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Cultura e teoria da cultura 
As primeiras informações sobre a cultura e a diversidade cultural vieram com o 
interesse dos colonizadores e das descobertas de novas terras nos séculos XV e XVI. 
Dos colonizadores e exploradores europeus saíram as cartas e relatos sobre povos 
exóticos e caçadores de cabeça na época das descobertas. Nenhum dos observadores e 
viajantes possuía instrução ou formação específica. O que viam e descreviam muitas 
vezes era confundido com anedotas que deformavam a realidade pelas ideias 
preconceituosas fabricadas pelas superstições dos europeus cristãos. 
Montaigne (1533-92) interessou-se pela comparação entre os costumes de seu país e os 
de povos nunca antes vistos. Seu estudo sobre os canibais inspirou Shakespeare a 
escrever a peça “A Tempestade”. Segundo Mair (1979, p. 25), esse empreendimento 
deu uma mostra do quanto grosseira era a interpretação dos europeus sobre o 
comportamento dos povos primitivos. 
Somente no final do século XVIII é que a Antropologia começou a se desenvolver e o 
estudo da cultura como disciplina científica deu impulso aos estudos e pesquisas 
comparativas. Até então existiam apenas algumas publicações com um pouco mais de 
critério, como a que o missionário jesuíta, Lafitau, publicou em 1724, comparando os 
costumes dos índios americanos com os povos antigos descritos pelos autores latinos e 
gregos. 
Outro estudo, escrito por Charles de Brosses em 1760, comparou a religião egípcia 
antiga com a religião da África ocidental. 
Já no século XIX, Ratzel procurou - entre os objetos encontrados em diversos lugares 
muito distantes- semelhanças que pudessem indicar a origem do homem. Em 1851, 
Lewis Morgan publicou “The League of the Iroquois”, o primeiro trabalho que 
descreveu o sistema político baseado nas linhagens autônomas. 
Foi aprendendo com os nativos sobre seu sistema social que Morgan descobriu que os 
nomes que eles empregavam para definir as relações de parentesco, por exemplo: pai, 
mãe, avô, avó, irmão, irmã, tio etc, abrangia uma rede de relações muito maior do que 
na cultura inglesa. Morgan ficou tão entusiasmado com suas descobertas que em 1871 
publicou outro estudo, “Systems of Consanguinity and Affinity”, obra em que testa sua 
hipótese de que o sistema de parentesco amplo caracterizava a evolução da família, 
transitando da fase de promiscuidade para o casamento monogâmico. 
 2 
Diversos estudos seguiram-se ao trabalho de Morgan, como o do jurista Bachofen, em 
1861, o primeiro a indicar que a forma de organização da sociedade teria sido 
primeiramente matrilinear, ou seja, que toda a descendência partiria de um único 
antepassado do sexo feminino. Tanto Morgan quanto Bachofen inspiraram a obra de 
Friedrich Engels, “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”. Com 
Morgan e Engels, o investimento antropológico no conhecimento científico avança ao 
ponto de refutar a tese da degradação da humanidade. Para eles, a humanidade progride. 
Nesse ponto, Marx e Engels preservaram a conclusão de Morgan sobre a comunidade 
primitiva baseada na consaguinidade, evoluindo da família matriarcal para a patriarcal 
e desta para o contrato, evidenciando em cada uma dessas fases o núcleo dos modos de 
produção. 
Esses estudos foram evoluindo com uma geração de novos entusiastas da ciência do 
homem. Edward B. Tylor, por exemplo, foi chamado o pai da Antropologia inglesa. Na 
sua primeira publicação em 1871, “A Cultura Primitiva”, forneceu as bases para a 
superação do monismo, isto é,crença na existência de uma única cultura, que 
acompanhou os primeiros estudos do parentesco e da organização social. Deu um passo 
importante na fundação da ciência do homem pelo uso do que chamou “aritmética 
social”, formulando o primeiro método para dispor os dados em tabelas e estabelecer 
comparações. 
James Frazer tornou a Antropologia conhecida com seu livro “Golden Bough” (O Ramo 
de Ouro), ampliando a compreensão das práticas rituais dos primitivos, e explicou a 
magia e a proximidade desta com a ciência, o que tornou o seu livro um dos mais lidos 
sobre o assunto. Com a fundação da Antropologia e seu acolhimento pela academia, o 
estudo da cultura crescia e as fontes tradicionais, desprovidas de caráter científico, 
tornavam-se insuficientes. 
Uma vez acolhidos os estudos e descobertas mais sistemáticas sobre as diferenças 
culturais, essas também puderam ser vistas e recebidas como indagações provindas da 
Antropologia científica. 
 
Os problemas centrais que são colocados para a Antropologia passam a ser aquela 
conjunção de formas apreendidas pelo interesse antropológico de Morgan, Maine, 
Taylor, entre outros cientistas que se baseavam numa proposição evolucionista, mas 
ainda insuficientemente articulada para responder as questões relacionadas às 
semelhanças e diferenças culturais. Isso levou à necessidade de buscar uma 
 3 
compreensão das semelhanças culturais, isto é, a maneira de pensar e de comunicar 
do homem, contra o que Kaplan e Manners(1988, p. 15) denominaram de “unidade 
psicobiológica do homem”. Nesse sentido, o que permanece imutável e o que varia 
passaram a ser considerados como objetos específicos e intercomplementares do que 
vieram a se tornar os diversos campos da Antropologia: Antropologia física ou 
biológica e Antropologia social ou cultural. 
O passo decisivo da efetivação da Antropologia cultural foi o desenvolvimento do 
conceito de cultura, que garantiu critérios mínimos na construção do pensamento 
antropológico, como observam e definem Hoebel e Frost (1976, p. 4). 
Cultura é o sistema integrado de padrões de comportamento 
aprendidos, os quais são característicos dos membros de uma 
sociedade e não o resultado da herança biológica. 
 
Os resultados daí provenientes classificaram os antropólogos pelas teorias que 
desenvolveram a partir de seus estudos e pesquisas de campo. Essas teorias serão 
analisadas na seção seguinte. 
 
Teoria da cultura 
Com a instituição da Antropologia como ciência do homem, a teoria da cultura assumiu 
um contorno mais nítido. Os estudos realizados por Morgan, Bachofen, McLenann e 
todos que se interessaram pelas diferenças e semelhanças culturais proporcionaram as 
evidências para a formulação de uma explicação e teorização da cultura. Morgan, por 
exemplo, desenvolveu em “Ancient Society” (Sociedade Antiga), escrito em 1877, um 
complexo estudo sobre o desenvolvimento social humano e construiu, entre as suas 
diversas obras, uma teoria da cultura, que colocou o estudo da família como uma das 
mais importantes contribuições ao elucidar os princípios da estrutura familiar e sua 
evolução. Morgan lançou as bases da antropologia da religião e da família e toda a 
trajetória da teoria da cultura, de certa forma, reflete a importância desse tema na 
contemporaneidade. 
Para muitos dos antropólogos contemporâneos, a definição de cultura de Tylor continua 
tendo receptividade no meio acadêmico até os dias de hoje.(LEAF, 1988; 
KLUCKHOHN, 1972). Os estudos de Tylor, entretanto, colocaram no centro da sua 
preocupação os mesmos temas tratados por Morgan, mas, ao atender às exigências 
científicas do século XIX, seu estudo sobre a religião agregou novos elementos que 
 4 
atestam a relacionalidade da família e da religião com a organização social. Para Tylor 
em seu livro “Cultura Primitiva”, publicado em 1871, (apud LEAF, 1988, p. 133) 
Cultura ou Civilização, tomada em seu amplo sentido etnográfico, é aquele 
todo que inclui o conhecimento, a fé, a arte, a moral, asleis, os costumes e 
quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridospelo homem enquanto 
membro da sociedade. 
 
 
Tylor, nessa definição, avançou do evolucionismo para uma teoria da cultura que 
relativiza o conceito de conhecimento ao mesmo tempo que reduz a supremacia do 
conceito de civilização, trazendo-o para o âmbito da cultura. Isso não significa dizer que 
Tylor era relativista. Assim, a teoria da cultura de Tylor recusa a diferença entre culturas 
superiores e inferiores. A coerência da postura do antropólogo pode ser verificada na 
expressão “sobrevivência” que ele introduziu na sua teoria da cultura. Numa 
interpretação aproximada dos seus intérpretes, essa expressão significa traços culturais 
que veiculam através do tempo por entre os costumes, crenças, opiniões e rituais. Isso 
mostra que Tylor superou as preocupações originárias da tradição colonialista de buscar 
semelhanças e diferenças entre o homem primitivo e o civilizado para se deter na 
causalidade do comportamento. 
A influência dos estudos de Tylor em torno do animismo como uma síndrome religiosa 
primitiva também está no conceito de totemismo, tornando-se uma das fontes mais 
importantes da teoria da organização social. O animismo é uma forma de religião que se 
funda na crença de que espíritos habitam seres vivos e objetos sem vida, tais como 
árvores, rochas, nuvens, ventos ou animais. 
 
Tylor fechou o ciclo conceitual sobre ciência e causalidade quando concebeu as crenças, 
ou seja, cultura, como esquemas de comunicação. Na tradição de Tylor, J.G Frazer 
comungou da interpretação de queos povos primitivos revelam certo nexo e, em seu 
livro“Golden Bough”, ele concluiu sobre o interesse universal pela religião, 
descobrindo também uma relação entre religião e a fertilidade dos homens, o que ele 
chamou de senso radical lógico. 
Reuniu um volume significativo de dados sobre mitos e rituais de origem grega e latina 
passando a observar o fenômeno da religião e suas características diferenciais entre os 
povos primitivos em todo o mundo. Um dos seus mais importantes legados foi a teoria 
da magia simpática, chamando a atenção para o caráter simbólico dos ritos mágicos. Em 
seus estudos, mostrou que os rituais imitavam o efeito desejado, mas Frazer interpretou 
 5 
esse fenômeno, como um processo inverso de raciocínio. Explicou que a magia lida 
com as forças em ação nos fenômenos da natureza. Assim concluiu que a magia 
transforma-se em religião quando essas forças são externalizadas, adquirindo formas 
humanas. 
A evolução desse processo é contínua segundo Frazer, e ele revelou numerosos cultos e 
histórias que atestam a sobrevivência da interação do homem com a natureza através 
dos cultos como a dança do sol, que muitos povos ainda praticam. Dessa lógica 
derivam, segundo o autor, os tabus alimentares e do corpo. Por exemplo: em algumas 
culturas certos animais servem para alimentar o homem; em outras, são proibidos ou 
reprovados, como em grande parte da cultura ocidental são tabus o cão, o gato, assim 
como é a vaca para os indianos. 
A contribuição teórica de Frazer ganhou destaque quando concluiu que a religião, assim 
como os ritos mágicos, não são meras “tolices”, mas revelam como funciona a mente 
humana. Os estudos de Frazer tiveram continuidade nas pesquisas de diversos 
antropólogos, como Marcel Mauss. Assim como o estudo da teoria do raciocínio por 
analogiaseria retomado, mais tarde, pelo antropólogo Francês Lèvi-Strauss. 
 
É importante notar que, na trajetória da Antropologia cultural, o interesse pelos 
processos mentais vai se distanciando das explicações de causalidade psicobiológica ou 
de raça. Nesse curso, observam Kaplan e Manners, (1981, p. 200), que a teoria da 
cultura, ao contrário da psicologia, que esteve inicialmente preocupada com a 
personalidade individual, volta-se para a personalidade de grupo. Nesse sentido, a 
teoria da cultura vê a relação da cultura com a personalidade como coisas intimamente 
relacionadas e interdependentes. 
 
Franz Boas ,nascido na Alemanha, migrou para os Estados Unidos, onde liderou a 
fundação da Antropologia. Boas (2004) estudou a relação entre a geografia e etnologia 
para compreender e identificar as características culturais de cada povo. Viveu um ano 
entre os esquimós como descreve as atividades que desenvolveu junto daquele povo: 
Costumava ficar nas aldeias dos esquimós e examinar os arredores. Assim 
que terminava o trabalho, passava para a próxima vila. Andei ao longo de 
toda a costa. Nas aldeias, vivia com os esquimós nas suas casas de neve. Em 
geral, propunha a um homem que conhecia bem a região que me 
acompanhasse por alguns dias. (BOAS, 2004, p.68). 
 
 
 6 
O estudo da etnologia ganhava destaque e com ela as regras de comportamento. Boas 
observou que o ambiente físico dos esquimós determinava a forma de vida e o 
pensamento daquele povo. Mas a convivência com os esquimós acabou impulsionando-
o para o estudo de outros povos, de onde concluiu que existe uma interdependência 
entre a estrutura e o funcionamento dos fatos sociais. 
Na avaliação de Leaf (1981, p. 191), Boas acabou revelando sua tendência ao 
difusionismo na medida em que desprezou o método comparativo para adotar o método 
histórico. Assim, ampliou suas pesquisas coletando, entre os esquimós de Labrador, os 
índios do Oeste, e as tribos do Alasca, indicadores que pudessem revelar uma linha 
uniforme de evolução para as sociedades humanas. A partir desses estudos 
etnográficos, defendeu que as tribos deveriam ser estudadas uma em relação à outra e 
concluiu que algumas tribos de índios norte-americanos imitavam seus vizinhos. 
 
Com isso, Boas chamou a atenção para a relação étnica entre os esquimós e os índios 
americanos e inaugurou o método etnográfico e uma concepcão da cultura como uma 
teoria construída pelo próprio nativo. Nesse sentido, o trabalho do etnólogo seria a 
reconstituição histórico-conjectural de cada povo, trabalho que faria coletando 
pormenorizadamente o material de campo e, apreendendo os fenômenos no próprio 
contexto, Boas contribuiu com a Antropologia física e linguística. 
 
Na mesma linha da etnologia de Boas, o antropólogo polonês Bronislaw Malinowski, 
professor da London School of Economics, foi considerado o fundador da Antropologia 
Social na Grã- Bretanha, tornando-se uma das mais importantes referência no método 
etnográfico. Em 1914, Malinowski seguiu viagem para o Pacífico Sul para estudar os 
habitantes das Ilhas Trobriands, somente saindo de lá em 1918. Nos seus experimentos 
com o método etnográfico, revelou os perigos da dedução de atitudes psicológicas em 
face dos eventos religiosos. Foi rigoroso com o método de pesquisa de campo. Procurou 
desvendar, no pensamento desse povo, os processos através dos quais ele identificaria a 
ordem no pensamento e no comportamento. No livro “Uma Teoria Científica da 
Cultura” Malinowski (1975, p. 42) definiu cultura como: 
O todo integral constituído por implementos e bens de 
consumo, por cartas constitucionais e para os vários 
agrupamentos sociais, por ideias e ofícios humanos, por 
crenças e costumes. Quer consideremos uma cultura muito 
simples ou primitiva, ou extremamente complexa e 
desenvolvida, deparamo-nos com uma vasta aparelhagem, em 
 7 
parte material em parte humana, em parte espiritual, com a 
ajuda da qual o homem é capaz de lidar com os problemas 
concretos, específicos, com que se defronta. 
 
Malinowski conseguiu em seus relatos publicados (MALINOWSKI, 1983, 1997), 
responder a muitas indagações, como, por exemplo, concluiu que a cultura forma um 
todo integrado e que portanto não poderia ser decomposta para fins de análise 
comparativa. Essa conclusão para alguns dos seusintérpretes colocaria em cheque a 
teoria difusionista como a que se fez referência anteriormente entre as teses que 
orientou a teoria da cultura de Boas. 
Na teoria da cultura de Malinowski, todos os costumes possuem um significado vivo e 
vigente para os membros de uma sociedade. Na linha do sociólogo francês Émile 
Durkheim, defendeu que os costumes são praticados não por meras crenças, mas porque 
essas cumprem uma função social. Confirmou essa tese ao identificar uma relação entre 
a forma como um povo organiza a sua vida em sociedade e suas necessidades 
biológicas. Argumentou, nesse sentido, que o alimento, o abrigo, o casamento e a 
família seriam constitutivos de um todo organizado e dotado de linguagem (palavras) e 
pensamento. E, no mesmo sentido que seus antecessores negaram a inferioridade das 
culturas primitivas, afirmou que esse todo seria o mais importante legado; um sistema 
de conhecimento, valores e regras de conduta que se aperfeiçoariam continuamente com 
as novas gerações. 
Radcliffe-Brown operou no mesmo sentido a analogia entre o sistema biológico e a 
organização social, mas apostou na ideia de que os costumes, as cerimônias e crenças 
teriam uma função social e não psicológica. O argumento do autor, valendo-se da força 
que as instituições sociais exercem na vida das pessoas, levá-lo-ia à conclusão de que a 
função das crenças seria manter viva na mente do indivíduo a dependência deste da 
sociedade. Mas é preciso também esclarecer que a contribuição de Radcliffe-Brown foi 
mais além ao separar o significado da função, o que será levada adiante por seus 
seguidores. 
No estudo das instituições tanto quanto no estudo do parentesco, afirmava ele, o valor e 
a validade dependem do alcance dos conceitos e dos fundamentos teóricos. Nos estudos 
sobre parentesco e casamento na África (MELATTI, 1979, p. 63), Radcliffe-Brown 
concluiu que um sistema de parentesco e casamento pode ser definido como “um 
arranjo que capacita as pessoas para a conjugalidade e cooperação umas com as outras 
dentro da vida social ordenada”.Assim, o que une as pessoas é a convergência de 
 8 
interesses e sentimentos. Da mesma forma, concluiu que o vínculo entre pais e filhos 
pode ser estabelecido não apenas pelo nascimento, mas também pela adoção. 
Embora muitos dos seus críticos o acusem de não ter sido suficientemente claro quanto 
ao que seria essa estrutura, há um consenso em torno do reconhecimento do que essa 
separação representou para as teorias. É o caso de Kaplan e Manners (1981, p. 154) 
quando analisaram criticamente as teorias da cultura, afirmando que estas não dão a 
devida atenção ou que negligenciam o todo tomando apenas a parte, como é o caso das 
teorias técnoeconômicas. Assim, esclareceram o que seja o sentido empregado por 
Radcliffe-Brown como sendo a estrutura de qualquer entidade – um átomo, uma 
molécula, um cristal, um organismo, uma sociedade - referindo-se às relações mais ou 
menos duradouras entre as partes. 
Quando escreveu sobre as tribos aborígenes da Austrália, Radcliffe-Brown situou dois 
elementos básicos: 1) a família, ou seja, o grupo formado por um homem e uma mulher 
e seus filhos; 2) a horda, um pequeno grupo que possui e ocupa um território definido 
como área de caça. Desenvolveu, a partir desses dois núcleos, uma teoria sobre as 
organizações sociais e sobre os sistemas de parentescos mais complexos. 
No transcorrer do século XX, diversas teorias da cultura surgiram em torno do mesmo 
estruturalismo, porém com novos elementos. Seriam exemplos Edmund Leach, que viu 
o conjunto de regras ou normas ideais como estrutura; e Lévi-Strauss, que via a 
estrutura como modelos construídos a partir da realidade. 
O casamento e o sistema de parentesco continuaram como um dos temas mais 
importantes do estudo da cultura, ganhando destaque no livro de Claude Lèvi-Strauss, 
“As Estruturas Elementares do Parentesco” (1982). Incluiu-se entre seus temas de 
destaque o estudo dos mitos, das artes e da linguística. Seu trabalho sobre o sistema de 
parentesco foi considerado um dos trabalhos teórico mais substancial sobre o tema. A 
teoria da cultura de Lévi-Strauss perseguiu a natureza inconsciente dos fenômenos 
coletivos tomando a estrutura como a lei que organiza os sistemas. Concluiu que a 
linguagem e a cultura têm relações lógicas. A linguagem como fato cultural seria o meio 
de perpetuar as formas da vida social, mas também um produto da cultura. 
Na antropologia contemporânea, Clifford Geertz, antropólogo americano, é considerado 
um dos mais lidos teóricos da cultura. Seguindo os passos de Weber, (1991),definiu a 
cultura como um sistema de significados e a antropologia como uma ciência 
interpretativa. (GEERTZ,1978). Considerado um dos maiores defensores do 
 9 
relativismo, dedicou-se ao estudo da cultura do Islã e dos rituais, os quais considerou 
como textos etnográficos, ou seja, modos de comunicação utilizados pela cultura. 
Em seu livro “Saber Local”(1997, p. 48), Geertz reafirmou sua conclusão de que a 
cultura é a concepção única, ou seja, uma teoria de cada povo sobre o dever ser, desde a 
organização social, o sistema de parentesco, o comércio, as leis, a administração da 
água, a mitologia, a arquitetura, o status, o poder, a autoridade, o governo etc. O 
trabalho do antropólogo consiste na interpretação dessa teoria ou o que ele chama de 
texto. Apesar das diversas possibilidades de explicação, a escolha das categorias 
culturais (palavras, símbolos), segundo Geertz, não depende da escolha do antropólogo 
porque é própria da cultura do grupo cultural que ele está estudando. Nesse sentido, a 
explicação do antropólogo deve conectar a ação ao seu significado e ambas ao local. O 
método,que Kaplan e Manners(1981) denominaramde ecologia cultural, teve 
repercussão importante nos trabalhos de Lèvi-Straus. 
 
No final do século XX, a palavra cultura tornou-se o lugar comum dos debates sobre a 
interação em escala global. O interesse pelo estudo da cultura não se restringiu às 
formas como um povo distingue-se dos outros ou a totalidade e especificidade da sua 
vida em sociedade. Passaram a se denominar também de cultura certas especificidades 
ou diferenças de grupos contra outras características de grupos, dentro de uma mesma 
sociedade. O fenômeno passou a ser chamado de “globalização da cultura”, 
(WARNIER, 2003; TOURAINE, 2006). Touraine (2006) até mesmo propôs um novo 
paradigma para se compreenderem as relações e os novos atores sociais hoje. Mas ele 
não reconheceu, na interação entre povos de culturas diferentes, tendência à 
universalização da cultura. 
 
Os estudos sobre a globalização não acompanharam o otimismo, de Marshal McLuhan, 
que chamou de “aldeia global” o que lhe pareceu despontar como uma cultura universal 
mais democrática, integrada pala mídia. Berger e Huntington (2004), em estudos sobre 
o processo de globalização em diversos países, concluíram que a interação entre 
culturas depende do grau de aceitação e rejeição e de coexistência de culturas diferentes 
até a possibilidade de síntese. 
Immanuel Wallerstein (1994), por exemplo, viu o raciocínio binário como tendência 
mundial, ou seja, uma linha imaginária que na sua interpretação divide o grupo e não 
 10 
unifica. A distinção estrutural entre ideal e real, antiga e existente em diversas 
civilizações, seria uma invenção social, para Wallerstein (1994, p. 41). 
Em resumo, o imbricamento das teorias da cultura e da globalização faz parte de um 
novo projeto científico que não apenas atualiza a teoria da cultura como investiga se há 
ou não um processo de interação que possa representar algum tipo de efeito deletério à 
singularidade de uma cultura,isto é, a maneira de pensar, os valores ou costumes de um 
povo. 
Outra questão é se a globalização e o estilo de vida cosmopolita do homem no nosso 
século estariam modificando a composição sociológica da família, da religião, das 
classes sociais, a organização do trabalho e do poder político. Entretanto, quando se 
analisam os acontecimentos que têm transcorrido nos últimos dez anos, vê-se que os 
problemas do mundo são os mesmos e que nem as importantes transformações da 
tecnologia resolvem muito menos insinuam o fim dos conflitos étnicos, políticos, das 
crises sociais e econômicas. 
O conflito entre Palestina e Israel, a crise política da Síria, a crise econômica, a miséria, 
a violência em todo o mundo abrem uma escalada de reivindicações que se inscrevem 
nesse projeto como movimentos culturais e marco histórico de transição cultural da 
humanidade. O tema da cultura nesse processo transformou-se numa questão ética ao 
mesmo tempo em que as respostas para a escassez de alimento, de água, de terra, de 
segurança, de saúde e, sobretudo, a questão da sustentabilidade apresentam-se como um 
dos maiores desafios para todas as áreas do conhecimento. 
 
Identidade e relações étnicas e culturais 
Todas as vezes que alguém se refere a outrem o faz sempre se referindo ao nome, à cor 
da pele, à profissão, ao sexo, ao estado civil, ou à nacionalidade.A necessidade de 
conferir traços diferenciais, de referir-se a alguém pela profissão, pela nacionalidade, 
tipo físico ou característica física, faz parte do processo de socialização. Como bem 
observou o sociólogo Norbert Elias (1994, p.13), a sociedade não é uma unidade, um 
amontoado de pessoas. Quando nos referimos à sociedade estamos sempre nos referindo 
a um grupo, apontando no mapa ou pensando em algum lugar do planeta. Nesse 
momento poderíamos estar nos referindo ao Brasil, à China, à Índia ou a qualquer outro 
país por suas diferenças culturais: valores, tipos físicos, religião, política ou economia. 
Isso porque o homem, independente de onde viva, nasce e cresce vivendo como 
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membro de uma sociedade, sendo criado por um pai, mãe, parente ou comunidade, 
pertencendo a um país, sendo portador de uma cidadania e tendo deveres e obrigações 
para com seu povo ou nação. 
O sociólogo Harold Garfinkel (1964), reconhecido como o pai da etnometodologia 
(apud SCOTT, 2010), estudou aprofundadamente como se dão as interações humanas, 
não devidamente valorizadas,tendo em vista as rotinas do cotidiano, que são 
indiscutíveis. Observou que o comportamento das pessoas no simples contato diário 
segue ritos tão rigorosos que podem ser percebidos pela regularidade e generalidade dos 
gestos, das palavras, da entonação da voz, o que, segundo ele, evidenciam também a 
diversidade da cultura. Mas o ponto forte de sua análise foi mostrar como a cultura 
condiciona nossa personalidade. 
Uma maneira de ver com clareza como a cultura influencia na construção da nossa 
identidade é observar como opera a educação e o processo de socialização dos primeiros 
meses de vida. O processo de formação do nosso self e de dominação dos nossos 
desejos mais instintivos é chamado socialização. Por meio da socialização, vamos 
aprendendo a viver em sociedade, assimilando os valores, seguindo as regras e, assim, 
somos transformados em pessoas ou membros de uma sociedade. Isso é feito pela 
internalização de costumes, valores e regras de convivência. É dessa forma que a cultura 
fornece a imagem de quem somos. 
Cada pessoa em determinado momento da vida ocupa um espaço e um tempo 
sociológico. Esse tempo é o que define a função social dos membros da sociedade. A 
infância, a adolescência, a velhice são, como afirma Elias (1994, p.21), o que define 
cada passante e sua função na sociedade. Há tempo para brincar, para adquirir a 
propriedade, ter uma profissão, trabalhar. Assim, o indivíduo aprende também a 
selecionar e construir expectativas em relação a nós e aos outros. Essa seleção é operada 
por imagens de comportamento e padrões aceitáveis, que são projetados sobre nossas 
predisposições e que são moldados pela cultura. 
Quando analisamos a identidade sobre o prisma da interação, a imagem de quem somos 
e o que pensamos definem o tipo de interação. Isso implica construir uma noção mais 
pluralista de identidade. Nesse ponto, a identidade define-se por certas características 
que um indivíduo atribui ao outro e se autoclassifica como portador de uma cultura. 
Esses atributos, entretanto, não são escolhidos de forma arbitrária. Giddens (2003, p. 
42) chama de “marcadores” aqueles traços herdados e adquiridos. O idioma, a maneira 
de vestir, os hábitos e as convenções de cada grupo fazem parte da cultura; portanto, são 
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aprendidos. Giddens (2001), Hall (2006), Habermas (2000), Chatterjee (2000), Verdery 
(2000) e Mann (2000) fizeram leituras diferentes do papel da cultura na configuração 
das identidades no mundo contemporâneo, mas não se distanciaram da concepção de 
que a identidade se relaciona com a compreensão que as pessoas têm da sua cultura. 
Estudos mais recentes sobre a cultura urbana e de minorias étnicas mostram que são 
aplicadas formas de conhecimento para subjugar grupos ou pessoas de menor poder. 
Nos últimos anos tem, inclusive, aumentado o número de conflitos interétnicos e 
intensificado rótulos de identidade. 
A questão colocada por François Jullien, no seu livro “Diálogo entre as Culturas” 
(JULLIEN, 2009), chega muito a propósito para preencher uma lacuna na concepção 
jurídica de Direitos Humanos e nas discussões sobre identidade e as relações étnicas na 
contemporaneidade. Observa o filósofo que, na reunião de Viena, em 1993, quando 180 
Estados assinariam reafirmando a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, 
sequer um terço assinou o documento. A conclusão desse estudo é que a cultura 
nacional, tomada nesse sentido pela posição particular de cada país, prevaleceu sobre o 
universal. 
Muito próximo dessa conclusão está o conceito de nacionalidade de Acton (2000) como 
contraponto à ideia de globalização, quando conclui que o vínculo de um povo com o 
Estado não é meramente físico, mas ético. Diz ele que o sentimento de pertencimento à 
nação ou à pátria é, na vida política, o que representa a fé na religião. 
Ernest Gellner (2000) encaminha sua analise da identidade a partir do prisma das 
desigualdades de acesso ao progresso e a tecnologia. Argumenta que a expansão da 
tecnologia, associada a uma nova modalidade de trabalho menos físico, na comunicação 
impessoal e numa nova modalidade de emprego menos estável, cria um campo de 
tensão entre as culturas, opondo culturas superiores e inferiores. 
 
Relações étnicas e culturais 
A afirmação da identidade e a marcação da diferença implicam, sempre, as operações de 
incluir e de excluir. Michel Foucault sugere que as identidades são formadas por 
modelos discursivos ou por formas de representação da ideia que fazemos das pessoas e 
de seu comportamento. Disso deduz Foucault (1988) que, historicamente, as 
identidades operadas na forma de estigma do tipo “loira burra”, “ mulher histérica”, 
“sogra megera” etc, podem ser vistas não como tipos essenciais de self, mas como 
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rótulos construídos pela forma predominante de discurso em contextos sociais e 
históricos particulares. 
Ainda que as identidades sejam formadas a partir de fontes primárias, as crenças, as 
ideologias, os valores são fontes de identidade. Essa pluralidade de identidades sociais 
também pode ser fontes potenciais de conflito. 
O sociólogo inglês Anthony Giddens (2005) lembra que por mais de 25 anos o mundo 
foi segregado pela rivalidade global entre os paísesda União Soviética e do leste 
Europeu e os países capitalistas do Ocidente mais o Japão. Conhecida como Guerra 
Fria, a rivalidade velada entre esses países motivou a construção de identidades 
compartilhadas baseadas em ideologias. 
Em abril de 2011, o Senado francês aprovou a lei que proíbe o uso do véu islâmico, em 
público, na França. Essa medida causou estranhamento em boa parte do mundo. 
Os conflitos étnicos são antigos na história da humanidade. O país Basco, por exemplo, 
com sua língua própria, preserva sua cultura e suas fronteiras, independente da Espanha 
e da França. Os judeus lutam pela preservação do seu território, motivo das tensões 
entre Israel e Palestina. Os conflitos étnicos nos Bálcãs envolveram a Iugoslávia 
formada por diversas nacionalidades: sérvios, croatas, eslovenos macedônios, albaneses 
e húngaros. Essa região reúne uma complexa composição étnica, envolvendo três 
grupos religiosos – muçulmanos, cristãos ortodoxos e católicos romados, além de cinco 
idiomas diferentes: sérvio-croata, esloveno, albanês, húngaro e macedônio. Em junho de 
1991, após violentos conflitos, a Eslovênia e a Croácia declaravam independência da 
Iugoslávia. 
Há, todavia, que considerar que os estudos de identidade não se resumem nos conflitos 
étnicos. Outro aspecto da identidade seria o estudo de desvios de comportamento, 
conhecido nas ciências sociais pelo trabalho de Goffman e Becker ( 2008), que partem 
das regras sociais como a fonte dos padrões de comportamento. Essas fontes 
forneceriam, segundo a lógica do interacionismo, critérios classificatórios de 
comportamentos desejáveis e reprováveis. 
Quando uma pessoa infringe o critério estipulado pelos padrões aceitos pelo grupo, ela é 
considerada o que Becker, (2008, p. 140) chama de outsiders, aqueles que se desviam 
dos padrões de identidade seguidos pelo grupo. Por exemplo, o homosexualismo e a 
prostituição são algumas das infrações de regras e também marcadores de identidade. À 
medida que as regras dos grupos entrechocam-se, é estabelecido um desacordo e a 
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consequência é a acusação por um comportamento ou atitude desviada das regras do 
grupo. 
Em anos mais recentes, os estudos da identidade passaram a considerar também a 
influência dos meios de comunicação de massa na consciência identitária. A conclusão 
é que cada vez mais, nas culturas ocidentais contemporâneas, o self torna-se 
multifacetado, instável e fragmentado. Em resumo, boa parte desses estudos sobre a 
identidade volta-se para a socialização. Um exemplo é o caso do comportamento padrão 
estipulado pela ética profissional. Aprender a se vestir, portar-se, e as sutilezas do 
ambiente ocupacional tornaram-se tão importante quanto possuir habilidades técnicas. 
Chegamos ao ponto de retorno da tradição sociológica da solidariedade, conceito que 
Durkheim (1999; 2002) havia desenvolvido referindo-se à identificação das pessoas 
com outros membros do grupo de pertencimento. Marx (1976), referindo-se à 
solidariedade da classe trabalhadora, cunhou a identidade do proletariado, que 
encontrou sua expressão máxima na organização dos sindicatos, ao passo que Georg 
Simmel (2006) acrescentou que o senso de solidariedade entre os membros de 
sociedades secretas seria mais intenso. 
 
A formação do povo brasileiro 
O povo brasileiro originou-se da história do Brasil, colônia de Portugal. E essa é a 
história da expansão territorial dos portugueses que, valendo-se de indígenas, os 
primeiros habitantes deste território, e dos negros africanos, desbravaram as terras, os 
mares e os rios deste Brasil. 
Assim, o interesse econômico esteve associado às conquistas territoriais e essas 
conquistas deram-se a um preço muito elevado. O historiador brasileiro Helio Vianna, 
escrevendo sobre a conquista da Amazônia (1977), destaca a luta contra os indígenas e 
o aprisionamento desses povos. Com a justificativa de expandir as zonas de incursões 
luso-brasileiras, as chamadas tropas de resgate subiam os rios em canoas para 
aprisionarem os indígenas, devastando as suas aldeias e, à força, traziam os seus 
moradores para o trabalho forçado nos povoados, fazendas e engenhos. 
A necessidade de mão de obra, que crescia com a extensão da agricultura colonial, 
intensificou a submissão das populações indígenas ao trabalho escravo, bem como o 
tráfico de homens e mulheres que, na condição de escravos trazidos da África, serviam 
aos nobres e aos senhores de fazendas e engenhos. 
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A coroa portuguesa incumbiu os primeiros governadores de receberem e fixarem as 
primeiras famílias trazidas de toda Europa. Os governadores tinham a tarefa de fixar 
essas famílias de imigrantes europeus para atender a um projeto da coroa portuguesa de 
promover a organização social, econômica e política nos moldes do patriarcado ibérico 
e assim consolidar a ocupação portuguesa. O regime de capitanias hereditárias foi 
determinante para as condições de desigualdade social que configura as classes sociais e 
a concentração do poder da política brasileira. 
Cultura e identidade nacional 
A formação do povo brasileiro não provém de uma única matriz étnica. Ao longo da 
pré-história os povos de etnias diferentes mesclaram-se ao longo do litoral e também se 
isolaram no interior, formando um país de diversas nações: povos de língua, cor, tipo 
humano, religião e costumes diversos. 
A identidade do povo brasileiro está associada diretamente à pluralidade dessa 
formação. Cada povo forma uma nação, cada nação tem a sua língua, suas crenças, seu 
Deuse o seu território. Para se construir uma nação, é necessário que exista uma cultura. 
Mas a nação brasileira é uma profusão de culturas. 
O povo brasileiro, como definia o antropólogo Darcy Ribeiro (2006), é um povo 
mestiço. A colonização portuguesa produziu a fusão de raças e etnias sob a influência e 
força da cultura europeia. A fusão do branco com o índio e o negro deu origem ao 
mestiço. Holanda (1963), em sua obra “Raízes do Brasil”, chega a dizer que o povo 
brasileiro desconhece fronteiras. Ele vem de diversas matrizes e, assim, descende dos 
aventureiros e dos povos coletores, caçadores e lavradores. O povo brasileiro é uma 
mistura de raças e de culturas. 
O escritor Machado de Assis (1999), ao se referir à posição do Brasil no mundo, 
classificou- o como “fora do lugar”. Essa metáfora traduz a condição ambígua de uma 
cultura que se apoiava economicamente na mão de obra escrava e na subjugação dos 
povos indígenas enquanto parte das elites políticas do país pretensamente se diziam 
adeptos da ideologia liberal. Os representantes dessa elite frequentavam os círculos 
intelectuais da Europa, embora a situação econômica do Brasil representasse um 
importante atraso em relação àquele continente. 
O paradigma da colonização alimentou por muitos anos a problemática da soberania na 
vida política nacional. O tema do progresso e do subdesenvolvimento atormentou os 
governos brasileiros até recentemente. A integração nacional, outro tema presente na 
cultura política e econômica do Brasil, orientou o governo brasileiro na sua marcha para 
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o Oeste. A inauguração de Brasília, em 1960, foi um marco simbólico da identidade 
nacional. Em 1964, a tomada do poder pelos militares foi o marco decisivo da 
centralização da política, da economia e da administração pública no Brasil. 
O tema do progresso e da modernidade continuava um tema constante na esfera 
intelectual. A luta pela redemocratização do Brasil foi também um movimento de 
demarcação das identidades regionais. Os estados e as regiões puderam manifestar-se 
através da identidade política com um modelo federalista que, para Oliven, (2002), foi 
também uma reivindicaçãodo reconhecimento das diferenças culturais. 
Concluiu Oliven que o revigoramento do modelo federativo deu-se a partir de um 
movimento, que ressaltava – no momento em que o país encontrava-se integrado do 
ponto de vista político – as diferenças dos estados regionais, a vocação da economia 
regional, a sua diversidade cultural, ambiental e política. As populações que marcavam 
as diferenças étnicas dos imigrantes precisavam enviar uma mensagem para o país de 
que a identidade nacional passava antes pela identidade regional. 
 
As festas e comemorações, os hábitos e costumes do povo brasileiro hoje promovem a 
economia local e regional. A identidade étnica dos povos indígenas, os negros, os 
imigrantes alemães, italianos, franceses, holandeses e todas as demais etnias formam a 
nação brasileira e consolidam a identidade nacional e a cultura brasileira. A força dessa 
pluralidade étnica tem sido decisiva na redemocratização do país. A consciência 
nacional, impulsionada por uma maior consciência dos direitos civis, abre espaço para 
reivindicações e reconhecimento de novas identidades como, por exemplo, os jovens, os 
idosos, os homosexuais, as mulheres, os negros, as populações vulneráveis das favelas. 
 
O número de igrejas por todo Brasil criou um padrão cultural pela crescente 
organização dos movimentos de representação política. As identidades regionais, ao 
mesmo tempo que definiram as fronteiras das diferenças étnicas e culturais, 
entrelaçaram as diferenças pelos direitos políticos e civis. 
O movimento negro deu sua contribuição à identidade nacional brasileira e continua 
sendo relevante na construção da nova agenda para a consolidação dos direitos 
humanos. 
Os movimentos indígenas, ao reivindicarem seus direitos à terra, ensinam ao homem 
branco como preservar a natureza e o sentido da terra, do ar e da água nas suas culturas. 
Ensejam a sustentabilidade pela preservação das florestas e da sua biodiversidade. 
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Sugerem novas formas de pensar o mundo através de uma nova racionalidade técnica na 
prática do artesanato e da indústria química. A música, uma vocação que vem dos 
negros e dos povos indígenas, é um dos mais importantes bens simbólicos de 
exportação. O fluxo de bens culturais que veiculam no mercado externo é a maior 
riqueza brasileira.

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