erros de ortografia ou escreva palavras grudadas. Tal fato, que é na verdade indicador de progresso, acaba sendo interpretado como regressão, pois o professor não tem clara a diferença entre copiar e escrever. Na nossa cultura, a produção de multi-repetentes em massa decorre da visão de que o aluno é sempre responsável por sua aprendizagem. Essa maneira de olhar para a questão do fracasso escolar, embora não produza diretamente a repetência maciça, é certamente responsável pela aceitação institucional do fenômeno, por sua naturalização. Tanto que, quando se trata de crianças de apenas sete anos, consideradas jovens demais para tanta responsabilidade, a suposta falta de empenho é transferida para a família. 5 A despeito de todas as boas intenções, o atual esforço de transformação da educação brasileira será sugado pelo buraco negro da nossa incapacidade de alfabetizar os alunos no início da escolaridade obrigatória (na verdade, o processo de alfabetização começa bem antes e deveria estar presente na Educação Infantil, como costuma acontecer com os filhos da elite). Prova disso é que, para desespero dos que sabem para onde isso sempre nos tem levado, estamos assistindo à transformação da generosa ideia de progressão continuada nessa perversão que está tornando-se conhecida como “promoção automática”. Atualmente, com a progressão continuada, as classes continuam divididas entre “os que vão” e “os que não vão”, mas com uma pequena diferença: antes eram os que “vão aprender e passar de ano e os que não vão aprender nem passar de ano” e agora todos “passam de ano”, porém só alguns “vão” aprender. RECEITA DE ALFABETIZAÇÃO Pegue uma criança de 6 anos e lave a bem. Enxágüe-a com cuidado, enrole-a num uniforme e coloque-a sentadinha na sala 6 de aula. Nas oito primeiras semanas, alimente-a com exercícios de prontidão. Na 9ª semana ponha uma cartilha nas mãos da criança. Tome cuidado para que ela não se contamine no contato com livros, jornais, revistas e outros perigosos materiais impressos. Abra a boca da criança e faça com que engula as vogais. Quando tiver digerido as vogais, mande-a mastigar, uma a uma, as palavras da cartilha. Cada palavra deve ser mastigada, no mínimo, 60 vezes, como na alimentação macrobiótica. Se houver dificuldade para engolir, separe as palavras em pedacinhos. Mantenha a criança em banho-maria durante quatro meses, fazendo exercícios de cópia. Em seguida, faça com que a criança engula algumas frases inteiras. Mexa com cuidado para não embolar. Ao fim do oitavo mês, espete a criança com um palito, ou melhor, aplique uma prova de leitura e verifique se ela devolve pelo menos 70% das palavras e frases engolidas. Se isso acontecer, considere a criança alfabetizada. Enrole-a num bonito papel de presente e despache-a para a série seguinte. Se a criança não devolver o que lhe foi dado para engolir, recomece 7 a receita desde o início, isto é, volte aos exercícios de prontidão. Repita a receita tantas vezes forem necessárias. Ao fim de três anos, embrulhe a criança em papel pardo e coloque um rótulo: aluno renitente. ALFABETIZAÇÃO SEM RECEITA Pegue uma criança de 6 anos ou mais, no estado em que estiver, suja ou limpa, e coloque a numa sala de aula onde existam muitas coisas escritas para olhar e examinar. Servem jornais, livros, revistas, embalagens, propaganda eleitoral, latas vazias, caixas de sabão, sacolas de supermercado, enfim, vários tipos de materiais que estiverem ao seu alcance. Converse com a turma, troque ideias sobre quem são vocês e as coisas de que gostam e não gostam. Escreva no quadro algumas frases que foram ditas e leia-as em voz alta. Peça às crianças que olhem os escritos que existem por aí, nas lojas, nos ônibus, nas ruas, na televisão. 8 Escreva algumas dessas coisas no quadro e leia-as para a turma. Deixe as crianças cortarem letras, palavras e frases dos jornais velhos e não esqueça de mandá-las limpar o chão depois, para não criar problema na escola. Todos os dias leia em voz alta alguma coisa interessante: historinha, poesia, notícia de jornal, anedota, letra de música, adivinhações. Mostre alguns tipos de coisas escritas que elas talvez não conheçam: um catálogo telefônico, um dicionário, um telegrama, uma carta, um bilhete, um livro de receitas de cozinha. Desafie as crianças a pensar sobre a escrita e pense você também. Quando elas estiverem escrevendo, deixe-as perguntar ou pedir ajuda ao colega. Não se apavore se uma criança estiver comendo letra: até hoje não houve caso de indigestão alfabética. Acalme a diretora se ela estiver alarmada. Invente sua própria cartilha. Use sua capacidade de observação para verificar o que funciona, qual o modo de ensinar que dá certo na sua turma.Leia e estude você também. 9 Obs.: Os textos “Receita de Alfabetização” e “Alfabetização sem receita” têm circulado em cursos para professores, às vezes, sem indicação da autoria. Foram publicados: no Boletim Informativo n.1, da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, jul/1989; pelo Boletim Carpe Diem, Centro de Aperfeiçoamento dos Profissionais de Educação, Prefeitura de Belo Horizonte, ano IV, n.4, janfev/1994. AS DIMENSÕES DO APRENDER A LER E A ESCREVER Durante muito tempo a alfabetização foi entendida como mera sistematização do B+A = BA, isto é, como a aquisição de um código fundado na relação entre fonemas e grafemas. Em uma sociedade constituída em grande parte por analfabetos e marcada por reduzidas práticas de leitura e escrita, a simples consciência fonológica que permitia aos sujeitos associar sons e letras para produzir/ interpretar palavras (ou frases curtas) parecia ser suficiente para diferenciar o alfabetizado do analfabeto. 10 Com o tempo, a superação do analfabetismo em massa e a crescente complexidade de nossas sociedades fazem surgir maiores e mais variadas práticas de uso da língua escrita. Tão fortes são os apelos que o mundo letrado exerce sobre as pessoas, que já não lhes basta a capacidade de desenhar letras ou decifrar o código da leitura. Seguindo a mesma trajetória dos países desenvolvidos, o final do Século XX impôs a praticamente todos os povos a exigência da língua escrita não mais como meta de conhecimento desejável, mas como verdadeira condição para a sobrevivência e a conquista da cidadania. Foi no contexto das grandes transformações culturais, sociais, políticas, econômicas e tecnológicas que o termo letramento surgiu, ampliando o sentido do que tradicionalmente se conhecia por “alfabetização”. Hoje, tão importante quanto conhecer o funcionamento do sistema de escrita é poder se engajar em práticas sociais letradas, respondendo aos inevitáveis apelos de uma cultura grafocêntrica. Mais do que expor a oposição entre os conceitos 11 de “alfabetização” e “letramento”, Magda Soares (In: Colello, 2004: 10910) valoriza o impacto qualitativo que este conjunto de práticas sociais representa para o sujeito, extrapolando a dimensão técnica e instrumental do puro domínio do sistema de escrita: “alfabetização é o processo pelo qual se adquire o domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou seja: o domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas – para exercer a arte e ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita denomina-se letramento, que implica habilidades várias, tais como: capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos.” Por isso, aprender a ler e a escrever implica não apenas o conhecimento das letras e do modo de decodificá-las (ou de associá-las), mas a possibilidade de usar esse conhecimento em benefício de formas de expressão e comunicação, possíveis, reconhecidas, necessárias e legítimas em um determinado contexto cultural. 12 O DESAFIO DE ENSINAR A LER E A ESCREVER Na análise da questão em como conciliar duas vertentes da língua em um único sistema de ensino, destacaremos dois embates: o conceitual e o ideológico. O EMBATE CONCEITUAL DA ALFABETIZAÇÃO E O LETRAMENTO Tendo em vista a independência e a interdependência entre alfabetização e letramento (processos paralelos, simultâneos ou não, mas que indiscutivelmente se complementam), alguns autores contestam a distinção de ambos os conceitos, defendendo um único e indissociável processo de aprendizagem. Em uma concepção progressista de “alfabetização”, o processo de alfabetização incorpora a experiência do letramento e este não passa de uma redundância em função de como o ensino da língua escrita já é concebido. É preciso conhecer o mérito teórico e conceitual de ambos os termos. Balizando o movimento pendular das propostas pedagógicas (não raro transformadas em modismos banais e mal assimiladas), a compreensão que hoje temos do fenômeno do letramento presta-se tanto para banir definitivamente as 13 práticas mecânicas de ensino instrumental, como para se repensar na especificidade da alfabetização. Na ambivalência dessa revolução conceitual, encontra-se o desafio dos educadores em face do ensino da língua escrita: o alfabetizar letrando. O EMBATE IDEOLÓGICO DA ALFABETIZAÇÃO E O LETRAMENTO Contagiada pela concepção de que o uso da escrita só é legítimo se atrelada ao padrão elitista da “norma culta” e que esta, por sua vez, pressupõe a compreensão de um inflexível funcionamento linguístico, a escola tradicional sempre pautou o ensino pela progressão ordenada de conhecimento: aprender a falar a língua dominante, assimilar as normas do sistema de escrita para, um dia (talvez nunca), fazer uso desse sistema em formas de manifestação previsíveis e valorizadas pela sociedade. Em síntese, uma prática reducionista pelo viés linguístico, e autoritária pelo significado político; uma metodologia etnocêntrica que, pela desconsideração do aluno, mais se presta a alimentar o quadro do fracasso escolar. 14 O SIGNIFICADO DO APRENDER A LER Ao permitir que as pessoas cultivem os hábitos de leitura e escrita e respondam aos apelos da cultura grafocêntrica, podendo inserir-se criticamente na sociedade, a aprendizagem da língua escrita deixa de ser uma questão estritamente pedagógica para alçar-se à esfera política, evidentemente pelo que representa o investimento na formação humana. A história do ensino no Brasil, a despeito de eventuais boas intenções e das “ilhas de excelência”, tem deixado rastros de um índice sempre inaceitável de analfabetismo agravado pelo quadro nacional de baixo letramento. A APRENDIZAGEM DA LEITURA Ler não deve se resumir a decifrar caracteres, distinguir símbolos e sinais, unir letras e emitir sons correspondentes: isso é muito mais um trabalho de discriminação visual e auditiva que antecede a leitura propriamente dita. Ler, além de decifrar, é interpretar a mensagem, atribuir a ela uma vivência pessoal e exteriorizá-la. 15 A leitura faz parte da rotina diária da criança e ela não espera receber instruções de outra pessoa para iniciá-la. Placas, letreiros, programas de TV, embalagens, marcas, títulos e todos os objetos constantes no seu dia-a-dia transmitem uma significação própria e se tornam tão familiares que sua leitura é espontânea, podendo ocorrer muito antes da decifração dos códigos. Por exemplo, a maioria das crianças lê a palavra Coca- Cola, decifrando, ou não, sua escrita. No entanto, na escola, algumas crianças ficam bloqueadas para a leitura, principalmente quando são apresentados textos pouco significativos para elas. A sala de aula deve dar continuidade à leitura prazerosa, aquela que estimula a criança, que aguça sua curiosidade, sensibilizando-a de alguma maneira. As crianças demonstram ser leitores atentos, curiosos e observadores, desde que o material a ser lido seja interessante e desafie sua inteligência. Bilhetes e comunicados dirigidos aos pais devem ser lidos junto com as crianças, sempre que possível. Material escrito, como livros de histórias, revistas, jornais, folhetos, gibis, artigos, livros 16 didáticos de diferentes anos escolares precisam estar presentes na classe, não importando se a criança está “pronta” para lê-los. Intuitivamente, ela escolhe o material escrito de acordo com suas necessidadese opta por livros com maior ou menor número de desenhos, páginas e letras. Muitas vezes, a criança escolhe um livro e troca-o logo em seguida sem ter feito um bom uso dele porque, certamente, aquele material ainda não parecia ser suficientemente interessante ou não era adequado ao seu “estágio” de leitor. Ainda assim, o aluno precisa ter liberdade de escolher e de usar diferentes modelos de escrita e isso deve ser feito de modo que ele não sinta, desde o início, que a finalidade da leitura é a aquisição de habilidades de decodificação. O professor precisa incentivar o gosto pela leitura porque ela é a base da escrita, procurando desenvolver, no aluno, a leitura crítica, para que possa questionar e opinar sobre o conteúdo implícito e explícito do texto. A interpretação não deve se resumir a, simplesmente, completar frases transcritas diretamente do texto ou a responder perguntas 17 que, visivelmente, possibilitam (ou direcionam para) uma única resposta, mas deve, sim, estar baseada no que o texto transmite ao aluno enquanto indivíduo, para que, depois, ele possa externar suas opiniões. Ao fazer a leitura, o professor precisa respeitar as interferências do aluno e garantir que, de alguma forma, ele “participe” do texto que está sendo lido. Leituras de letras de música, receitas de culinária, contos de fada, regras de jogos, histórias vivenciadas pela classe, manchetes de jornal, embalagens e avisos são elementos que oferecem uma base interessante para se fazer, além da interpretação, as atividades de gramática, ou mesmo quaisquer outros trabalhos ligados às diferentes áreas de estudo. Discute-se o uso de textos literários, como se fossem didáticos, em atividades ligadas ao exercício da língua. No entanto, após trabalhar a leitura de várias maneiras, não vimos nem percebemos qualquer impedimento na utilização de qualquer texto, desde que seja agradável ao aluno, em diferentes situações. Ao contrário, os resultados foram surpreendentes bons, visto que, quando o texto não é do 18 interesse do aluno, todo o trabalho fica prejudicado, tanto em nível teórico quanto prático. SUGESTÕES PARA LEITURA • Leituras individual ou coletiva. • Leituras silenciosa ou em voz alta. • Ler o que está fixado nas paredes: ler e interpretar o material que faz parte do ambiente alfabetizador. • Ler textos que a criança tem na memória (pseudoleitura). • Ler palavras ou frases que formam o Banco de Palavras. • Ler textos produzidos pelos próprios alunos e fazer a interpretação oral ou escrita. • Recortar de jornais e revistas somente as palavras ou frases que saiba ler e fazer a leitura para o professor. • Ler um texto e reduzir (resumir) as informações. • Ler frases fora de ordem e organizá-las, tornando o texto coerente. 19 • Com o professor, fazer a leitura dialogada: o professor lê um texto e incentiva o diálogo, lançando perguntas e desafiando os alunos a sugerir uma continuidade para a história. • Antecipar uma história com base no título e/ ou na capa do livro. A ESCOLHA DOS TEXTOS Que textos escolher para as crianças? No momento de começar o ensino sistemático da leitura, o tema e os significados do texto escolhido são decisivos. Para crianças de 6 anos, que estão iniciando o processo de alfabetização, cheias de curiosidade e disposição para aprender, há muitas escolhas: histórias, poemas, trava línguas, canções de roda. Em se tratando de crianças grandes, repetentes, que já passaram por vários métodos e cartilhas, deve-se conversar sobre a vida deles, o que fazem fora da escola, se trabalham, do que gostam, etc. Nesse caso, talvez uma notícia sobre futebol, uma letra de rap ou de uma canção, uma piada, um anúncio ou um bilhete sejam mais atraentes. 20 Trata-se de dar a essas crianças a certeza de que estão avançando, aprendendo coisas novas, até porque a maioria já passou por muitas experiências frustrantes e já conhece os nomes das letras, além de algumas palavras simples ou sílabas. Deve ser aflitivo para essas crianças ter sempre a sensação de começar do zero, portanto é bom escolher um texto diferente, usado na vida social, que seja uma novidade para elas. Deve-se trabalhar com os textos das próprias crianças? Seja qual for o tipo de turma, textos orais produzidos pelas crianças e escritos pelo professor também podem servir de ponto de partida para o trabalho de alfabetização. COMO COMEÇAR A ESTUDAR O TEXTO? Escreva o texto na lousa, numa cartolina grande ou em papel manilha. Faça uma leitura normal, fluente e converse com a turma sobre o texto. Em seguida, faça a leitura didática, apontando as palavras com o dedo ou com a régua, mostrando os espaços em branco entre as palavras. 21 Mostre aos alunos que quando falamos as palavras parecem emendadas umas nas outras. Assim, a separação entre as palavras, os espaços existentes entre elas no papel são uma das características da língua escrita. COMO FAZER PARA MOSTRAR OS SONS DAS LETRAS? Aprender a ler envolve aprender que as letras representam sons, que a mesma letra pode representar mais de um som de acordo com o contexto e o mesmo som pode ser representado por mais de uma letra. Não é uma questão de adivinhação da criança, é conhecimento sistemático, que tem que ser passado por uma pessoa que conheça o código alfabético. QUANDO É QUE ELAS VÃO COMEÇAR A LER REALMENTE? As crianças estarão lendo quando forem capazes de perceber como as letras funcionam para representar os sons da língua e ao mesmo tempo possam entender o que diz o texto. Para isso, pode-se sistematizar o ensino da leitura e da escrita, começando pelo texto natural, significativo (e não por um texto cartilhado) e caminhar gradativamente na direção do conhecimento de palavras, sílabas, letras e regras ortográficas. 22 SUGESTÕES DIDÁTICAS PARA MELHORAR A COMPETÊNCIA TEXTUAL E A EXPRESSÃO ORAL Paráfrase: pedir ao aluno que diga a mesma coisa lida de um outro jeito, que conte uma história, narrada pela professora, com suas próprias palavras. Resumo: propor resumos orais de uma história, um capítulo de novela ou uma notícia. Ensinar que no resumo destacamos aquilo que consideramos mais importante, o que realmente não pode faltar. Produção de um texto a partir de um título dado: títulos de histórias conhecidas como histórias de fadas, lendas, fábulas, etc. podem ser usados para iniciar a atividade. Classificação dos diversos tipos de textos: cada vez que apresentar um texto, explicar de que tipo de texto se trata: uma narrativa, uma poesia, um texto didático, uma notícia jornalística, um anúncio, uma receita. Brincadeiras com palavras: pedir a dois alunos que digam cada qual uma palavra e a partir daí deixar a turma criar uma história. Reprodução de histórias: No exemplo abaixo, há muitas 23 repetições e modos de dizer típicos da língua oral. Histórias assim podem ser retrabalhadas para ficar de acordo com as convenções da escrita. A bruxa tava fazendo comida. Ela botou o dedo no fogão, ela queimou. Aí foi passear na água, viu o jacaré. O jacaré comeu ela, aí ele levou pro mar, aí, ela caiu lá dentro e foi embora. (Teixeira apud Carvalho, 2005: 56) COMO USAR O INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA? Ao iniciar o ano letivo, uma das tarefas do professor é saber o que seus alunos já sabem e o que ainda não sabem; é conhecer quem são eles, que vivências têm com o mundo da escrita em sua família e cotidiano; que experiênciasprévias têm da escola, de sua cultura e de seus modos de lidar com a escrita. Essa tarefa é muito importante para o professor porque é com base nela que poderá desenvolver os principais mecanismos em torno dos quais controla, com autonomia, seu processo de trabalho. “Sabendo o que os alunos já sabem”, tem uma referência segura para elaborar seu planejamento e estabelecer 24 metas a ser atingidas, selecionar e criar atividades e estabelecer formas de trabalho adequadas para turmas mais ou menos heterogêneas. Assim, a avaliação diagnóstica é o ponto de partida do trabalho pedagógico; sobretudo: é ponto de partida de um trabalho pedagógico autônomo, em que o professor controla o que ensina, o para que ensina, o como ensina. Mas a avaliação diagnóstica é também um instrumento fundamental ao longo do processo de ensino-aprendizagem. Para o desenvolvimento do conjunto de capacidades envolvidas no domínio inicial da língua escrita, enfatizamos que não se pode perder de vista, por meio dos elementos fornecidos pela avaliação contínua e diagnóstica, nem os objetivos correspondentes a cada ano, nem a necessidade de reagrupamentos dinâmicos, temporários e rotativos, para atendimento de alunos com dificuldades ou necessidades específicas de aprendizagem. A exposição desses argumentos evidencia a relevância atribuída à avaliação diagnóstica ao longo da alfabetização. É por essa 25 razão que se apresenta esta proposta de instrumento de avaliação, para que ela seja assumida como um ponto de partida para o diagnóstico das aprendizagens dos alunos, bem como para o planejamento de ações e intervenções necessárias ao longo do processo de ensino-aprendizagem da língua escrita. Leia a matriz e o instrumento de avaliação e saiba: ✓ Quais as capacidades avaliadas? ✓ Por que avaliar essas capacidades? ✓ Quais são as possibilidades de avaliação de cada capacidade? ✓ Que atividades podem ser feitas para sua avaliação? ✓ Selecione as atividades a serem realizadas por seus alunos. ✓ Faça uma revisão das atividades e amplie este instrumento de avaliação, fazendo novas questões ou atividades que você julga importante avaliar. ✓ Desenvolva as atividades selecionadas (e também as que você elaborou) com seus alunos. ✓ Analise seus resultados ✓ Comunique seus resultados a pais e alunos 26 A MATRIZ DE REFERÊNCIA: PRESSUPOSTOS, OBJETIVOS, ESTRUTURA Uma matriz de referência discrimina conhecimentos e competências a serem avaliados. Sua finalidade é orientar a elaboração de estratégias ou questões de avaliação. Desse modo, ao se elaborar uma estratégia ou uma questão, sabe-se, de maneira controlada e sistemática, as habilidades que serão avaliadas e, assim, seus objetivos. É importante que se considere a matriz de referência apenas como uma baliza para professores e especialistas do período de alfabetização, sem pretensões de esgotar o repertório de capacidades ou de procedimentos possíveis para avaliação. Também é importante considerar que a matriz poderá servir à avaliação de alunos dos três primeiros anos do Ensino Fundamental, pois apresenta capacidades progressivas e diferenciadas quanto ao grau de complexidade. Assim, enquanto determinadas crianças poderão evidenciar o desenvolvimento de capacidades incipientes ou próprias a 27 alunos de turmas de seis anos, outras poderão estar transitando em domínios esperados para os anos seguintes e outras, por sua vez, poderão demonstrar já ter consolidado capacidades projetadas para o último ano, ao final do período de alfabetização. Para que a matriz aqui proposta seja melhor compreendida, apresentam-se, a seguir, algumas de suas características. CAMPO DE ABRANGÊNCIA: FOCOS DE ATENÇÃO E CAPACIDADES A matriz de referência da avaliação diagnóstica apresenta capacidades que devem ser desenvolvidas ao longo de todo o período considerado, englobando, de forma indissociável, os processos de alfabetização e letramento. Esses dois processos são os focos principais de atenção da matriz. O foco na alfabetização enfatiza a apropriação do sistema de escrita alfabético-ortográfico, bem como o desenvolvimento de capacidades motoras e cognitivas pertinentes a esse processo. 28 O foco no letramento, como dimensão complementar e indissociável da alfabetização, privilegia aspectos relativos à inserção e participação do indivíduo na cultura escrita, abrangendo capacidades de uso do sistema de escrita e de seus equipamentos e instrumentos na compreensão e na produção de textos, em diversas situações ou práticas sociais. Em contextos de avaliação mais formal, aspectos relativos à alfabetização são mais facilmente observados. Por isso, a necessária perspectiva do letramento precisa ser explorada e avaliada nas interações dos professores com as crianças, nas quais se possa examinar, de forma mais natural, a relação dos alunos com diversos gêneros e suportes textuais (por exemplo, revistas em quadrinhos, livros, bilhetes, jornais, propagandas). Assim, situações efetivas de uso da escrita e da leitura devem ser criadas em sala de aula para que se possa saber como a criança se relaciona com a escrita no seu dia-a-dia e para que se possa avaliar o que ela conhece e entende sobre a escrita. Para articular, na matriz, alfabetização e letramento (apesar da ressalva que se fez nos parágrafos acima), foram enfatizados três eixos ou domínios de capacidades relacionados à: 29 ✓ aquisição do sistema de escrita; ✓ leitura; ✓ produção de textos. MATRIZ DE REFERÊNCIA DA AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA 30 31 32 O INSTRUMENTO: ELABORAÇÃO, APLICAÇÃO, ANÁLISE E REGISTRO Fornecer subsídios para a organização da prática de ensino da língua escrita 33 Auxilia os educadores na organização de seu processo de trabalho: ✓ mostrando como podem ser elaboradas atividades de avaliação diagnóstica com base nessas capacidades; ✓ fornecendo um modelo de instrumento de avaliação, para que o educador possa elaborar, a partir dele, novas atividades ou instrumentos de avaliação diagnóstica. Após a elaboração deste instrumento de avaliação diagnóstica, serão apresentados outros instrumentos: ✓ de planejamento do trabalho com crianças no processo de ensino-aprendizado da língua escrita; ✓ de criação de rotinas de trabalho para os três diferentes anos, de trabalho com crianças com “dificuldades de aprendizagem”, dentre outros. O MATERIAL DIDÁTICO PARA A FORMAÇÃO CONTINUADA DE ALFABETIZADORES O instrumento pretende, como se viu, auxiliar as escolas a organizar seu processo de trabalho. Mas ele pretende, também, servir, assim como o restante da coleção “Instrumentos da 34 Alfabetização”, como um material que subsidie professores e educadores em seu processo de formação continuada. Espera-se que ele seja um dos materiais em torno dos quais os educadores, de acordo com suas possibilidades e necessidades, formem grupos de estudo para, ao mesmo tempo, planejar e fundamentar suas ações e, após sua realização, refletir e avaliar sobre sua adequação e pertinência. Desse modo, este material propõe, em sua Para que esses objetivos sejam alcançados, é preciso estar atento para as orientações apresentadas a seguir. Utilização coletiva, o estudo, o planejamento, a ação e a reflexão contínuas, buscando fazer com que o educador tenhauma base sólida para se formar e intervir na realidade de sua sala de aula, em sua escola. O INSTRUMENTO SE DIRIGE AOS TRÊS PRIMEIROS ANOS DO ENSINO FUNDAMENTAL Como se trata de um instrumento de avaliação diagnóstica, pode ser utilizado ao longo de todo o período aqui compreendido como o dos anos decisivos da alfabetização. 35 Isso não significa, porém, que quaisquer resultados sejam aceitáveis. Como se pode constatar a seguir, espera-se que, a cada ano, os alunos atinjam níveis claramente definidos de alfabetização. PRIMEIRO ANO Na conclusão do primeiro ano ou no início do segundo, o ideal é que o aluno domine, mesmo que com erros, o princípio alfabético da escrita (capacidade 5, na matriz de referência), isto é, que a criança saiba que nosso sistema de escrita representa “sons” ou fonemas. Isto significa que o aluno deve ser capaz de escrever e ler palavras com certa autonomia, ainda que com erros e hesitações. O importante é que mostre conhecer que as “letras” ou grafemas representam “sons” ou fonemas. Isto também significa que as capacidade de 1 a 4 devem estar dominadas e, em grande parte, consolidadas. Ainda na conclusão do primeiro ano (ou no início do segundo), espera-se que os alunos sejam capazes de compreender e produzir sentenças ou 36 textos, com apoio do professor, quando este serve de “escriba” e de leitor (a criança dita textos e ouve textos lidos pelo professor). SEGUNDO ANO Ao final do segundo ano ou iniciando o terceiro, o ideal é que o aluno demonstre dominar as capacidades trabalhadas no primeiro ano e que, além disso: ✓ leia e escreva, com autonomia, palavras e sentenças com fluência; ✓ leia e escreva, com autonomia, textos curtos, mesmo que com algumas hesitações e erros, e mesmo que com fluência e rapidez um pouco limitadas; ✓ compreenda e produza textos, com maior grau de autonomia, porém contando ainda com a ajuda do professor. TERCEIRO ANO Espera-se que, ao final do terceiro ano, o aluno esteja plenamente alfabetizado: 37 ✓ lendo e escrevendo com fluência e rapidez textos mais extensos e complexos que os lidos em avaliações do segundo ano; ✓ compreendendo e produzindo textos com autonomia, quer dizer, sem ajuda do professor. O INSTRUMENTO APRESENTA ATIVIDADES DE AVALIAÇÃO E NÃO ATIVIDADES DE ENSINO Embora muitas das atividades de avaliação propostas possam ser utilizadas como atividades de ensino, é importante ter em mente que isso nem sempre acontece. Um bom exemplo diz respeito às atividades voltadas para compreender palavras compostas por sílabas mais simples (por apenas uma vogal e por consoante e vogal) e, em momentos mais avançados do aprendizado, ler palavras com sílabas complexas. Com certeza, nos momentos em que o professor quer trabalhar a análise de sílabas, será mais interessante começar por sílabas mais simples; isso não significa, porém, que, durante o primeiro 38 ano ou em boa parte do segundo, as atividades de ensino devam se resumir ao contato apenas com sílabas mais simples. O INSTRUMENTO EXIGE A MEDIAÇÃO DO PROFESSOR Um instrumento com objetivos diagnósticos pode criar situações artificiais e excessivamente controladas; pode, ainda, trazer à tona a pouca familiaridade dos alunos com certos conceitos e contextos explorados ou com o próprio tipo de avaliação por exemplo, com alguns de seus enunciados ou instruções. Por essa razão, uma primeira recomendação enfática é que os professores se coloquem como mediadores efetivos em tais situações e estabeleçam condições de interação com as crianças: ✓ lendo enunciados para alunos ainda sem autonomia de leitura; ✓ conferindo a compreensão de elementos textuais ou não textuais (como imagens); ✓ adaptando situações propostas às vivências sócio- culturais das crianças; ✓ monitorando o nível de desempenho e a margem de frustração que pode ocorrer em alunos nos 39 momentos iniciais da alfabetização, quando não podem demonstrar certas capacidades. Na avaliação, torna-se fundamental, antes mesmo de qualquer aferição de desempenhos específicos, que o professor investigue o campo de experiências da criança, dentro e fora da escola, por meio de sondagens sobre seu processo de inserção na cultura escrita e, em particular, na cultura escolar. Várias questões são pertinentes a essa sondagem, tais como: ✓ Quem é essa criança? ✓ Quem são seus pais? ✓ Como vive? ✓ O que a criança já sabe sobre a escrita? ✓ O que não sabe? ✓ Como vem se realizando sua trajetória escolar? ✓ Quantas pessoas da família sabem ler e escrever? ✓ O que elas lêem? ✓ Que materiais de escrita a criança utiliza na escola e fora dela? ✓ O que ela acha difícil? ✓ O que acha mais fácil? 40 ✓ O que mais aprecia na leitura e na escrita? Tais questões pressupõem um contexto interativo, no cotidiano das ações pedagógicas, que escapa às possibilidades de qualquer instrumento com um perfil pretensamente objetivo; por essa razão, esse espaço de atuação do professor não pode ser negligenciado. O INSTRUMENTO DEVE SER APLICADO COM FLEXIBILIDADE As considerações apresentadas evidenciam que a aplicação do instrumento diagnóstico admite variações quanto ao uso do tempo e à organização dos alunos. Quanto ao tempo utilizado, o professor poderá optar por dividir o repertório de questões por ele selecionadas em algumas sessões, para melhor controle dos fatores já apontados. Uma sugestão é organizá-las em três sessões, de acordo com os domínios propostos (aquisição do sistema, leitura e produção textual). Quanto à organização dos alunos, grande parte das questões supõe envolvimento coletivo prévio, ou em pequenos grupos, para contextualização e confirmação de percepções. A 41 exploração da linguagem oral, por exemplo, não poderia ser feita de outra forma. Por outro lado, outras capacidades podem exigir avaliações mais individualizadas, como em situações de leitura cujo foco é a verificação do nível de fluência do aluno. A mesma observação pode se aplicar a crianças com descompassos nas progressões esperadas; nesses casos, os focos de observação e análise poderão ser ampliados, com a aplicação do instrumento em pequenos grupos ou individualmente. O INSTRUMENTO PRESSUPÕE UMA ANÁLISE CUIDADOSA DOS ERROS DOS ALUNOS A realização de um diagnóstico dependerá, sempre, da perspectiva assumida em relação à abordagem dos erros dos alunos em situações de testes. É necessário fazer com que os erros dos alunos se tornem “observáveis”, que permitam inferir hipóteses ou conflitos cognitivos subjacentes a cada resposta ou a desempenhos alternativos em relação ao esperado. 42 Somente nessa perspectiva se torna possível realimentar o processo de aprendizagem e efetuar intervenções que possam retomar ou consolidar capacidades não desenvolvidas. Desse modo, os erros possibilitam a verificação de conceitos e estratégias utilizados pelas crianças na resolução da atividade. Para isto, o lugar de mediação do professor, anteriormente referido, coloca-se em destaque. Sua postura investigativa é o elemento central nesse tipo de avaliação: ele transforma o erro em fonte de informação, por exemplo, sobre o que a criança pensa sobre a escrita ou sobre o que ela acha que a escrita representa. Assim, o professor poderá tomar decisões mais consistentes quanto à regulação do processo de ensino-aprendizado, avançandoem certos objetivos ou prolongando o trabalho de consolidação de certas capacidades ainda não desenvolvidas. TIRA-TEIMA Descubra em que consiste tornar os erros observáveis. 43 É só tentar descobrir a “lógica” que a criança empregou para fazer o “erro”. Análise alguns “erros” que a criança comete quando está aprendendo a falar: 1) Mônica estava brincando de “lojinha”. Quando sua colega quis comprar um brinquedo, ela disse: “Esse eu já vendeu”. 2) Lucas estava brincando de “morto”. Quando se cansou, levantou-se e disse: “Pai, eu desmorri!” Observe agora alguns “erros” de escrita feitos por crianças: 3) penti (pente) vivi (vive) morri (morre) contenti (contente) Para analisar, se quiser, esses “erros”, transformando-os em “observáveis”, aí vão algumas dicas: ✓ Para o “erro” número 1: lembre-se que, no Português, temos três grandes padrões de conjugação. Há os verbos terminados em “-ar”, em “-er” e em “-ir”; leve em conta 44 que os verbos terminados em “-ar” são os mais frequentes na língua; exclua a hipótese de que a criança está imitando alguém: nenhum adulto fala “eu vendeu”. ✓ Para o erro número 2: exclua também a hipótese de que a criança está imitando alguém: nenhum adulto fala “eu desmorri”; “desmonte” a palavra “desmorri” e veja se há alguma lógica na “montagem” que a criança fez. ✓ Para o erro número 3: leve em conta que essa criança é pernambucana e que, como as crianças de muitos outras regiões brasileiras, ela fala [‘penti], [‘vivi], [‘morri] e [con’tenti]. Preencha o quadro abaixo com palavras, de acordo com o modelo. Depois, marque a sílaba tônica. Responda: o que a criança está pensando e não está pensando para fazer esses “erros”? Obs: Atenção: as palavras entre colchetes são transcrições aproximadas da fala. O sinal ‘ indica que a sílaba seguinte é a tônica. 45 O INSTRUMENTO SÓ CUMPRIRÁ SEUS OBJETIVOS SE SEUS RESULTADOS FOREM COMUNICADOS E UTILIZADOS O instrumento proposto inclui textos dirigidos ao professor, com comentários e explicações sobre cada bloco de atividades. O objetivo desses textos é possibilitar ao professor conhecer, de modo mais aprofundado, as finalidades das atividades ou alternativas de avaliação de uma mesma capacidade, de modo a auxiliá-lo na tarefa de mediação que lhe está sendo atribuída. Os textos buscam, ainda, contextualizar o instrumento e suas condições de aplicação, para que seu uso não se reduza apenas a um teste classificatório, aplicado de forma isolada e desvinculada das práticas pedagógicas conduzidas pelo professor. De nada adianta utilizar o instrumento de avaliação diagnóstica apenas para dar uma nota ao aluno e classificá-lo numa categoria 46 como “atrasado” ou “adiantado”. Para que o instrumento alcance os objetivos para os quais foi proposto, é necessário que o professor e seus colegas: ✓ analisem os resultados dos alunos (em grupo e individualmente); ✓ registrem esses resultados de modo a visualizar adequadamente os diferentes níveis de rendimento (em gráficos ou nas fichas de registro propostas) e a acompanhar, ao longo do período da alfabetização, o crescimento do aluno; ✓ apresentem os registros da turma aos alunos, estabelecendo com eles objetivos e metas a serem alcançadas; ✓ comuniquem os resultados aos pais, para incentivar o acompanhamento do aluno e dar a eles conhecimentos para fazê-lo; ✓ utilizem os resultados para orientar o planejamento a ser elaborado, para propor e executar ações, na sala de aula e na escola, para buscar a resolução dos problemas encontrados; para modificar estratégias e 47 procedimentos de ensino que não se mostraram adequados; para avançar naqueles pontos em que os resultados se mostraram satisfatórios. O INSTRUMENTO APRESENTA VÁRIAS POSSIBILIDADES DE REGISTRO O desempenho dos alunos numa avaliação diagnóstica pode ser registrado de diferentes formas: por exemplo, por meio de fichas descritivas, relatórios individuais de natureza mais qualitativa, diários de campo que acompanhem o processo de aprendizagem da turma, de grupos ou de alunos específicos. O instrumento de avaliação aqui sugerido comporta possibilidades diversas de registro, dependendo da ênfase e do foco pretendido – desde um relatório de aprendizagem de cada aluno até fichas descritivas do desempenho de um grupo ou turma (que podem até ser representadas por gráficos). No caso de fichas, algumas direções podem ser esboçadas quanto a sua estrutura mais geral. A primeira ficha apresentada (Ficha I) se destina a um registro individual, ou seja, à avaliação da situação de cada aluno em relação às capacidades focalizadas 48 no diagnóstico, explicitada na matriz de referência e aqui retomadas apenas parcialmente: Fichas desse tipo oferecem relatórios individuais que poderão ser explorados junto aos próprios alunos, a seus pais e à equipe pedagógica da escola, para decisões referentes à vida escolar do aluno, a sua trajetória na série ou ciclo e a sua situação ao final de cada ano. Propiciam direções para a reorientação do planejamento do professor, que poderá avançar em campos com capacidades 49 consolidadas ou trabalhar as lacunas de capacidades ainda não desenvolvidas, propondo formas de intervenção mais específicas. A segunda ficha apresentada (Ficha II) se destina a um diagnóstico da situação de cada aluno, tendo como referência o coletivo da classe. Após registrar a situação do aluno, por níveis de capacidades, o professor poderá chegar a uma visão geral do desenvolvimento de sua turma pelos níveis evidenciados: As capacidades avaliadas estão apenas sugeridas nessa ficha, no sentido horizontal. Na matriz de referência (apresentada na seção anterior) poderá ser encontrado o conjunto de 50 capacidades focalizadas. Isso significa que o registro será prolongado até a capacidade de número 18. No sentido vertical, estão sendo sugeridos três níveis para registro do desempenho do aluno nestas capacidades: Nível 1 capacidades ainda não desenvolvidas (sem domínio) Nível 2 capacidades em desenvolvimento (domínio parcial, transição de níveis) Nível 3 capacidades já consolidadas. Pelo registro apresentado de forma parcial, constata-se que o professor poderá obter um quadro geral das capacidades desenvolvidas pelos alunos desta turma. Perceberá, por exemplo, que Ana permanece no nível 1, na maioria das capacidades, mesmo nas já exploradas no primeiro ano e, portanto, merecerá atenção especial em seu processo de apropriação do sistema de escrita. Carlos, por sua vez, já revela domínio ou consolidação de várias das capacidades exploradas e desenvolve, atualmente, outras, esperadas para o segundo ano. 51 Os níveis encontrados poderão estar, portanto, de acordo com o patamar esperado para o ano em que os alunos se encontram ou em descompasso com os objetivos projetados. Nesse último caso, as metas precisam ser redefinidas, do ponto de vista dos conteúdos e dos procedimentos propostos, para que se trabalhe de forma mais sistemática sobre as áreas de defasagem ou de transição. Um terceiro exemplo de registro (Ficha III) pode oferecer um mapeamento ainda mais global da turma. 52 Da mesma forma que na ficha anterior, esse tipo de registro está parcialmente apresentado. Na matriz de referência poderão ser identificadas todas as capacidades sugeridas na primeira coluna.Com um registro descritivo dessa natureza, o professor poderá determinar de modo mais claro as capacidades efetivamente desenvolvidas no período avaliado, tendo o conjunto da classe como referência. Por exemplo, poderá perceber que determinados alunos estão sem domínio de capacidades a serem desenvolvidas no primeiro ano. Essas capacidades deverão, portanto, ser retomadas. Também poderá constatar que outros alunos apresentam problemas em relação ao reconhecimento de unidades fonológicas, capacidade que deverá ser, assim, trabalhada sistematicamente. O professor terá, desse modo, um ponto de partida para o monitoramento da trajetória dos alunos, do ponto de vista de suas aprendizagens efetivas. A partir da organização dos domínios de capacidades, o professor se orientará quanto às demandas para o ensino em relação a determinados conhecimentos ou capacidades: 53 Introduzir, trabalhar sistematicamente ou consolidar, retomar e mesmo avançar. Além disso, poderá estar atento às dificuldades evidenciadas na última coluna, sobretudo nos casos de alunos que ainda não desenvolveram capacidades esperadas ou que revelam inconsistência em outras que deveriam estar em desenvolvimento. A MATRIZ DE REFERÊNCIA POSSUI DUAS FINALIDADES BÁSICAS: ✓ fornecer subsídios para a organização da prática de ensino da língua escrita; ✓ servir de material didático para a formação continuada de alfabetizadores. Para que essas finalidades sejam alcançadas, é preciso ter em mente que o instrumento proposto: ✓ dirige-se aos três primeiros anos do Ensino Fundamental; ✓ apresenta atividades de avaliação e não atividades de ensino; ✓ exige a mediação do professor; 54 ✓ deve ser aplicado com flexibilidade; ✓ pressupõe uma análise cuidadosa dos erros dos alunos; ✓ só cumprirá seus objetivos se seus resultados forem comunicados e utilizados; ✓ apresenta várias possibilidades de registro. COMUNICANDO RESULTADOS DA AVALIAÇÃO A comunicação dos resultados da avaliação aos alunos pode ser feita por fichas descritivas ou gráficos (individuais ou de toda a turma), relatórios diários ou periódicos, entre outros. Uma outra estratégia que possibilita o levantamento de informações relevantes para reorientar o processo de construção de significados pelo próprio aluno é a realização de autoavaliações. Sua principal finalidade é fazer com que o aluno tome consciência de seus avanços e de suas dificuldades, de modo a elaborar, com autonomia, novas formas de estudo, direcionadas para os problemas que enfrenta. 55 Esse exercício já pode ser desenvolvido a partir do levantamento de suas primeiras percepções sobre o processo de inserção no mundo da escrita e da leitura. Exemplificando, pode-se perguntar ao aluno: ✓ o que julga que já sabe sobre a escrita? ✓ o que não sabe? ✓ quais são suas dificuldades nas aprendizagens da escrita e da leitura? Essas questões podem ser respondidas pela análise das atividades que foram selecionadas para a aplicação do instrumento de avaliação diagnóstica ou a partir de registros de resultados feitos pelo professor. Os registros de auto-avaliação do aluno podem se apoiar também em debates, textos individuais ou coletivos, análise comparativa de atividades desenvolvidas por ele durante o período de aplicação do instrumento de avaliação diagnóstica, entre outros. Obs: Portfólio é uma organização e arquivo de registros das aprendizagens dos alunos, selecionados por eles próprios ou 56 pelo professor, com intenção de fornecer uma síntese de percurso do aluno ou de sua trajetória de aprendizagem. Uma outra sugestão para a reflexão sobre o desempenho escolar é a organização de portfólios compostos por algumas das atividades consideradas mais representativas do processo de aprendizagem dos alunos. Dessa forma, o professor disporá de um conjunto de informações relevantes e úteis para explicar os aspectos significativos do processo de aprendizagem de um aluno, ao longo de um determinado período. A organização dos portfólios pelo próprio aluno deve ser orientada pelas seguintes questões: O que aprendi? De que forma aprendi? A partir desses eixos, cada aluno poderá construir o registro de ações, atividades espontâneas ou dirigidas pelo professor, 57 produções próprias ou reproduções de informações e documentos, apreciações e dificuldades. A periodicidade de sua elaboração será sempre determinada pelos objetivos da série ou ciclo e pelas motivações ao longo do processo, podendo ser trimestral, semestral ou mesmo anual. Um outro aspecto deve ser levado em conta: no momento de comunicação de resultados da avaliação, também é oportuno incentivar os alunos a não mascararem suas lacunas, procurando expor e refletir sobre seus erros mais recorrentes, sem receios de censuras. Assim, as crianças serão incentivadas a buscar informações e conhecimentos que possibilitem a superação dos problemas e lacunas ainda constatados. Por isso, é fundamental que o aluno não só revele suas dúvidas e dificuldades, como também sinta confiança no professor e nos seus colegas para pedir ajuda quando julgar necessário. ESTABELECENDO NOVAS METAS COM OS ALUNOS Seja qual for o modo pelo qual os resultados dos alunos são comunicados, é importante, em seguida, estabelecer novas metas para o aprendizado. 58 Cada aluno e a turma como um todo devem saber o que se espera que desenvolvam num determinado período de tempo. Fazer cartazes com essas metas ou objetivos (para a turma) e registrar nos cadernos de cada aluno suas metas individuais é uma boa forma de organizar e favorecer o processo de ensino aprendizado. Incentivar, por fim, o aluno, ao final de um determinado período, a registrar a consecução das metas previstas é um estímulo importante para o desenvolvimento de seu processo de aprendizado. FAMÍLIA E ESCOLA: COMUNICANDO RESULTADOS, COMPARTILHANDO PROJETOS Cabe considerar que a decisão de adotar uma prática de avaliação mais formativa passa, necessariamente, por uma explicação dos objetivos do trabalho pedagógico aos pais dos alunos, a seus responsáveis, ou àqueles que acompanham sua vida escolar, como tios ou irmãos mais velhos. 59 Essa explicação deve ser capaz de reafirmar e reconstruir o compromisso entre a família e a escola. Se existem relações de confiança, explicações sobre processos alternativos de avaliação podem ser bem recebidas; os pais podem compreender, assim, que uma avaliação sem notas, mais descritiva e processual, é importante para situar e posicionar o avanço escolar de seu filho. Quando a escola adota algum tipo de relatório ou ficha descritiva do processo de aprendizagem, em substituição aos tradicionais boletins, precisa estar atenta para organizá-los numa linguagem bem clara, que possibilite a qualquer familiar identificar o que cada aluno aprendeu e o que precisa aprender, sem rebuscamentos técnicos que só os profissionais da escola compreendem. As fichas apresentadas na seção anterior podem ser uma fonte de esclarecimento para os pais, desde que as capacidades avaliadas sejam descritas de forma acessível. O ideal é que se apresente a cada pai uma ficha relacionada ao desempenho do próprio filho (como já sugerido), com o diagnóstico das capacidades desenvolvidas no período. Tais capacidades podem ser expostas com ênfase nos campos ou 60 eixos da aquisição do sistema de escrita(ou da “alfabetização”), da leitura e da escrita e produção de textos, para que os pais visualizem claramente as áreas que estão sendo avaliadas. Além disso, a pontuação pode estar implícita ou explícita, quando se posiciona o aluno em níveis de aprendizagem e isto deve ser traduzido de forma compreensível. Por exemplo, quando o registro aponta três níveis de desenvolvimento de capacidades dos alunos, pode-se esclarecer aos pais que: Nível 1 – representa capacidades não desenvolvidas pela criança, que precisará de acompanhamento mais atento da escola e da família para superar dificuldades iniciais e avançar em direção a capacidades mais elaboradas; Nível 2 – representa capacidades em desenvolvimento, ou seja, um processo intermediário no qual a criança revela domínio apenas parcial. Nível 3 – representa capacidades já dominadas ou consolidadas e, portanto, traduzem um desempenho mais avançado em relação aos demais níveis, predispondo a criança a novas aprendizagens em capacidades mais elaboradas. 61 Além da ficha de registro individual, poderão ser apresentadas aos pais fichas de síntese do desempenho global da turma (como já sugerido na Ficha III), para que eles percebam o desempenho do filho no contexto da turma. Um gráfico, evidenciando a situação de toda a classe, poderá ser apresentado para uma melhor visualização, como no exemplo que se segue: Mesmo que muitos pais tenham dificuldade em interpretar gráficos como este, algumas explicações gerais poderão oferecer pistas sobre a situação da turma. Por exemplo: 62 ✓ A turma em que seu filho se encontra, com 36 alunos, está em excelentes condições de desempenho, pois a grande maioria já desenvolveu e consolidou as capacidades esperadas para esse momento — como mostram as colunas relativas ao nível 3. ✓ Alguns alunos se encontram no nível 2 em várias capacidades (17, 13, 18). Isso evidencia que essas capacidades ainda precisam ser trabalhadas, pois este nível revela um processo ainda em desenvolvimento. ✓ A capacidade 11 é a que apresenta maior dificuldade nesta turma. ✓ Há 18 alunos ainda no nível 1, ou seja, sem domínio desta capacidade, que não foi desenvolvida ou suficientemente trabalhada. ✓ Essa constatação, porém, é mais importante para o professor do que para os pais, pois ela indica que o docente deve reorientar seu trabalho, explorando mais detidamente a capacidade em questão. ✓ Uma leitura mais simples do eixo horizontal poderá também ser feita, sem detalhamento de capacidades, agrupando-as 63 pelas áreas principais da alfabetização (de 1 a 6 = aquisição do sistema de escrita; de 7 a 13 = leitura; de 14 a 28 = escrita e produção de textos). ✓ Desse modo, o gráfico poderá ser mais acessível à compreensão dos pais. ✓ Finalmente, a localização de casos específicos de dificuldades poderá ser feita pela consulta ao registro na ficha consolidada pelo professor, a partir de observações pontuais sobre desempenhos individuais dos alunos. Essa estratégia orientará os pais em relação à situação de seus filhos e às necessidades de maior apoio (por parte da família e da escola) em suas aprendizagens. É importante acentuar que poderá haver uma tendência, por parte dos pais, em traduzir os níveis registrados de forma quantitativa (1, 2 ou 3) como conceitos de fraco, médio ou forte desempenho, de forma cristalizada. Assim, deve-se procurar esclarecer o caráter dinâmico dos processos de aprendizagem e, portanto, a possibilidade de que a criança esteja sempre mudando de nível ou patamar, em uma 64 mesma série ou momento de ciclo ou de uma série ou fase do ciclo para outra. Muitas vezes, as fichas descritivas criadas pela escola podem não ser suficientes para orientar, de forma adequada, alguns grupos de familiares. Nesses casos, é preciso definir outras estratégias que o professor possa utilizar para repassar as informações sobre o processo de aprendizagem dos alunos, como, por exemplo: ✓ A elaboração de uma lista dos itens que foram ensinados em determinado período, seguida da apresentação de alguns exemplos de como foi o desempenho da classe. ✓ A seleção de algumas capacidades nas quais os alunos apresentam maior dificuldade, com explicações paralelas sobre como elas são desenvolvidas em sala e com exemplos de atividades e sugestões de tarefas. Assim, os pais podem acompanhar melhor o progresso de seus filhos. ✓ A apresentação de portfólios elaborados pelo aluno ou pelo professor, conforme já enfatizado anteriormente. O professor poderá sugerir que esses registros sejam apresentados pelas próprias crianças aos seus pais, criando, assim, situações em 65 que ela possa compartilhar e refletir sobre seu processo de aprendizagem, sucessos e dificuldades. O professor poderá acompanhar essas situações de interação entre pais e filhos, fornecendo apoio e informação. Ele poderá, também, destacar situações e momentos significativos na trajetória de aprendizagem das crianças, para que os pais percebam progressos em relação a patamares anteriores. As informações a serem repassadas pela escola devem possibilitar aos familiares saber realmente o que o aluno já aprendeu e aquilo que ainda precisa aprender. Os momentos de encontro com as famílias devem servir para esclarecimentos, compreensão e reflexão sobre os desafios que precisam ser superados e para a construção de um compromisso entre escola e família para a busca de alternativas para resolução de dificuldades. Tais momentos devem se prestar a um balanço do trabalho já realizado ou a ser realizado, e à socialização entre educadores, alunos e seus familiares. É uma boa oportunidade de se quebrar a tensão tão comum nesses momentos. 66 Avaliação alguma cumpre seus objetivos se: ✓ não for comunicada aos alunos, por meio de sua participação ativa na análise de seus próprios resultados e no estabelecimento de novas metas de aprendizado; ✓ não for comunicada aos pais ou responsáveis, de forma a engajá-los na escolarização do filho e de forma a mostrar-lhes os meios que a escola adotará para ampliar suas possibilidades de aprendizagem. INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA Apresentamos, a seguir, exemplos de atividades e questões. Com base na análise do professor e da escola, um verdadeiro instrumento será construído, seja a partir da seleção de atividades que aqui apresentamos, a partir da elaboração de novas atividades. Os exemplos são apresentados por capacidade e antecedidos de um texto em que se caracterizam as atividades e, sempre que possível, explicitam-se outras estratégias de avaliação, que podem, em geral, ser desenvolvidas no cotidiano da sala de aula. 67 Uma das etapas mais importantes na formação da criança é a vida escolar. Na escola, a criança tem um primeiro contato com os seus deveres, suas responsabilidades e com outras crianças com quem ela desenvolve a socialização. Muito além do ensino escolar, a educação infantil é fundamental para a formação da criança como cidadã. Portanto, é de extrema importância que a escola possa acompanhar essa formação com uma avaliação da educação infantil. Embora seja um papel fundamental da escola avaliar o desenvolvimento dos alunos, muitas delas não dão a devida importância a essa atividade, limitando a realizá-la baseando-se apenas no desempenho escolar da criança. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, na seção 11, referente à Educação Infantil, artigo 31,preconiza que: “[…] a avaliação far- se-á mediante o acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao Ensino Fundamental”. 68 A avaliação deve ampliar o olhar do professor a respeito do contexto da aprendizagem e das atividades realizadas. O docente deve estar atento ao modo como foi executada a tarefa e o que norteou os procedimentos, a saber: o ambiente, os materiais, as escolhas, enfim, tudo que cerca o momento da realização da atividade. A avaliação poderá ser realizada em forma de observação, registro e atividades práticas. A aprendizagem precisa ser avaliada durante o processo de trabalho, de forma contínua, tendo como objetivo o desenvolvimento do aluno em todos os aspectos. É nesse momento que o professor pode perceber as dificuldades e os acertos dos alunos. A avaliação da aprendizagem deve contemplar os momentos em que a criança: ✓ exercita os conceitos aprendidos tanto no contexto escolar como no extraescolar; ✓ tem oportunidade de interpretar a ação dos adultos; 69 ✓ tem possibilidade de expressar os sentidos que atribuiu aos conceitos, modificando-os a partir das relações que estabeleceu. Portanto, o olhar do professor sobre os aspectos que facilitam ou dificultam o desenvolvimento das crianças ajudará a organizar e reorganizar outras atividades, os materiais oferecidos, as formas de execução e os agrupamentos de crianças. Assim o professor terá como prever, já no planejamento, as ações que contribuirão para alcançar seus objetivos e facilitar o aprendizado do aluno. Segundo os Referenciais Curriculares, ao avaliar os alunos, analise as seguintes questões: ✓ De que forma os conhecimentos que o aluno já possui foram considerados? ✓ Qual o objetivo da atividade? Que desafio ela propõe ao aluno? ✓ Que providências foram tomadas previamente para que a atividade fosse realizada? ✓ Que instruções foram dadas para sua realização? Elas foram bem formuladas? 70 ✓ Que conteúdos/temas estão sendo contemplados? ✓ O espaço foi previamente preparado? ✓ Como foi a participação dos alunos? ✓ Houve interação entre eles? O registro avaliativo poderá ser realizado na forma de diagnóstico, veja a seguir. Diagnóstico: Registrar o perfil do aluno e a fase do desenvolvimento em que ele se encontra no início do ano letivo. Observação: Registrar os avanços do aluno ao longo do processo de aprendizagem. É importante que, a cada dia, seja feito pelo menos um registro, pois isso possibilita um retrato dos passos percorridos na construção das aprendizagens. Essa forma de registrar diariamente a caminhada do aluno tem o objetivo de mostrar a importância de cada aula, de cada passo, como uma oportunidade de desenvolvimento. Relatórios: 71 (bimestrais/trimestrais, em forma de áudio, vídeo, fotografias, fichas). Os relatórios deverão registrar os eixos norteadores trabalhados e as reações do aluno diante das propostas oferecidas. Para cada eixo, redija um pequeno texto, sempre levando em consideração o progresso do aluno. Cuidado para que esse relatório não seja apenas um registro contendo “o comportamento que a criança apresentou”, utilizando-se, para isso, de listas uniformes de comportamentos a serem classificados: “atingiu parcialmente”, “não atingiu”, “não apresentou”, “apresentou”, “muito bom”, “bom”, “fraco”, “muito fraco”. A avaliação não deve se reduzir a preencher fichas padronizadas ao fim de um período letivo. Avaliar não é apenas medir, comparar ou julgar. Muito mais do que isso, a avaliação apresenta uma importância social e política fundamental no fazer educativo. Portfólio: A organização do portfólio torna-se significativa pelas intenções de quem o organiza, do aluno e também da família. Não há 72 sentido em coletar trabalhos dos alunos para mostrá-los aos pais somente como instrumento burocrático. Ele precisa constituir-se um conjunto de dados que apresente avanços, mudanças conceituais, novos jeitos de pensar e de fazer pelos quais o estudante passou. Autoavaliação: A criança nessa fase já é capaz de fazer uma autoavaliação justa, correta e precisa, pois tem consciência de suas atitudes e do seu desempenho na execução de tarefas e na interação com os colegas. Participar de uma autoavaliação requer amadurecimento e possibilita o desenvolvimento de valores (responsabilidade, honestidade, sinceridade). A autoavaliação pode ser expressa oralmente, tendo o professor como escriba, ou por desenhos e pintura a cores (determine uma cor para cada ação da criança), entre outros. São muitos os instrumentos que podem ser utilizados para acompanhar o desenvolvimento da criança e possibilitar ao professor a reflexão das ações pedagógicas. A escolha deverá 73 estar de acordo com o planejamento pedagógico e a realidade da sala de aula. O PAPEL DO PROFESSOR NA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL Os professores estarão presentes no cotidiano da criança e vão acompanhar de perto o seu desenvolvimento. Além de exercer a função de educador, o professor deve atentar-se à forma como cada aluno se comporta com os colegas, com os próprios professores, nas aulas e nas atividades, e identificar com qual área de conhecimento a criança tem mais facilidade. Vale ressaltar que cada professor é responsável por avaliar o aluno sob a sua perspectiva. Por isso, o empenho de todos é fundamental para realizar uma avaliação correta. Assim, todos os professores colaboram para um relatório fiel da criança com base no que foi observado. 74 Observe e registre Seja em um caderno ou por meio de um diário on-line, é importante sempre registrar informações relevantes sobre os alunos. A avaliação da educação infantil é um processo contínuo, portanto, é fundamental anotar essas informações de cada criança periodicamente. Para facilitar os registros, o professor pode dividir a turma em grupos e dedicar cada dia da semana para observar os alunos de um grupo com mais atenção. Assim, ao final da semana, ele terá informações sobre todos os alunos. Alguns itens específicos devem ser observados com mais atenção e registrados ao longo do tempo: ✓ Quais são as características do aluno? ✓ Como é a sua participação nas atividades? ✓ Ele tem autonomia? ✓ Quais são as suas habilidades e dificuldades? ✓ Como se ele comporta nas aulas? ✓ Como se relaciona com colegas e professores? ✓ Como reage a conquistas e fracassos? 75 ✓ Como reage a conflitos e adversidades? ✓ Quais foram os seus avanços? Esses são alguns dados importantes que devem ser registrados. Muitas outras situações do cotidiano podem ser anotadas. Com essas informações em mãos, os professores podem conhecer melhor os seus alunos, traçar estratégias para que eles se interessem mais pelas aula se para melhorar formação das crianças. Converse com os alunos Não basta realizar uma avaliação sem conversar com a criança antes e entender o seu lado. É preciso dar voz ao aluno para que ele não seja avaliado sob uma única perspectiva. Assim, ele pode expor o que acha da aula, da escola, dos professores, dos colegas e dos outros elementos que o envolvem no ambiente escolar. Embora seja necessário que a criança se expresse, o professor deve conhecê-la para aproximar-se dela. Além da avaliação tomar outra perspectiva, essa prática desenvolve, na criança, a concepção de cidadania.76 Elabore relatórios e dossiês Para realizar a avaliação dos alunos, é importante fazer relatórios sobre cada um deles ao final de cada etapa. Como esses relatórios serão entregues aos pais, a elaboração deve ser bem precisa acerca das informações coletadas, descrevendo e avaliando a criança na escola durante a etapa. Montar um dossiê de cada aluno também é um recurso que pode ser usado para avaliar a educação infantil. Utilizar atividades, e trabalhos manuais pode comprovar o que está sendo descrito no relatório e exemplificar o seu desenvolvimento escolar. Embora a avaliação da educação infantil seja uma tarefa importante da escola, é preciso ser realizada em conjunto com os pais. Além de estarem presentes no dia a dia das crianças, eles possuem outras visões sobre elas e terão mais o que falar sobre os seus filhos. A colaboração dos pais ajuda a desenvolver um trabalho que, além de melhorar o desempenho escolar das crianças, será também fundamental para a formação delas como cidadãs. 77 REALIZANDO UMA SONDAGEM As investigações sobre a psicogênese da língua escrita permitem ao professor atuar como mediador no processo ensino aprendizagem e fornecer pistas para o aprendiz tornar-se alfabético. Atividade essencial, nesse processo, é a sondagem diagnóstica, que capacita o educador a conhecer as hipóteses das crianças envolvidas no processo de alfabetização (pré-silábico, intermediário I, silábico, silábico-alfabético e alfabético). Para realizar a sondagem escolhem-se quatro palavras (uma polissílaba, uma trissílaba, uma dissílaba e uma monossílaba, nessa ordem) e uma frase de um mesmo campo semântico (mesmo assunto). Por exemplo: dinossauro, jacaré, gato e boi. O gato dormiu na sala. Pede-se, então, para que as crianças escrevam do jeito que souberem. ● O professor pode pedir às crianças que ao lado da palavra façam o desenho, que servirá como índice para a leitura. 78 ● Quando o professor encontra dificuldade para realizar a leitura da escrita da criança, é importante pedir para que ela leia, apontando as letras e sinais correspondentes à fala. Outro elemento importante que pode servir como sondagem é a escrita de textos espontâneos (escrever uma história, como souber). Nesse caso, a análise da escrita pode ser feita a partir dos seguintes parâmetros: não alfabético, nível intermediário II e alfabético). A partir do material investigado em uma sondagem, pode-se refletir sobre o pensamento da criança e perceber sua hipótese linguística. Isso permite a formação de grupos de trabalho heterogêneos e propostas de atividades diversificadas, que objetivem a desestruturação da hipótese que a criança tem a respeito da linguagem escrita, bem como a construção de uma nova hipótese, culminando na reconstrução do código linguístico. Uma das formas de contribuir para esse trabalho é utilizar jogos. 79 Jogando se aprende a fazer de conta, representar uma coisa por outra, criar códigos, perceber as letras. Apreende-se o valor sonoro convencional e reconstrói o código linguístico. Para que se lê? • Para sentir o texto, dialogar com seu autor ou, simplesmente, para usufruí-lo: sem perguntas, sem questionamentos. É a leitura-prazer. • Para buscar informações, coletar dados. É a leitura-pesquisa. • Para ampliação dos conhecimentos – apossar-se do que já foi construído pela humanidade. • Para esclarecer dúvidas, buscar respostas. Pergunta-se ao texto. A leitura e a escrita de textos funcionais, científicos e literários, a partir do conhecimento e do domínio das propriedades específicas de cada um; a busca de coerência, interna e externa, de coesão, de harmonia, de movimento e de estabelecimento de paralelos e de ligações, entre o real e o imaginário, possível ou 80 não, em suas produções escritas, são alguns pontos a ser construídos. Viver em sociedade exige conhecer e utilizar-se de diferentes materiais impressos que circulam ou que atropelam, visualmente, as pessoas: outdoor, propagandas, cartazes, panfletos, jornais, revistas, receituário médico, placas, anúncios, bilhetes, catálogo telefônico, circulares, ofícios, requerimentos, cheques e muitos outros. Permitir a exploração destes materiais (leitura e produção) significa partir da realidade dos educandos, isto é, do que é cotidiano; significa, ainda, propiciar-lhes a oportunidade de ampliar e aprimorar a sua competência linguística, de se adaptar à sociedade. As crianças, que vivem num ambiente estimulador, constantemente estão recebendo informações sobre a função social da escrita. • ampliar a memória; recordar aspectos e coisas que possam ser esquecidos (lista de compras, agenda). • encontrar informações urgentes (endereços, telefones...); • comunicar-se à distância (bilhete, recado, carta...). 81 O texto técnico-informativo exige escritor e leitor interessados em determinado tema. Permite o crescimento do indivíduo enquanto ser social e de cultura. Os textos científicos/ informativos possibilitam novas formas de pensamento; trazem novos conhecimentos, permitem avanços científicos e a busca de soluções alternativas. São textos relacionados com o conhecimento sistematizado já produzido pelo homem nos diferentes campos da ciência. Permite acrescentar coisas ao que se sabe. O terceiro tipo de texto inclui um outro aspecto do letramento, que é o prazeroso, o belo, o estético da língua – a literatura. Envolver-se com literatura é permitir-se conhecer outros padrões linguísticos, enxergar o mundo através de outros olhos e de pensamentos, os mais diversos. É apresentar estilos, o como se utilizar da língua escrita, de forma viva, com muito movimento e harmonia. Permite viagens no tempo – passado e futuro – envolvimento em idéias e acontecimentos de nossa própria escolha. 82 Buscam-se, em um texto, informações, reflexões, pretextos e prazer. Mas o que é uma sondagem? É uma atividade de escrita que envolve, num primeiro momento, a produção espontânea pelos alunos de uma lista de palavras sem apoio de outras fontes escritas. Ela pode ou não envolver a escrita de frases simples. É uma situação de escrita que deve, necessariamente, ser seguida da leitura pelo aluno daquilo que ele escreveu. Por meio da leitura, você poderá observar se o aluno estabeleceu ou não relações entre aquilo que ele escreveu e aquilo que ele lê em voz alta, ou seja, entre a fala e a escrita. AVALIAÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO Na medida em que for possível, o professor deve observar o trabalho diário de seus alunos, circulando pela classe, conversando e discutindo a respeito das atividades. A observação atenta indica ao professor fatores importantíssimos, como: adequação do assunto, tempo de execução, interesse individual e da classe, conclusão das atividades. 83 Assim, a observação por parte do professor serve para avaliar não só o seu trabalho, mas também o de seus alunos; é um indicador para a continuidade, ou não, de sua prática pedagógica. De maneira geral, avaliar a qualidade dos trabalhos executados é mais coerente do que atribuir valores numéricos a eles, visto que, muitas vezes, esse procedimento não é suficiente para representar a realidade dos alunos no que se refere à apreensão de conceitos e conteúdos. Infelizmente, nosso ano escolar é interrompido por férias no mês de dezembro, o que pressupõe que uma etapa de aprendizagem foi cumprida, e nem sempre isso é real. No decorrer do ano,
Compartilhar