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FUNDAMENTOS DE QUÍMICA MEDICINAL Carlos Gustavo Lopes da Silva Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar o mecanismo de ação dos diferentes agentes sanguíneos e hematopoiéticos, bem como reações adversas e indicações clínicas. � Compreender a relação entre estrutura química e atividade farmaco- lógica dos diferentes agentes sanguíneos e hematopoiéticos. � Analisar as principais interações e incompatibilidades medicamentosas de forma química e farmacológica. Introdução As células sanguíneas maduras têm tempo limitado de sobrevida, por isso é necessária a sua contínua reposição por um processo denomi- nado hematopoiese. Essa produção de células novas precisa atender as necessidades basais, bem como as situações de aumento de demanda (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). A produção de eritrócitos pode aumentar, em média, 86 vezes em resposta à anemia ou à hipoxemia, enquanto que a produção de leu- cócitos pode aumentar de 10 a 20 vezes em resposta às infecções sis- têmicas e à produção de plaquetas quando o seu consumo resultar em trombocitopenia. A regulação da produção de células do sangue é bastante complexa, pois envolve as células-tronco hematopoiéticas. Elas são células medulares ósseas raras que têm capacidade de autorrenovação e compromisso quanto à descendência de sua linhagem e geram células destinadas a se diferenciarem em nove linhagens de células sanguíneas distintas. Os locais onde ocorre esse processo de diferenciação são, em grande parte, nas cavidades medulares do crânio, dos corpos vertebrais, da pelve e da parte proximal dos ossos longos. A produção dessas células envolve diversas interações entre as células- -tronco e progenitoras hematopoiéticas e as células e macromoléculas complexas do estroma da medula óssea e sofre influência de diversos fatores de crescimento hematopoiéticos solúveis e ligados à membrana (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Vários desses hormônios e citocinas foram identificados e clonados, o que gerou a produção de quantidades suficientes para uso terapêutico. As aplicações na clínica envolvem o tratamento de doenças hematológicas primárias, o uso como adjuvantes no tratamento de infecções graves e nos cuidados de pacientes submetidos à quimioterapia do câncer ou do transplante de medula óssea. O processo de hematopoiese também necessita de um suprimento equilibrado de minerais (ferro, cobalto, cobre) e de vitaminas (ácido fólico, vitamina B12, piridoxina, ácido ascórbico e riboflavina), pois a deficiência desses minerais e vitaminas resultam em anemias características ou, em alguns casos, em comprometimento e falência geral do processo de hematopoiese. Para que se realize a correção de uma deficiência específica, é neces- sário ter um diagnóstico preciso do estado anêmico, o conhecimento da dose certa, do uso de inúmeras combinações medicamentosas e da resposta esperada (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Sendo assim, podemos dividir os agentes sanguíneos em algumas classes: os que atuam na eritropoiese, os que atuam nos fatores de cres- cimento mieloide e nos trombopoiéticos, além dos fármacos que atuam no tratamento da anemia e dos processos de coagulação. Neste capítulo, você irá estudar o mecanismo de ação, as reações adversas, as indicações clínicas e a relação entre a estrutura química e a atividade farmacológica dos agentes sanguíneos e hematopoiéticos, que atuam no controle, na prevenção e na cura de doenças que afetam o sistema sanguíneo. Também vai analisar as principais interações e in- compatibilidades medicamentosas de forma química e farmacológica. Agentes sanguíneos e hematopoiéticos2 Mecanismo de ação, reações adversas e indicações clínicas Agentes estimulantes da eritropoiese A substância farmacológica que estimula a produção de células vermelhas no sangue é denominada agente estimulante da eritropoiese. A eritropoietina é o regulador mais importante da proliferação de progenitores de eritroides. Quando está ausente, ocorre anemia grave, observada em pacientes com insuficiência renal, pois a eritropoiese é controlada por um sistema de retro- alimentação. Nos rins, existem sensores que têm a capacidade de detectar alterações no suprimento de oxigênio modulando a excreção de eritropoietina (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Na presença de anemia ou de hipoxemia, a síntese aumenta rapidamente, em cem vezes ou mais, eleva os níveis séricos de eritropoietina, ao mesmo tempo em que a sobrevida, a proliferação e a maturação das células progenitoras medulares são estimuladas. Segundo Hilal-Dandan e Brunton (2015), na presença de infecção ou de estado inflamatório, a excreção de eritropoietina, o aporte de ferro e a proli- feração de progenitores são suprimidos pelas citocinas inflamatórias. A eritropoietina humana recombinante (alfapoietina) é quase idêntica ao hormônio endógeno, no entanto, em ensaios modernos, as diferenças podem ser detectadas, pois são muito úteis na identificação de atletas que fazem uso do produto recombinante para dopping sanguíneo (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). A terapia com eritropoietina recombinante, em associação com um aporte adequado de ferro, pode ser muito eficaz no tratamento de diversas anemias, principalmente aquelas associadas à resposta eritropoiética precária, bem como no tratamento de anemias associadas à cirurgia, à Aids, à quimioterapia do câncer, à prematuridade e a distúrbios inflamatórios crônicos. O efeito colateral mais comum na terapia com alfapoietina consiste no agravamento da hipertensão, que ocorre entre 20 e 30% dos pacientes e está mais frequentemente associado a uma rápida elevação do hematócrito. Ainda durante a hemodiálise, os pacientes que recebem alfapoietina podem necessitar de anticoagulação aumentada. 3Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fatores de crescimento mieloides Os fatores de crescimento mieloides são glicoproteínas que estimulam a proliferação e a diferenciação de uma ou mais linhagens celulares mieloides. Esses fatores são produzidos de forma natural por várias células diferentes, incluindo fibroblastos, células endoteliais, macrófagos e células T. Entre as formas recombinantes produzidas por vários fatores de crescimento, há o fator de estimulação de colônias de granulócitos-macrófagos (GM-CSF). A atividade do GM-CSF (sargramostim — fármaco para estimulação mieloide) restringe-se aos neutrófilos e a seus progenitores, estimulando a proliferação, a diferenciação e a função, além disso intensifica as atividades fagocíticas e citotóxicas dos neutrófilos. Outra função do G-CSF é mobilizar as células hematopoiéticas primitivas, incluindo células-tronco hematopoiéticas, da medula óssea para o sangue periférico (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). O sargramostim pode causar como efeito adverso dor óssea, mal-estar, febre, diarreia e exantema. Após um longo tempo de uso do fármaco, há outros efeitos mais graves: � edema periférico; � derrames pleurais; � dispneia; � elevação dos níveis séricos de creatinina, de bilirrubina e de enzimas hepáticas. Há também o filgrastim, fator de estimulação de colônias de granulócitos (G-CSF) humano recombinante, que tem por objetivo aumentar a produção de neutrófilos e é eficaz no tratamento de neutropenia grave após transplante de células-tronco hematopoiéticas autólogas e de quimioterapia em altas doses. Fatores de crescimento trombopoiéticos A interleucina-11 (IL-11) é uma citocina que estimula a hematopoiese, o crescimento das células epiteliais intestinais e a osteoclastogênese, bem como inibe a adipogênese. Também intensifica a maturação dos megacariócitos in vitro. A IL-11 humana recombinante, a oprelvecina, resulta em resposta trombopoiética em 5 a 9 dias quando administrada diariamente a pessoas saudáveis (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Agentes sanguíneos e hematopoiéticos4 Os dois fármacos utilizados e que imitam a trombopoietinarecombinante na sua forma molecular são o romiplostim e o eltrombopag. Com relação aos fatores de crescimento trombopoiéticos, há a oprelvecina que pode provocar retenção hídrica e sintomas cardíacos como taquicardia, palpitação, edema e dispneia. Fármacos para anemias A deficiência de ferro constitui a causa nutricional mais comum de anemia nos humanos e pode ser causada pelo aporte inadequado de ferro, pela má absorção, pela perda de sangue ou pelo aumento das necessidades, como, por exemplo, durante a gravidez. Se a deficiência for grave, resulta em anemia microcítica hipocrômica e pode afetar o metabolismo no músculo. Outras adversidades associadas à deficiência de ferro são problemas de comportamento e de aprendizagem em crianças, anormalidades no metabo- lismo de catecolaminas e comprometimento da produção de calor (HILAL- -DANDAN; BRUNTON, 2015). A resposta da anemia ferropriva à ferroterapia é influenciada por diversos fatores que incluem: � gravidade da anemia; � capacidade do paciente de tolerar e de absorver ferro medicinal; � presença de outras doenças complicantes. O sulfato ferroso administrado por via oral constitui o tratamento de es- colha para a deficiência de ferro, e a dose recomendada é de 150 mg diários, divididos em duas ou três doses. O ácido ascórbico aumenta a absorção do ferro medicinal e, quando a terapia com ferro oral não tem sucesso, se opta pela administração parenteral. Veja no Quadro 1 uma lista das formulações de ferro. 5Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fonte: Adaptado de Whalen, Finkel e Panavelil (2016, p. 424). Formulação com ferro Ferro elementar (%) Observações Gliconato ferroso 12 � Menos ferro elementar, mas tolerabilidade similar a do sulfato ferroso Citrato amônio férrico 18 � Menos biodisponível do que os sais ferrosos � Precisa ser reduzido à forma ferrosa no intestino Sulfato ferroso 20 � Suplemente de ferro por via oral mais comum � Baixo custo com boa eficácia e tolerância Sulfato ferroso anidro 30 � Formulação de liberação prolongada de sulfato ferroso (uma dosagem diária) � Custo mais elevado do que o sulfato ferroso Fumarato ferroso 33 � Eficácia e tolerabilidade similar ao sulfato ferroso � Praticamente insípido comparado com outros sais de ferro Ferro carbonila 100 � Micropartículas de ferro purificadas � Dissolve no estômago formando sal de HCl para ser absorvido � Menos tóxico do que os sais de ferro devido a menor velocidade de absorção (liberação de ferro contínua por 1 a 2 dias) Complexo ferro- -polissacarídeo 100 � Inodoro e insípido � Biodisponibilidade similar a do sulfato ferroso Quadro 1. Características das diversas formulações de ferro Agentes sanguíneos e hematopoiéticos6 Os sais ferrosos administrados em grandes quantidades são tóxicos, prin- cipalmente em crianças. Produzem dor abdominal, diarreia e vômitos do conteúdo gástrico marrom ou sanguinolento; os sintomas mais graves são cianose, sonolência, hiperventilação por causa da acidose e colapso cardio- vascular. Em caso de intoxicação, se utiliza a deferiprona, que é um quelante de ferro oral aprovado para tratar superdose de ferro causada por transfusões de sangue em pacientes com talassemia. A vitamina B12 (cianocobalamina) e o ácido fólico (folato) são componentes indispensáveis na dieta. A deficiência de uma dessas vitaminas compromete a síntese de DNA em qualquer célula na qual ocorram replicação e divisão de cromossomos, por isso, o sistema hematopoiético é particularmente sensível à deficiência dessas vitaminas. Vejamos na Figura 1 a estrutura química da vitamina B12 e seus fármacos análogos. Figura 1. Estrutura química e fármacos análogos da vitamina B12. Fonte: Hilal-Dandan e Brunton (2015, p. 1008). Fármacos para sistema de coagulação Após uma lesão vascular, são ativados a aglutinação das plaquetas (trombócitos) e o sistema de coagulação para, com plaquetas e moléculas de fibrina, formar um “tampão” que fecha a lesão e interrompe o sangramento (homeostasia). 7Agentes sanguíneos e hematopoiéticos A formação desnecessária de coágulo intravascular, uma trombose, pode colocar a vida em risco. Se o coágulo se forma em uma artéria coronária, pode levar ao infarto do miocárdio; se um coágulo se forma na veia profunda das pernas e se desprende, pode ir ao pulmão e causar embolia pulmonar e, ainda, se alcançar o cérebro pode causar um acidente vascular encefálico (AVE) (LÜLLMANN; MOHR; HEIN, 2017). Para a profilaxia das tromboses, são utilizados fármacos que diminuem a coagulabilidade do sangue, bem como inibidores de aglutinação das plaquetas. Entre os fármacos inibidores da coagulação estão: � ácido acetilsalicílico; � clopidogrel (inibidor da aglutinação de plaquetas); � rivaroxabana, dabigatrana, lepirudina e bivalirudina (inibidores diretos da cascata de coagulação); � varfarina (hidroxicumarina — anticoagulante oral); � heparina e seus derivados (uso parenteral). Com relação à varfarina, a principal reação adversa é o sangramento, que aumenta com a intensidade e com a duração da terapia anticoagulante, bem como se for combinada a outras medicações que interferem na hemostasia ou, ainda, na presença de uma fonte anatômica potencial de sangramento (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). A incidência relatada de episódios hemorrágicos geralmente é inferior a 3% por ano em pacientes tratados com índice de normatização internacional (INR)-alvo de 2 a 3. O risco de hemor- ragia intracraniana aumenta de forma acentuada com um INR superior a 4. A varfarina, quando administrada durante a gravidez, provoca defeitos congênitos e aborto, por isso os antagonistas da vitamina K precisam ser evitados nessa condição clínica, e deve-se optar pelo uso da heparina, da heparina de baixo peso molecular (HBPM) ou do fondaparinux com segurança nesse caso (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Com relação aos anticoagulantes de uso parenteral como a heparina e seus derivados, eles devem ser imediatamente interrompidos se for constatada a ocorrência de trombocitopenia sem explicação ou de qualquer uma das manifestações clínicas irregulares, em cinco dias ou mais após o início da heparinoterapia, independentemente da dose. Ainda podem ocorrer anorma- lidades nas provas de função hepática. Agentes sanguíneos e hematopoiéticos8 Relação entre estrutura química e atividade farmacológica Agentes estimulantes da eritropoiese As preparações disponíveis de eritropoietina humana recombinante (alfapoie- tina) são fornecidas em frascos de dose única com 2.000 a 40.000 unidades/mL para administração intravenosa ou subcutânea. Quando injetada por via in- travenosa, a alfapoietina é depurada do plasma com meia-vida de 4 a 8 horas e o efeito nos progenitores medulares tem maior duração. Uma dose seminal pode ser suficiente na busca por uma resposta adequada (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Ainda existe a alfadarbepoietina, que também é uma proteína de estimula- ção da eritropoiese. É uma forma geneticamente modificada da eritropoietina, com mutação de quatro aminoácidos e adição de outras cadeias laterais de carboidrato durante sua síntese, o que aumenta a sobrevida do fármaco na circulação por 24 a 26 horas. Fatores de crescimento mieloides O GM-CSF recombinante humano (sargramostim) é uma glicoproteína de 127 aminoácidos que tem como efeito terapêutico estimular a mielopoiese. A aplicação clínica inicial do sargramostim foi feita em pacientes submetidos a transplante de medula óssea autóloga. Também foi utilizado para encurtar o período de neutropenia e reduzir a morbidade em pacientes submetidos à quimioterapia intensiva para câncer. O sargramostim estimula a mielopoiese em alguns pacientes com neutro- penia cíclica, com mielodisplasia, com anemia aplástica ou com neurotrope- nia associada à Aids. Sua administração é feita por injeção subcutânea ou por infusão intravenosa lenta, em doses de 125 a 500 µg/m2/dia. Os níveis plasmáticos de GM-CSF aumentamrapidamente após injeção subcutânea e declinam com meia-vida de 2 a 3 horas. Quando for administrado por via in- travenosa, as infusões devem ser mantidas em 3 a 6 horas (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). O filgrastim é utilizado rotineiramente em pacientes submetidos à coleta de células-tronco do sangue periférico (CTSP) para transplante de células-tronco. Sua administração é feita por injeção subcutânea ou por infusão intravenosa durante, pelo menos, 30 minutos, em doses de 1 a 20 µg/kg/dia 9Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fatores de crescimento trombopoiéticos O fármaco é administrado na dose de 25 a 50 µg/kg/dia por via subcutânea, com meia-vida de 7 horas. A oprelvecina é utilizada em pacientes submetidos à quimioterapia para neoplasias malignas não mieloides que apresentaram trombocitopenia grave. A trombopoietina é uma glicoproteína produzida pelo fígado, pelas células do estroma medular e por muitos outros órgãos. É o principal regulador da produção plaquetária. Existem duas formas de trombopoietina recombinante para uso clínico: � Fator de crescimento de desenvolvimento dos magacariócitos humanos recom- binantes (rHuMGDF) modificado de forma covalente com polietilenoglicol para aumentar a meia-vida na circulação. � Trombopoietina humana recombinante (rHuTPO). Fármacos para anemias Anemias nutricionais são causadas por deficiências de substâncias como ferro, ácido fólico e vitamina B12, que são necessárias para eritropoiese normal; no entanto, indíviduos com anemias de base genética, como a anemia falciforme, são beneficiados com tratamento farmacológico com hidroxiureia, além da suplementação nutricional. A anemia pode ser corrigida, ao menos por um tempo, pela transfusão sanguínea (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016). A suplementação com ferro elementar corrige a deficiência. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) recomenda uma ingestão de 150 mg/dia de ferro elementar oral, dividido em duas ou três doses diárias para pacientes anêmicos por deficiência de ferro. Agentes sanguíneos e hematopoiéticos10 O resultado primário da deficiência de ácido fólico é a anemia megalo- blástica (eritrócitos de grande tamanho), que é causada pela diminuição da síntese de purinas e de pirimidinas. Esse fenômeno leva à incapacidade do tecido eritropoiético de produzir DNA e de proliferar. As deficiências de vitamina B12 podem resultar em baixa oferta na dieta ou má absorção da vitamina em razão da insuficiência das células parietais gástricas em produzir fator intrínseco (como na anemia perniciosa) ou a perda da atividade do receptor necessário para a captação intestinal da vitamina. A administração dessa vitamina pode ser feita por via oral, intramuscular ou subcutânea profunda, em casos de anemia perniciosa. Entre os fármacos utilizados para o tratamento de anemia falciforme estão: � Hidroxiureia — diminui a frequência e a gravidade das crises dolorosas de anemia falciforme durante o curso da doença e também é usada para o trata- mento da leucemia mieloide crônica e da policitemia vera.e a pentoxifilina. � Pentoxifilina — aumenta deformabilidade dos eritrócitos e diminui a viscosidade do sangue; está disponível em comprimidos de liberação prolongada e é tomada 3 vezes ao dia com alimentos. Veja na Figura 2 a estrutura química do ácido fólico e dos fármacos análogos. Figura 2. Estrutura química do ácido fólico e fármacos análogos. Fonte: Hilal-Dandan e Brunton (2015, p. 1093). 11Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fármacos para sistema de coagulação Os anticoagulantes orais são antagonistas da vitamina K. Os fatores de co- agulação II, VII, IX e X, bem como as proteínas anticoagulantes C e S são sintetizados, em grande parte, no fígado e são biologicamente inativos, a não ser que 9-13 dos resíduos de glutamato aminoterminais sejam carboxilados, levando ao surgimento dos resíduos de gama-carboxiglutâmico (Gla) de ligação de Ca2+ (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). Essa reação da proteína precursora descarboxi exige a presença de CO2, O2 e vitamina K reduzida, e é catalisada pela y-glutamil carboxilase. A car- boxilação está diretamente acoplada à oxidação da vitamina K a seu epóxido correspondente. A vitamina K reduzida deve ser regenerada a partir do epóxido para carboxilação e síntese de proteínas biologicamente competentes. A enzima que cataliza esse processo, a vitamina K epóxido redutase (VKOR), é inibida por doses terapêuticas de varfarina. Na Figura 3, estão apresentados o ciclo da vitamina K e o mecanismo de ação da varfarina. Figura 3. Ciclo da vitamina K e mecanismo de ação da varfarina. Fonte: Hilal-Dandan e Brunton (2015, p. 861). Agentes sanguíneos e hematopoiéticos12 Entre os anticoagulantes de uso há a heparina e seus derivados (HBPMs e fondaparinux) que não têm atividade intrínseca, pois ligam-se à antitrombina e aceleram a taxa na qual ela inibe várias proteases da coagulação. A antitrobina é sintetizada no fígado e circula no plasma em uma concentração próxima de 2,6 µM (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). A heparina, as HBPMs e o fondaparinux agem como catalisadores, pois após se unirem à antitrombina e promoverem a formação de complexos covalentes entre antitrombina e proteases-alvo, eles se dissociam do complexo e então catalisam outras moléculas antitrombinas. A heparina em altas doses pode interferir na agregação plaquetária, prolo- gando o tempo de sangramento. Esse fármaco e seus derivados são indicados no tratamento inicial da trombose venosa e da embolia pulmonar, em razão de seu rápido início de ação. Veja na Figura 4 a estrutura química da heparina e sua ligação com a antitrombina. Ainda existem os agentes fibrinolíticos representados pelo plasminogê- nio, a2-antiplasmina e ativador do plasminogênio tecidual. O objetivo dessa classe de fármacos é aumentar a fibrinólise e, com isso, aumentar o tempo de coagulação do sangue. Os inibidores da fibrinólise são representados pelo ácido aminicaproico e pelo ácido tranexâmico, revertendo estados de fibrinólise excessiva; porém, têm como principal problema que os trombos formados durante o tratamento com o fármaco não sofrem lise. Existem também os fármacos antiplaquetários representados pelo ácido acetilsalicílico, pelo dipiridamol, pela ticlodipina, pelos clopidogrel e pelo prasugrel. Interações e incompatibilidades medicamentosas O Quadro 2 apresenta um resumo dos fármacos utilizados no tratamento da anemia e suas interações e incompatibilidades medicamentosas, bem como as variáveis de monitoramento em cada situação. Com relação aos fármacos para o sistema de coagulação, qualquer subs- tância ou condição é potencialmente perigosa quando altera a captação ou o metabolismo do anticoagulante oral ou da vitamina K, bem como quando interfere na síntese, na função ou na depuração de qualquer fator ou célula envolvidos na hemostasia ou na fibrinólise (HILAL-DANDAN; BRUNTON, 2015). 13Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fi gu ra 4 . E st ru tu ra p en ta ss ac ar íd ic a de li ga çã o da h ep ar in a à an tit ro m bi na . O s gr up os s ul fa to s ne ce ss ár io s pa ra a li ga çã o à an tit ro m bi na e st ão in di ca do s em v er m el ho . Fo nt e: H ila l-D an da n e Br un to n (2 01 5, p . 8 55 ). Agentes sanguíneos e hematopoiéticos14 Medicação Efeitos adversos Interações farmacológicas Variáveis de monito- ramento Tratamento da anemia � Cianoco- balamina/ B12 � Dor no local da injeção � Artralgia � Tonturas � Cefaleia � Nasofaringite � Anafilaxia � Inibidores da bomba de prótons – po- dem diminuir absorção � Vitamina B12 � Folato � Ferro � Eritropoietina/ α--epoetina � Edema � Prurido � Náusea/ êmese � Hipertensão � AVE � Trombose � α-Darbepoetina – duplicação do tratamento pode levar ao aumento dos efeitos adversos � Hemo- globina e hematócrito � Ferritina sérica � Pressão arterial� α-Darbepoetina � Edema � Dispneia � Hipertensão � AVE � Trombose � α-Epoetina – duplicação do tratamento pode levar a aumentar os efeitos adversos � Hemo- globina e hematócrito � Ferritina sérica � Pressão arterial � Ácido fólico � Gosto ruim da boca � Náusea � Confusão � Irritabilidade � Colestiramina – pode interferir na absorção � Hemograma completo � Folato sérico � Ferro � Prurido � Náusea, êmese, diarreia � Cefaleia � Anafilaxia � Deferroxamina – quela o ferro � Dimercaprol – quela o ferro � Hemograma, hematócrito � Ferro sérico � Capacidade de ligação do ferro total (CLFT) � Transferrina � Contagem de reticulócitos Quadro 2. Fármacos para o tratamento de anemia e interações medicamentosas (Continua) 15Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Fonte: Adaptado de Whalen, Finkel e Panavelil (2016, p. 428). Quadro 2. Fármacos para o tratamento de anemia e interações medicamentosas Medicação Efeitos adversos Interações farmacológicas Variáveis de monito- ramento Tratamento da anemia falciforme � Hidroxiureia � Mielossu- pressão � Úlceras de pele � Leucemia secundária � Medicação HIV – hidroxiureia pode diminuir a contagem CD4 � Salicilatos – aumentam o risco de sangramento � Probenecida – aumenta ácido úrico � Hemograma completo � Pentoxifilina � Náusea, êmese � Trombocito- penia � Icterícia � Anafilaxia � Cetorolaco (contrain- dicado) – aumenta o risco de sangramento � Ginkgo biloba – aumenta o efeito antiplaquetário � Hemograma completo (Continuação) Existem alguns fatores, interações e incompatibilidades que provocam redução no efeito dos anticoagulantes orais que são: � Redução da absorção do fármaco em consequência da ligação à colestiramina no trato gastrintestinal. � Aumento do volume de distribuição e meia-vida curta em consequência de hipo- proteinemia, como na síndrome nefrótica. Agentes sanguíneos e hematopoiéticos16 Todas essas interações, com frequência, aumentam o risco de hemorragia em pacientes que utilizam anticoagulantes orais. HILAL-DANDAN, R.; BRUNTON, L. L. Manual de farmacologia e terapêutica de Goodman & Gilman. 2. ed. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2016. 1216 p. LÜLLMANN, H.; MOHR, K.; HEIN, L. Farmacologia: texto e atlas. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018. 416 p. WHALEN, K.; FINKEL, R.; PANAVELIL, T. A. Farmacologia ilustrada. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. 680 p. Leituras recomendadas BARREIRO, E. J.; FRAGA, C. A. M. Química medicinal: as bases moleculares da ação dos fármacos. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. 608 p. KATZUNG, B. G.; TREVOR, A. J. Farmacologia básica e clínica. 13. ed. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2017. 1216 p. (Série Lange). TOY, E. C. et al. Casos clínicos em farmacologia. 3. ed. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2016. 468 p. (Série Lange). � Aumento da depuração metabólica do fármaco em decorrência da indução de enzimas hepáticas, particularmente a CYP2C9, por barbitúricos, carbamazepina ou rifampicina. � Ingestão de grandes quantidades de alimentos ou suplementos ricos em vitamina K. � Aumento dos níveis dos fatores da coagulação durante a gravidez. 17Agentes sanguíneos e hematopoiéticos Conteúdo:
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