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1 INTENSIVO PCGO DIREITO PENAL – PARTE ESPECIAL Sumário 1. Crimes contra a vida .............................................................................................................. 3 2. Crimes de lesões corporais .................................................................................................. 25 3. Periclitação da vida e da saúde ........................................................................................... 31 4. Rixa ...................................................................................................................................... 43 5. Crimes contra a honra ......................................................................................................... 55 6. Crimes contra a liberdade individual .................................................................................. 66 7. Crimes contra a inviolabilidade do domicílio ...................................................................... 80 8. Crimes contra a inviolabilidade de correspondência .......................................................... 82 9. Crimes contra a inviolabilidade dos segredos ..................................................................... 85 → CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO ....................................................................................... 89 1. Furto .................................................................................................................................... 89 2. Roubo e da extorsão ......................................................................................................... 101 3. Usurpação ......................................................................................................................... 112 4. Dano .................................................................................................................................. 114 5. Apropriação indébita ......................................................................................................... 117 6. Estelionato e outras fraudes ............................................................................................. 122 7. Receptação ........................................................................................................................ 134 8. Disposições gerais ............................................................................................................. 138 → CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL ................................................................. 139 1. Crimes contra a propriedade intelectual .......................................................................... 139 → CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO .......................................................... 142 1. Crimes contra a organização do trabalho ......................................................................... 142 → CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO E CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS ...... 150 1. Crimes contra o sentimento religioso ............................................................................... 150 2. Crimes contra o respeito aos mortos ................................................................................ 151 → CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL ........................................................................... 153 1. Crimes contra a liberdade sexual ...................................................................................... 153 2. Crimes contra vulnerável .................................................................................................. 158 3. Disposições gerais ............................................................................................................. 165 2 4. Lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual..................................................................................................................................... 166 5. Ultraje público ao pudor ................................................................................................... 170 → CRIMES CONTRA A FAMÍLIA ............................................................................................. 173 1. Crimes contra o casamento............................................................................................... 173 2. Crimes contra o estado de filiação .................................................................................... 177 3. Crimes contra a assistência familiar .................................................................................. 179 4. Crimes contra o pátrio poder, tutela curatela .................................................................. 183 → CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA .................................................................. 185 1. Crimes de perigo comum .................................................................................................. 185 2. Crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos ................................................................................................................................. 194 3. Crimes contra a saúde pública .......................................................................................... 199 → CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA ...................................................................................... 216 1. Crimes contra a paz pública .............................................................................................. 216 → CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA ........................................................................................ 221 1. Moeda falsa ....................................................................................................................... 221 2. Falsidade de títulos e outros papéis públicos ................................................................... 224 3. Falsidade documental ....................................................................................................... 227 4. Outras falsidades ............................................................................................................... 236 4. Fraudes em certames de interesse público ...................................................................... 240 → CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ................................................................ 240 1. Crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral .................. 241 2. Crimes praticados por particular contra a administração em geral .................................. 258 3. Crimes praticados por particular contra a administração pública estrangeira ................. 272 4. Crimes contra a administração da justiça ......................................................................... 273 5. Crimes contra as finanças públicas ................................................................................... 292 3 DIREITO PENAL - PARTE ESPECIAL Aula 01. Crimes contra a pessoa. 1. Crimes contra a vida I. Homicídio (art. 121). Modalidades: • Homicídio doloso simples • Homicídio doloso qualificado • Homicídio doloso privilegiado • Homicídio culposo • Homicídio culposo majorado • Homicídio doloso majorado a) Homicídio simples • Art. 121. Matar alguem: • Pena - reclusão, de seis a vinte anos. Pode ser hediondo quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente. → Sujeito ativo Crime comum. Euclides Custódio da Silveira ➔ crime de homicídio praticado por irmãos xifópagos (siameses). Oirmão “A” cometeu o homicídio e o irmão “B” não. Se o irmão fosse ao cárcere ficará o irmão “B” preso? 4 • Doutrina: se a separação dos irmãos for cirurgicamente possível, e houver o consentimento do inocente, haverá a separação e o outro vai ao cárcere. • Se não for possível, não se imporá a pena ao irmão “A”. → Sujeito passivo Qualquer pessoa. A pena é aumentada de 1/3 se o crime é cometido contra: • Menor de 14 anos • Maior de 60 anos → Conduta É tirar a vida de alguém. Quando começa a vida extrauterina? Começa com o parto, quando se inicia o trabalho do parto. Isso se dá com o início das contrações expulsivas. No caso de uma gravidez de cujo nascimento se dê por cesariana, isto ocorrerá com o início da operação, com a incisão. → Voluntariedade O homicídio doloso pode ser direto ou eventual. R. Sanches: • Se o agente portador do vírus HIV e tem relação sexual com sua esposa com a intenção de transmitir os vírus a ela, há tentativa de homicídio. • Caso use preservativo e o preservativo rasgue culposamente, lesão corporal culposa. STJ: indivíduo que intencionalmente transmite vírus HIV a parceiro pratica lesão corporal gravíssima, tendo em vista se tratar de enfermidade incurável. → Consumação e tentativa Consuma-se com a morte. Crime material. 5 É crime plurissubsistente, podendo ocorrer com diversos atos. Ex.: facadas. Tentativa é plenamente possível. b) Homicídio privilegiado É o homicídio com uma causa de diminuição de pena de 1/6 a 1/3. Art. 121, §1º: 03 hipóteses em que o homicídio é privilegiado: • Relevante valor social: interesse de toda a coletividade. Ex.: matar estuprador de diversas crianças no bairro. • Relevante valor moral: interesse individual, havendo sentimento de misericórdia ou compaixão. Ex.: homicídio eutanásico. • Homicídio emocional: o sujeito ativo reage logo após injusta provocação de vítima, sob domínio de violenta emoção. Requisitos: o Domínio de violenta emoção o Reação imediata o Injusta provocação da vítima Os Tribunais entendem que o privilégio se faz presente enquanto estiver presente o domínio de violenta emoção. Não há tempo definido. → Comunicabilidade do §1º No caso de concurso de pessoas, dada a natureza pessoal de minorante, não haverá comunicação ao coautor. Só há alteração da quantidade da pena, mas não na qualidade da pena. → Natureza jurídica do privilégio O sujeito, tendo preenchido todos os requisitos do homicídio privilegiado, tem direito público subjetivo à diminuição de pena. c) Homicídio qualificado 6 É crime hediondo. Pena: de 12 a 30 anos de reclusão. → Mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe • Paga: o pagamento vem antes. • Promessa de recompensa: o pagamento vem depois. • Motivo torpe: motivo vil, repugnante, abjeto. • Ex.: homicídio mercenário (crime de concurso necessário). STJ O reconhecimento da qualificadora da "paga ou promessa de recompensa" em relação ao executor do crime de homicídio mercenário não qualifica automaticamente o delito em relação ao mandante, nada obstante este possa incidir no referido dispositivo caso o motivo que o tenha levado a empreitar o óbito alheio seja torpe (Inf. 575, STJ). Em outras palavras, o STJ decidiu que: i) A “paga ou a promessa de recompensa” é circunstância acidental do delito de homicídio, de caráter pessoal e, portanto, incomunicável automaticamente aos coautores; ii) É possível que esta circunstância se comunique entre o mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o mandante a encomendar a morte tenha sido torpe, desprezível ou repugnante; Ex: encomendou a morte para ficar com a herança da vítima; Ex: homem que contrata pistoleiro para matar o estuprador de sua filha. Executor ➔ responderá por homicídio qualificado (121, § 2º, I) Mandante ➔ responderá por homicídio simples, podendo até mesmo ser beneficiado com o privilégio do § 1º. 7 Há ainda uma discussão sobre a necessidade de a recompensa ter natureza econômica ou não. O entendimento prevalente é no sentido de que essa recompensa deve ter natureza econômica. STJ e STF Vingança poderá ou não constituir motivo torpe, a depender das peculiaridades do caso concreto. Exemplos de motivação de homicídio torpe: • Preconceito • Canibalismo e Vampirismo • Motivação econômica • Intenção de ocupar o cargo da vítima • Matar por prazer • Preso que mata outro por integrar facção criminosa rival → Motivo fútil • Caracteriza-se pela desproporcionalidade entre a resposta e a provocação. • Cuidado para não com ausência de motivo. O homicídio sem motivo aparente é homicídio simples. Ex. de motivo fútil: matar em razão de dívida de 5 reais. • STJ: a qualificadora do motivo fútil é incompatível com o dolo eventual, tendo em vista a ausência do elemento volitivo (Info 583). • Doutrina: não é possível a concomitância entre motivo torpe e fútil no crime de homicídio. STJ: não incide a qualificadora de motivo fútil, na hipótese de homicídio supostamente praticado por agente que disputava "racha", quando o veículo por ele conduzido, por conta de choque com outro automóvel também participante do "racha", tenha atingido o veículo da vítima, terceiro estranho à disputa automobilística. Não há aqui motivo fútil. O acidente 8 teve causa em comportamento imprudente do agente, que não foi resposta à ação ou omissão da vítima. Na verdade, não há nenhum motivo. → Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum • Circunstâncias que têm natureza objetiva, pois se relacionam ao meio empregado. • Possível a interpretação analógica. ▪ Insidioso: é o meio dissimulado ▪ Cruel: é o emprego de meio desnecessário para obter o seu resultado. ▪ Veneno: substância biológica ou química capaz de perturbar ou destruir as funções vitais do organismo humano. ▪ Magalhães Noronha: toda substância pode ser veneno, como é o caso do diabético que ingere alto teor de açúcar, assim como a pessoa que ingere substância da qual tem alergia. ▪ Só haverá essa qualificadora por veneno (venefício) se a pessoa desconhecer que está ingerindo veneno. R. Sanches ➔ do contrário, será a qualificadora do meio cruel, pois traz sofrimento desnecessário. ▪ Tem-se crime impossível por absoluta ineficácia do meio quando a substância não poderia, nem mesmo em altíssimas doses, provocar a morte de um ser humano. ▪ No caso do emprego de tortura, somente haverá a qualificadora do homicídio, se a intenção do agente, ao torturar a vítima, era alcançar o resultado morte. ▪ Se o agente queria apenas torturar e a morte resulta de conduta culposa, haverá o crime de tortura qualificado pelo resultado (art. 1º, §3º, da Lei 9.455/97). → À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido • Há interpretação analógica. • Trata-se de qualificadora quanto ao modo de execução (circunstância objetiva). 9 Atenção A premeditação não é qualificadora do crime de homicídio, podendo ser cometido por meio de traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, mas não qualifica, por si só, o crime. STJ A qualificadora de homicídio praticado por meio de traição, emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido é incompatível com o dolo eventual. → Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime Aqui há conexão. Essaconexão poderá ser: • Conexão teleológica: para assegurar a execução de um crime futuro. • Conexão consequencial: para assegurar a ocultação, a impunidade ou a vantagem de crime passado. Se o homicídio foi praticado para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de contravenção penal, não haverá essa qualificadora, mas poderá haver outra, como o motivo torpe ou fútil. → Feminicídio É a morte da mulher por conta da sua condição de pertencer ao sexo feminino. São duas as hipóteses em que haverá razões de condição de sexo feminino, quando houver: • Violência doméstica e familiar • Menosprezo ou discriminação à condição de mulher *Matar mulher, por si só, não é feminicídio. ➢ O autor poderá ser homem ou poderá ser mulher. Conceito de violência doméstica e familiar 10 Art. 5º da Lei Maria da Penha: Qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: • No âmbito da unidade doméstica: espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; • No âmbito da família: compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; • Em qualquer relação íntima de afeto: na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Perceba: o feminicídio fundado em violência doméstica é uma norma penal em branco imprópria heterovitelina. É possível figurar como vítima de feminicídio o transexual? Transexual: pessoa que sofre dicotomia entre o sexo físico e o psicológico. Há duas correntes: 1ª: como geneticamente não é mulher, não poderá sofrer feminicídio. 2 (Majoritária): É plenamente possível, se o transexual mudar o sexo de forma irreversível. Assim, passa a ter outra realidade morfológica, tanto que a jurisprudência considera possível a troca de nome. Atenção! A qualificadora do feminicídio incide quando o homicídio se dá por conta das razões de sexo feminino. Ou seja, o transexual deverá ser morto por ser mulher. Se for morto por ser transexual, não será caso de feminicídio. • Sanches sustenta que essa qualificadora é de ordem subjetiva. → Contra autoridade ou agente de segurança pública (homicídio funcional) Inciso VII: o homicídio será qualificado quando cometido contra: 11 • Autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública no exercício da função ou em decorrência dela; • Ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até 3º grau, em razão dessa condição. ▪ O art. 142 da CF trata das Forças Armadas. ▪ O art. 144 da CF trata das polícias em geral, incluindo o corpo de bombeiros militares. • O homicídio praticado contra guarda municipal ou metropolitana, em razão da sua função, é qualificado? Sanches entende que sim. O §8º do art. 144 descreve a guarda municipal como uma das autoridades. E se o homicídio é praticado contra agentes de segurança viária, tal como os agentes do DETRAN? Sanches entende que sim. Fundamento: o art. 144, §10º, da CF, diz que a segurança viária compreende a fiscalização de trânsito. Se está no art. 144, está abrangido pela qualificadora. • Vale lembrar! Essa qualificadora tem natureza subjetiva e é incompatível com o privilégio. → Pluralidade de circunstâncias qualificadoras Fernando Capez: é inapropriado falar em homicídio duplamente ou triplamente qualificado. Basta uma circunstância para qualificar o homicídio. Neste caso, as demais seriam valoradas como: 1ªC: como circunstâncias judiciais. 2ªC: como agravantes. Caso não haja previsão como agravante, será valorada como circunstância judicial. → Homicídio qualificado-privilegiado É possível o homicídio qualificado-privilegiado, desde que a qualificadora tenha natureza objetiva. 12 Ex.: matou, valendo-se de meio cruel, mas logo após a injusta provocação da vítima e sob o domínio de violenta emoção. Neste caso, o crime seria hediondo ou não? 1ªC: o homicídio qualificado-privilegiado não é hediondo. 2ªC: o homicídio qualificado-privilegiado permanece sendo qualificado, sendo hediondo. STJ: o homicídio qualificado-privilegiado não é hediondo. d) Homicídio doloso majorado §4º, art. 121: aumenta-se a pena do homicídio de 1/3, quando o crime é praticado contra: • Menor de 14 anos • Maior de 60 anos É indispensável que o autor tenha o conhecimento dessa condição. e) Milícia privada ou grupo de extermínio A pena do homicídio será aumentada de 1/3 quando é praticado por milícia privada, sob pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. A lei não conceitua esses institutos. Doutrina: • Grupo de extermínio: pessoas que se reúnem, formando “justiceiros”, que atuarão na ausência do poder público, a fim de matar pessoas consideradas marginais ou perigosas. É reflexo do direito penal subterrâneo (ocorre quando as milícias são efetuadas pelos próprios agentes estatais). • Milícia armada: grupo de pessoas, civil ou não, tendo a finalidade de devolver a segurança da população mais carente que perdeu a paz. Quantas pessoas devem integrar um grupo de extermínio ou milícia privada? A lei não diz. Há duas correntes: 13 • 1ªC: deve ser aplicado o art. 288 do CP (3 ou mais pessoas); • 2ªC: deve ser aplicado o conceito de organização criminosa (4 ou mais pessoas - Lei 12.850/13). f) Majorante do feminicídio 121, § 7º: A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: • I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; • II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; • III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima. • No caso do inciso I: o agente responderá pelo feminicídio majorado, em concurso formal impróprio ou em concurso material, com o aborto, se sabia que a vítima estava gestante. • No caso do inciso III, R. Sanches: a expressão “na presença de” está abrangida pela transmissão por meio de vídeo. Trata-se de uma interpretação extensiva conferida à majorante. g) Homicídio culposo O agente, por negligência, imprudência ou imperícia, dá causa ao resultado morte. h) Homicídio culposo majorado Causa de aumento será de 1/3, se o homicídio culposo: • Resulta de inobservância de regra técnica ou profissão, arte ou ofício Não se confunde com a imperícia, eis que, neste caso, o indivíduo não tem aptidão para realizar o ato. No caso da inobservância de regra técnica ou profissão, arte ou ofício, o sujeito tem aptidão para o exercício de arte, profissão ou ofício, mas atua com descaso, com displicência. Flávio Monteiro de Barros 14 • Se o cirurgião cardíaco mata a vítima porque, no momento da cirurgia, não presta atenção em algum ponto ➔ cometeu homicídio culposo majorado (inobservou técnica). • Se um médico, recém formado, realiza uma cirurgia cardíaca e mata a vítima por imperícia, não incide a majorante, porque ele não tem aptidão para o exercício daquela cirurgia. Perceba: não há bis in idem. • Se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências de seu ato ou foge para evitar prisão em flagrante ➢ A pena será aumentada de 1/3. ➢ Aqui há omissão de socorro. O agente deixa de prestar socorro à vítima quando podia e não havia risco pessoal. STJ: no homicídio culposo, a morte instantânea da vítimanão afasta a causa de aumento de pena de 1/3, a não ser que o óbito seja evidente, perceptível por qualquer pessoa. i) Perdão judicial • Houve fato típico, ilícito, culpável, mas a pena torna-se desnecessária: princípio da bagatela imprópria. • É causa extintiva da punibilidade. O perdão judicial, diferentemente do perdão do ofendido, não precisa ser aceito pelo infrator para produzir seus efeitos. Qual é a natureza jurídica da sentença do perdão judicial? É declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório (Súmula n° 18 do STJ). STJ: para aplicar o perdão judicial, é preciso uma das seguintes situações: • Que a vítima tenha relação de parentesco com o agente do crime • Que vítima tenha relação de afeto com o agente do crime 15 • Que o agente do crime tenha sofrido sequelas físicas ➢ STJ não admite sequelas morais para justificar o perdão judicial. j) Ação penal A ação penal nos crimes de homicídio é pública incondicionada. k) Princípio da especialidade No caso de a vítima do homicídio ser Presidente da República, Presidente do Senado, Presidente da Câmara ou Presidente do STF e o agente tiver motivação ou objetivos políticos, o crime será o do art. 29 da Lei de Segurança Nacional, pois atinge os poderes da República. II. Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (art. 122) • Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: • Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. • Parágrafo único - A pena é duplicada: • I - se o crime é praticado por motivo egoístico; • II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. a) Sujeito do crime O crime é comum. • Suicídio: é a eliminação direta e voluntária da própria vida. O delito exige que a pessoa tenha capacidade de discernimento. Apenas quem tem capacidade de discernimento poderá ser sujeito passivo do crime. • Se não houver capacidade de discernimento, o agente terá cometido o crime de homicídio. • Exige-se que a conduta seja dirigida à pessoa determinada ou a várias pessoas determinadas. • O induzimento genérico não é enseja o crime de induzimento ao suicídio. 16 Ex.: obra literária que promova o suicídio não é capaz de incriminar o autor do livro. a) Conduta São 3 as formas de realizar o crime: • Induzimento: é de cunho moral. • Instigação: também é de cunho moral. • Auxílio: é uma prestação material, como fornecer a arma. ➢ É possível que o agente induza, instigue e auxilie a vítima a se suicidar. Tipo misto alternativo, de conduta múltipla ou de conteúdo variado. A multiplicidade da conduta pode ter reflexo na dosimetria da pena. • A maior parte da doutrina entende que o auxílio moral e material somente pode ser praticado de forma comissiva. Não falar nada não é induzir ao suicídio. • Porém a conduta omissiva pode ser considerada como induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, quando o autor tinha o dever jurídico de evitar o resultado. Dessa forma, o agente poderia praticar o crime por meio de conduta omissiva. Que crime comete o agente que, depois de ter induzido alguém a se suicidar, tenha, no momento culminante do ato, interferido na sua execução, causando a morte de quem tentava se suicidar? • Doutrina: responde o agente apenas pelo homicídio. • Responde também por homicídio o agente que, depois de auxiliar, vê a vítima, após a prática do ato, pedir a ajuda do agente, mas dolosamente impede intervenção salvadora. ➢ CP, art. 146, §3º, II: não configura constrangimento ilegal a coação exercida para impedir suicídio. b) Voluntariedade Somente é punível a título de dolo. 17 Alguns entendem que é possível a prática do crime mediante dolo eventual. Não é pacífico na Doutrina. c) Consumação e tentativa Consuma-se no momento em que a vítima morre ou sofre lesões de natureza grave. Isto é uma condição objetiva de punibilidade, Não admite o crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio a forma tentada. d) Majorantes da pena A pena é duplicada quando: • Crime cometido por motivo egoístico • Crime é cometido contra menor • Crime é cometido contra quem tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência ➢ Atenção: ainda que seja menor, é necessário que seja dotada de algum grau de discernimento. Do contrário, não haveria induzimento ao suicídio, e sim homicídio. e) Duelo americano, roleta russa e pacto de morte (ambicídio) Duelo americano: duas pessoas, diante de duas armas, e apenas uma delas está carregada. Elas combinam de tirar a sorte para escolher a arma e logo após dar um tiro na sua própria cabeça. Quem sobreviver responderá pelo crime do art. 122. Roleta russa: praticamente a mesma coisa. As pessoas colocam uma munição na arma e vão atirando até que chega o momento em que o projétil é disparado na própria cabeça da vítima. Os sobreviventes responderão pelo crime do art. 122. Ambicídio ou pacto de morte: as duas pessoas combinam de tirar a própria vida conjuntamente. Caso não dê certo e um deles sobreviva, responderá por induzimento ao suicídio. Neste último caso, é possível que o sobrevivente responda por homicídio. 18 R. Sanches exemplifica: casal de namorados combina de se matar, situação em que eles se fecham numa sala com gás. No caso, o namorado abriu a torneira de gás. Supondo que o namorado sobreviva, ele não responderá pelo induzimento ao suicídio, e sim por homicídio. Se a namorada sobreviver, ela responderá pelo induzimento. Atenção: No caso, se os dois sobreviverem, o namorado responderá por tentativa de homicídio e a namorada não responderá por crime algum, salvo se o namorado sofrer lesão corporal de natureza grave, situação em que a namorada responderá pelo induzimento ao suicídio. f) Ação penal A ação penal do crime é pública incondicionada. III. Infanticídio • Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: • Pena - detenção, de dois a seis anos a) Sujeito ativo A genitora. Trata-se de crime próprio. Admite-se coautoria e participação. A condição pessoal é elementar e, portanto, comunica-se ao coautor que não estava em estado puerperal. b) Sujeito passivo Somente poderá ser sujeito passivo o sujeito nascente ou recém-nascido. c) Conduta Matar, durante o parto ou logo após: circunstância de tempo, submetida a juízo de valor do magistrado. Doutrina: “logo após” compreende todo o período do estado puerperal. 19 • Obs.: a depender do grau de desequilíbrio fisiopsíquico oriundo do parto, pode a gestante ser considerada portadora de doença ou perturbação da saúde mental, aplicando-se as disposições do art. 26, caput ou parágrafo único, do CP, caso tenha retirado total ou parcialmente sua capacidade de entendimento ou de autodeterminação. d) Voluntariedade O delito é punido a título de dolo, direto ou eventual. E se a mãe, por equívoco, acaba por matar filho de outra pessoa (confunde com seu próprio filho)? Responde por infanticídio, como se tivesse praticado o delito efetivamente contra seu filho. Trata-se de erro sobre a pessoa (art. 20, §3º do CP). e) Consumação e tentativa Consuma-se com a morte da criança. A tentativa é possível. f) Ação penal A ação é pública incondicionada. IV. Aborto É a interrupção da gravidez, com a destruição do produto da sua concepção (Mirabete). • Doutrina majoritária brasileira:o termo inicial do aborto é o começo da gravidez, ou seja, a partir do momento em que a gestação tem início sendo considerado como tal o momento da nidação (momento em que o óvulo fecundado é implantado no útero da mulher). No entanto, existe intensa discussão sobre quando se inicia a vida e qual é o status jurídico do embrião durante a fase inicial da gestação. Há 02 posições principais: • 1ªC: existe vida desde a concepção (nidação), desde que o espermatozoide fecundou o óvulo, dando origem à multiplicação das células. • 2ªC: antes da formação do sistema nervoso central e da presença de rudimentos de consciência (o que geralmente se dá após o terceiro mês da gestação) não é possível falar-se em vida em sentido pleno. 20 • Dado científico: Nos 3 primeiros meses, o córtex cerebral (que permite que o feto desenvolva sentimentos e racionalidade) ainda não foi formado nem há qualquer potencialidade de vida fora do útero materno. • Com base nessa premissa científicas, diversos países do mundo adotam como critério que a interrupção voluntária da gestação não deve ser criminalizada, desde que feita no primeiro trimestre da gestação. Ex.: Alemanha, Bélgica, França e Uruguai. 1ª Turma do STF A interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação provocada pela própria gestante (art. 124) ou com o seu consentimento (art. 126) não é crime. • É preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do CP para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade. (Inf. 849). STJ • Iniciado o trabalho de parto, não há crime de aborto, mas sim homicídio ou infanticídio, conforme o caso. • Para configurar o crime de homicídio ou infanticídio, não é necessário que o nascituro tenha respirado, notadamente quando, iniciado o parto, existem outros elementos para demonstrar a vida do ser nascente. Ex.: batimentos cardíacos. a) Aborto provocado pela gestante ou com consentimento da gestante • Há aqui uma exceção à teoria monista: quem pratica o aborto com o consentimento da gestante pratica o crime do art. 126 e a gestante que consentiu com o aborto pratica o crime do art. 124. • Art. 124: provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque. Pena de detenção, de 1 a 3 anos. Veja: pena mínima não superior a 1 ano, caberá sursis (art. 89 LJE). 21 → Sujeitos do crime Pode ser sujeito ativo do crime apenas a gestante. • Cezar Roberto Bitencourt: o crime é de mão própria. • Rogério Sanches e doutrina majoritária: trata-se de crime próprio. Portanto, se a gestante e o namorado decidem realizar em conjunto as manobras abortivas, haveria a possibilidade de coautoria. Sujeito passivo: o óvulo, o feto ou o embrião. Se a mulher estiver grávida de trigêmeos, quantos crimes cometeu? 3 crimes de aborto em concurso formal, pois atinge 3 vítimas (fetos). → Voluntariedade O crime de aborto só é punível a título de dolo. → Consumação Consuma-se no momento em que o feto é morto, ou seja, no momento em que há a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção (crime material). → Ação penal A ação penal é pública incondicionada. b) Aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante Art. 125: provocar aborto, sem o consentimento da gestante. Pena será de reclusão, de 3 a 10 anos. → Sujeitos do crime • Sujeito ativo: qualquer pessoa • Sujeito passivo: a genitora e o feto (dupla subjetividade passiva). → Voluntariedade O crime é praticado de forma dolosa. 22 • Atenção: se o sujeito matar uma mulher grávida, sabendo dessa condição, responderá pelo crime de homicídio em concurso formal com o crime de aborto. → Ação penal A ação penal é pública incondicionada. c) Aborto provocado por terceiro, com o consentimento da gestante • Art. 126: provocar aborto com o consentimento da gestante • Pena: reclusão, de 1 a 4 anos. Veja: também admite a suspensão condicional do processo. § único: aplica-se a pena do aborto sem o consentimento da gestante (reclusão de 3 a 10 anos), se: • A gestante não é maior de 14 anos • A gestante é alienada ou débil mental • O consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência Há aqui um dissenso presumido pela lei. → Sujeitos do crime Sujeito ativo: qualquer pessoa (crime comum). Sujeito passivo: é o feto apenas. → Ação penal A ação penal é pública incondicionada. d) Aborto majorado pelo resultado Art. 127: as penas cominadas ao aborto provocado por terceiro com consentimento da gestante e o crime de aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante: • São aumentadas de 1/3: se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; 23 • São duplicadas: se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. Trata-se de crimes preterdolosos. • Essa causa de aumento de 1/3 ou duplicação das penas não se aplica ao aborto provocado pela gestante ou pelo crime de consentimento para que lho provoquem. • Para que incida a majorante do art. 127, não é indispensável que o aborto ocorra. Se a vítima sofrer lesão corporal de natureza grave ou morrer, mas o feto se salvar, haverá a incidência da majorante. O artigo diz que haverá o acréscimo quando as lesões ou a morte constituírem consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo (ainda que o aborto não ocorra). • Logo, é possível tentativa de aborto majorado. • Caberia tentativa de crime preterdoloso? Em regra, não. Mas Frederico Marques afirma que é possível, quando a parte frustrada recai sobre a conduta dolosa. A figura da tentativa deverá recair sobre o aborto. e) Aborto legal Art. 128: não se pune o aborto praticado por médico: • se não há outro meio de salvar a vida da gestante; • se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Na verdade, trata-se de uma excludente de ilicitude, apesar de mencionar que “não se pune”. O dispositivo prevê duas situações distintas: • Aborto necessário (ou terapêutico): visa salvar a vida da gestante. • Aborto sentimental (humanitário ou ético): é resultante de estupro. → Aborto necessário (ou terapêutico) Há aqui 3 condições para ser considerado legal: 24 • Que o aborto seja praticado por médico • Que haja perigo de morte da gestante • Que seja impossível o uso de outro meio para salvar a vida da gestante Preenchidos esses requisitos, não se exige nem mesmo a autorização da gestante ou autorização judicial. → Aborto sentimental (humanitário ou ético) Há também necessidade de preencher 3 requisitos: • Aborto ser praticado por médico • Gravidez resultar de estupro • Consentimento da gestante, ou, caso seja incapaz, autorização do representante legal Aqui também não há necessidade de autorização judicial. → Aborto de feto anencefálico • Feto anencéfalo: é um embrião, feto ou recém-nascido que não possui uma parte do seu sistema nervoso central, não possuindo os hemisférios cerebrais. Não há possibilidade de vida extrauterina. • STF: houve uma derrotabilidade da norma, fazendo uma interpretação conforme, para que compreender que o aborto é crime, salvo nas hipóteses de aborto necessário, humanitário e do feto anencéfalo. Ou seja, a norma do crime de aborto é constitucional, mas ela é derrotada para o aborto de fetoanencéfalo. Homenagem ao princípio da dignidade da pessoa humana, da legalidade, liberdade de decisão sobre o próprio corpo e autonomia da vontade. → Aborto de feto no primeiro trimestre STF, 1ª Turma: o aborto cometido até o 3º mês não é crime, visto que não haveria sistema nervoso central. 25 • Se a lei diz que a vida termina quando há o fim das atividades cerebrais, já que os órgãos podem ser doados, é preciso fazer uma leitura a contrario sensu, de modo a entender que a vida não começa quando não houver a formação desse sistema. Portanto, como não há vida até o 3º mês de gravidez, é possível o aborto sem ser crime neste caso. Aula 02. Dos crimes contra a pessoa: Das lesões corporais. Periclitação da vida e da saúde. 2. Crimes de lesões corporais I. Crime de lesão corporal (art. 129) • Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: • Pena - detenção, de três meses a um ano. Infração de menor potencial ofensivo A lesão corporal poderá ser: • Leve • Culposa • Grave • Gravíssima • Seguida de morte Lesão corporal leve e l. c. culposa são infrações de menor potencial ofensivo. L. c. grave admite sursis processual. a) Sujeitos do crime Crime bicomum. b) Voluntariedade Pode ser cometido na forma dolosa, culposa e preterdolosa. II. Lesão corporal de natureza grave 26 Art. 129, §1º: são lesões corporais de natureza grave, ensejando pena de 1 a 5 anos, caso resultem em: • Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 dias; Envolve qualquer atividade corporal costumeira. Art. 168, §2º, do CPP: a gravidade da lesão será comprovada por um laudo médico complementar após o trigésimo dia a contar da data da lesão. Caso não haja laudo, cabível prova testemunhal. • Perigo de vida; Probabilidade séria de morte (colocou em risco a vida da vítima). Deve ser atestado, e não presumido. É necessário que a conduta seja culposa. Caso contrário, há tentativa de homicídio. • Debilidade permanente de membro, sentido ou função; Debilidade: diminuição ou enfraquecimento da capacidade funcional da vítima, no tocante a membro, sentido ou função. Ex.: perda do movimento de um olho. STJ: a lesão corporal que provoca na vítima a perda de 2 dentes tem natureza grave, e não gravíssima. • Aceleração de parto; Há um parto prematuro. Se provocar o aborto, não é lesão corporal de natureza grave, e sim de natureza gravíssima. Para incidir essa qualificadora, é necessário que o agente saiba da gravidez da vítima. III. Lesão corporal de natureza gravíssima Pena: reclusão de 2 a 8 anos, desde que resulte: • Incapacidade permanente para o trabalho; 27 A vítima não poderá mais trabalhar. Doutrina e jurisprudência prevalentes: a incapacidade deverá ser para qualquer espécie de trabalho. Caso possa trabalhar em outra função, não caberá a qualificadora. • Enfermidade incurável; Doutrina: enfermidade que não tem cura provável ou tratamento certo pela medicina, ainda que seja possível tratamento experimental. ➢ Nucci: condenado o indivíduo por lesão gravíssima e vindo o ofendido a ser curado da enfermidade que era incurável (desenvolvimento da medicina), a qualificadora se mantém. A impossibilidade de cura é aferida no momento da condenação. ➢ Porém, STJ: a aferição da possibilidade de cura ou não da enfermidade deverá ser analisado com base no momento da consumação do crime, e não no momento da condenação. ➢ STJ: o indivíduo que tenha a intenção de transmitir vírus HIV a parceiro/a pratica lesão corporal de natureza gravíssima, tendo em vista se tratar de enfermidade incurável. • Perda ou inutilização do membro, sentido ou função; Perda da função por inteiro. Ex.: pessoa que ficou cega dos dois olhos. Ex.2: perda de um braço ou de uma perna Sanches: gravíssima lesão que causa impotência generandi ou coeundi • Deformidade permanente; É o dano estético, capaz de constranger a vítima, assim como quem a vê. STJ A qualificadora “deformidade permanente” do crime de lesão corporal não é afastada por posterior cirurgia estética reparadora que elimine ou minimize a deformidade na vítima. O fato criminoso é valorado no momento de sua consumação (Inf. 562). • Aborto; 28 Trata-se de crime preterdoloso. O sujeito causa o aborto na mulher grávida por conta da lesão, acreditando que essa lesão não levaria ao aborto. O indivíduo deve saber que a mulher está grávida. IV. Lesão corporal seguida de morte Conhecida também como homicídio preterdoloso. §3º: a pena será de reclusão, de 4 a 12 anos, se da lesão corporal resultar morte e as circunstâncias evidenciarem que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo. Vale lembrar: em regra, crime preterdoloso não admite tentativa. STJ: o crime de lesão corporal seguida de morte é compatível com a agravante de delito cometido à traição ou emboscada. V. Lesão corporal dolosa privilegiada §4º do art. 129: se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de 1/6 a 1/3. Portanto, haverá l. c. dolosa privilegiada quando o agente atua com: • Relevante valor social • Relevante valor moral • Injusta provocação da vítima, sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. VI. Lesão corporal dolosa ou preterdolosa majorada §7, art. 129: a lesão corporal terá sua pena aumentada de 1/3, quando: • O crime for praticado contra menor de 14 anos • O crime for praticado contra maior de 60 anos 29 • O crime for praticado por milícia privada, sob pretexto de prestação de serviço de segurança • O crime for praticado por grupo de extermínio VII. Substituição da pena §5º - A pena de detenção poderá ser substituída pela pena de multa, caso, não sendo graves as lesões, estejamos diante de uma das seguintes hipóteses: • Ocorrer qualquer das hipóteses da lesão dolosa privilegiada (§4º); ou • Ocorrer reciprocidade de lesões VIII. Lesão corporal culposa Lesão corporal culposa: é a ofensa a integridade física de outrem por negligência, imprudência ou imperícia. §6º: no caso da lesão corporal culposa, a pena será de detenção, de 2 meses a 1 ano (IMPO). A intensidade da lesão é irrelevante para efeito de tipificação, podendo ter consequências na dosimetria da pena. IX. Lesão corporal culposa majorada A lesão corporal culposa será majorada de 1/3, quando: • O crime resultar de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício • O agente deixar de prestar imediato socorro à vítima • O agente não procura diminuir as consequências do seu ato • O agente fugir para evitar prisão em flagrante X. Perdão judicial Admite-se o perdão judicial no caso de lesão corporal culposa, nas mesmas circunstâncias em que se admite perdão judicial no crime de homicídio culposo. STJ ➔ para aplicar o perdão judicial, é preciso que estejamos diante de uma das seguintes situações: 30 • Vítima tenha relação de parentesco com o agente do crime • Vítima tenha relação de afeto com o agente do crime • Agente do crime tenha sofrido sequelas físicas XI. Violência doméstica e familiar § 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (A lesão corporal leve no âmbitodoméstico e familiar é qualificada) *Art. 129, §9º, do CP não trata apenas da lesão contra a mulher. Atenção • Sendo a lesão corporal de natureza grave ou gravíssima e cometido o crime contra uma das pessoas do §9º (vulneráveis), a pena será aumentada de 1/3 (§10 do art. 129). • Se a lesão corporal de natureza leve é cometida dentro do ambiente doméstico, ela será qualificada. Mas se estivermos diante de lesão de natureza grave ou gravíssima no ambiente doméstico, temos uma causa de aumento de pena. XI. Violência doméstica e familiar contra pessoa portadora de deficiência Se a lesão decorrente de violência doméstica e familiar se der em face de pessoa portadora de deficiência, a pena será aumentada de 1/3 (§11). XII. Lesão corporal contra autoridade ou agente de segurança pública §12º: se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até 3º grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de 1/3 a 2/3. Esse aumento incide em qualquer uma das lesões corporais dolosas (leve, grave, gravíssima ou seguida de morte), não incidindo na lesão corporal culposa. 31 Atenção: Lei 8.072/90 traz as modalidades de lesão corporal gravíssima e a seguida de morte, desde que cometidas contra essas autoridades de segurança pública. Portanto, são crimes hediondos: • Lesão corporal gravíssima funcional • Lesão corporal seguida de morte funcional XIII. Ação penal Ação penal pública incondicionada. Caso seja lesão corporal de natureza leve ou culposa, a ação será pública condicionada à representação da vítima. Em se tratando de violência doméstica e familiar contra homem, seguirá a regra da ação penal pública condicionada à representação. Caso a lesão corporal seja cometida por violência doméstica e familiar contra a mulher, e sendo de natureza leve ou culposa, a ação penal será pública incondicionada STF: não se aplica os ditames da Lei 9.099/95 a esses casos. Súmula 542 do STJ: a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. 3. Periclitação da vida e da saúde Aqui são tratados os crimes de perigo. Os crimes de perigo podem ser subdivididos em: • Crime de perigo concreto: é indispensável que se comprove a situação de perigo. • Crime de perigo abstrato: é desnecessário que se comprove a situação de perigo. I. Perigo de contágio venéreo 32 • Art. 130 - Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado: • Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa (IMPO). • § 1º - Se é intenção do agente transmitir a moléstia: • Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa (cabe sursis processual). • § 2º - Somente se procede mediante representação. • Se o indivíduo sabe ➔ dolo direto. • Se o indivíduo deve saber ➔ dolo eventual. • Bem jurídico: a incolumidade física e da saúde da vítima. a) Sujeitos do crime Sujeito ativo: qualquer pessoa contaminada por moléstia venérea. Sujeito passivo: qualquer pessoa que não tenha essa moléstia venérea. Se a mulher sabe que o parceiro tem a moléstia venérea e consente que o agente pratique o ato sem o uso de preservativo, haverá crime da mesma forma: bem indisponível. Atenção: AIDS não é considerada moléstia venérea, podendo configurar tentativa de lesão corporal de natureza gravíssima, por se tratar de uma enfermidade incurável. Exemplo de moléstia venérea seria a sífilis. b) Voluntariedade • Conduta dolosa. Dolo de perigo. Esse dolo poderá ser direto ou eventual. • Se o agente se relaciona com a intenção de transmitir a doença, o dolo não é mais de perigo, e sim dolo de dano, havendo o crime qualificado do §1º. • O agente somente responderá pelo crime se não alcançar o intento danoso que tinha. Caso tenha alcançado, haverá outro crime, que é o de lesão corporal (aplica-se o princípio da consunção). 33 c) Consumação e tentativa Trata-se crime de perigo abstrato. Basta que se comprove a prática do ato sexual, ainda que a vítima não tenha sido contaminada. Cuida-se de crime formal. • Há uma presunção de perigo, mas se ficar demonstrado que, por meio do ato sexual, a vítima não foi posta em perigo em momento algum, pois era impossível o seu contágio, não haverá o crime. Ex.: o agente usou preservativo. Neste caso, o sujeito não agiu com dolo direto e nem com dolo eventual. Atenção • Haverá crime impossível se a vítima já estava contaminada. Se a vítima já possui a moléstia, o contágio é impossível. Como é tratada a situação em que se pratica o ato de libidinagem e há o contágio da vítima? Supondo que o dolo fosse de perigo (art. 130), situação na qual o contágio efetivamente aconteceu. Doutrina majoritária: o contágio é o mero exaurimento do tipo penal, considerado no momento da dosimetria. Admite-se a tentativa? 1ªC: é impossível, pois somente é possível expor ou não a vítima a risco. 2ªC (Sanches): é possível, visto se tratar de crime plurissubsistente (admite o fracionamento da conduta), podendo ser interrompida a execução, impedindo-se que o perigo ocorra por circunstâncias alheias à vontade do agente. Ex.: ato sexual frustrado por conta da chegada do ex-namorado da vítima. d) Ação penal: é pública condicionada à representação II. Perigo de contágio de moléstia grave 34 Aqui já não se fala mais em moléstia venérea. • Art. 131 - Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: • Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. ➢ Cabível a suspensão condicional do processo. ➢ O tipo exige o especial fim de agir (elemento subjetivo do tipo). • Observe: não é necessário que o ato se dê por meio sexual, podendo ser qualquer ato capaz de produzir o contágio. • Bem jurídico: incolumidade física e da saúde. a) Sujeitos do crime • Sujeito ativo: qualquer pessoa. • Sujeito passivo: qualquer pessoa que não tenha essa moléstia grave. Do contrário, haveria crime impossível. Ex. de moléstia grave: febre amarela, tuberculose, poliomielite... b) Voluntariedade Crime punido a título de dolo. Mas perceba: há um dolo de dano. O sujeito quer transmitir a doença, agindo com o especial fim de agir. Há um crime de perigo com dolo de dano. Este é o elemento subjetivo, o especial fim de agir. Não se admite o dolo eventual, por conta da exigência do dolo específico. c) Consumação e tentativa • Consumação: dá-se com a prática do ato perigoso, ainda que não ocorra a transmissão da moléstia grave. Crime formal. • A tentativa é possível, se houver conduta plurissubsistente. • Os crimes de tendência interna transcendente são crimes formais. 35 • Se o contágio ocorrer e resultar em lesão corporal leve, esta ficará absorvida pelo crime de perigo de contágio de moléstia grave. Se resultar em lesão corporal grave ou em morte, o sujeito responderá por lesão corporal de natureza grave ou pelo homicídio preterdoloso (princípio da consunção). d) Ação penal É pública incondicionada. III. Perigo para a vida ou saúde de outrem Crime de perigo. • Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: • Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. (IMPO e subsidiariedade expressa) Parágrafo único. A pena é aumentada de um1/6 a 1/3 se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. A ideia é proteger os “boias frias”. Objeto jurídico: é incolumidade da vida e da saúde das pessoas. a) Sujeitos do crime Qualquer pessoa. Crime comum. O ofendido deve ser uma pessoa determinada. Se a infração coloca em risco um número indeterminado de pessoas, o sujeito ativo responde por crime de perigo comum (art. 250 e seguintes do CP). b) Voluntariedade Crime doloso (dolo direto ou eventual). Dolo de perigo. c) Consumação e tentativa Consumação: dá-se quando há o efetivo risco, ou seja, quando a pessoa é exposta a situação de risco a sua saúde ou a sua vida. 36 Se da conduta perigosa sobrevier dano à pessoa, deverá ser verificado se o dano é mais grave ou mais leve do que o crime em apreço. Sendo mais leve, o sujeito responde pelo crime de perigo. Sendo mais grave, o indivíduo responde pelo crime mais gravoso. A tentativa é admissível quando o crime for subsistente. d) Ação penal A ação penal é pública incondicionada. IV. Abandono de incapaz • Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: • Pena - detenção, de seis meses a três anos (cabe sursis processual). *O sujeito passivo pode ser um menor, um ébrio, um doente etc. Hipóteses preterdolosas: • § 1º - Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave: • Pena - reclusão, de um a cinco anos. (cabe sursis processual) • § 2º - Se resulta a morte: • Pena - reclusão, de quatro a doze anos. • § 3º - As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço: • I - se o abandono ocorre em lugar ermo; • II - se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima. • III – se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos Observe: não está escrito companheiro, motivo pelo qual não será considerado, sob pena de analogia in malam partem. a) Sujeitos do crime 37 • Sujeito ativo: somente pode ser quem tenha a autoridade sobre o incapaz ou que o tenha sob seus cuidados ou vigilância. Trata-se de crime próprio. • Sujeito passivo: somente pode ser quem está sob a vigilância ou autoridade do sujeito ativo. Também é próprio. b) Voluntariedade O crime exige um dolo de perigo: dolo de abandonar, colocando o incapaz em uma situação de risco. O dolo de dano altera a natureza da infração penal; Se o sujeito abandona a criança para que ela morra, o dolo será de matar (homicídio). Não se admite o crime na forma culposa. c) Consumação e tentativa Consumação: dá-se no momento do abandono, colocando a vítima em uma situação de risco concreto. É necessária a demonstração de que a vítima foi submetida a situação de perigo. • Caso tenha sido praticado mediante ação, admite-se a tentativa. • Mas caso praticado por meio de omissão, não se admite a tentativa. d) Ação penal A ação penal será pública incondicionada. V. Exposição ou abandono de recém-nascido • Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria (especial fim de agir): • Pena - detenção, de seis meses a dois anos (IMPO). • § 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: • Pena - detenção, de um a três anos (cabe sursis proc.). • § 2º - Se resulta a morte: • Pena - detenção, de dois a seis anos. 38 *A ideia é desmotivar o aborto, pois a pena do crime é muito + leve. • Em qualquer um desses casos (§§ 1º e 2º), o crime será preterdoloso, causando o resultado culposamente. • Bem jurídico: a incolumidade física e a saúde do recém-nascido. a) Sujeitos do crime • Cezar Roberto Bitencourt: somente a mãe pode ser o sujeito ativo do crime. • Doutrina majoritária: tanto a mãe quanto o pai podem ser sujeito ativo do crime, pois ambos poderão abandonar o recém-nascido para ocultar desonra própria. Ex.: sujeito casado que abandona o recém-nascido para que não se descubra a gravidez gerada pela gravidez da amante. b) Conduta Expor ou abandonar o recém-nascido, colocando em risco concreto para ocultar uma desonra própria. É indispensável que haja honra a se preservar. Se não há, não se pode invocar o art. 134 do CP. Por isso, doutrina dirá que a prostituta não poderia praticar este crime. c) Voluntariedade Crime doloso. Exige-se o elemento subjetivo do tipo: o fim de ocultar desonra própria. Se o marido da mulher que o traiu abandona o recém-nascido adulterino (filho resultante do adultério), ele não pratica o crime do art. 134, pois ele não age para ocultar desonra própria, mas age para ocultar desonra alheia. Ou seja, o indivíduo estaria cometendo o crime do art. 133, que é mais grave do que esse. VI. Omissão de socorro • Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: • Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa (IMPO). 39 • Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte (AINDA ASSIM IMPO). Trata-se de dever imposto a todos, e não dever jurídico específico. a) Sujeitos do crime Sujeito ativo: qualquer pessoa. Crime comum. • Esse dever de assistência recai sobre todas as pessoas. Por isso a doutrina vai dizer que esse crime não admite coautoria. • Diante de situação em que várias pessoas podem ajudar alguém, mas omitem socorro, cada uma pratica um crime de omissão de socorro. Porém, se apenas uma delas ajudar a vítima, nenhuma das outras cometerá o crime, pois desaparece a obrigação. Sujeito passivo: • Criança (pessoa com menos de 12 anos) abandonada ou extraviada • Inválido ou ferido desamparado • O que se achar em grave e iminente perigo b) Conduta A conduta pode ocorrer de duas formas: • Deixar de atender determinada norma, sendo um crime omissivo • Deixar de solicitar socorro à autoridade pública, sendo um caso de assistência mediata Se o crime é omissivo próprio, não admitirá tentativa. c) Voluntariedade A omissão deve ser dolosa. Não se admite a conduta culposa. d) Consumação Dá-se no momento da omissão. Crime omissivo próprio. e) Majorante de pena 40 O crime tem a sua pena aumentada de: • Metade: resultar lesão corporal de natureza grave. • Triplicada: resultar em morte. Se a morte do periclitante for inevitável, responderá o agente pela omissão do comportamento devido, apesar de este não ter a capacidade de evitar o resultado danoso? Não responderá. Exige-se para a incidência da qualificadora que se prove, no caso concreto, que a conduta omitida seria capaz de impedir o resultado mais gravoso. Ex.: se a morte da vítima se deu por lesões no cérebro, cuja assistência prestada jamais impediria a superveniência do evento letal, não há como atribuir esse resultado ao agente. VII. Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial Objetivo: impedir condutas abusivas em hospitais particulares. • Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial: • Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. • § único. Apena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte. a) Sujeitos do crime Somente podem ser sujeito ativo do crime: administradores de hospitais particulares, funcionários de hospitais particulares... *hospital público não pode exigir garantia. • G. Nucci: há duplo requisito cumulativo no tipo, devendo haver prestação de garantia e o preenchimento de formulário. 41 • Entendimento prevalente: tanto a exigência de um como a exigência do outro tipifica o crime. Situação emergencial. • A situação de urgência é uma situação de menor imediatidade do que a emergência. • Há o entendimento de que a situação de urgência está abrangida pelo tipo penal. b) Voluntariedade Crime doloso. Elemento subjetivo do tipo: exige-se a garantia ou o preenchimento de formulário como condição para viabilizar o atendimento médico emergencial. c) Consumação e tentativa • Consuma-se com a exigência indevida, condicionando o atendimento emergencial à prestação de uma garantia ou à prestação de um formulário. • É crime de perigo concreto, devendo provar a situação de perigo e que ela não foi atendida. • A tentativa é possível, desde que, antes que se exija a garantia ou o preenchimento de formulário, alguém atenda ao paciente sem impor esta condição. d) Ação penal A ação penal é pública incondicionada. VIII. Maus-tratos • Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina: • Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa (IMPO). 42 Portanto, há 3 condutas possíveis para o crime de maus-tratos, quando o sujeito expõe a perigo de vida ou a saúde de pessoa sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia: • Privando de alimentação ou cuidados indispensáveis • Sujeitando a trabalho excessivo ou inadequado • Abusando de meios de correção ou disciplina • § 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: • Pena - reclusão, de um a quatro anos (cabe sursis processual) • § 2º - Se resulta a morte: • Pena - reclusão, de quatro a doze anos. • § 3º - Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos. a) Sujeitos do crime • Sujeito ativo: pessoa que tenha autoridade, vigilância ou guarda em relação à vítima da infração penal (crime próprio). Discussão: companheiro de quem tem essa relação de ascendência pode praticar o crime em face do descendente? Ex.: companheiro da mãe da vítima pratica esse crime em face do seu enteado? • 1ªC: é possível, desde que comprove que a vítima estava sob a sua autoridade, vigilância ou guarda. • 2ªC: não é possível, pois o agente não tem o poder correicional sobre o enteado. Pela legalidade estrita, não é possível. b) Voluntariedade O crime é de ação múltipla, ou de conteúdo variado, podendo ser cometido pela privação de alimentos, sujeição a trabalhos excessivos, abuso dos meios de correção. 43 No caso do abuso do meio corretivo ou disciplinar, o meio empregado para expor a perigo, a vida ou a saúde do corrigido ou do disciplinado deve ser idôneo. Se não se verificar que houve a exposição a perigo da vida ou da saúde da vítima punida gravosamente, ainda que seja vexatória a punição, não há que se falar em crime de maus- tratos. Ex.: mãe que raspa os cabelos da filha não comete o crime de maus-tratos, pois não houve perigo à vida da filha neste caso. c) Consumação e tentativa Atenção: a conduta de maus-tratos não se confunde com o crime de tortura, previsto no art. 1º, II, Lei 9.455/95. • No caso da tortura: a vítima é submetida a intenso sofrimento físico ou mental. A intenção do agente é causar intenso sofrimento físico ou mental na vítima. • No crime de maus-tratos: basta a exposição à situação de perigo à saúde ou à vida da pessoa. A intenção do agente pode ser a disciplina, mas a exerce abusando desse poder regular do direito. A consumação se dá no momento em que o agente cria o perigo real, visto que há perigo concreto: deve ser demonstrada a situação de perigo para que fique tipificado o delito. Aula 03. Dos crimes contra a pessoa: Da rixa. Dos crimes contra a honra. Crimes contra a liberdade individual (crimes contra a liberdade pessoal). 4. Rixa Rixa: briga entre mais de duas pessoas, em que cada um age por sua conta, não havendo grupos determinados. • Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores: • Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa (IMPO) 44 • Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos (rixa qualificada - IMPO). Bem jurídico tutelado: incolumidade física ou mental da pessoa humana. I. Sujeitos do crime • Crime é comum. • O agente, no crime de rixa, será sujeito ativo e simultaneamente sujeito passivo. • O crime é de concurso necessário: exige ao menos 3 pessoas brigando entre si.. Computa-se o inimputável. • A participação da rixa pode ser material ou moral, como no caso do indivíduo que incentiva os demais a brigarem. II. Voluntariedade Conduta dolosa ➔ dolo de perigo: vontade consciente de tomar parte na briga. III. Consumação e tentativa Consuma-se no momento em que tem início o conflito, sendo um crime de perigo presumido. Trata-se de crime unissubsistente, logo prevalece que o crime de rixa não admite tentativa. Há legítima defesa na rixa? Via de regra: não se admite legítima defesa em caso de rixa. Fundamento: no caso da rixa, todos estão agredindo injustamente. Logo, não há falar em legítima defesa. Exceção: quando a rixa tiver um padrão, mas um dos rixosos não o observar. Ex.: a briga é de socos e chutes, mas um dos indivíduos pega uma arma de fogo. Logo após, sofre uma pedrada de um dos indivíduos, havendo legítima defesa. IV. Qualificadora Ocorrendo lesão grave ou morte, a pena da rixa passará a ser de detenção de 6 meses a 2 anos. 45 Existem alguns sistemas que vão justificar a punição dos rixosos no tocante às outras infrações: • Sistema da solidariedade absoluta: todos os participantes da rixa vão responder também pelo outro crime mais grave, lesão corporal grave ou homicídio. • Sistema da cumplicidade correspectiva: havendo morte ou lesão grave, e não sendo possível apurar quem foi o autor da morte ou da lesão, todos responderão pelo crime. No entanto, a pena será a média da sanção do autor e do partícipe. Há uma pena atenuada para aqueles que participaram da rixa, mas não causaram o resultado agravador. • Sistema da autonomia: a rixa é punida por si só, independentemente do resultado agravador. ➢ Caso tenha ocorrido, haverá qualificação do crime de rixa. ➢ Pelo resultado agravador, só responderá aquele que o praticou. Ex.: João, José, Carlos e Antonio participaram de uma rixa. Antonio morreu. Os outros 3 respondem por rixa qualificada. Mas se João foi quem matou, apenas ele responderá por rixa qualificada e pelo homicídio. Este é o sistema adotado. *Se houver vários homicídios, a rixa qualificada será uma só, sendo os demais homicídios delitos autônomos. • Caso o agente tenha participado da rixa, mas tenha deixado o local antes da ocorrência do resultado morte, ele responderá pela rixa qualificada.Fundamento: a participação do indivíduo deu condições para que o evento morte ou lesão corporal grave viesse a ocorrer. • Por outro lado, se João entrar na rixa após a morte de José, João não responderá pela rixa qualificada, eis que não contribuiu para que o desfecho morte ocorresse. V. Ação penal: é pública incondicionada. Crimes contra a honra I. Introdução A honra se subdivide em: 46 • Honra objetiva: reputação do sujeito, boa fama. É como o indivíduo é visto pela sociedade. Calúnia e difamação atinge a honra objetiva. • Honra subjetiva: é como o sujeito se vê. É a autoestima. É o juízo de valor que o indivíduo faz de si mesmo. A injúria atinge a honra subjetiva. • Os crimes contra a honra são, na verdade, crimes de dano, e não de perigo. • Todavia, dispensa-se o resultado naturalístico: basta que a ofensa seja irrogada e alcance a vítima para que se considere consumado o crime. É dispensável que a honra seja abalada ou afetada. I. Calúnia • Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: • Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa (IMPO). • § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. • § 2º - É punível a calúnia contra os mortos (sujeito passivo: a família do morto). Exceção da verdade • § 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: • I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; Fundamento: APPrivada objetiva proteger a vítima, não expô-la contra sua vontade. • II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141; *Presidente da República ou Chefe de Governo Estrangeiro. • III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. Fundamento: ação pública ➔ o Estado tem total interesse em saber se aconteceu o fato. a) Sujeitos do crime Crime comum. 47 Não podem ser autores do crime de calúnia, por conta da inviolabilidade funcional: • Senador • Deputado federal • Deputado estadual • Vereador, nos limites da circunscrição municipal Advogados somente têm a inviolabilidade no tocante à difamação e à injúria, quando realizá- la no exercício profissional. No caso do crime de calúnia, os advogados não possuem a inviolabilidade. STF (Inf. 831, 2016) A imunidade parlamentar material protege os Deputados Federais e Senadores, qualquer que seja o âmbito espacial (local) em que exerçam a liberdade de opinião. No entanto, para isso, é necessário que as suas declarações tenham conexão com o desempenho da função legislativa ou tenham sido proferidas em razão dela. Sujeito passivo: pessoa física ou jurídica. O menor poderá ser vítima da calúnia, ainda que não cometa crime, porque o que é tipificado na calúnia é a conduta de imputar a alguém fato definido como crime. Dessa forma, o menor, a pessoa jurídica ou inimputável poderá ser vítima de calúnia. • No caso da calúnia contra os mortos, o sujeito passivo é a família. • Se alguém imputar falsamente contra alguém fato definido como contravenção penal, não haverá calúnia, mas sim difamação. • Havendo o consentimento da vítima, o delito ficará excluído, eis que a honra é bem disponível, até porque o crime é de ação penal privada. b) Voluntariedade Dolo de dano: vontade de ofender e macular a honra objetiva. 48 Admite-se que o dolo seja dolo direto ou eventual. Mas no tocante ao §1º, o dolo deverá ser direto. c) Consumação e tentativa • No momento em que uma terceira pessoa toma conhecimento do fato imputado à vítima. • Delito formal: não é necessário que a honra da pessoa seja atingida. • Admite-se a tentativa quando se der por meio escrito. d) Exceção da verdade É um incidente processual. Forma de defesa indireta, pois permite ao ofensor provar a verdade da sua imputação. Não poderá levantar a exceção da verdade quando: • Se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível • Se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141 • Se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível • Art. 85 do CPP: se o excepto tiver foro por prerrogativa de função, ela será processada perante o Tribunal competente. Ex.: excepto Senador ➔ exceção da verdade processada no STF. e) Exceção da notoriedade Art. 566 do CPP levanta essa possibilidade. Trata-se de oportunidade em que se confere ao réu a possibilidade de provar que o fato é de domínio público, ou seja, que todos sabem do fato. Admite-se na calúnia e na difamação. Se o fato já é de domínio público, não há um atentado à honra objetiva. f) Princípio da especialidade 49 • Se houver calúnia contra o Presidente da República, Presidente do Senado, Presidente da Câmara ou Presidente do STF, e a motivação do crime ser política, haverá o crime contra a segurança nacional (art. 26 da Lei 7.170/83). • Sendo cometido na propaganda eleitoral ou visando fins eleitorais, haverá crime eleitoral do art. 324, sendo de ação penal pública incondicionada. III. Difamação • Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: • Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa (IMPO). Exceção da verdade • Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. a) Consumação e tentativa Quando terceira pessoa toma conhecimento do fato falso. A tentativa é possível se for escrita a difamação. b) Exceção da verdade • Regra: não cabe. • Exceção: se o ofendido for funcionário público e a difamação se der no uso de suas funções. Ou seja, admite-se que se prove que o fato imputado ao sujeito é verdadeiro. Prevalece o entendimento de que, se o fato for verdadeiro, há a exclusão da ilicitude e não da tipicidade. • Fundamento: o art. 139 não se exige que o fato seja falso. Basta que se impute fato ofensivo à reputação da vítima. A necessidade de que o fato seja falso só se exige quando a ofensa seja proferida contra funcionário público e a tenha ocorrido por conta do exercício de suas funções. Sendo o fato verdadeiro, não haverá uma difamação por uma excludente de ilicitude, já que a falsidade da afirmação não é elementar do tipo. 50 Exposição de Motivos, item 49: a disposição não alcança o Presidente da República e o Chefe de Governo Estrangeiro. c) Exceção de notoriedade É admitida. d) Princípio da especialidade Se houver difamação contra o Presidente da República, Presidente do Senado, Presidente da Câmara ou Presidente do STF, e a motivação do crime ser política, haverá o crime contra a segurança nacional (Lei 7.170/83). IV. Injúria Atinge a honra subjetiva da vítima. • Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: • Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. • § 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: • I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; • II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. • § 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: • Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Ex.: se a injúria consistiu em um tapa na cara. • § 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou
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