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765-Einstein Suplemento v6n1 pS138-142

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einstein. 2008; 6 (Supl 1):S138-S42
Moléstia de Dupuytren
Dupuytren’s disease
Rames Mattar Junior*
RESUMO
A doença de Dupuytren é uma afecção das mais conhecidas dos 
cirurgiões de mão. É herdada como doença autossômica dominante 
e se caracteriza pelo aparecimento de nódulos ou cordões, de 
consistência endurecida, na palma da mão, podendo provocar uma 
deformidade em fl exão das articulações metacarpofalangianas e 
interfalangianas. É mais freqüente em homens jovens do que em 
mulheres, mas na velhice, a freqüência pode se igualar. O tratamento 
está indicado em pacientes sintomáticos ou com contraturas que 
prejudiquem a função. O tratamento mais utilizado é a fasciectomia 
limitada das estruturas comprometidas e a recidiva é comum.
Descritores: Contratura de Dupuytren; Mão (anatomia)/patologia
ABSTRACT
Dupuytren’s disease is one of the most frequent conditions seen 
by practicing hand surgeons. Inherited in an autosomal dominant 
pattern, the disease is characterized by a nodular thickening of the 
palmar fascia metacarpophalangeal and proximal interphalangeal 
joints. It is more frequent in young men than in women, but in old age 
its frequency may equal in men and women. Treatment is offered to 
symptomatic patients with painful nodular or disabling contracture. 
The most prevalent surgical procedure is limited fasciectomy of the 
involved abnormal structures and recurrence is common.
Keywords: Dupuytren’s Contracture; Hand/pathology
INTRODUÇÃO
A moléstia de Dupuytren foi descrita, em 1831, pelo 
Barão Guillaume Dupuytren, um célebre cirurgião 
francês (Figura 1). Ele encontrou como causa da 
moléstia o espessamento e a retração da fáscia palmar, 
que produzia uma deformidade em fl exão dos dedos 
(Figura 2). Por essa razão a denominação contratura de 
Dupuytren está associada a essa moléstia(1). A afecção é 
devida à metaplasia da fáscia palmar.
As manifestações iniciais se relacionam, na maioria 
das vezes, ao aparecimento de nódulos ou cordões, de 
consistência endurecida, na palma da mão(2-6). Os nódu-
los e cordões, geralmente indolores, podem progredir 
e aumentar de tamanho e com suas retrações, pode-se 
provocar uma deformidade em fl exão das articulações 
* Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP, São Paulo (SP), Brasil.
Autor correspondente: Rames Mattar Junior – Avenida Albert Einstein, 627 – sala 1.212 – Morumbi – CEP 04066-000 – São Paulo (SP), Brasil – Tel.: 11 3747-3262 – e-mail: rames@usp.br
Figura 1. Barão Guillaume Dupuytren (1777-1835)
Figura 2. Extensão contratura normal
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metacarpofalangianas (MCF) e interfalangianas pro-
ximais (IFP). Pode haver associação com a formação 
de cordões fi brosos na fáscia plantar (moléstia de Le-
derhose) e na fáscia peniana (moléstia de Peyronie).
O cordão espessado pode permanecer inalterado por 
anos ou aumentar progressivamente. O quarto e quinto 
dedos são os mais comumente acometidos. Nos jovens, 
acomete mais homens que mulheres, variando de 7:1 a 
15:1. Nos idosos, há um aumento da incidência nas mu-
lheres, chegando esta a se igualar com a dos homens. 
A etiologia é ainda desconhecida. A hereditarieda-
de é comprovada pela alta incidência na população des-
cendente do norte da Europa, sendo às vezes reconheci-
da como doença dos Vikings. A herança é autossômica 
dominante, com penetrância variada, existindo também 
associação importante com a epilepsia, diabetes e in-
gestão alcoólica (radicais livres)(7-8). No entanto, não há 
evidências que se trate de uma moléstia ocupacional.
O aspecto anatomopatológico é de uma lesão agres-
siva, exibindo um grande número de células e mitoses. 
A célula básica encontrada é chamada de miofi broblas-
to (semelhante ao fi broblasto encontrado normalmente 
na fáscia palmar, mas com capacidade de retração).
AFECÇÃO
A primeira alteração, geralmente, ocorre com o 
aparecimento de nódulos na palma da mão, progredindo 
para a formação cordões fi brosos, comumente, 
indolores, podendo ocorrer deformidades em fl exão 
das articulações MCF e IFP(9-10). Também pode ocorrer 
associação com a formação de cordões fi brosos na fáscia 
plantar (Lederhose) e na fáscia peniana (Peyronie).
O cordão espessado pode permanecer inalterado por 
anos ou aumentar progressivamente. O quarto e quinto 
dedos são os mais comumente acometidos (Figura 3).
do tendão do músculo palmar longo. Possui fi bras 
longitudinais, denominadas bandas pré-tendinosas, 
que se dirigem aos dedos e polegar. Afastada da prega 
palmar distal, algumas fi bras das bandas pré-tendinosas 
vão para a pele. Próxima à cabeça dos metacarpos, 
as bandas pré-tendinosas dividem-se em dois feixes 
que passam ao redor da cabeça do metacarpo (banda 
espiral). A banda espiral emite algumas fi bras para a 
cápsula da articulação MCF, terminando no espaço 
interdigital (Figura 4).
Figura 3. Deformidade característica da contratura de Dupuytren com 
deformidade em fl exão do quarto e quinto dedos
Figura 4. Anatomia da fáscia palmar
O ligamento transverso palmar superfi cial se loca-
liza profundamente à banda pré-tendinosa e proximal-
mente à prega palmar distal. Normalmente, não está 
afetado na moléstia de Dupuytren. O ligamento natató-
rio se localiza nos espaços interdigitais, enviando fi bras 
que vão para os dedos e freqüentemente está afetado, 
contribuindo para diminuir o movimento de abdução 
entre os dedos e a contratura em fl exão da IFP. 
A aponeurose palmar também emite expansões 
para a fáscia dos músculos interósseos, metacarpos e 
ligamento metacárpico transverso profundo, formando 
compartimentos por meio dos denominados septos de 
Legueu e Juvara. Nesses compartimentos passam os 
tendões fl exores, músculos lumbricais e feixes neuro-
vasculares.
Nos dedos, a fáscia palmar continua como fáscia di-
gital lateral, que recebe fi bras do ligamento natatório, 
banda espiral e ligamentos de Grayson e Cleland.
Características da fáscia palmar
 Forma triangular, com ápice (origem) no punho, 
próximo as fi bras terminais do tendão do músculo 
palmar longo;
 Fibras longitudinais (bandas pré-tendinosas);
 Distalmente à prega palmar distal algumas fi bras 
vão para a pele;
Anatomia da fáscia palmar
A fáscia palmar possui uma forma triangular, com 
ápice (origem) no punho, próximo as fi bras terminais 
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 Proximalmente à cabeça dos metacarpos, divide-se 
em dois feixes que passam ao redor da cabeça do 
metacarpo (banda espiral);
 A banda espiral emite algumas fi bras para a cápsula 
da MCF, terminando no espaço interdigital. 
Feixes de fi bras transversas da fáscia palmar
 Ligamento transverso palmar superfi cial: localiza-se 
profundamente à banda pré-tendinosa e proximal-
mente à prega palmar distal. Normalmente não está 
afetado na moléstia de Dupuytren;
 Ligamento natatório: fi ca entre os espaços interdigi-
tais e envia fi bras que vão para os dedos. Comumen-
te está afetado, contribuindo para diminuir o movi-
mento de abdução entre os dedos e a contratura em 
fl exão da IFP.
Anatomia da fáscia palmar na região distal
 A aponeurose palmar também emite expansões 
para a fáscia dos músculos interósseos, metacarpos 
e ligamento metacárpico transverso profundo, de-
nominados de septos de Legueu e Juvara e assim, 
formam-se compartimentos nos quais passam os 
tendões fl exores, músculos lumbricais e feixes neu-
rovasculares;
 Nos dedos, há a fáscia digital lateral, que recebe 
fi bras do ligamento natatório, banda espiral e liga-
mentos de Grayson e Cleland. 
QUADRO CLÍNICO
Além dos nódulos e cordões, aparecem deformidades em 
fl exão das MCF e IFP proximais. A presença do cordão 
e das deformidades são características da moléstia de 
Dupuytren. A flexão da articulação MCF ocorre quase 
que exclusivamente pela formação do cordão pré-
tendinoso. A fl exão da IFP ocorre pela formação do 
cordão central (continuação da banda pré-tendinosa), 
cordão espiral (formado pela banda pré-tendinosa e 
banda espiral) e cordão lateral (fáscia digital lateral, 
ligamentos de Grayson e Cleland), confi rme Figura 5 
A, B, C e D.
Alguns pacientes referem sentir dor, queimação, 
hiperestesia, prurido ou outras sensações nas fases de 
atividade da doença(6).
TRATAMENTO
A indicação para tratamento cirúrgico se baseia no grau 
de limitação de movimentos da articulação (limitação 
da extensão), normalmente utilizando-se a limitação 
maior que 20 a 30o para a articulação MCF e de 10 a 
20º para a IFP. Alguns autores indicam cirurgia para 
qualquer grau de limitação da extensão da IFP(11-18). 
Nos estágios iniciais, sem deformidade em fl exão 
dos dedos, pode ser indicada cirurgia quando os nódu-
los palmares forem grandes e difi cultarem a utilização 
da mão nas atividades diárias. 
Tratamento cirúrgico
Existem inúmeras técnicas cirúrgicas utilizadas no 
tratamento da contratrura de Dupuytren. Diversos 
tipos de incisões podem ser utilizados, variando de 
longitudinais nos dedos e transversas na palma da mão 
e em zig-zag (descrita por Brunner). A fasciotomia 
percutânea é utilizada para casos graves (retrações 
graves) ou quando há alguma contra-indicação de 
procedimento cirúrgico demorado (fasciectomia 
parcial).
Existem várias possibilidades para fasciectomias: 
 fasciectomia percutânea (utilizada em casos graves 
para correções progressivas, em etapas);
 fasciectomia limitada, regional ou parcial (mais uti-
lizada);
 fasciectomia extensa ou total (raramente utilizada, 
grande morbidade);
 dermofasciectomia (ressecção da pele junto com a 
fáscia, utilizada em recidivas).
Incisões
Existem muitas possibilidades de incisões. O cirurgião 
deverá escolher a de sua preferência e discutir vantagens e 
desvantagens de cada técnica com o paciente (Figura 6).
A fasciotomia percutânea é indicada para casos gra-
ves, como estágio de preparação para a fasciectomia 
parcial ou limitada(15). Permite uma correção parcial da 
deformidade em fl exão (retração), mas está associada a 
alto índice de recidiva (Figura 7).
Figura 5. Nódulos e cordões nas mãos 
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Fasciectomia regional ou limitada ou parcial
A fasciectomia regional é a cirurgia mais realizada para 
correção da deformidade e indicada nos casos de gravi-
dade pequena ou moderada. Usualmente, realizam-se 
incisões quebradas em múltiplos V, tipo Brunner. Todo 
cuidado deve ser tomado para preservar as estruturas do 
feixe vásculo nervoso e sistema de polias (Figuras 8 e 9).
Fasciotomia palmar 
A dermofasciectomia está indicada nos casos de recidiva 
quando há grave comprometimento do tecido cutâneo. 
A pele patológica é substituída por enxerto de pele total 
(Figura 10).
Figura 6. Tipo de incisões utilizadas para realização da fasciectomia na moléstia 
de Dupuytren
Figura 7. Fasciotomia percutânea
Figura 8. Fasciectomia regional
Figura 9. Fasciectomia parcial regional
 Figura 10. Dermofasciectomia
Na maioria das vezes, é possível realizar a sutura da 
pele e enxertos de pele podem ser utilizados nos casos 
de retração mais grave. 
No método da palma aberta (Mac Cash), aguarda-
se uma cicatrização secundária (cicatrização por segun-
da intenção da ferida)(17-18). Manter a ferida cirúrgica 
aberta para cicatrização por segunda intenção promove 
bons resultados na palma da mão, pois não há risco de 
formação de hematomas, mas apresentam uma demora 
na cicatrização. Em nossa experiência, preferimos re-
alizar uma hemostasia bastante criteriosa e promover 
o fechamento da pele por sutura ou enxertos de pele 
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convencional (Figura 11). Quando não é possível ven-
cer a deformidade em fl exão após ressecção da fáscia 
doente, pode ser necessária a liberação da placa volar 
retraída e capsulotomia. Quando houver comprometi-
mento articular (casos graves) a artrodese da IFP pode 
estar indicada.
Complicações
As complicações mais comuns são:
 formação de hematoma (com conseqüente sofri-
mento da pele local) e recorrência da lesão;
 lesão de nervo digital;
 necrose;
 infecção.
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Figura 11. Técnica da palma aberta, com 
cicatrização por segunda intenção
Figura 12. Pós-operatório: órteses para manutenção da correção das 
deformidades, exercícios e tratamento da cicatriz (massagem, sucção e 
elastômeros de silicone)
Métodos de tratamento da ferida operatória e 
revestimento cutâneo
 Sutura;
 Enxerto de pele;
 Cicatrização secundária.
Métodos de tratamento de deformidade em fl exão 
complexa
 Liberação da placa volar retraída;
 Artrodese da IFP (comprometimento articular).
Pós-operatório
 Órteses, exercícios e tratamento da cicatriz (massa-
gem, sucção e elastômeros de silicone), de acordo 
com a Figura 12.

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