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1 GRANDES SÍNDROMES GERIÁTRICAS Yeda Duarte Como já vimos, com o envelhecimento ocorrem múltiplas alterações nos diferentes sistemas orgânicos cujo resultado final é a progressiva diminuição de nossa reserva funcional o que, em condições normais não acarreta maiores problemas mas, em situações de estresse (de qualquer natureza) podem levar à situação de desequilíbrio e incapacidade de readaptação ocasionando uma descompensação progressiva que pode ser manifestada por diferentes agravos ou doenças. Também já comentamos que os idosos costumam apresentar sinais e sintomas relacionados às doenças ou agravos de forma atípica, obscura ou inexistente. Isso exige do profissional de saúde uma grande capacidade de observação e a compreensão da necessidade de valorização da queixa da pessoa idosa buscando, juntamente com ela, identificar o que está ocorrendo e, intervir precocemente de forma a auxiliá-la em sua recuperação. Pelo fato da reserva funcional da pessoa idosa ser progressivamente menor, a intervenção precoce torna-se essencial para a melhoria da qualidade assistencial. É comum que, entre as pessoas idosas, certos conjuntos de situações ocorram com maior frequência e, a partir da análise minuciosa de cada uma dessas condições, é possível compreender seus prováveis determinantes. Tais condições são denominadas “grandes síndromes geriátricas” ou os cinco “is” da geriatria pois a cada uma dessas condições foi dado um nome iniciado pela letra “I”: Imobilidade, Instabilidade Postural, Iatrogenia, Insuficiência cognitiva e Incontinência. Posteriormente acrescentou-se mais uma condição denominada “Insuficiência familiar” e, mais recentemente ainda, incluiu-se a “síndrome de Fragilidade” porém, nenhum nome iniciado por “i “foi encontrado para denomina-la. É sobre isso que vamos conversar nesse momento. O primeiro ponto que devemos lembrar é que, uma “síndrome” se caracteriza por múltiplas etiologias, ou seja, não existe uma causa única. Ela, geralmente, não causa risco iminente de morte mas compromete, de forma significativa, a qualidade de vida da pessoa acometida. Dada a multiplicidade etiológica associada à síndrome, ela envolve terapêutica complexa e, de 2 preferência, uma abordagem multidisciplinar. No entanto, ainda hoje, pela inadequada formação de muitos profissionais, as síndromes podem ser, erroneamente, confundidas como parte do processo normal de envelhecimento e, por essa razão, não serem adequadamente tratadas. A figura a seguir, nos auxilia a compreender a relação das grandes síndromes com o processo de envelhecimento: Observa-se que a associação entre as alterações fisiológicas relacionadas à senescência ou seja, ao processo “normal” de envelhecimento e, as relacionadas à senilidade ou, as associadas aos processos de doença que comumente acometem os idosos, pode levar às “grandes síndromes”. Na maioria das vezes, não estamos atentos para essas condições embora convivamos com os idosos diariamente. O que é mais comum, é darmos mais atenção para o que se chama ‘epifenômenos” ou seja, as condições agudas, decorrentes das síndromes, que acometem as pessoas idosas e, geralmente são as responsáveis pela procura dos serviços de saúde. São exemplos dessas condições as pneumonias e as fraturas pós quedas. Uma síndrome geralmente leva à outra produzindo o que se denomina “efeito dominó” cujo significado final é a piora significativa da qualidade de vida da pessoa idosa e de seus familiares. 3 Vamos agora, conversar um pouco sobre cada uma das síndromes. INSTABILIDADE POSTURAL A Instabilidade Postural aumenta o risco de ocorrência de quedas. Pode ser consequência de alterações no sistema locomotor (com alteração da marcha), no sistema vestibular (vertigens, tonturas), no sistema sensorial (em especial a diminuição da acuidade visual) e do sistema de propriocepção (capacidade de perceber o próprio corpo e seu entorno). A principal consequência dessa síndrome é a ocorrência de quedas que são devastadoras na vida das pessoas idosas. A Secretaria do Estado de Saúde fez, há alguns anos uma campanha de prevenção de quedas no Estado de São Paulo tendo como slogam “Cair de maduro é só para fruta”, partindo do princípio que cair na velhice, embora seja frequente, não é normal. Queda é o deslocamento não intencional do corpo para um nível inferior à posição inicial com incapacidade de correção em tempo hábil, determinada por circunstâncias multifatoriais, comprometendo a estabilidade (Associação Médica Brasileira, 2000). A queda é, geralmente, um evento sinalizador do início do declínio da capacidade funcional ou sintoma de uma nova doença ou agravo. Porque “Queda em idosos” é um evento tão importante? 4 Porque é frequente, pode ser devastador, comprometendo a saúde e a independência dos idosos; pode levá-lo ao óbito e, além disso, custa caro tanto para o Estado quanto para as famílias. Estudos epidemiológicos apontam que 35% a 40% dos idosos com idade igual ou superior a 60 anos caem ao menos uma vez ao ano, aumentando para 50% entre os idosos de 80 anos e mais e, 13% de todos os idosos caem duas vezes ou mais ao ano e são chamados de “caidores”. Depois de um ano, 20% dos “caidores” recorrentes estão no hospital, em uma instituição de longa permanência (ILPI) ou morreram. Outros dados mostram que, entre os idosos que sofreram quedas, 30 a 75% deles sofrem lesões, de diferentes tipos mas, a maioria, não procuram assistência a não ser em casos mais graves. As fraturas constituem os desfechos mais graves relacionados às quedas. A fratura de quadril compreende cerca de 25% das fraturas pós-queda em idosos da comunidade. A taxa de hospitalização por fratura de quadril em mulheres acima de 65 anos nos EUA aumentou 23%. Em São Paulo, no ano de 2000, encontrou-se uma prevalência de 28,6% de quedas entre as pessoas idosas residentes na comunidade. Quando a ocorrência desse agravo é analisada em contextos fechados como Instituições de Longa Permanência de Idosos (ILPIs) ou hospitais, verifica-se uma prevalência três vezes maior (1,5 quedas/leito/ano). Outro estudo colocou o Brasil em segundo lugar no relato de quedas como causa de morte entre as pessoas idosas. Segundo dados do Ministério da Saúde, em fevereiro de 2000, a taxa de mortalidade hospitalar em decorrência de queda, foi de 2,6%. Essa taxa eleva-se dramaticamente com a idade, sendo que 70% das mortes ocorreram com pessoas a partir dos 75 anos. A queda figura entre as mais importantes causas de acidentes nesse grupo etário e representa a principal causa de morte na categoria “traumas externos”. Pesquisas mostram que, entre os idosos que sofreram queda há um aumento de aproximadamente 50% na mortalidade no ano subsequente à mesma. Alguns autores afirmam que metade dos idosos que sofrem fratura de quadril em decorrência da queda ficam incapacitados e podem ser institucionalizados e, desses, 25% morrerão em menos de seis meses, o que mostra o impacto negativo desse agravo na sobrevida e na qualidade de vida da pessoa idosa. 5 De 10 a 25% das quedas institucionais são acompanhadas por lesões, muitas vezes dolorosas, e/ou fraturas, responsáveis pelo maior comprometimento da mobilidade das pessoas idosas e por internações mais prolongadas. Alguns estudos associam as quedas às internações hospitalares e as quedas recorrentes uma importante causa de admissão prematura em ILPs. Denomina-se caidor o indivíduo que teve uma queda no decorrer de seis meses a um ano; caidor recorrente, aquele que teveduas ou mais quedas no mesmo período e não caidor, aquele que não caiu. Não é incomum que as pessoas idosas omitam a informação referente à ocorrência de quedas para os profissionais de saúde, familiares ou cuidadores. Isso ocorre ou por não estarem conscientes dos riscos associados às quedas ou por as considerarem eventos comuns, ou ainda, por terem receio de serem considerados frágeis e, também, por considerarem tal relato constrangedor. Atualmente é considerada um “evento sentinela” responsável pelo desenvolvimento de uma “cascata de problemas” conforme demonstrado no exemplo a seguir: Uma pessoa idosa sofre uma queda acidental e desenvolve medo de cair novamente. Torna-se assim, mais insegura reduzindo as atividades físicas que costumava desenvolver. Isso provoca menor mobilidade que, por sua vez, pode culminar com maior declínio funcional. Este pode levar à perda da independência, repercutindo de forma significativa em sua qualidade de vida. Alguns autores descrevem os fatores biológicos envolvidos no processo de envelhecimento, principalmente as perdas funcionais e as adaptações a certas situações de estresse, redução da capacidade física, desenvolvimento de alterações cognitivas, o que repercute em sua performance. Mesmo os idosos mais saudáveis apresentam alterações de equilíbrio e força devido à diminuição de sua capacidade sensorial, musculoesquelética e neurológica. Essas alterações podem comprometer gradativamente a execução de suas atividades cotidianas como levantar-se de uma cadeira, carregar as próprias compras, ir ao cinema ou visitar um amigo ou outros familiares. Em consequência pode ocorrer comprometimento da independência, podendo, em última instância, gerar isolamento social que pode ser acompanhado por quadros depressivos, interferindo na sua qualidade de vida. 6 Vários estudos apontam que uma das mais importantes consequências das quedas é o desenvolvimento do “medo de cair”, seguido das fraturas, hospitalização precoce, imobilização, institucionalização, isolamento social, depressão e óbito. “Ptofobia” é o nome dado para caracterizar a fobia de quedas das pessoas idosas. A perda de confiança pode resultar na restrição das atividades. Além de ocorrer entre os idosos que sofreram quedas, pode ocorrer também entre os que não sofreram. As quedas geram sintomas como ansiedade e depressão além da perda de confiança na própria capacidade de andar com segurança em diferentes ambientes o que está associado ao declínio funcional, sentimentos de inutilidade, isolamento social e depressão. Cerca de 45% dos idosos que caem apresentam alguma limitação em suas atividades em decorr6encia de lesões físicas ou por medo de cair. Os quadros depressivos não são incomuns e estão relacionados ao sentimento de impotência, desamparo e isolamento social, pela impossibilidade de se locomover, quadros frequentemente presentes entre os idosos que sofreram quedas com lesões, em especial fraturas. Alguns pesquisadores consideram que um dos determinantes primordiais da qualidade de vida da pessoa idosa é sua capacidade de deambulação. Estudo mostrou que, entre os idosos que sofreram quedas, 88,5% deles tinham receio de cair novamente, 24% sofreram fraturas,24,3% tiveram de abandonar suas atividades anteriores, 26,9% precisaram modificar seus hábitos e 23,1% desenvolveram a síndrome de imobilidade. A queda também gera impacto nos cuidadores e familiares de idosos com demência, pois esses tornam-se mais ansiosos devido ao receio do idoso cair novamente. Esse medo os transforma em pessoas super-protetoras e pode ter como consequência uma maior restrição à autonomia da pessoa idosa. Fatores de risco de quedas entre pessoas idosas As causas associadas às quedas entre as pessoas idosas são multifatoriais e complexas, resultado da associação de fatores individuais e ambientais. Chang e col identificaram como principais riscos associados às quedas certos medicamento, alterações visuais, riscos ambientais e presença de 7 hipotensão ortostática. Para outros pesquisadores os fatores de riscos para a ocorrência de quedas podem ser classificados em: fatores intrínsecos; extrínsecos ou ambientais; situacionais ou comportamentais. Entre as pessoas idosas esses fatores podem estar mais acentuados e interligados, podendo levar à hospitalização ou institucionalização. Os fatores intrínsecos estão relacionados às alterações fisiológicas advindas do processo de envelhecimento (ex: alterações no equilíbrio, estabilidade postural, diminuição da força, diminuição na acuidade auditiva e visual, alterações posturais), a presença de comorbidades e o uso de múltiplos medicamentos (polifarmácia). As desordens cardiovasculares são responsáveis por 77% da procura pelos serviços de emergência com histórico de quedas inexplicáveis, recorrentes e associadas às perdas de consciência inexplicáveis. Essas causas podem ser divididas em três grupos: desordens mediatas neurológicas; anormalidades intrínsecas cardíacas estruturais e rítmicas; causas diversas. A síncope vaso vagal é uma síndrome mediata neurológica e pode ocorrer, em qualquer idade, em decorrência de situações geradoras de estresse (p. ex: dor ou trauma emocional), podendo levar à perda da consciência. A síndrome da carótida sinusal ou “ataque de queda” é uma doença que raramente ocorre antes dos 50 anos e tem prevalência desconhecida. Ocorre, geralmente, após manobras realizadas na carótida sinusal (lateralização da cabeça por um esforço, dor ou permanência em pé tempo prolongado) podendo ser acompanhada por amnésia ou perda da consciência. É mais frequente em homens e essa associação pode estar relacionada à maior prevalência de comorbidades cardiovasculares nesse grupo. A prevalência de hipotensão ortostática aumenta com a idade. A hipotensão pós prandial pode ser exacerbada na mudança postural. Sua prevalência é desconhecida assim como a morbi-mortalidade associada. Todos esses achados justificam a necessidade do desenvolvimento de intervenções que visem a prevenção desse agravo. 8 A denominada “marcha senil” também pode estar associada a maior ocorrência de quedas entre as pessoas idosas. Essa marcha se caracteriza por base alargada, diminuição do balanço dos braços, postura encurvada, flexão de quadril e joelhos, passos mais curtos e maior lentidão ao caminhar. Esse tipo de marcha representa uma tentativa de aumentar a estabilidade e a segurança ao caminhar. Com relação aos medicamentos, as drogas psicoativas têm um efeito de lentificação da resposta, sonolência, hipotensão postural além de outros efeitos colinérgicos como, por exemplo, a visão turva. Já os anti-hipertensivos podem aumentar a chance de ocorrência de quedas devido a hipotensão postural. Assim, é fundamental que o profissional de saúde que atende pessoas idosas conheça os efeitos adversos associados aos medicamentos de forma a prevenir a ocorrência de quedas associadas aos mesmos. Entre os fatores extrínsecos destacam-se os riscos ambientais como iluminação inadequada, pisos irregulares ou escorregadios, obstáculos no caminho (móveis, fios), tapetes soltos, ausência de barras de apoio em banheiros, ausência de corrimãos em escadas, roupas muito longas, calçadas inadequadas, uso inadequado de tecnologia assistida (andador, bengala ou cadeiras de rodas). A maioria das quedas acontecem na residência dos idosos (70%) em especial no quarto, na cozinha, no banheiro e na sala de jantar. Cerca de 10% delas ocorrem nas escadas, sendo o primeiro e o último degrau os mais perigosos.Já os fatores situacionais ou comportamentais são representados por algumas atividades que podem aumentar o risco de ocorrência do agravo como, por exemplo, deambular de meia, ir ao banheiro à noite com as luzes apagadas, subir em cadeira ou banquinho para pegar objetos localizados em níveis elevados, andar apressadamente quando isso constitui um hábito etc. Cerca de ⅓ dos idosos caem devido aos riscos ambientais existentes em seus domicílios. Nesses locais, a maior frequência de quedas ocorre nas escadas (subindo ou descendo) ou quando estão em pé. Quando se comparam os sexos, verifica-se uma maior propensão masculina para cair fora da 9 residência, enquanto entre as mulheres, isso ocorre mais no interior da mesma. Isso pode estar associado ao fato de os homens idosos ainda trabalharem e/ou saírem mais enquanto as mulheres costumam ficar mais em suas casas realizando os afazeres domésticos. Atualmente, no entanto, observa-se uma contínua mudança nesse comportamento. Segundo Perracini e Ramos, vários estudos tem indicado uma maior frequência de quedas entre as mulheres em decorrência da presença de osteoporose embora não existam dados suficientes para comprovar essa relação. Sabe-se, no entanto, que a presença de osteoporose aumenta o risco de fraturas. Evitar a ocorrência de quedas tornou-se um fato importante e desafiador. Conhecer o histórico de quedas (definir o tipo de evento, como, onde e quando ocorreu) é o primeiro passo para um adequado planejamento das intervenções e das medidas preventivas. O histórico de quedas é o maior preditor de futuras quedas entre as pessoas idosas residentes na comunidade, em instituições hospitalares e em ILPIs. É necessária uma avaliação criteriosa da queda ocorrida identificando detalhadamente seu histórico, medicações utilizadas pela pessoa idosa, alterações visuais, de marcha, de equilíbrio, problemas nas articulações, problemas neurológicos e cardiovasculares. O roteiro de perguntas a seguir, contribui para uma melhor avaliação da situação de quedas apresentadas pelas pessoas idosas: a) Histórico de quedas nos últimos 3 meses b) Onde caiu? c) O que fazia? d) Sentiu algo antes de cair? e) Conseguiu levantar-se sozinho(a)? Necessitou de mais de 5 minutos para se levantar? f) Iniciou medicação nova ou alterou a dosagem de algum medicamento que costumava tomar? g) Você toma mais de 4 medicamentos diferentes por dia? h) Ingeriu bebidas alcoólicas antes da queda? i) Tem alguma doença crônica que estava/está descompensada? j) Como está sua capacidade funcional (capacidade em desempenhar de forma independente suas atividades do dia a dia)? k) Foi ao oftalmologista recentemente? 10 l) Peça que descreva a casa e os ambientes onde costuma circular para avaliar riscos ambientais; m) Verifique evidências de maus tratos incluindo abandono e auto negligência. As intervenções nas situações de ocorrência de quedas são multifatoriais. Exercícios programados com ênfase no treinamento de equilíbrio e marcha, modificações nos esquemas medicamentosos (aprazamento), tratamento de hipotensão postural, alterações no ambiente físico tornando-o mais seguro, e tratamento das desordens cardiovasculares são alguns exemplos. Promover a saúde da pessoa idosa inclui medidas de prevenção de quedas onde se destacam: a) Avaliação geriátrica ampla com medidas corretivas adequadas; b) Racionalização do uso de medicamentos; c) Redução do consumo de bebidas alcoólicas; d) Avaliação da acuidade visual; e) Avaliação nutricional; f) Estímulo à atividade física para fortalecimento muscular, melhoria do equilíbrio e marcha e da amplitude articular, aumento da flexibilidade e alongamento; g) Correção de fatores de risco ambientais (p. ex: barras de apoio no banheiro, piso antiderrapante no banheiro e cozinha); h) Conscientização e modificação de comportamentos de risco IMOBILIDADE A Síndrome da Imobilidade (SI) envolve a incapacidade de deslocamento sem o auxílio de terceiros para os cuidados necessários à vida diária podendo o idoso estar restrito ao leito ou a uma cadeira de rodas. Caracteriza-se por um conjunto de alterações decorrentes de um período de imobilização prolongada que comprometem a independência e, consequentemente, a qualidade de vida da pessoa idosa. Estima-se uma prevalência de 25% a 50% após hospitalização prolongada e 75% entre os idosos institucionalizados. Na comunidade essa prevalência é menor, girando em torno de 25%. 11 A SI é multifatorial envolvendo uma associação entre polipatologias, aspectos psicológicos e sociais. Suas principais causas são: a) Problemas osteoarticulares incluindo problemas nos pés (deformidade, calosidade, ulcera plantar); b) Alterações cardiovasculares (AVC, insuficiência cardíaca, doença arterial periférica); c) Doenças respiratórias (DPOC); d) Iatrogenia medicamentosa (neurolépticos, ansiolíticos, hipnóticos) e) Doenças neurológicas e psiquiátricas (demência, depressão, Parkinson); f) Desnutrição; g) Quedas repetidas; h) Isolamento social A imobilidade prolongada gera um progressivo declínio funcional que atinge vários sistemas orgânicos. Tais alterações associadas às decorrentes do próprio envelhecimento acabam por ocasionar a SI que pode estar associada a várias complicações como desenvolvimento de úlceras por pressão, trombose venosa profunda, embolia pulmonar, isquemia arterial aguda, fraturas, incontinência, retenção urinária, infecções, atrofia muscular, encurtamento dos tendões, contraturas, constipação, delirium, inversão do ritmo do sono, depressão, entre outras. A SI representa o máximo da incapacidade funcional sendo difícil sua reversão após sua instalação. Daí ser fundamental sua prevenção a partir de um trabalho conjunto entre os profissionais de saúde e os familiares da pessoa idosa. Algumas medidas de prevenção podem ser ressaltadas: Identificar dos fatores de risco Restringir o tempo no leito Iniciar fisioterapia passiva e ativa Treinar o idoso, quando restrito ao leito por qualquer razão, a: o Elevar o quadril o Deslocar-se lateralmente o Virar-se no leito Iniciar deambulação precoce sempre precedida da fase em posição sentada Apoio nutricional e psicológico. 12 INCONTINENCIA ESFINCTERIANA Entre as incontinências, a urinária é a mais comumente observada nas pessoas idosas. Isso não faz dessa condição algo “normal” na velhice, muito pelo contrário. Ela representa uma alteração que deve ser investigada e tratada dadas seu impacto na qualidade de vida das pessoas acometidas. A incontinência urinária tem importante impacto social gerando estigma social capaz de causar restrições das atividades sociais, isolamento e depressão. Vamos inicialmente lembrar algumas alterações na micção que ocorrem com o envelhecimento. Em primeiro lugar vamos lembrar as alterações que ocorrem nos dois sexos. É mais comum entre os idosos a noctúria ou seja, urinar à noite. Há uma redução da contratilidade e da capacidade de armazenamento vesical, diminuição da habilidade em retardar a micção, aumento do volume residual (quantidade de urina na bexiga após a micção aumenta para 50 a 100 ml) e surgimento de contrações não inibidas do detrusor (essas contrações espontâneas eram, antes, inibidas pelo centro inibitório da micção). Nos homens, a hipertrofia da próstata é comum, deslocando a pressão para o colo da bexiga e resultando em retenção urinária, incontinência e infecção do trato urinário (a próstata é uma “esfera” que abraça a uretra e seu aumento leva a um estrangulamentoda mesma dificultando a passagem da urina). Os idosos podem apresentar dificuldade em iniciar a micção e na manutenção do jato urinário. As mulheres idosas, em especial as multíparas, podem apresentar incontinência por estresse ou seja, liberação involuntária de urina quando do aumento da pressão intra-abdominal (tosse, espirro, carregar peso, gargalhar,etc) em decorrência do enfraquecimento da musculatura pélvica e da bexiga. Pode ainda ocorrer outros tipos de incontinência (urgência, funcional, hiperfluxo e mista) mas isso não deve ser considerada uma alteração normal do envelhecimento. Cerca de 1/3 das pessoas idosas com incontinência apresentam causas reversíveis como delirium, infecção urinária, uretrite e vaginite atróficas, restrição da mobilidade, aumento da diurese, impactação fecal (alteração do ângulo entre o reto e a uretra com obstrução parcial da última), distúrbios psíquicos, uso de 13 determinados medicamentos (diuréticos, sedativos, antidepressivos, analgésicos opióides, antipsicóticos) ou substâncias (cafeína, álcool). Toda pessoa idosa com queixa de perda involuntária de urina, dificuldade em controlar a micção, dificuldade em segurar a urina até chegar ao banheiro deve ser cuidadosamente avaliada. Essa avaliação inclui anamnese, exame físico e análise da urina. Na anamnese investiga-se a história da incontinência e seu impacto social. Perguntas como: quando começou, é intermitente ou contínua, ocorre de dia ou à noite, a caminho do banheiro e/ou durante algum esforço; devem ser incluídas. Deve-se ainda investigar a presença de polaciúria (aumento da frequência miccional), disúria (dor à micção), enurese (perda involuntária de urina dormindo), intervalo entre as micções, sensação de esvaziamento da bexiga insuficiente, características do jato urinário. Incluir na avaliação a presença de constipação intestinal, acesso ao banheiro, cirurgias prévias, doenças neurológicas e uso de medicamentos. O tratamento da incontinência não é padronizado. Deve ser personalizado para cada idoso. Deve-se investigar a(s) causa(s) tratando-se as reversíveis como, por ex, uso de antibióticos para os casos de infecção; de estrogênio tópico para atrofia genital acentuada; enemas e laxativos para impactação fecal; diminuição da restrição ao leito, etc. Os tratamentos farmacológicos e os cirúrgicos são de indicação médica e feitos após minuciosa avaliação.Também devem ser utilizados os tratamentos não farmacológicos que envolvem modificações ambientais e técnicas corporais. As primeiras visam facilitar o acesso ao banheiro e tornar mais fácil e seguro seu manuseio (iluminação adequada, barras de apoio). A segunda envolve a realização de exercícios para fortalecimento da musculatura do assoalho pélvico (treinamento vesical, exercícios de Kegel, cones vaginais, biofeedback e eletroestimulação) e a criação do hábito miccional (ir ao banheiro em intervalos regulares independente da vontade de urinar). O uso de tampões uretrais, absorventes e fraldas podem ser grandes aliados na melhoria da qualidade de vida da pessoa idosa. 14 Mais rara porém presente é a incontinência fecal (IF). Dados do Estudo SABE mostram que 7% das pessoas idosas residentes no município de São Paulo referem a presença de IF. Devemos lembrar que o intestino sofre várias alterações com o processo de envelhecimento que podem ocasionar maior prevalência de constipação, neoplasias e doença diverticular. Alterações na inervação intestinal e na musculatura podem ocasionar hipotonia e diminuição dos movimentos que impulsionam o bolo fecal. Não é incomum que idosos com impactação fecal (fecaloma) queixem-se de perda de “fezes líquidas” que nada mais são do que muco eliminado pelo ânus produzido pelo intestino na tentativa de “empurrar” as fezes impactadas. O desconhecimento desse tipo de situação pode levar a uma conduta errônea como o tratamento da perda fecal como diarreia o que pioraria significativamente o quadro apresentado. O tratamento deve ser feito com o uso de enemas, laxativos, uso de fibras e aumento na ingestão de líquidos. A real incontinência fecal é geralmente associada a alterações no esfíncter anal externo e está associada a presença de AVC, neuropatia periférica (diabetes) e declínio cognitivo. Suas consequências são tão ou mais desastrosa que as observadas na IU e, por essa razão, devem ser adequadamente abordadas. IATROGENIA Iatrogenia refere-se a um estado de doença, efeitos adversos ou complicações causadas por ou resultantes do tratamento médico. O termo deriva do grego iatros (médico, curandeiro) e genia (origem, causa), e pode aplicar-se tanto a efeitos bons como ruins. Em farmacologia, o termo iatrogenia refere-se a doenças ou alterações patológicas criadas por efeitos adversos associados aos medicamentos. De um ponto de vista sociológico, a iatrogenia pode ser clínica, social ou cultural. Embora seja usada geralmente para se referir às consequências de ações 15 danosas dos médicos, pode igualmente ser resultado das ações de outros profissionais não médicos. Desde o tempo de Hipócrates reconhece-se o potencial efeito lesivo das ações de uma pessoa que tenta curar. O princípio da não-maleficência (primum non nocere) é um ponto importante da bioética e a doença ou morte iatrogênica causada intencionalmente, ou por erro evitável ou negligência de quem cura, é considera um crime na maioria das civilizações. Com o desenvolvimento da medicina científica ao longo dos séculos mais recentes, a grande evolução das técnicas e dos medicamentos disponíveis permitiu uma enorme queda da mortalidade iatrogénica. Condições iatrogênicas não resultam necessariamente de erros médicos, tais como falhas durante uma cirurgia, ou a prescrição do medicamento errado. De fato, tanto os efeitos intrínsecos como os derivados de um tratamento médico podem ser iatrogênicos. Por exemplo, a radioterapia ou quimioterapia, devido à agressividade necessária dos agentes terapêuticos, causam perda de cabelo (alopécia), anemia, vómitos e náuseas, entre outros. Estes efeitos são iatrogênicos porque são consequência do tratamento médico. Há situações onde podem realmente ocorrer negligência ou falhas nos procedimentos, como quando uma prescrição com má caligrafia leva à dispensa do medicamento errado podendo levar a efeitos danosos ao paciente tratado. Uma causa muito comum de efeitos iatrogênicos é a interação medicamentosa, que ocorre quando um ou mais medicamentos alteram os efeitos de outros que estão sendo tomados pelo paciente, aumentando ou diminuindo a sua ação. Efeitos adversos como reações alérgicas a medicamentos, mesmo quando inesperadas, são uma forma de iatrogenia. A evolução de antibióticos pode ser iatrogênica, já que geralmente ocorre como resultado de uma má utilização dos antibióticos. Em relação às pessoas idosas, as interações medicamentosas que ocasionam reações adversas a medicamentos (RAM) constituem as principais condições iatrogênicas. Segundo a OMS, as RAMs são definidas como qualquer 16 efeito nocivo, não intencional e não desejado de uma droga ocorrendo em doses usadas para profilaxia, diagnóstico ou tratamento. Quando dois ou mais medicamentos são administrados simultaneamente duas situações podem ser observadas. Na primeira, denominada indiferença farmacológica, cada medicamento age provocando os feitos desejados sem qualquer interação com o(s) outro(s). Na segunda, ao contrário, os medicamentos interagem ou seja, a ação de um interfere nos efeitos do outro podendohaver sinergismo (potencialização) ou antagonismo (prejuízo na ação do outro). Entre os idosos essas situações podem ocorrer com maior frequência dado o uso de múltiplos medicamentos e, muitas vezes pela presença da denominada polifarmácia (uso de 5 ou mais medicamentos diferentes). Por outro lado, a iatrogenia também pode estar associada ao uso das denominadas drogas potencialmente impróprias para pessoas idosas integrantes da lista de BEERS. Para minimizar essas ocorrências, alguns cuidados são necessários com as prescrições das pessoas idosas: a) Esteja atento à presença de reações adversas e tratamentos desnecessários; b) Considere a adesão, a informação e o tipo de embalagem do medicamento (pode confundir os idosos) e escolaridade da pessoa idosa; c) Investigue a automedicação; d) Atenção ao aprazamento entre as drogas (amplos intervalos entre as doses); e) Revise a prescrição em todo atendimento do idoso e relembre com ele a indicação de cada medicamento; f) Investigue reações adversas potenciais; g) Esteja atento a possíveis interações medicamentosas. INSUFICIÊNCIA COGNITIVA Entende-se por cognição o conjunto de funções cerebrais formadas pela memória (armazenamento das informações), função executiva (capacidade de planejamento, antecipação, sequenciamento e monitoramento de tarefas 17 complexas), linguagem (compreensão e expressão da linguagem escrita e oral), praxia (capacidade de executar um ato motor), gnosia (capacidade de reconhecimento de estímulos visuais, auditivos e táteis) e função visuo-espacial (capacidade de localização no espaço e percepção das relações entre os objetos). O funcionamento integrado dessas diferentes funções permite que os indivíduos interajam entre si e com o mundo buscando resolver as situações e dificuldades cotidianas (capacidade de decidir) que juntamente com nosso humor (motivação) são responsáveis pela manutenção da autonomia da pessoa idosa. A senescência não afeta a cognição de forma significativa. As alterações que ocorrem, como já vimos anteriormente, levam a uma lentificação do processo cognitivo, redução da atenção, maior dificuldade no resgate das informações apreendidas e redução da memória prospectiva e contextual (dificuldade com detalhes) o que não acarreta prejuízo importante no desempenho das atividades cotidianas. A incapacidade cognitiva é um diagnóstico sindrômico que envolve esquecimento confirmado por familiares, dificuldade no desempenho de atividades cotidianas e alteração na triagem cognitiva. Está associada a quatro grandes causas: a) Demência b) Depressão c) Delirium d) Doença mental. As pessoas idosas podem apresentar desordens depressivas caracterizadas pela baixa do humor e variabilidade na gravidade. Existe depressão sintoma e depressão doença. A tristeza é um sentimento que pode estar presente em vários momentos da vida mas é insuficiente para inviabilizar completamente os projetos de vida da pessoa que preserva o interesse em algumas atividades. A perda geradora da tristeza é gradativamente superada e permite uma vida psíquica normal. 18 Já a depressão caracteriza-se pela presença de humor deprimido (sensação de vida vazia, irritabilidade, emotividade excessiva, choro frequente, considera- se um peso para a família e acha a morte uma solução); perda de interesse ou prazer com as atividades que antes eram agradáveis; perda ou ganho significativo de peso; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada; diminuição da capacidade de concentração, pensamentos recorrentes de morte ou ideação suicida. A prevalência de depressão nas pessoa idosas varia de 10% (idosos da comunidade) a 30% (residentes em ILPIs). É ainda sub diagnosticada e, por essa razão, sub tratada nesse grupo. Requer atenção dos profissionais de saúde pois compromete significativamente a qualidade de vida das pessoas idosas e de seu entorno familiar. O delirium é de instalação aguda e caracteriza-se pela presença de alterações do nível de consciência e pelo comprometimento global das funções cognitivas (memória, percepção, linguagem, etc). Geralmente está associado a quadros infecciosos e alterações metabólicas que devem ser investigadas e tratadas. Uma vez tratada a causa, tendem a desaparecer. A principal pergunta a ser feita para auxiliar na identificação do problema é “há quanto tempo a pessoa idosa está apresentado o quadro”. Instalações repentinas sugerem a presença de delirium. Doenças mentais de início tardio também podem comprometer a cognição das pessoas idosas. As mais comuns são parafrenia tardia (quadro intermediário entre a esquizofrenia e a paranoia), esquizofrenia residual e oligofrenia, as duas últimas com histórico de doença mental prévia. DEMENCIAS Demência é o nome dado ao conjunto de alterações que ocorrem no cérebro das pessoas modificando suas capacidades intelectuais. O termo “demência” significa que a pessoa apresenta déficits de memória associados com dificuldades em pelo menos um outro setor, de intensidade suficiente para restringir as atividades diárias. Antigamente, quando as pessoas idosas 19 apresentavam esse tipo de problema diziam que estava “esclerosada” ou pior, que estavam “caducando” e achavam que isso era normal, simplesmente porque elas eram velhas. Existem vários tipos de demência, mas a mais frequentemente observada nas pessoas idosas é a Doença de Alzheimer nome esse atribuído ao médico psiquiatra alemão Alois Alzeimer que, em 1907, identificou mudanças no tecido cerebral de uma mulher (Sra August D.) que havia morrido de uma rara doença mental. Caracteriza-se como uma doença crônica, degenerativa e progressiva e, ainda hoje, incurável. Gradativamente as pessoas acometidas por essa doença vão apresentando problemas de memória, dificuldades no raciocínio (não conseguem resolver problemas do dia a dia), desorientação temporal (dia, mês e ano em que estamos), dificuldade com operações matemáticas (fazer contas), dificuldade de linguagem e alterações de comportamento (agitação, alucinações, delírios, etc). Esses problemas interferem no desempenho das atividades cotidianas do próprio idoso e das pessoas que o cercam. Ela é entendida como um grupo de sintomas que frequentemente acompanham a doença ou condição. Sua causa ainda não está completamente esclarecida. Embora a Doença de Alzheimer (DA) seja mais frequentemente observada em pessoas idosas, ela não é própria do envelhecimento, pois pode acometer pessoas em qualquer período da idade adulta. Assim, é uma doença que se associa à idade, mas não é devida à idade. Nessa doença ocorre a morte de células do sistema nervoso (neurônios) iniciando-se em uma região do cérebro ligada à memória. Com o avançar da doença a morte celular vai se expandindo para outras áreas do cérebro e comprometendo outras habilidades intelectuais e de comportamento. A evolução da doença pode variar de três anos (em pessoas com diagnóstico aos 80 anos) até dez ou mais anos se o diagnóstico ocorrer em idades mais jovens. As primeiras queixas são sempre relacionadas à memória (esquece compromissos, onde colocou as chaves, os óculos, esquece alimentos no fogo e mesmo com o cheiro de queimado não se lembra que os deixou lá, esquece recados, pagamento de contas, aniversários, etc). Como muitas pessoas, sem a doença, também podem apresentar parte ou muitos desses esquecimentos, essa queixa não é valorizada pelo próprio idoso ou por seus familiares. Como 20 esses esquecimentosvão se acentuando isso pode gerar quadros de ansiedade ou depressão. Esses sintomas vão se somando a outros, como dificuldade em aprender novas tarefas, lidar com tarefas que exijam raciocínio ou operações matemáticas. Tarefas que habitualmente eram feitas em problemas podem começar a se tornar penosas. Podem apresentar dificuldades em dizer o nome das coisas, ele vê uma colher, sabe pra que ela serve, é capaz de descrever mas não consegue nominá-la ( ele diz ...aquilo que usamos para tomar sopa...). De modo geral, as primeiras atividades cujo desempenho é comprometido pela doença, são as mais complexas (administração de finanças, uso de transportes públicos, dirigir um carro, fazer compras, preparar uma refeição), as atividades que costumava fazer (pequenos consertos domésticos, costura, bordado) e, posteriormente, as atividades mais simples (vestir-se, banhar-se, etc). Essas queixas serão confirmadas por exames neuropsicológicos específicos para avaliar a memória, a linguagem, a capacidade de cálculo, o raciocínio, o julgamento entre outros. O diagnóstico definitivo, no entanto, só pode ser feito por biópsia cerebral ou autópsia. Isso normalmente não é feito, a biopsia pelos riscos e por não trazer nenhum benefício ou modificação ao tratamento da pessoa e a autopsia só em feita após o óbito (ajudará para pesquisa, mas não para o tratamento da pessoa idosa de quem cuidamos). COMO EVOLUI A DOENÇA DE ALZHEIMER? Embora o curso da DA não seja o mesmo para todas as pessoas, os sintomas desenvolvidos na maioria das vezes, seguem os mesmos estágios gerais. a) Estágio pré clínico: regiões do cérebro ligadas à memória de curto e longo prazo começam a ser afetadas. Essas mudanças possivelmente se iniciam 10 a 20 anos antes dos primeiros sinais e sintomas perceptíveis. Iniciam os primeiros sintomas de perda de memória, ainda pouco significativos; b) Estágio inicial: nessa fase a doença começa a afetar o córtex cerebral, a perda de memória continua a evoluir e outras habilidades cognitivas começam também a ser afetadas. Normalmente é nessa fase que é feito 21 o diagnóstico clínico. Os principais sinais incluem: perda de memória, dificuldade em se localizar no espaço (ao sair de casa pode não conseguir voltar), demora mais tempo para desempenhar as atividades do dia a dia que sempre fez; apresenta problemas para administrar as finanças e pagar as contas; dificuldades de julgamento frente a problemas levando- o a decisões ruins; perda espontaneidade e do senso de iniciativa; mudanças de humor e de personalidade que podem aumentar a ansiedade. Nessa fase a pessoa pode ainda parecer saudável mas começa a apresentar dificuldades no desempenho de atividades mais complexas no dia a dia. c) Estágio moderado: fase em que a doença avança para outras áreas do córtex cerebral que controlam a linguagem, raciocínio, processamento sensorial e consciência. As regiões afetadas ficam mais atrofiadas continuam a se atrofiar e os sinais e sintomas da doença tornam-se mais pronunciados. É a fase em que os problemas comportamentais, como agitação e perambulação, podem ocorrer exigindo maior supervisão e cuidado. Os familiares geralmente têm muita dificuldade em lidar com essa fase. Os principais sinais e sintomas observados são: perda de memória mais acentuada; confusão mental; dificuldade em manter a atenção; problemas no reconhecimento de amigos e familiares; dificuldade com linguagem; problemas com leitura e com números; dificuldade em se organizar e pensar com lógica; incapacidade em aprender novas coisas ou em lidar com situações inesperadas, agitação, perambulação, dificuldade em repousar, medo e ansiedade, especialmente ao entardecer; alucinações, ilusões, irritabilidade, desconfiança ou paranóia; perda de controle dos impulsos (uso de linguagem vulgar; despir-se em locais e momentos inadequados, utilizar modos não aceitos socialmente); problemas de percepção espacial (dificuldade em levantar da cadeira ou se posicionar na mesa). O comportamento do ser humano é resultado de complexos processos cerebrais. Na DA esse processo é afetado ocasionando situações estressantes ou comportamentos inapropriados. Por exemplo: a pessoa idosa pode reagir furiosamente recusando-se a tomar banho ou a trocar 22 de roupa simplesmente porque não está compreendendo o que o cuidador está pedindo a ele e, se ele entender, pode não se lembrar como fazer isso. A fúria é uma forma de mascarar a ansiedade ou a confusão; para a pessoa idosa faz sentido tirar a roupa quando sente calor, o que ela não entende ou se lembra é que isso não é aceitável que isso seja feito em locais públicos. d) Estágio avançado: é o último estágio da DA, há várias áreas do cérebro atrofiadas. As pessoas não mais conseguem reconhecer familiares e pessoas queridas ou se comunicar com os outras; são completamente dependentes da ajuda de outras pessoas. Outros sintomas incluem: perda de peso; dificuldade em deglutir (engolir); infecções de pele; gemidos constantes; maior sonolência; incontinência urinaria e fecal. Geralmente ficam acamados parte ou todo o tempo o que propicia a instalação de quadros infecciosos como, por exemplo, pneumonia, que poderão levá-la a óbito. 23 No conjunto, a evolução da doença é progressivamente lenta, mas a pessoa pode apresentar períodos nos quais seu estado fica estável (platôs) que podem durar meses e, às vezes anos, após os quais pode ocorrer uma piora brusca. Quadros de piora brusca também podem estar associados à ocorrência de outros problemas de saúde que o doente não saberá explicitar. Assim, na vigência dessas situações, sempre é necessário investigar. Hoje existem algumas medicações para tratamento da DA, elas não vão curá-la, vão apenas tornar sua progressão mais lenta. Sua associação com outras medicações vai permitir o controle dos sintomas associados como alterações de comportamento, agressividade, agitação, depressão e apatia. A pessoa idosa com DA pode também ser portadora de uma ou mais doenças crônicas simultâneas (hipertensão, diabetes, etc) que continuam a requerer o mesmo acompanhamento de antes do diagnóstico da demência. Se isso não for feito, tais doenças poderão descompensar agravando a sintomatologia apresentada. Se a opção da família for manter a pessoa idosa com DA em sua casa ou na casa de algum parente é necessário que sejam algumas medidas de segurança sejam providenciadas para evitar a ocorrência de acidentes. CONDIÇÕES GERAIS DE SEGURANÇA: Com o avançar da doença as pessoas idosas tornam-se cada vez menos capazes de se cuidarem sozinhas e em segurança. Alguns princípios de segurança gerais podem ser úteis: 1. Prevenção de riscos: é muito difícil antecipar o que uma pessoa com DA pode fazer. O fato de ainda não ter acontecido nada de mais grave não significa que ela não é motivo de preocupação pois acidentes sempre podem ocorrer. Fazer uma revisão da casa buscando controlar ou minimizar situações de possível perigo é, assim, recomendável; 2. Adaptação do ambiente: será mais fácil modificar o ambiente do que mudar a maioria dos comportamentos; 24 3. Redução do perigo: reduzindo o perigo pode-se aumentar a independência. Um ambiente seguro pode ser menos restritivo e a pessoa idosa poderá circular com mais segurança e liberdade. ALGUNS LEMBRETES: Coloque os telefones de emergência e o endereço de sua casa ao lado de todos os telefones existentes na casa; Coloque uma secretaria eletrônica para atender ao telefone quando não puder fazê-lo e programe-apara fazê-lo ao menor número de chamadas possível. A pessoa idosa com DA pode não estar capacitada a receber recados e pode ser vítima de trotes maldosos que podem ocasionar uma reação catastrófica (ver mais adiante). Guarde aparelhos celulares em locais seguros para que não se percam; Instale alarme de incêndio em todos os cômodos da casa; Evite o uso e a existência no interior da casa de produtos inflamáveis ou voláteis; Instale fechaduras de segurança em todas as portas e janelas que dão para o exterior; Guarde do lado de fora da casa, em local seguro, uma chave reserva, pois a pessoa idosa com DA pode trancar a porta e deixá-lo para fora; Procure não deixar fios elétricos pelo caminho; proteja as tomadas com dispositivos apropriados; Certifique-se que todos os cômodos contam com iluminação adequada; Instale interruptores de luz no início e no final das escadas; As escadas devem ter, no mínimo, um corrimão que vá do primeiro ao último degrau; Guarde todos os medicamentos em local seguro e trancado; Mantenha bebidas alcoólicas trancadas em local seguro e fora do alcance da pessoa idosa; Mantenha o ambiente organizado, a desordem pode levar à confusão; Retire móveis ou enfeites dos locais de circulação da pessoa idosa; Guarde sacolas plásticas em locais seguros e trancados (a pessoa pode acidentalmente asfixiar-se); 25 Retire da casa armas de fogo; Guarde todas as ferramentas e materiais elétricos na parte externa da casa; Elimine plantas venenosas do interior da casa; Se tiver aquários, mantenha-os fora de alcance. Cozinha: Instale fechaduras de segurança nas portas dos armários e nas gavetas onde existirem materiais cortantes, perfurantes ou quebráveis; Guarde em local seguro fósforos, produtos de limpeza, facas, talheres, louça valiosa; Não utilize nem armazene líquidos inflamáveis na cozinha; Mantenha uma luz noturna acesa na cozinha durante a noite; Guarde pequenos objetos em uma gaveta trancada (a pessoa idosa com DA pode confundi-los com alimentos); Retire frutas e verduras artificiais da cozinha bem como enfeites de geladeira com aparência de produtos comestíveis; Quartos: Mantenha uma luz noturna acesa no quarto durante a noite; Mantenha um intercomunicador ligado no quarto da pessoa idosa com DA (daqueles que se utiliza no quarto de bebês) para avisá-lo de qualquer ruído que indique queda ou necessidade de ajuda; Retire ventiladores ou aquecedores portáteis; Encoste a cama na parede ou, em último caso, coloque o colchão no chão (para evitar quedas); Banheiro: Nunca deixe o idoso com DA, sozinho no banho; Retire a fechadura interna do banheiro para evitar que o idoso se tranque em seu interior; Coloque tapetes antiderrapantes no interior do box e na frente do lavabo; Eleve o assento do vaso sanitário ou coloque barras de apoio a seu lado; 26 Instale barras de apoio no chuveiro preferencialmente de cores contrastantes com a parede; Coloque uma cadeira ou banco de plástico no interior do box para facilitar o banho, instale chuveirinho manual; Prefira chuveiros elétricos que utilizam uma só chave para mistura da água. Aquecedores com entradas separadas para água fria e quente podem ser motivo de acidentes; Coloque ralo com filtro na pia para evitar a perda de pequenos objetos; Mantenha uma luz noturna acesa no banheiro durante a noite; Retire do banheiro todos os aparelhos elétricos pequenos; Proteja as tomadas com protetores específicos; Sala: Retire fios soltos de todas as áreas de circulação; Retire tapetes soltos; Repare o assoalho se apresentar algum piso solto; Identifique todas as estruturas de vidro com um decalque contrastante; Guarde em local seguro controles remotos, aparelhos de som, DVDs, etc COMPREENDENDO OS DISTÚRBIOS DE COMPORTAMENTO Os portadores de DA por não conseguirem expressar seus sentimentos e emoções como outras pessoas fazem, pode recorrer a comportamentos não usuais ou até estranhos, chegando, às vezes, a ser perigosos. Embora muito difícil e complexo, é importante tentar compreender o significado desses comportamentos. A maneira como o cuidador reage aos comportamentos do idoso refletem no mesmo. Se o cuidador está irritado, cansado e zangado (muitas vezes com razão), ele, provavelmente, se sentirá da mesma forma. É importante que se compreenda que essas reações não são intencionais ou pessoais. Ele não as tem “de propósito”. ALGUMAS DICAS... Perambulação: Esse costuma ser um comportamento frequente; pode expressar inquietação, insegurança ou falta de atividade física. 27 “ele caminha sem parar, de um lado para outro do quarto” “ele fica, à noite, andando ao redor da mesa, por horas seguidas” O que fazer? Embora esse comportamento possa ser muito irritante para o cuidador, ele, em si, não causa nenhum mal ou coloca a pessoa em perigo. Deixe-o andar. Se isso acontecer à noite e ele residir em um apartamento, providencie um calçado confortável com solado de borracha para não fazer barulho e incomodar os vizinhos do andar de baixo. Reorganize o ambiente de forma a permitir que ele tenha espaço para andar sem ficar se chocando com móveis ou outros obstáculos. Se for um comportamento constante procure organizar caminhadas externas com ele, preferencialmente à tarde, em lugares pouco agitados. Perguntas repetitivas: Esse é outro comportamento frequente e igualmente perturbador. Ele faz sempre as mesmas perguntas mesmo quando o cuidador acabou de respondê-la. Ele também pode repetir as mesmas frases e gestos constantemente. É preciso entender que o problema de base dessa pessoa é a memória. Ele repete as perguntas por que não memorizou as respostas. Cada vez que ele pergunta, para ele é como se fosse a primeira vez. Esse comportamento também pode expressar insegurança e ser a tradução de um pedido de ajuda. É uma forma de chamar a atenção do cuidador. Ações ou frases repetitivas podem expressar aquilo que ainda ele consegue fazer e que, de alguma forma o interessa ou o preocupa. Assim, uma mãe com DA pode falar ao telefone com o filho todos os dias, em diferentes momentos e sempre perguntar se ele se alimentou (independente da hora), se dormiu, se está bem. O que fazer? Não adianta se irritar ou tentar argumentar, apenas responda e entenda que é o máximo de elaboração que ela está conseguindo chegar. Não adianta dizer que você “já respondeu mais de 20 vezes”, isso só vai aumentar a insegurança do doente. É um comportamento, de fato, cansativo, monótono e irritante mas não gera perigo algum. Deixe-o perguntar. Procure responder à pergunta de forma clara e precisa, lenta e articuladamente e peça que ele repita o que você disse. 28 Se a pergunta repetitiva estiver relacionada à hora (que horas são?), procure responder relacionando-a com alguma atividade (é hora do almoço, do jantar, de tomar banho, etc). A atividade ainda pode servir como uma referência de tempo enquanto o valor da hora provavelmente perdeu seu significado concreto. Ele(a) o(a) segue por toda parte: Você pode representar a única referência de segurança que ele ainda tem, o resto do mundo pode parecer hostil e ameaçador. Pode também ser um comportamento “mimético” ou seja, o doente reproduz os gestos, atitudes, idas e vindas do seu cuidador. Isso ocorre pela evolução da doença onde o doente perde sua autonomia em relação ao ambiente e passa a imitar o comportamento das pessoas ao seu redor, é um comportamento dedependência social. Pode ainda representar a angústia que sente em ficar sozinho. O que fazer? Procure entretê-lo com algum tipo de atividade que ele gosta de fazer e que o distrai. Momentaneamente ele vai esquecê-lo, mas permanecerá tranquilo porque sabe que você está por perto. Tente descobrir outras pessoas ou parentes com quem ele se sente tranqüilo e veja a possibilidade de essas pessoas virem, rotineiramente, visitá-lo. Isso o auxiliará a manter outros vínculos e não se sentir inseguro na sua ausência. Acostume-o também a ficar sozinho em alguns momentos. Apatia ou tristeza: Ele poderá se apresentar assim em diferentes momentos, em especial quando for ficando cada vez mais dependente. Pode representar um mecanismo de defesa contra o fracasso. Pode começar a apresentar uma menor reação às circunstancias emocionais, não quer fazer nada, nada o agrada, não quer mais sair. Ele passa a reagir menos aos eventos felizes ou infelizes (arrefecimento afetivo). Ele tende a aumentar com o avançar da doença e a comprometer as atividades do dia a dia. Isso tende a afetar também suas relações sociais e familiares aumentando seu isolamento. 29 O que fazer? Avalie a capacidade remanescente do doente e proponha atividades programadas que ele consiga desempenhar. Essas atividades podem fazê-lo se sentir útil e integrado. Busque as atividades que lhe dão prazer e faça-as junto com ele. Mas avalie bem, pois se ele não conseguir desempenhar a atividade isso pode induzi-lo a perceber seu fracasso aumentando a angústia ainda mais. Evite que ele faça o que não se sente capaz de fazer. Não o coloque em situações de hiperestimulação, dê-lhe tempo para entender o que lhe foi solicitado e para que tente responder. Valorize seus sucessos, mesmo que mínimos. Inquietação, nervosismo: As dificuldades apresentadas pelo doente no dia a dia modificam sua autopercepção e geram angústia. A desorientação (no tempo e no espaço) gera insegurança e ansiedade. No início da doença ele tem dificuldade em entender o que está acontecendo e entra em pânico por seus lapsos de memória e por perder a confiança em si mesmo. Com o avançar da doença, ele pode se sentir frequentemente diante de um fracasso pois já não sabe avaliar o que é ou não capaz de fazer e tem medo que as pessoas o julguem um incapaz. O que fazer? Não tente argumentar ou explicar. Procure transmitir-lhe calma e tranquilidade (atenção ao tom de voz e postura corporal), se ele perceber que você está irritado com a situação, isso vai deixá-lo ainda mais nervoso. As palavras são importantes, mas podem não ser suficientes, toque-o gentilmente mostrando seu afeto. Fique a seu lado e procure fazer com ele as tarefas que o angustiam. Procure melhorar a autoestima do doente elogiando-o quando arrumado e limpo, ressaltando seus feitos manuais ou artesanais ou suas tarefas concluídas. Isso mostra reconhecimento e atenção e transmite confiança. Alucinações e ideias delirantes: A pessoa idosa com DA pode referir que vê, ouve ou sente coisas, pessoas ou animais que não existem (alucinações) na realidade ou ainda pode referir temor ou expressar pensamentos que não condizem com a realidade (ideias delirantes). Geralmente as alucinações são 30 visuais, simples ou muito elaboradas. Podem também ser auditivas (ouve a mãe chamando, alguém falando, etc). Na maioria das vezes são fenômenos transitórios. Podem ser favorecidas por comprometimentos sensoriais (redução da visão ou da audição). As consequências das alucinações dependem de sua natureza e de como são vivenciadas tanto pelo doente quanto por quem o cerca. Alucinações acompanhadas de agitação podem estar associadas a um evento clínico e o médico deve ser comunicado. As ideias delirantes representam uma interpretação equivocada de uma situação vivida. As mais comuns são roubo, ciúme ou está convencido que querem se livrar dele. Elas se caracterizam como uma convicção absoluta e inabalável do doente que ele pensa serem verdadeiras. Elas resistem a qualquer prova em contrário ou evidencias da realidade. Elas são geralmente transitórias e limitadas a um campo determinado, Normalmente não evoluem para um delírio que toma conta da vida do doente. Não se sabe sua causa, mas sabe-se que estão associadas às lesões cerebrais ocasionadas pela doença e, também, à dificuldade do doente em interpretar a realidade em decorrência de sua desorganização mental. Ideias de roubo ou ciúme podem afetar as relações afetivas, diminuir sua motivação e a de outras pessoas o que afetará a qualidade dos cuidados prestados. O que fazer? Não entre em pânico e não tente argumentar dizendo que aquilo que ele refere ver, sentir ou ouvir não é real. Para ele é bem real e ele tem plena convicção disso resistindo a qualquer tentativa de lhe mostrar o contrário. Se for possível, remova-o do ambiente ou comece outro assunto muito diferente como, por exemplo, o que fez durante o dia. Procure prender sua atenção com uma atividade prazerosa. No caso de ideias delirantes, se você for o alvo das acusações, não leve como uma ofensa pessoal. Não se zangue, por mais que pareça, não é pessoal. Se o alvo for outra pessoa, procure certificar-se da veracidade da situação (pode não ser verdade mas, pode também ser). Deixe-o falar, procure não tomar partido, evite argumentar, alimentar ou contradizer suas colocações, tranquilize-o e desvie sua atenção para uma atividade de substituição. 31 Esconder objetos: Ele pega uma coisa que pensa que precisa, coloca-a em um lugar que lhe pareceu adequado naquele momento e, em seguida, esquece que a pegou e onde a colocou. Por essa razão, ele não vai entender sua irritação. É comum que os doentes coloquem os objetos em locais inusitados e que não se lembrem onde estão ou neguem tê-los pego. Isso ocorre geralmente porque ele esqueceu o que devia fazer com esses objetos ou se distraiu quando os pegou ou ainda, para não ter que reconhecer seus déficits, nega ter visto ou pego o objeto em questão. Há situações em que ele vai referir que foi roubado e pode acusar a você ou a outra pessoa que trabalha na casa gerando situações tensas. O que fazer? Não o repreenda, ele não fez por mal. Possivelmente quis realmente guardá-lo, mas não vai se lembrar nem que o pegou e nem onde o colocou. A noção de significado das coisas pode estar perdida ou alterada. Assim, procure os objetos perdidos em todos os possíveis esconderijos (qualquer lugar onde ele possa caber). Considere olhar dentro dos bolsos das roupas no armário, dentro de sapatos e bolsas guardados, embaixo do tapete, do colchão ou de outros objetos maiores, dentro do lixo, da geladeira, atrás de almofadas, etc. Para evitar essas situações procure ser organizado e não deixe objetos de valor (chaves, talão de cheques, contas) ao alcance do idoso. Procure diminuir o número de “esconderijos” possíveis. Retire as chaves das gavetas deixando-as trancadas. Nunca despreze o lixo sem olhar seu interior. Tenha sempre cópias das chaves mais importantes e coloque-as em lugares distintos. Ele fica repetindo que quer ir para casa, mas está nela: Em conseqüência da doença ele está desorientado e pode ter dificuldade em reconhecer o ambiente como familiar, principalmente se foi modificado. O que fazer? Não tente argumentar e explicar que ele está na casa dele. Tire-o do ambiente, dê uma volta e retorne. Isso pode bastar para que ele se acalme. Se estiver muito agitado, coloque-o no carro e de uma volta mais longa. 32 Ele não se reconhece mais no espelho ou aos membros dafamília: É triste, mas é próprio da doença e seus mecanismos ainda não estão totalmente esclarecidos. Não significa que houve uma falha no cuidado, apenas evolução da doença. Pode ocorrer que ele reconheça a foto da esposa no álbum de casamento, mas não reconheça a mulher que está a seu lado como sendo ela. Ele pode olhar no espelho e conversar com sua imagem como se fosse um estranho ele pode até achar que as pessoas que vê na televisão são personagens reais e iniciar uma conversa com eles. O que fazer? É necessário explicar aos familiares que sofrem muito com essas situações por mais que entendam que isso é causado pela doença. Oriente-os a não tentar argumentar, não guardar rancor, não se torturar e, acima de tudo não repreendê-lo. Lembre-os da inutilidade em ficar repetindo o nome e o papel das pessoas, ele não será capaz de fixar. Às vezes essas situações são transitórias, oriente-os a sair brevemente do ambiente e, retornar depois, pois isso pode bastar para minimizar a situação. Ele troca o dia pela noite: Isso pode acontecer por várias razões. Com o envelhecimento, a pessoa tende a dormir menos horas. Ela pode apresentar períodos de sonolência durante o dia e o cuidador permitir que ela durma por longos períodos o que vai interferir no sono noturno (pequenos cochilos não são ruins); ela pode ainda não ter nenhum gasto energético durante o dia (falta de atividade física). Pode acordar à noite e se sentir desorientada e perdida ficando com medo, inquieta e ansiosa. O que fazer? Mantenha uma programação rotineira de atividades durante o dia, pois assim, à noite, ele estará fisicamente mais cansado. Assegure-se que o quarto é um ambiente calmo e acolhedor onde o idoso se sente confortável e em segurança. Tranque portas e janelas que dão acesso à rua ou ao exterior da casa ou apartamento. Instale uma lâmpada noturna para que, ao acordar, ele consiga perceber o ambiente onde está. Programe passeios mais longos, mas de forma bem planejada e preferencialmente à tarde. Cerifique-se que ele 33 esvaziou a bexiga antes de deitar. Caso ele levante e você não veja, ao perceber procure se aproximar dele com calma, de frente, olhando em seus olhos, falando delicadamente e lembrando-o quem você é. Mostre-lhe que está escuro, não adianta dizer “que é noite”, pois isso pode não ter mais nenhum significado. Converse calmamente com ele e tente levá-lo de volta ao quarto. Caso ele insista em ficar acordado, proponha alguma atividade para entretê-lo. Reações catastróficas: A pessoa com DA gradativamente vai perdendo a noção de tempo e de espaço assim ela pode não saber onde está, se é dia ou noite, que horas são, etc. Isso o deixa muito inseguro e desorientado. Ele pode reagir desproporcionalmente às situações apresentadas gritando, chorando, batendo o pé ou até se tornando agressivo. A agressividade verbal é mais frequente que a física. Ele age assim porque não consegue adequar sua reação à situação que vivencia, ele vê ameaça e perigo onde não existem e apenas reage a essas sensações que, para ele são reais. O que fazer? Para o cuidador essas são situações sempre difíceis de lidar pois cansam, estressam e magoam. O cuidador sempre fica se perguntando o que ele fez para desencadear essa situação. Muitas vezes não fez nada ou, fez algo que foi inadequadamente interpretado. Quando ocorrer esse tipo de situação procure manter a calma e tente controlá-la. Não grite com o idoso ou o segure com força, pois ele pode se sentir ameaçado e agredido o que só irá piorar o quadro. Não se afaste, fale com ele em tom normal, com devagar e com delicadeza; se estiver chorando console-o. Não tente argumentar ou racionalizar nem tente se justificar, isso só piorará a situação. Se ele ficar agressivo, não tente segurá-lo, saio do seu alcance, mas deixe que ele continue visualizando sua pessoa. Aguarde que a ira tende a passar. Esqueça o ocorrido após passar. Não tente voltar a ele tentando conversar a respeito, isso não vai ajudar. Por mais difícil e ilógico que pareça, geralmente há uma razão para o desencadeamento dessas situações. Procure descobrir qual é para poder evitá-la. Se isso acontecer em um ambiente público não se estresse e não sinta vergonha. Procure afastar as pessoas e explique que a pessoa é portadora de DA. Hoje em dia essa doença 34 já é bem conhecida e alguém a conhecerá e poderá ajudá-lo a conter a situação conversando com as pessoas que estão começando a aglomerar ao seu redor. Ele sai na rua e não sabe voltar para casa: O doente pode fugir de casa caracterizando uma fuga ou se perder em um trajeto corriqueiro caracterizando uma andança a esmo. As fugas geralmente ocorrem após alguma contrariedade ou por algum distúrbio de reconhecimento (não reconhece a casa, a esposa e foge para encontrá-los). O vagar a esmo está ligado à desorientação e à memória espacial. Ele sai, se perde, não encontra o caminho de volta, perde as referências e começa a vagar. Isso pode ocorrer porque está tentando chegar a um antigo endereço. Elas podem ser potencialmente perigosas, pois a pessoa pode andar longas distâncias e não conseguir pedir ajuda. Pode cair, ficar exposta a frio ou calor intenso, à chuva, ser agredida. Sua expressão (ar incerto ou perdido) ou atitude podem levar as pessoas a pensarem, erroneamente, que se trata de um alcoolista ou drogado e se afastarem dele recusando ajuda. Em cidades pequenas essas situações são menos problemáticas, pois geralmente as pessoas se conhecem e podem ajudar. Numa cidade como São Paulo, a pessoa pode, simplesmente, desaparecer. O que fazer? Não entre em pânico, analise calmamente a situação. Dê uma volta rápida no quarteirão. Se a busca começar rapidamente ele poderá ser encontrado em um raio de 1,5km de sua residência. Vá aos lugares que costuma ir quando sai com ele perguntando se as pessoas o viram; telefone para a polícia e saiba como descrevê-lo lembrando-se de como estava vestido quando desapareceu; avise os familiares. Como essa situação pode ser bastante comum, o ideal é preveni- la. Avise vizinhos e comerciantes próximos sobre a doença do idoso e que ele poderá se perder. Forneça seu telefone para os mesmos para que eles possam avisá-lo numa eventual circunstância dessas. Não deixe que o idoso use objetos de valor (jóias) ou carregue seus documentos originais. Providencie um identificador, que pode ser uma pulseira ou pode ser costurado na parte interna da roupa contendo nome, sobrenome, endereço e telefone de contato. Procure ter sempre uma foto da pessoa idosa atualizada para auxiliá-lo (ou à polícia) na busca. Mantenha as portas de acesso à rua, trancadas e as chaves em locais de 35 difícil acesso. Colocar uma cortina ou uma tapeçaria cobrindo a porta também auxilia. Não se desespere e não se sinta necessariamente culpado. Procure prevenir essas situações e mantenha a família sempre orientada quanto a essa possibilidade. Saiba sempre para quem deve ligar se isso acontecer. Tenha sempre à mão telefones úteis (polícia, bombeiros, pronto-socorro, hospitais e serviços de urgência próximos, do médico do idoso e do parente que costuma ajudar. Quando ele for localizado, procure entender porque ele agiu dessa maneira, isso auxiliará no estabelecimento de um planejamento preventivo para novas ocorrências semelhantes. Síndrome do “sundown”(por do sol): Os distúrbios de comportamento podem acontecer mais frequentemente em determinados horários do dia. É o caso do final da tarde, conhecido como sundown (pôr do sol). Nesse horário, o doente fica mais agitado, mais confuso e desorientado.Começa a seguir o cuidador pela casa toda, fica andando de um lado a outro e pode ver ou ouvir coisas que não existem. Isso pode ocorrer porque o doente perdeu a noção de dia e noite, ele confunde os dois períodos e perde a noção de suas respectivas atividades. O aumentar da escuridão pode provocar a sensação de medo aumentando sua insegurança. O que fazer? Pesquise uma causa física ou medicamentosa, converse com o médico. Tranquilize-o procurando ficar ao lado dele nesse momento e repita calmamente que ele não tem nada a temer. Inicie uma atividade de substituição que ele goste. Programe o dia para ter um fim de tarde calmo evitando tudo que possa causar estimulação excessiva (menos barulho, menor número de pessoas circulando, menos agitação). A pessoa idosa com DA tem comportamentos sexuais inadequados: Esse tipo de comportamento pode estar relacionado às modificações da vida afetiva, à perda de julgamento crítico (desinibição ou conveniências sociais). Geralmente o doente apresenta uma diminuição da libido e da atividade sexual, mas, às vezes, pode ocorrer o contrário, aumentando. Isso pode ser expresso de diferentes maneiras: masturbação na frente de terceiros, uso de palavras ou 36 gestos obscenos, assédio sexual com seu cuidador, propostas sexuais a uma pessoa desconhecida, apalpar pessoas desconhecidas ou com quem não tem qualquer intimidade. As manifestações inadequadas podem ser resultado da manutenção das necessidades sexuais. Mas, com a doença, ele está desorientado e pode ter perdido a conveniência social manifestando seus desejos de forma intempestiva (quando, como e onde não se deve). A manifestação mais frequente costuma ser “falta de pudor” (aparece nu na frente de visitas, crianças ou estranhos). É necessário entender e explicar para a família que esses comportamentos são devidos à ausência de crítica, não são intencionais. O que fazer? São situações extremamente delicadas para todos os envolvidos. Caso ainda exista o companheiro ou a esposa, converse sobre a possibilidade de manutenção, na medida do possível, de uma vida sexual ativa; da troca de gestos carinhosos (acariciar, beijar, manter maior contato físico). Lembre-se que o(a) idoso não está com más intenções, está apenas respondendo a estímulos que não controla mais. Fale sobre possíveis alterações de seu comportamento sexual para evitar surpresas desagradáveis. Caso ele(a) tire a roupa em público, explique que não é exibicionismo, ele apenas esqueceu a importância e o significado social do fato de estar vestido. Não o(a) repreenda, leve-o(a) gentilmente de volta a seu quarto para vesti-lo(a). Explique às pessoas que ele(a) está doente e por essa razão não sabe que tais atitudes são inadequadas. Ele(a) não teve a intenção de chocar ninguém. Se a pessoa idosa se masturba, entenda e explique que ela o faz porque sente prazer, mas que a doença a fez perder o sentido das convenções sociais. Se ele fizer isso em privacidade, deixe-o; se não, leve-o gentilmente ao seu quarto, volte e explique o que está acontecendo. O QUE FAZER QUANDO SAIR COM O IDOSO COM DA DE CASA? Procure levá-lo ao banheiro antes de sair. Não pergunte apenas se ele está com vontade de ir ao banheiro, lembre-se que ele pode não fazer mais a associação necessidade/ação. Verifique se as roupas que está utilizando são 37 adequadas e fáceis de despir e vestir. Prepare uma valise com roupas adicionais para poder trocá-lo em caso de “acidentes”; inclua toalha e lenços higiênicos. Assim que chegar ao destino, localize o banheiro mais próximo e acompanhe-o até lá. Auxilie-o, pois será um ambiente estranho e ele poderá apresentar dificuldades. Faça isso a cada duas horas aproximadamente. Fique atento a sinais que demonstrem que ela tem vontade de ir ao banheiro (ficar inquieto ou tentar tirar a roupa), aja rápida, mas calmamente. COMO RECONHECER SINAIS DE DESCONFORTO Com o avançar da doença, o idoso vai apresentando dificuldades em expressar desconforto, dor ou mal estar. O cuidador precisa estar atento para poder auxiliá-lo buscando reconhecer sinais que possam mostrar isso e buscando suas causas. Dificilmente ele utilizará palavras para expressar, Ele poderá chorar, gritar, ficar agitado ou muito apático. O comportamento não terá, necessariamente, uma causa evidente ou direta ele só está apontando que algo está errado. A tensão emocional pode ser expressa por inquietação, agitação e nervosismo. Pode começar a andar de um lado para outro, mexe insistentemente em alguma coisa ou em si mesmo. Apatia e passividade podem estar relacionadas ao avançar da doença. O cuidador deve estar atento se a instalação desse quadro foi repentina, pois pode indicar alterações físicas (doenças, infecções, etc). Sempre haverá uma razão para os sinais de desconforto. O cuidador poderá identificá-las mais facilmente se construir um bom vínculo com a pessoa de quem cuida e estar atento a seus sinais. COMO OCUPAR O TEMPO LIVRE As atividades do dia-a-dia com um idoso com DA, quando adequadamente executadas, ocupam boa parte do dia pois levarão mais tempo para serem executadas. Mesmo assim, sobrará algum tempo livre que deverá ser preenchidas com atividades estimuladoras e planejadas. Por muito tempo a pessoa idosa poderá manter suas capacidades físicas podendo e devendo ser estimulado a utilizá-las. Desenvolvimento de atividades diversas tem muitas vantagens: manutenção da capacidade funcional; redução da dependência; diminuição do tédio e do isolamento; melhora da auto estima do idoso. 38 Para o alcance dessas vantagens, o cuidador deve estar atento a três regras básicas: As atividades propostas devem mobilizar as capacidades físicas e mentais remanescentes dos idosos: o Não proponha atividades que sabe ele não consegue mais desempenhar; o Procure conhecer os hábitos e preferências dos idosos e propor atividades que já faziam antes. O cuidador não deve fazer a atividade PELO idoso mas COM o idoso: O cuidador deve dar ao idoso o tempo necessário para a execução da atividade. QUAL O CRITÉRIO DE ESCOLHA DAS ATIVIDADES? Escolha atividades concebidas para adultos; As atividades devem ser concretas e de utilidade reconhecida (varrer a casa, estender a toalha na mesa, etc); Estarem centradas em coisas que ele sabia e gostava de fazer; Devem ter, preferencialmente, curta duração; Devem ser divididas em pequenas sequências claramente indicadas; Demonstre como fazer quando o ver com dúvidas mas, não faça por ele; A qualidade do produto não deve ser importante, a execução e o entretenimento causado é que importam é a atividade; Passear é adequado e estimulante do ponto de vista físico, cognitivo e social. O período da tarde é o mais indicado. Procure fazer os mesmos trajetos, a rotina auxilia a desorientação causada pela doença. Procure um lugar ou horário mais tranquilo (menos barulho, menor tráfego). Estimule-o durante o passeio, conversando, mostrando as coisas. Não tenha pressa, o passeio não é uma corrida. Se ele quiser parar, faça uma pausa; Atividades culinárias para as mulheres costumam ser familiares e estimulantes. Evite objetos cortante ou que possam quebrar. Oriente-a passo a passo e supervisione a atividade valorizando seus acertos. 39 ALGUMAS DICAS PARA O BOM CUIDADO DE UM IDOSO COM DEMENCIA DE ALZHEIMER: Lembre-se sempre que você está cuidado de uma pessoa que tem uma doença crônica e progressiva que, pode apresentar problemas de comportamento conforme for avançando; A agitação ou mudança de comportamento
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