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Conhecendo o essencial Vinhos

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Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Embrapa Uva e Vinho
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Documentos nº 48
Conhecendo o essencial
sobre uvas e vinhos
Celito Crivellaro Guerra
Francisco Mandelli
Jorge Tonietto
Mauro Celso Zanus
Umberto Almeida Camargo
Bento Gonçalves, RS
2009
ISSN 1516-8107
Junho, 2009
Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na:
Embrapa Uva e Vinho
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Comitê de Publicações da Unidade
Presidente: Gilmar Barcelos Kuhn
Secretária-Executiva: Nêmora Gazzola Turchet
Membros: Gildo Almeida da Silva e Francisco Mandelli
Normalização bibliográfica: Kátia Midori Hiwatashi
Tratamento de ilustrações: Acervo da Embrapa Uva e Vinho
Elaboração da capa: Ana Paula Bombardelli
1ª edição
1ª impressão 2005: 3.000 exemplares
2ª impressão 2009: 1.000 exemplares
Todos os direitos reservados.
A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte,
constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610).
CIP. Brasil. Catalogação-na-publicação
Embrapa Uva e Vinho
________________________________________________________________________
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos / Celito Crivellaro Guerra...
[et al.]. – Bento Gonçalves : Embrapa Uva e Vinho, 2009.
69 p. : il. ; 10 cm. -- (Documentos / Embrapa Uva e Vinho, ISSN
1516-8107 ; 48).
1. Viticultura. 2. Uva. 3. Variedade. 4. Enologia. 5. Vinho. 6.
Classificação. 7. Análise Sensorial. 8. Espumante. I. Guerra, Celito
Crivellaro. II. Mandelli, Francisco. III. Tonietto, Jorge. IV. Zanus, Mauro
Celso. V. Camargo, Umberto Almeida. VI. Série.
 CDD 663.2 (21. ed.)
_______________________________________________________________________
  Embrapa 2009
Autores
Celito Crivellaro Guerra
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e
Vinho. E-mail: celito@cnpuv.embrapa.br
Francisco Mandelli
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e
Vinho. E-mail: mandelli@cnpuv.embrapa.br
Jorge Tonietto
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e
Vinho. E-mail: tonietto@cnpuv.embrapa.br
Mauro Celso Zanus
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e
Vinho. E-mail: zanus@cnpuv.embrapa.br
Umberto Almeida Camargo
Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e
Vinho. E-mail: umberto@cnpuv.embrapa.br
Apresentação
A vitivinicultura brasileira tem apresentado crescimento significativo nos
últimos anos, decorrente da vigorosa expansão na área cultivada e na
tecnologia de produção de uvas e de elaboração de vinhos. Merece
destaque a difusão da produção de uvas e vinhos, além de outros
derivados, para regiões emergentes em diversas regiões do Brasil, desde
a Metade Sul do Rio Grande do Sul até a região Nordeste, passando por
pólos de importância crescente nos Estados de Minas Gerais, São Paulo,
Mato Grosso e Goiás. A variabilidade de climas e solos do Brasil traz
como resultado adicional um enorme potencial de obtenção de produtos
com características diferenciadas, aptas a agradarem os diferentes
paladares dos consumidores. Trata-se de uma evolução resultante do
esforço conjunto de produtores, vinificadores, empresários,
extensionistas, técnicos, pesquisadores, entre outros, que certamente
contribuíram em grande medida para que a vitivinicultura nacional passe
a ter um reconhecimento crescente quanto à qualidade de seus
produtos.
Soma-se a esse esforço a inserção crescente de conceitos como
zoneamento vitivinícola, indicações geográficas como sinais de
qualidade, segurança dos alimentos, alimentos funcionais,
sustentabilidade ambiental, entre outros, que colocam a atividade em
sintonia com as tendências da vitivinicultura mundial, na qual a
competitividade é cada vez mais essencial para a sustentabilidade
econômica e social. Em adição, esse aprimoramento na atividade
vitivinícola tem trazido resultados altamente promissores, haja vista a
expressiva quantidade de premiações em concursos nacionais e
internacionais.
A tecnologia, fruto da pesquisa e desenvolvimento e missão da
Embrapa, está inserida neste contexto, pois é componente fundamental
para a obtenção de produtos de elevada qualidade. É neste sentido que,
durante seus 30 anos de existência como Embrapa Uva e Vinho, várias
tecnologias de elevado impacto técnico, econômico, social e ambiental,
têm sido disponibilizadas ao setor produtivo.
O objetivo desta publicação é contribuir para ampliar a base de
conhecimento dos vinhos brasileiros, desde as principais regiões e
variedades, as técnicas de elaboração dos principais produtos até os
princípios técnicos da degustação do produto final. É nossa expectativa
que o conhecimento aqui sistematizado se agregue ao esforço do setor
produtivo para que mais consumidores aprendam a apreciar o fruto da
evolução que tem sido característica da vitivinicultura brasileira e que
ainda tem promissoras fronteiras a serem exploradas.
Alexandre Hoffmann
Chefe-Geral da Embrapa Uva e Vinho
Sumário
Regiões de Produção ............................................................... 9
Variedades de Uva .................................................................. 17
Variedades tintas .............................................................. 18
Variedades brancas .......................................................... 25
O Clima e a Safra Vitícola ........................................................ 31
O efeito da época de maturação ......................................... 33
Safra ruim para Chardonnay e ótima para o Cabernet
Sauvignon? ...................................................................... 34
Tipos de Vinho ....................................................................... 39
1. Definição .................................................................. 39
2. Classificação dos vinhos .............................................. 39
3. Classificação de bebidas vínicas ................................... 43
4. Classificação de destilados à base de vinho ................... 44
5. Coquetéis à base de vinho ........................................... 45
Processos de Elaboração .......................................................... 47
1. Elaboração de vinhos tranqüilos .................................... 47
2. Elaboração de vinhos espumantes ................................. 56
Tópicos de Degustação de Vinhos e Espumantes ......................... 59
Vocabulário ..................................................................... 59
A técnica da degustação ................................................... 61
Características dos vinhos de elevada qualidade .................... 62
Descrevendo vinhos varietais .............................................. 62
A degustação dos espumantes ........................................... 65
A temperatura certa para apreciar os vinhos ......................... 66
Referências Bibliográficas ......................................................... 69
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 9
Regiões de Produção
_______________________________
Jorge Tonietto
Nos cinco continentes, o mundo da uva e do vinho concerne mais de
40 países segundo os dados da OIV (Figura 1). Os maiores produtores
de vinho são a França, a Itália, a Espanha, os Estados Unidos e a
Argentina.
A partir da introdução do cultivo da videira no Brasil, ocorrida em 1535,
muitas regiões brasileiras em diferentes Estados chegaram a
experimentar e a desenvolver o cultivo da uva e a produção de vinhos.
Contudo, a vitivinicultura somente ganhou impulso e tornou-se atividadede importância sócio-econômica a partir do final do século XIX, com a
chegada dos imigrantes italianos, sobretudo no Estado do Rio Grande do
Sul. Atualmente o Brasil é o 16º produtor mundial de vinho, com
regiões produtoras situadas nos paralelos clássicos da viticultura
mundial do Hemisfério Sul, como também com vinhedos destinados à
elaboração de vinhos na zona intertropical (Figura 1).
No Brasil, mais de uma dezena de regiões produzem vinhos finos e/ou
vinhos de consumo corrente. Os vinhos finos são aqueles elaborados
exclusivamente a partir de uvas de variedades européias (Vitis
vinifera L.).
Atualmente, a vitivinicultura brasileira de vinhos finos é desenvolvida
como atividade economicamente importante nas regiões geográficas Sul
e Nordeste. Nas regiões sulbrasileiras colhe-se uma safra por ano, como
na clássica viticultura mundial. Já no Nordeste as colheitas se sucedem
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 10
ao longo do ano. As diferentes regiões, com distintas características de
clima, solo, variedades de uvas, sistemas de produção e de vinificação e
envelhecimento possibilitam a produção de vinhos com ampla
diversidade de características de sabor e aroma, peculiares, o que
constitui uma das qualidades da vitivinicultura brasileira atual.
Os quatro Estados brasileiros produtores de vinhos finos e suas
respectivas regiões são:
- Estado do Rio Grande do Sul
O Estado do Rio Grande do Sul, localizado na região Sul do Brasil, é o
maior produtor, com 3 regiões vitivinícolas: a tradicional região
produtora da Serra Gaúcha e as regiões emergentes – Campanha e
Serra do Sudeste (Figura 2).
Na região tradicional da Serra Gaúcha (Figura 2), cujo cultivo de uvas
data do final do século XIX, a principal área de cultivo de uvas para a
elaboração de vinhos finos está localizada sobretudo na margem
esquerda do Rio das Antas, em Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul,
Garibaldi, Farroupilha, Caxias do Sul e municípios vizinhos (Figura 3).
A atividade envolve milhares de produtores.
Uma sub-região da Serra Gaúcha hoje constitui-se na primeira Indicação
Geográfica do Brasil: a Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos,
cuja área delimitada está apresentada na Figura 4. Os vinhos que obtêm
o qualificativo de IP Vale dos Vinhedos, possuem identificação no rótulo
e ostentam o selo de controle numerado. Cabe referir que outras zonas
específicas estão buscando qualificar-se como IP: Monte Belo do Sul,
Pinto Bandeira e o Submédio São Francisco.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 11
Os vinhedos comerciais da região da Campanha tiveram início na
década de 1980. A topografia da região permite o estabelecimento de
módulos de vinhedos extensos que podem ser amplamente
mecanizados. O clima e o solo distintos conferem à região, que
experimenta um período de expansão da área cultivada, um novo
potencial na produção de vinhos finos brasileiros (Figura 2).
A viticultura da região da Serra do Sudeste (Figura 2) teve igualmente
início na década de 1980. Contudo, foi nos últimos anos que diversos
novos empreendimentos vitícolas foram estabelecidos. A paisagem
permite a mecanização nos vinhedos e o clima e o solo são
característicos e distintos dos encontrados na Serra Gaúcha e na
Campanha, configurando uma região de produção emergente.
Cabe registrar também, que uma pequena produção teve início
recentemente na região dos Campos de Cima da Serra no Rio Grande do
Sul.
- Estado de Santa Catarina
O Estado de Santa Catarina também passou a implementar nos últimos
anos um conjunto de vinhedos destinados à produção de vinhos finos na
região de São Joaquim, junto ao Planalto Sul Catarinense (Figura 5).
Com vinhedos de altitude, São Joaquim representa a região mais fria
das regiões produtoras de vinhos do Brasil.
- Estados de Pernambuco e Bahia
No Nordeste do Brasil, junto aos Estados de Pernambuco e da Bahia,
encontra-se a região vitivinícola do Vale do Submédio São Francisco
(Figura 6). Ela está situada em zona de clima tropical semi-árido, entre
09º e 10º de latitude Sul. O clima vitícola da região apresenta
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 12
variabilidade intra-anual, o que possibilita a produção de uvas e de
vinhos ao longo de todos os meses do ano. Esta região é uma das
regiões emergentes que teve início nos anos de 1980 e que hoje
experimenta um período de expansão da produção de vinhos finos, com
uma tipicidade distinta das tradicionais regiões produtoras da viticultura
mundial.
Figura 1. Países vitivinícolas do mundo e sua importância na produção mundial:
paralelos da viticultura clássica de produção de vinhos nos Hemisférios Sul e
Norte e a nova fronteira na zona intertropical, que inclui o Brasil (Elaboração:
Jorge Tonietto).
PAÍSES VITIVINÍCOLAS DO MUNDO
Paralelos da Viticultura Clássica Paralelos da Viticultura Clássica 
- Hemisfério Norte- Hemisfério Norte
Paralelos da Viticultura Clássica Paralelos da Viticultura Clássica 
- Hemisfério Sul- Hemisfério Sul
Maiores produtores
Menores produtores
Paralelos da Paralelos da 
Zona IntertropicalZona Intertropical
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 13
Figura 2. Localização das regiões vitivinícolas produtoras de vinhos finos do Rio
Grande do Sul: Serra Gaúcha, Campanha e Serra do Sudeste (Elaboração: Jorge
Tonietto; Cartografia digital: Naíssa Batista da Luz).
RIO GRANDE DO SUL
CAMPANHACAMPANHA
SERRA DO SUDESTESERRA DO SUDESTE
SERRA GAÚCHASERRA GAÚCHA
Foto: Acervo Miolo
Foto: Jorge Tonietto
Foto: Acervo Embrapa
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 14
Figura 3. Distribuição da área de cultivo de Vitis vinifera destinada à produção
de uvas para a elaboração de vinhos finos na região vitivinícola da Serra
Gaúcha, no Estado do Rio Grande do Sul (Fonte: Tonietto e Falcade, 2003).
Figura 4. Limites geográficos da área de produção delimitada da Indicação de
Procedência Vale dos Vinhedos, composta por parte dos municípios de Bento
Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul, na Serra Gaúcha, Rio Grande do Sul
(Fonte: Falcade et al., 1999).
Área de Cultivo de Uvas para Vinhos Finos na Serra Gaúcha
Escala
0 5 10 Km
N
RS
BENTO
GONÇALVES
SÃO VALENTIM
DO SUL
COTIPORÃ
MONTE BELO
DO SUL
GARIBALDI
NOVA PÁDUA
FLORES
DA CUNHA
CAXIAS DO SUL
FARROUPILHA
SANTA
TEREZA
NOVA ROMA
DO SUL
Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos
Área Delimitada
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 15
Figura 5. Localização da região de São Joaquim, no Planalto Sul Catarinense
(Elaboração: Jorge Tonietto; Cartografia digital: Naíssa Batista da Luz).
Figura 6. Localização da região vitivinícola do Vale do Submédio São Francisco,
nos Estados de Pernambuco e Bahia (Elaboração: Jorge Tonietto; Cartografia
digital: Naíssa Batista da Luz).
SANTA CATARINA
Santa Catarina
SÃO JOAQUIMSÃO JOAQUIM
Foto: Gilmar B. Kuhn
PERNAMBUCO E BAHIA
Bahia
Pernambuco
VALE DO SUBMÉDIO SÃO FRANCISCOVALE DO SUBMÉDIO SÃO FRANCISCO
Foto: Acervo Miolo
Foto: Jorge Tonietto
Foto: Jorge Tonietto
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 16
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 17
Variedades de Uva
_______________________________
Umberto Almeida Camargo
Existem, no mundo, milhares de variedades de uva. A maioria delas
pertence à espécie Vitis vinifera, originária do Cáucaso, de onde foi
difundida por toda a costa mediterrânea há centenas de anos, seja para
a produção de fruta para consumo in natura, seja como matéria-prima
para a elaboração de vinhos. Foi na costa mediterrânea que, ao longo de
séculos de cultivo, foram selecionadas estas milhares de variedades de
Vitis vinifera, especialmente variedades destinadas à elaboração de
vinhos. Algumasdelas ganharam o mundo, consagrando-se pela ampla
capacidade de adaptação e pelas características dos vinhos que
originam; outras, de adaptação mais restrita, permaneceram em suas
regiões de origem, proporcionando aos seus habitantes a oportunidade
de elaboração de produtos típicos e exclusivos.
O Brasil pertence ao chamado novo mundo vitivinícola, juntamente com
Chile, Argentina, Estados Unidos, África do Sul, Austrália e outros, cuja
base de produção são variedades importadas dos tradicionais países
produtores de vinhos da região mediterrânea. Em geral são variedades
cosmopolitas, cujos vinhos gozam de renome internacional como
varietais. Todavia, existem também variedades cuja adaptação e
qualidade dos vinhos a que dão origem se destacaram em determinadas
condições específicas dos novos países vitivinícolas. Como exemplos
pode-se citar a Riesling Itálico nas condições da Serra Gaúcha.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 18
Figura 7. Cacho de ‘Cabernet
Franc’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
A vitivinicultura brasileira nasceu e cresceu com base em uvas
americanas, as chamadas uvas comuns, variedades das espécies Vitis
labrusca e Vitis bourquina, usadas para a elaboração de vinhos de mesa.
Entretanto, a partir de meados do século XX começaram a ser
elaborados vinhos finos, com uvas de variedades de Vitis vinifera,
também conhecidas como uvas finas. As principais variedades deste
grupo cultivadas no Brasil são apresentadas a seguir.
Variedades tintas
Cabernet Franc
É uma variedade francesa da região
de Bordeaux. Foi introduzida no Rio
Grande do Sul pela Estação
Agronômica de Porto Alegre, por
volta de 1900. Na década de 1920
já era cultivada comercialmente
pelos irmãos maristas em Garibaldi.
Sua grande difusão no Estado,
entretanto, ocorreu nas décadas de
1970 e 1980, tornando-se a base
dos vinhos finos tintos brasileiros
nesse período. A partir daí, foi
superada pelas cultivares ‘Cabernet
Sauvignon’ e ‘Merlot’ nos novos
plantios de uvas tintas finas. A ‘Cabernet Franc’ adapta-se muito bem
às condições da Serra Gaúcha, é medianamente vigorosa e bastante
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 19
Figura 8. Cachos de ‘Cabernet
Sauvignon’ (Foto: Umberto
Almeida Camargo).
produtiva, proporcionando colheita de uvas de boa qualidade, atingindo
facilmente 18ºBrix a 20ºBrix, em vinhedos bem conduzidos. Origina
vinho com tipicidade, apropriado para ser consumido ainda jovem.
Em anos menos chuvosos, durante o período de maturação, o vinho é
mais encorpado e tem coloração mais intensa, apresentando
considerável evolução qualitativa com alguns anos de envelhecimento.
Na região do Vale do Loire, na França, é utilizada para a elaboração de
vinhos rosados de alta qualidade.
Cabernet Sauvignon
Trata-se de uma antiga variedade da
região de Bordeaux, França, hoje
plantada com sucesso em muitos países
vitícolas. Em 1913, já era cultivada
experimentalmente pelo Instituto
Agronômico e Veterinário de Porto
Alegre. As primeiras tentativas de sua
difusão comercial no Rio Grande do Sul
ocorreram nas décadas de 1930 e
1940. Entretanto, foi a partir do final
da década de 1980, com o incremento
da produção de vinhos varietais, que
ganhou expressão no Estado. Vários
clones procedentes da França, da
Califórnia, da Itália e da África do Sul foram trazidos para a formação
dos novos parreirais. Atualmente é a vinífera tinta mais importante do
Estado, vem sendo ampliado seu cultivo no Vale do São Francisco e em
novos pólos, como o de São Joaquim, em Santa Catarina, que apostam
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 20
Figura 9. Cachos de ‘Merlot’
(Foto: Umberto Almeida
Camargo).
nesta variedade. É uma planta muito vigorosa e medianamente
produtiva. Em vinhedos bem conduzidos obtêm-se uvas aptas à
elaboração de vinhos tintos típicos, que podem evoluir em qualidade
com alguns anos de envelhecimento. É bastante susceptível às doenças
de lenho que, se não forem controladas convenientemente, reduzem a
produtividade e causam morte precoce das plantas. O vinho de
‘Cabernet Sauvignon’ é mundialmente reputado pelo seu caráter
varietal, com intensa coloração, riqueza em taninos e complexidade de
aroma e buquê. Evolui com o envelhecimento, atingindo sua máxima
qualidade desde dois a três anos até cerca de vinte anos em
determinadas safras do Médoc, França, por exemplo.
Merlot
Pode ser considerada como uma
variedade originária do Médoc,
França, onde já era cultivada em
1850. Daí expandiu-se para outras
regiões da França e para muitos
outros países vitícolas, tornando-se
uma variedade cosmopolita.
Os registros da Estação Experimental
de Caxias do Sul informam que na
década de 1920 a ‘Merlot’ já era
cultivada no município por viticultores
pioneiros no plantio de castas finas.
Foi uma das cultivares básicas para a
Companhia Vinícola Riograndense
firmar o conceito dos seus vinhos
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 21
Figura 10. Cacho de
‘Pinotage’ (Foto: Umberto
Almeida Camargo).
finos varietais em meados do século passado. Tornou-se, a partir da
década de 1970, uma das principais viníferas tintas do Rio Grande do
Sul. Nos últimos anos cresceu em conceito, sendo, juntamente com a
‘Cabernet Sauvignon’, uma das viníferas tintas mais plantadas no
mundo. É uma cultivar muito bem adaptada às condições do sul do
Brasil, sendo cultivada também em Santa Catarina. Proporciona
colheitas abundantes de uvas que podem atingir 20°Brix, porém, é
bastante susceptível ao míldio. Origina vinho de alta qualidade,
consagrado como varietal e também muito usado em cortes com vinhos
de ‘Cabernet Sauvignon’, ‘Cabernet Franc’ e de outras castas de
renome.
Pinotage
‘Pinotage’ é resultante do cruzamento
‘Pinot Noir’ x ‘Cinsaut’, realizado na
África do Sul pelo Prof. Peroldt, em
1922. Ela só foi propagada para
testes em áreas comercias em 1952,
e em 1959 foi consagrada, ganhando
o concurso de vinhos jovens da cidade
do Cabo. O nome ‘Pinotage’ é uma
combinação dos nomes ‘Pinot’ com
‘Hermitage’, sendo esta uma
denominação usada para a ‘Cinsaut’
na África do Sul. Foi trazida ao Brasil
em 1979, pela Maison Forestier,
sendo cultivada experimentalmente
nos vinhedos da empresa, em
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 22
Figura 11. Cachos de ‘Pinot
Noir’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
Garibaldi. A partir de 1990 começou a ser plantada comercialmente na
Serra Gaúcha. É produtiva, resistente a podridões do cacho e apresenta
ótimo potencial glucométrico, atingindo, normalmente, 20ºBrix a
22ºBrix, com uma acidez total ao redor de 110 mEq/L. Origina vinho
frutado, apto a ser consumido jovem, e também vem sendo usada para
a elaboração de vinhos espumantes.
Pinot Noir
O berço da ‘Pinot Noir’ é a Borgonha,
na França, onde é utilizada para a
elaboração de vinhos tintos de alto
conceito. Também ocupa lugar de
destaque na região da Champagne,
originando, juntamente com a
‘Chardonnay’, os famosos vinhos
espumantes da região. É uma
variedade precoce, de ciclo curto, e
por isso muito difundida em vários
países da Europa setentrional. Foi
introduzida no Brasil há mais de
setenta anos, permanecendo nas
coleções ampelográficas das estações
experimentais. A difusão comercial da ‘Pinot Noir’, no Rio Grande do
Sul, foi iniciada no final da década de 1970, sendo, aqui, utilizada para
a elaboração de vinho tinto varietal e para vinhos espumantes.
Entretanto, é uma cultivar de difícil adaptação às condições do Estado
em razão de sua alta susceptibilidade à podridão, causada por Botrytis
cinerea e a outras podridões da uva. Se ocorrer chuva durante a
Conhecendo o essencial sobreuvas e vinhos 23
Figura 12. Cacho de ‘Syrah’
(Foto: Umberto Almeida
Camargo).
maturação, o que é normal no sul do Brasil, além das perdas diretas
causadas pelas podridões, o vinho não apresenta sua tipicidade varietal.
Syrah
‘Syrah’ é uma das mais antigas castas
cultivadas. Algumas referências
sugerem que seria originária de
Schiraz, na Pérsia, outras, que seria
nativa da Vila de Siracusa, na Sicília.
Independentemente de sua origem,
‘Syrah’ é cultivada na França há muito
tempo, principalmente em Côtes-du-
Rhône, Isere e Drôme. Da França,
expandiu-se por muitos países, sendo
hoje uma das variedades tintas mais
plantadas no mundo. Chegou ao Rio
Grande do Sul em 1921, procedente
dos vinhedos Vila Cordélia, de São
Paulo. Até 1970, não logrou espaço
nos vinhedos comerciais do Estado. Desde então, entretanto,
acompanhando a história de outras viníferas finas francesas, começou a
ser plantada comercialmente em Santana do Livramento e na Serra
Gaúcha, a partir de mudas importadas por vinícolas destas regiões.
É uma casta muito vigorosa e produtiva, características que, aliadas a
sua alta sensibilidade a podridões do cacho, a tornam de difícil cultivo
nas condições ambientais da Serra Gaúcha. Todavia, nas condições
semi-áridas do Nordeste, tem mostrado ótima performance na região do
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 24
Figura 13. Cachos de ‘Tannat’ (Foto:
Umberto Almeida Camargo).
Submédio São Francisco. O vinho de ‘Syrah’ é característico pelo seu
aroma e buquê.
Tannat
A ‘Tannat’ é originária da
região de Madiran, no sul
França, onde está sua maior
área de cultivo. Também é
importante no Uruguai, onde
é a principal vinífera tinta
cultivada. Foi introduzida no
Rio Grande do Sul pela
Estação Experimental de
Caxias do Sul, em 1947,
procedente da Argentina.
Novas introduções foram feitas, por essa mesma instituição, em 1971 e
1977, com materiais vindos da Califórnia e da França, respectivamente.
Destacou-se nos experimentos, passando a ser avaliada em unidades de
observação instaladas em propriedades de viticultores no início da
década de 1980. No mesmo período, foi plantada em Santana do
Livramento pela empresa National Distillers e a partir de 1987 começou
a ser difundida comercialmente na Serra Gaúcha. É uma variedade de
médio vigor, bastante produtiva; apresenta bom potencial glucométrico
e comporta-se bem em relação às doenças fúngicas. O vinho de
‘Tannat’ é rico em cor e em extrato, servindo para corrigir as
deficiências, destas características, em outros vinhos de vinífera.
Também tem sido comercializado, com sucesso, como vinho varietal.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 25
Figura 14. Cachos de ‘Chardonnay’
(Foto: Umberto Almeida Camargo).
É um vinho bastante adstringente e, portanto, necessita de
envelhecimento.
Variedades brancas
Chardonnay
Variedade de origem francesa,
possivelmente da Borgonha, a
‘Chardonnay’ foi introduzida em
São Roque, SP, em 1930, e no
Rio Grande do Sul em 1948. Não
houve difusão comercial desses
materiais, que permaneceram nas
dependências das Estações
Experimentais de São Roque e de
Bento Gonçalves,
respectivamente. A partir do final
da década de 1970, por interesse
do setor vitivinícola, esta casta
foi trazida de procedências
diversas e difundida na Serra
Gaúcha, tanto pelos órgãos de
pesquisa como pela iniciativa privada. É uma casta de brotação precoce,
sujeita a prejuízos causados por geadas tardias. Adapta-se bem às
condições da Serra Gaúcha, com vigor e produtividade médios,
atingindo boa graduação de açúcar em anos favoráveis. A ‘Chardonnay’
goza de renome internacional, especialmente pela qualidade dos vinhos
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 26
Figura 15. Cacho de ‘Malvasia
Bianca’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
que origina na Borgonha, assim como, pelos famosos espumantes
elaborados na região de Champagne, em corte com ‘Pinot Noir’.
No Brasil tem sido usada para a elaboração de vinho fino varietal e
também para vinhos espumantes.
Malvasia Bianca
A ‘Malvasia Bianca’ foi
introduzida no Rio Grande do
Sul pela Estação Experimental
de Caxias do Sul, em 1970,
procedente da Universidade da
Califórnia. Avaliada por
pesquisa, demonstrou bom
desempenho produtivo na Serra
Gaúcha, surgindo como uma
alternativa de uva aromática
para a região. A partir de
unidades de observação,
instaladas no campo de testes
da Cooperativa Vinícola Aurora
Ltda. e em propriedades de
viticultores, começou a ser
plantada comercialmente em
meados da década de 1980. Origina vinho acentuadamente moscatel
que pode ser comercializado como varietal ou ser usado como fonte de
aroma em cortes com outros vinhos brancos. Todavia, tem sido usada
principalmente para a elaboração de vinhos espumantes do tipo
moscatel.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 27
Figura 16. Cacho de ‘Moscato
Branco’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
Moscato Branco
Apesar do nome ‘Moscato
Italiano’, ainda não há uma
definição da identidade desta
cultivar com nenhuma das
várias cultivares de uvas
aromáticas descritas na
ampelografia italiana. Em 1931,
esta variedade já fazia parte do
campo de matrizes da Estação
Experimental de Caxias do Sul
para a distribuição de material
propagativo aos viticultores.
É muito bem adaptada às
condições do sul do Brasil,
sendo cultivada também em
Santa Catarina. É resistente à
antracnose, porém, bastante
susceptível ao apodrecimento da uva. Apresenta alta fertilidade, o que
leva, muitas vezes, os agricultores a exagerarem na carga, prejudicando
a qualidade. Nestes casos, a uva não atinge a maturação, sendo colhida
com baixo teor de açúcar e acidez excessivamente elevada. Além disso,
os vinhedos com sobrecarga têm apresentado problemas de declínio e
morte precoce de plantas. Entretanto, em vinhedos bem conduzidos, em
anos favoráveis, proporciona colheitas abundantes, de uvas de ótima
qualidade. Origina vinho acentuadamente moscatel, usado
principalmente em cortes, como fonte de aroma para outros vinhos;
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 28
Figura 17. Cacho de ‘Moscato
Canelli’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
também é empregada para a elaboração de espumantes, principalmente
os do tipo moscatel.
Moscato Canelli
Variedade de uva procedente da
Itália, introduzida no Vale do
Submédio São Francisco no início
da década de 1980, quando lá se
iniciou o cultivo de uvas para
vinho. Apresentou ótima adaptação
às condições do semi-árido
nordestino, sendo a principal uva
branca cultivada atualmente
naquela região. Além de
empregada na elaboração de
vinhos de mesa varietais, também
tem sido usada, com sucesso, na
elaboração de vinhos espumantes
do tipo moscatel.
Prosecco
Estudos ampelográficos, realizados a partir de 1979, mostram que a
variedade encontrada nos vinhedos de Bento Gonçalves, com o nome de
‘Biancheta Bonoriva’, é, na realidade, a ‘Prosecco’. Não há registros
sobre sua difusão, mas, segundo informações dos viticultores, ela é
plantada há muitos anos neste município. Mais recentemente, no final
da década de 1970, Ítalo Zanella, empresário e viticultor de Farroupilha,
importou mudas de ‘Prosecco’ da Itália para plantio em sua propriedade.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 29
Figura 18. Cachos de ‘Prosecco’
(Foto: Umberto Almeida Camargo).
Este material serviu de base
para novos plantios na região a
partir de 1980. A ‘Prosecco’ é
originária do norte da Itália,
onde é utilizada para a
elaboração de conceituado
vinho espumante, que leva seu
nome. Apresenta bom
desempenho agronômico na
SerraGaúcha, porém, em
virtude da precocidade de
brotação, pode sofrer danos
causados por geadas tardias em
áreas susceptíveis. A exemplo
do que ocorre na Itália, também
aqui origina espumantes de boa
qualidade, muito bem aceitos pelo consumidor brasileiro.
Riesling Itálico
A ‘Riesling Itálico’ também é uma variedade do norte da Itália, onde é
cultivada principalmente em Veneza, Pavia, Udine, Treviso e Bolzano.
Foi trazida para o Rio Grande do Sul pela Estação Agronômica de Porto
Alegre em 1900. A Companhia Vinícola Riograndense foi pioneira na
elaboração de vinho varietal desta cultivar no Estado e estimulou sua
difusão na Serra Gaúcha. A partir de 1973, houve grande incremento na
área cultivada, tornando-se uma das principais uvas finas brancas da
região. A planta de Riesling Itálico apresenta médio vigor, é fértil,
produtiva e muito bem adaptada ao ambiente da Serra Gaúcha. Em anos
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 30
Figura 19. Cacho de ‘Riesling
Itálico’ (Foto: Umberto Almeida
Camargo).
favoráveis, proporciona colheitas
abundantes, de uvas que chegam
a 20°Brix na plena maturação.
Entretanto, em anos mais
chuvosos, o viticultor, muitas
vezes, se vê forçado a antecipar a
colheita devido à incidência de
podridões do cacho. O vinho de
‘Riesling Itálico’ é fino, com aroma
sutil e típico, comercializado como
vinho fino de mesa varietal e,
também, utilizado na elaboração
de espumantes bem conceituados.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 31
O Clima e a Safra Vitícola
_______________________________
Francisco Mandelli
Mauro Celso Zanus
Os elementos meteorológicos, principalmente, temperatura, umidade e
radiação solar, exercem grande influência sobre o desenvolvimento,
produção e qualidade da uva destinada à elaboração de vinhos. Essa
influência ocorre em todos os estádios fenológicos da videira, ou seja,
desde o repouso vegetativo (inverno), a brotação, a floração, a
frutificação, crescimento das bagas (primavera), a maturação (verão)
até a queda das folhas (outono). Cada estádio fenológico necessita de
quantidade adequada de luz, água e calor para que a videira possa se
desenvolver e produzir uvas de qualidade.
Para o estudo do clima de uma safra, são utilizados os dados
meteorológicos e as normais climatológicas das estações localizadas nas
regiões de produção de uvas, associados aos dados dos principais
estádios fenológicos da videira, descritos a seguir:
a) Repouso vegetativo – a videira, no outono-inverno, devido à
diminuição da temperatura do ar, entra em dormência. As baixas
temperaturas que ocorrem em junho, julho e agosto são fundamentais,
pois, quanto mais frio for nesse subperíodo, melhor será a dormência e
melhores serão as condições para a brotação da videira. Uma boa
brotação conduz a uma melhor distribuição de ramos e de frutos,
beneficiando posteriormente a fase de maturação.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 32
b) Brotação – para a região sul do Brasil, de um modo geral, as videiras
brotam no final do inverno-início da primavera, à medida que ocorre o
aumento da temperatura. As videiras de brotação precoce começam a
brotar no início de setembro, enquanto as tardias, no início de outubro.
Nesse período, as temperaturas e a precipitação pluviométrica devem
proporcionar boas condições para a brotação da videira. As geadas
tardias, que podem ocorrer nesse período causam danos à brotação,
principalmente nas cultivares precoces, especialmente nos vinhedos
localizados em locais que propiciam acúmulo de ar frio.
c) Floração-Frutificação – esse subperíodo é um dos mais críticos para a
videira, pois define, em grande parte, a quantidade de uva a ser colhida
na safra. Para o adequado desenvolvimento da floração-frutificação, é
necessário tempo seco e ensolarado, com temperaturas superiores a
18ºC. Esse subperíodo inicia na metade de outubro, para as cultivares
precoces (Chardonnay, Pinot Noir, Gewürztraminer), e se estende até
meados de novembro, para as cultivares mais tardias (Cabernet
Sauvignon, Moscato Branco).
d) Maturação-Colheita – esse é o subperíodo de maior importância para
a qualidade da vindima. Durante o subperíodo de maturação, dias
ensolarados e com reduzida precipitação são fundamentais para a
obtenção de uvas sadias e com equilibrada relação açúcar/acidez, dentre
outros componentes, características essas essenciais para a elaboração
de vinhos de qualidade. O número de dias de chuva, desse período,
também deve ser considerado. Chuvas de maior intensidade,
intercaladas pela seqüência de dias ensolarados, são menos prejudiciais
à qualidade das uvas do que a seqüência de alguns dias nublados e/ou
de menor volume de precipitação. Outro fator que contribui muito para a
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 33
qualidade das uvas de uma safra é a sanidade das uvas. O ideal seria
colher as uvas pelo grau de maturação e não em função de problemas
fitossanitários causados especialmente pelas podridões do cacho.
O grau de maturação ideal, de acordo com as diferentes categorias de
vinhos é o seguinte:
Uvas para a elaboração de vinhos espumantes – que requerem vinhos
base de maior acidez: grau de maturação entre 17 a 18oBabo; uvas para
vinhos brancos, entre 18 a 20oBabo; uvas para vinhos tintos entre 18 a
22oBabo.
O efeito da época de maturação
De um modo geral, na região Sul do Brasil, as uvas de maturação
precoce, como Chardonnay, Gewürztraminer e Pinot Noir, começam a
ser colhidas em meados de janeiro, estendendo-se a colheita até o início
de fevereiro.
As uvas de maturação intermediária, como Riesling Itálico e Merlot,
apresentam data de colheita que se estende desde o final de janeiro até
meados de fevereiro.
As uvas de maturação tardia, como Cabernet Franc, Cabernet
Sauvignon e Moscato Branco, são colhidas desde a segunda quinzena
de fevereiro até, quase, o final de março.
Quando o período de maturação (da mudanças de cor das bagas até a
colheita) se caracteriza por dias ensolarados, com pouca chuva e
temperaturas amenas, ocorre inibição da podridão das uvas, permitindo
realizar a colheita quando os frutos apresentam casca, polpa e sementes
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 34
em estágio ideal de maturação. Nestas condições, as bagas podem
sintetizar e acumular mais açúcares, pigmentos, taninos, substâncias
aromáticas e seus precursores. A absorção de água pelas videiras com
um nível maior de restrição produz frutos mais concentrados em
açúcares e em substâncias orgânicas e minerais.
As temperaturas moderadas do subperíodo de maturação têm um efeito
na intensidade da cor dos vinhos. O metabolismo bioquímico que leva à
síntese de substâncias fenólicas – da qual fazem parte as antocianas
dos frutos – é favorecido pelas temperaturas mais amenas,
principalmente as noturnas. Além disso, a acidez adicional obtida devido
às baixas temperaturas contribui para um adequado pH dos vinhos.
Safra ruim para Chardonnay e
ótima para o Cabernet
Sauvignon?
Em um estudo de caracterização de safra para as condições da Serra
Gaúcha, Mandelli et al. (2003) empregaram o Quociente
Heliopluviomátrico de Maturação (QM) de Westphalen para discriminar
as safras (Tabela 1). Para o QM, que relaciona a insolação (horas) e a
precipitação pluviométrica (mm), consideraram o período efetivo
(40 dias) de influência sobre a maturação, segundo as seguintes
épocas: uvas de maturação precoce (11 de dezembro a 20 de janeiro),
intermediária (6 de janeiro a 15 de fevereiro) e tardia (25 de janeiro a
5 de março). As categorias de classificação foram: QM > 2,0 (alto
potencial), QM 1,0 – 2,0 (médio potencial) e QM < 1,0 (baixo
potencial). Esses autores constataram que em 52% dassafras ocorreu,
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 35
pelo menos, um período de maturação com a condição alto potencial e
em 26% com dois ou mais períodos de alto potencial. A freqüência de
períodos de baixo potencial dentro de cada grupo de maturação foi de
22%, 22% e 26%, respectivamente para o período das precoces,
intermediárias e tardias. Considerando os 81 períodos de maturação
avaliados, 30% foram classificados de alto potencial, 47% de médio
potencial e 23% de baixo potencial.
Tabela 1. Quociente heliopluviométrico de maturação (QM), insolação e
precipitação pluviométrica para os diferentes grupos de maturação.
Safras 1977 a 2003. Bento Gonçalves, RS.
Safra Maturação
Insolação
(h)
Precipitação
(mm)
QM*
1977 Precoce 297,6 197,1 1,51*
Intermediária 262,8 160,7 1,64*
Tardia 292,4 193,5 1,51*
1978 Precoce 336,5 76,7 4,39**
Intermediária 315,1 134,9 2,34**
Tardia 310,7 120,6 2,58**
1979 Precoce 406,2 31,0 13,10**
Intermediária 391,4 112,8 3,47**
Tardia 292,7 146,9 1,99*
1980 Precoce 328,7 162,4 2,02**
Intermediária 353,0 214,4 1,65*
Tardia 332,4 233,1 1,43*
1981 Precoce 291,0 166,4 1,75*
Intermediária 280,0 290,4 0,96
Tardia 256,0 265,7 0,96
1982 Precoce 343,7 108,1 3,18**
Intermediária 331,3 58,8 5,63**
Tardia 302,6 114,2 2,65**
1983 Precoce 321,1 231,1 1,39*
Intermediária 300,2 142,4 2,11**
Tardia 209,8 245,1 0,86
1984 Precoce 288,3 292,1 0,99
Intermediária 287,7 329,7 0,87
Tardia 300,2 247,1 1,21*
“Continua...”
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 36
Tabela 1. “Continuação”.
Safra Maturação
Insolação
(h)
Precipitação
(mm)
QM*
1985 Precoce 382,7 131,8 2,90**
Intermediária 315,9 135,9 2,32**
Tardia 290,3 161,3 1,80*
1986 Precoce 338,0 129,4 2,61**
Intermediária 318,2 119,0 2,67**
Tardia 303,6 155,6 1,95*
1987 Precoce 272,0 274,8 0,99
Intermediária 277,9 256,5 1,08*
Tardia 307,5 208,9 1,47*
1988 Precoce 303,3 184,0 1,65*
Intermediária 303,6 221,6 1,37*
Tardia 320,1 281,0 1,14*
1989 Precoce 304,8 149,7 2,04**
Intermediária 274,3 332,0 0,83
Tardia 279,5 208,5 1,34*
1990 Precoce 308,1 225,0 1,37*
Intermediária 275,9 267,8 1,03*
Tardia 285,2 163,3 1,75*
1991 Precoce 375,5 55,9 6,72**
Intermediária 363,0 99,2 3,66**
Tardia 338,0 126,5 2,67**
1992 Precoce 330,1 311,6 1,06*
Intermediária 304,1 234,2 1,30*
Tardia 258,1 208,9 1,24*
1993 Precoce 317,4 366,5 0,87
Intermediária 301,1 157,5 1,91*
Tardia 254,7 99,9 2,55**
1994 Precoce 370,8 103,9 3,57**
Intermediária 269,3 191,8 1,40*
Tardia 227,7 228,3 1,00*
1995 Precoce 279,8 286,2 0,98
Intermediária 272,6 210,0 1,30*
Tardia 251,0 316,3 0,79
1996 Precoce 283,6 301,7 0,94
Intermediária 238,6 516,3 0,46
Tardia 270,4 417,9 0,65
1997 Precoce 336,5 111,0 3,03**
Intermediária 272,6 218,7 1,25*
Tardia 225,1 271,4 0,83
“Continua...”
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 37
Tabela 1. “Continuação”.
Safra Maturação
Insolação
(h)
Precipitação
(mm)
QM*
1998 Precoce 241,8 218,4 1,11*
Intermediária 219,0 260,1 0,84
Tardia 204,5 293,4 0,70
1999 Precoce 325,3 121,1 2,69**
Intermediária 311,9 139,0 2,24**
Tardia 186,0 157,1 1,18*
2000 Precoce 312,7 233,3 1,34*
Intermediária 301,6 216,7 1,39*
Tardia 279,7 145,8 1,92*
2001 Precoce 262,9 324,6 0,81
Intermediária 218,0 274,9 0,79
Tardia 243,8 136,8 1,78*
2002 Precoce 351,9 70,1 5,02**
Intermediária 303,1 178,1 1,70*
Tardia 294,9 212,1 1,39*
2003 Precoce 321,9 170,0 1,89*
Intermediária 332,8 269,7 1,23*
Tardia 288,7 355,7 0,81
**Períodos de alto potencial; *Períodos de médio potencial; Períodos de baixo
potencial.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 38
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 39
Tipos de Vinho
_______________________________
Celito Crivellaro Guerra
1. Definição
Segundo definição constante na legislação vitivinícola do Mercosul (à
qual o Brasil é signatário), vinho é exclusivamente a bebida que resulta
da fermentação alcoólica completa ou parcial da uva fresca, esmagada
ou não, ou do mosto simples ou virgem, com um conteúdo de álcool
adquirido mínimo de 7% (v/v a 20ºC).
2. Classificação dos vinhos
De acordo com a lei acima citada, os vinhos classificam-se:
2.1. Quanto à classe:
2.1.1. Vinho de mesa
É o vinho com conteúdo alcoólico de 8,6 a 14% em volume, podendo
conter até 1 (uma) atmosfera de pressão de gás carbônico a 20ºC.
2.1.2. Vinho leve
É aquele com graduação alcoólica de 7 a 8,5% em volume, obtido
exclusivamente pela fermentação dos açúcares naturais da uva,
produzido durante a vindima, na região produtora.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 40
2.1.3. Vinho fino
É o vinho com graduação alcoólica de 8,6 a 14,0% em volume,
proveniente exclusivamente de variedades Vitis vinifera, à exceção das
variedades Criolla Grande e Cereza, elaborado mediante processos
tecnológicos adequados que assegurem a otimização de suas
características sensoriais.
2.1.4. Vinho espumante natural
É o vinho cujo anidrido carbônico provém de uma segunda fermentação
alcoólica do vinho na garrafa (método Champenoise/tradicional) ou em
grandes recipientes (método Charmat) com uma pressão mínima de
4 (quatro) atmosferas a 20ºC e graduação alcoólica de 10 a13% em
volume a 20ºC.
2.1.5. Vinho moscatel espumante ou moscato espumante
É o vinho cujo anidrido carbônico provém da fermentação em recipiente
fechado do mosto ou mosto conservado de uva Moscatel ou Moscato,
com uma pressão mínima de 4 (quatro) atmosferas a 20ºC, e um
conteúdo alcoólico de 7 a 10% em volume, e um remanescente mínimo
de açúcar natural de 60 gramas por litro. Para o Brasil, o remanescente
mínimo de açúcar natural será de 20 gramas por litro.
2.1.6. Vinho frisante
É o vinho com conteúdo alcoólico de 7 a 14% em volume, com um
conteúdo de anidrido carbônico de 1,1 até 2 atmosferas de pressão a
20ºC natural ou gaseificado.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 41
2.1.7. Vinho gaseificado
É o resultante da introdução de anidrido carbônico puro por qualquer
processo, devendo apresentar um conteúdo alcoólico de 7 a 14% em
volume e uma pressão compreendida entre 2,1 e 3,9 atmosferas a 20ºC
(no Brasil, é o vinho comercializado sob o nome de filtrado doce).
2.1.8. Vinho licoroso
É o vinho com conteúdo alcoólico natural ou adquirido de 14 a 18% em
volume, sendo permitido o uso de álcool etílico, mosto concentrado,
caramelo, mistela simples, açúcar e caramelo de uva.
2.1.9. Vinhos compostos
São aqueles com conteúdo alcoólico de 14 a 20% em volume, obtidos
pela adição ao vinho de macerados ou concentrados de plantas amargas
ou aromáticas, substâncias de origem animal ou mineral, álcool etílico,
açúcar, caramelo e mistelas simples. Deverão conter um mínimo de
70% de vinho.
Os vinhos compostos classificam-se em:
2.1.9.1. Vermute: é o vinho composto que contiver Artemísia sp.
predominante entre seus componentes aromáticos, com adição de
macerados ou concentrados de plantas amargas ou aromáticas.
2.1.9.2. Quinado: é o vinho composto que contenha quina (Chinchona
ou seus híbridos).
2.1.9.3. Gemado: o vinho composto que contenha gema de ovo.
2.1.9.4. Composto com jurubeba: é o vinho composto que contenha
jurubeba (Solanum paniculatum).
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 42
2.1.9.5. Composto com ferroquina: é o vinho composto que contenha
citrato de ferro amoniacal e quinino.
2.2. Quanto à cor:
- Tinto.
- Rosado ou rosé ou clarete.
- Branco.
2.3. Quanto ao teor de açúcar (expresso em g/L de glicose)
I. Para os vinhos leves, de mesa, frisantes e finos:
- Seco: com até 4 (quatro) g/L de açúcar.
- Demi-sec ou meio-seco: com teor superior a 4 e até 25 g/L de açúcar.
- Suave ou doce: com teor superior a 25 e até 80 g/L de açúcar.II. Para os vinhos espumantes naturais ou gaseificados:
- Nature: com até 3 (três) g/L de açúcar.
- Extra-brut: com teor superior a 3 e até 8 g/L de açúcar.
- Brut: com teor superior a 8 e até 15 g/L de açúcar.
- Sec ou Seco: com teor superior a 15 e até 20 g/L de açúcar.
- Demi-sec, meio-doce ou meio-seco: com teor superior a 20 e até
60 g/L de açúcar.
- Doce: com teor superior a 60 g/L de açúcar.
III. Para os vinhos licorosos:
- Seco: com até 20 (vinte) g/L de açúcar.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 43
- Doce: com teor superior a 20 g/L de açúcar.
IV. Para os vinhos compostos:
- Seco ou dry: com até 40 (quarenta) g/L de açúcar.
- Meio-seco ou meio-doce: com teor superior a 40 e até 80 g/L açúcar.
- Doce: com teor superior a 80 g/L de açúcar.
3. Classificação de bebidas
vínicas
3.1. Mistela ou mistela simples
É o mosto simples não fermentado, adicionado de álcool etílico até um
limite máximo de 18 % de álcool em volume e com teor de açúcar de
uva não inferior a 100 g/L, sendo proibida a adição de sacarose ou
outro edulcorante.
3.2. Mistela composta
É o produto com graduação alcoólica de 15 a 20% em volume, que
contém um mínimo de 70% de mistela e 15% de vinho de mesa,
adicionado de substâncias amargas e/ou aromáticas.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 44
3.3. Jeropiga
É a bebida elaborada com mosto de uva parcialmente fermentado,
adicionado de álcool etílico, com graduação alcoólica máxima de 18%
em volume e teor mínimo de açúcar de 70 g/L.
3.4. Pineau
É a bebida obtida a partir do mosto ou suco de uvas frescas das
variedades Ugni Blanc, Folle Blanc ou Colombard, com álcool vínico
envelhecido e brandy. A mistura deverá ter um envelhecimento mínimo
de 6 meses em barricas de madeira e sua graduação alcoólica deverá
estar compreendida entre 16 e 22% em volume a 20ºC.
4. Classificação de destilados à
base de vinho
São os produtos obtidos da destilação dos vinhos e/ou seus derivados.
4.1. Brandy
É o destilado de vinho com um envelhecimento mínimo de 6 meses
(como exceção para este produto se permitirá o uso de recipientes de
mais de 700 litros para seu envelhecimento, em cujo caso o período
mínimo será de um ano).
4.2. Aguardente de bagaço ou bagaceira
É a bebida com graduação alcoólica de 35 a 54% em volume a 20ºC,
obtida a partir de destilados alcoólicos simples de bagaço de uva, com
ou sem borras de vinhos, podendo ser feita uma retificação parcial
seletiva (estes produtos são comercializados sob o nome de graspa).
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 45
4.3. Destilados de vinhos aromáticos
É a bebida com uma graduação de 35% a 54% em volume a 20ºC,
obtida a partir de destilados alcoólicos simples de vinhos, elaborados
com uvas devidamente reconhecidas e aceitadas por seus aromas e
sabores, podendo ser destilados na presença das borras.
5. Coquetéis à base de vinho
5.1. Cooler
É a bebida com conteúdo alcoólico de 3,5 a 7% em volume, obtida pela
mistura de vinho de mesa, sucos de uva ou outras frutas e água
potável, podendo ser gaseificado e adicionado de açúcares. Deverá
conter no mínimo, 50% de vinho de mesa que poderá ser substituído
parcialmente por suco de uva, devendo a graduação alcoólica ser
proveniente exclusivamente do vinho de mesa, sendo proibida a adição
de álcool etílico ou outro tipo de bebida alcoólica.
O Cooler poderá conter extratos ou essências aromáticas naturais,
corantes naturais e caramelo.
5.2. Sangria
É a bebida obtida pela mistura de vinhos e sucos (concentrados e/ou
diluídos), polpa, extratos ou essências naturais de frutas com adição ou
não de almíbar/xarope, seja qual for seu conteúdo de açúcares e
eventualmente anidrido carbônico. A proporção mínima de vinho no
produto final deverá ser de 60% e o conteúdo alcoólico real de 7 a 12%
em volume a 20ºC.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 46
Observação 1: A classificação dos vinhos contida na legislação
vitivinícola do Mercosul, em linhas gerais, segue as mesmas definições
de outras leis, notadamente as dos países vitivinícolas tradicionais.
Entretanto, algumas especificidades existem em cada lei. Por exemplo,
a lei do Mercosul não faz menção às sub-classes de vinhos licorosos ou
de sobremesa, que dividem-se em vinhos doces naturais e vinhos com
adição de álcool.
Observação 2: Algumas classificações bastante utilizadas no jargão
enológico não existem necessariamente em lei. É o caso dos vinhos sem
gás carbônico, ditos vinhos tranqüilos, em oposição aos vinhos com gás
carbônico, denominados espumantes.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 47
Processos de Elaboração
_______________________________
Celito Crivellaro Guerra
1. Elaboração de vinhos
tranqüilos
Vinificação é o conjunto de procedimentos e processos empregados
para a transformação da uva madura em vinho. Engloba as fases de
fermentação e estabilização. As principais etapas na elaboração de
vinhos tranqüilos brancos, tintos ou rosados, são:
1.1. Colheita, recepção e análise da uva
Em geral é realizada manualmente. O transporte até a vinícola é feito
em caixas plásticas de 20 kg de capacidade, que podem ser empilhadas
sem danificar a uva. Na recepção da uva na vinícola, as caixas são
pesadas e o grau glucométrico é determinado, para fins de cálculo do
potencial alcoólico e de eventuais correções.
1.2. Desengace e esmagamento
A separação do engaço das bagas é efetuada com a finalidade de limitar
a adstringência, o amargor e o gosto desagradável de herbáceo e de
secura do vinho. Na vinificação em tinto, o esmagamento das uvas tem
como finalidade liberar o suco contido na polpa e facilitar a dissolução
da matéria corante durante a maceração. O esmagamento não deve ser
enérgico para evitar que as partes sólidas da uva sejam trituradas, o que
contribuiria para a formação de borras e aparecimento de sabor
herbáceo. No caso de uvas brancas, uma variação bastante utilizada da
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 48
técnica é o desengace sem esmagamento. A uva é em seguida prensada
inteira, o que pode aportar maior qualidade aromática ao vinho.
1.3. Sulfitagem do mosto
O uso de dióxido de enxofre em enologia como antioxidante e
bactericida é uma prática bastante antiga. No mosto ocorre um
equilíbrio entre as várias formas químicas do produto, sendo o SO2 a
forma mais eficaz no controle do crescimento de leveduras e bactérias.
A eficácia depende da quantidade de açúcar, de acetaldeído, do pH e da
temperatura do mosto e do vinho em elaboração. Ao longo da
vinificação, faz-se novas sulfitagens, visando corrigir os teores de SO2,
uma vez que diminuem por evaporação ou por reações químicas.
1.4. Adição de enzimas pectinolíticas
A utilização de enzimas pectinolíticas aumenta o rendimento da uva em
mosto, facilita a filtração e a clarificação de mostos e vinhos e contribui
para a obtenção de vinhos mais límpidos. Os preparados enzimáticos
comerciais possuem ação clarificante pois, além de diminuírem a
turbidez, aumentam a extração dos compostos fenólicos (principalmente
antocianinas), pela desagregação da parede das estruturas celulares que
as estocam na película da uva.
1.5. Desmostagem
Essa operação é realizada na elaboração de vinhos brancos e consiste
na separação do mosto das partes sólidas da uva, imediatamente após o
esmagamento. O equipamento utilizado pode ser um escorredor estático
ou a própria prensa utilizada para a prensagem da uva esmagada ou
inteira.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 49
1.6. Debourbagem ou desborra
Esta operação é realizada na vinificação em branco após a
desmostagem e adição de enzimas. Consiste na separação dos
constituintes sólidos do mosto (borras), peladiminuição da temperatura.
O uso de bentonite e a sulfitagem são fatores utilizados para melhorar
ainda mais a clarificação, que ocorre em até 24 horas.
1.7. Adição de leveduras
As leveduras são os microorganismos que transformam o açúcar
contido no mosto em álcool etílico. São, portanto, os agentes biológicos
da vinificação. Na moderna enologia, não se concebe a elaboração de
vinho sem o uso de leveduras selecionadas. Existem vários preparados
comerciais, compostos por leveduras secas ativas. A levedura
Saccharomyces cerevisiae é a que melhor se presta à vinificação, pois
tem a capacidade de transformar totalmente os açúcares da uva em
álcool etílico e outros compostos. Existem diversas cepas da leveduras
comerciais que se prestam mais à elaboração de vinhos brancos, tintos,
espumantes, etc.
1.8. Correção de açúcar ou chaptalização
O vinho é o produto da transformação do açúcar da uva em álcool e em
produtos secundários. Para a obtenção de cada 1ºGL de álcool, são
necessários 17 g/L de açúcar na uva. O ideal para a conservação e
qualidade do vinho é que o mesmo contenha pelo menos 12ºGL. Para
tanto, a uva madura deveria conter mais de 200 g/L de açúcar, ou cerca
de 22°Brix. Se a uva não contiver o teor necessário de açúcar, deve-se
adicioná-lo. Esta prática, denominada chaptalização, em homenagem ao
seu criador (Chaptal), é empregada em vários países onde as condições
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 50
naturais de cultivo da videira não permitem o acúmulo de teores
adequados de açúcar na uva madura.
A legislação brasileira estabelece que a chaptalização não pode
ultrapassar a correção máxima de 3ºGL potenciais.
1.9. Fermentação alcoólica
É a transformação dos açúcares da uva dissolvidos no mosto (glicose e
frutose) em álcool etílico e subprodutos (glicerol, acetaldeído, ácido
acético, ácido láctico, etc.).
Na vinificação em tinto, a fermentação alcoólica pode ser dividida em
duas fases: tumultuosa e lenta. A fermentação tumultuosa caracteriza-
se pela grande atividade leveduriana, gerando elevação da temperatura e
grande liberação de gás carbônico, que empurra as partes sólidas para a
parte superior do recipiente formando o “chapéu de bagaço”.
Na vinificação em branco, com maior controle de temperatura (cerca de
15ºC), a fase tumultuosa é menos evidente. Na fase lenta a intensidade
da fermentação diminui gradativamente, devido à diminuição do teor de
açúcar e aos teores crescentes de álcool, que limitam o
desenvolvimento das leveduras.
1.10. Maceração
É uma das primeiras e mais importantes etapas da vinificação em tinto.
Nela ocorre a extração dos compostos contidos nas partes sólidas da
uva. A mesma deve ser seletiva, permitindo a máxima extração dos
compostos que concorrem para a qualidade do vinho e limitando ao
máximo a extração dos que concorrem para limitá-la. Nessa fase,
variáveis como a relação fase sólida/fase líquida, tempo de maceração,
temperatura da massa vinária, número e freqüência das remontagens,
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 51
sistema de remontagem e volume de líquido remontado são decisivas
para que toda qualidade da uva seja refletida no vinho.
A maceração carbônica é uma técnica completamente diferente da
maceração tradicional, mas também empregada na vinificação em tinto.
Trata-se de uma maceração pré-fermentativa e consiste na colocação
dos cachos de uva inteiros em uma atmosfera saturada com gás
carbônico durante cerca de dez dias, à temperatura ambiente (cerca de
25°C). A atmosfera saturada com gás carbônico faz com que parte do
ácido málico se converta em etanol. Este por sua vez auxilia no
‘amolecimento’ da parede celular das cascas e polpas, facilitando a
extração de diversos compostos. Sob tais condições, há também a
aceleração da transformação de precursores de aroma em substâncias
aromáticas, de modo que o vinho obtido possui aroma intenso e
complexo.
Após os 10 dias de maceração carbônica, a uva é retirada do recipiente,
desengaçada, esmagada e posta a fermentar no modo tradicional de
vinificação em tinto. Os vinhos franceses da região do Beaujolais são
elaborados com o emprego desta técnica.
1.11. Separação das fases sólida e líquida
Esta operação, denominada descuba, consiste na separação do líquido
(vinho em elaboração) da fase sólida (bagaço). A análise sensorial
(degustação) é um meio simples e eficiente de se determinar o
momento da descuba. Se a mesma for efetuada após poucos dias de
maceração, a fermentação alcoólica continuará de modo lento após. Por
outro lado, se a maceração for longa, a fermentação alcoólica já se terá
completado quando da realização da descuba.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 52
1.12. Prensagem do bagaço
Esta operação, realizada logo após a descuba para os vinhos tintos e no
início da vinificação para vinhos brancos, possibilita um aumento de
rendimento de 10 a 15%, pela extração do vinho retido nos interstícios
das partes sólidas. O produto obtido pela prensagem possui qualidade
ligeiramente inferior ao vinho normal, uma vez que a prensagem das
partes sólidas libera vários compostos, de modo não seletivo. Assim, o
produto obtido por uma prensagem leve é misturado ao vinho normal e
aquele obtido por uma prensagem mais severa é normalmente destinado
à elaboração de vinho de segunda categoria ou destilado.
1.13. Fermentação malolática
Consiste na transformação do ácido málico em ácido láctico, pela ação
de bactérias conhecidas como bactérias lácticas. De maneira geral, os
vinhos tintos são beneficiados com esta fermentação ao adquirirem
maior complexidade aromática e suavidade gustativa. Entretanto, é
indesejável na maioria dos vinhos brancos, para os quais uma acidez
mais pronunciada realça o aroma e equilibra o sabor.
Normalmente a fermentação malolática inicia ao final da fermentação
alcoólica, quando a autólise das leveduras se intensifica. Pode ocorrer de
forma espontânea ou através da inoculação de bactérias lácticas ao vinho.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 53
1.14. Trasfegas
Consistem em transferir o vinho de um recipiente para outro, visando
separá-lo dos sólidos insolúveis que sedimentam ao final da fermentação
(borras). Podem servir também para a aeração do vinho, reequilibrando
seu potencial de oxido-redução.
1.15. Atesto
A operação consiste em manter completamente cheios os recipientes de
estocagem, evitando o contato do vinho como o ar. Esse contato pode
ocasionar no vinho oxidação descontrolada e/ou condições para o
desenvolvimento de bactérias nocivas à qualidade, principalmente
bactérias acéticas. O vinho utilizado no atesto deve ser de mesma
qualidade à do vinho atestado. Os atestos devem ser realizados logo
após a fermentação malolática e repetidos sempre que houver
necessidade.
1.16. Estabilização
É a fase que sucede as fermentações alcoólica e malolática. Nela,
diversos elementos originados da uva (polifenóis e ácido tartárico) ou da
autólise das leveduras (proteínas e peptídeos) são neutralizados e/ou
induzidos à sedimentação via métodos químicos ou físicos. Uma vez
decantados, são extraídos.
1.17. Filtrações
A filtração de vinhos é uma prática que deve ser efetuada com muita
precisão, pois deve servir para a retirada de micropartículas indesejáveis
do vinho, sem, no entanto, diminuir demasiadamente sua estrutura e
sua intensidade aromática. A moderna enologia preconiza a elaboração
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 54
de vinhos com o máximo de precisão e controle, de modo a aproveitar
todo o potencial de qualidade da uva. A filtração, por mais precisa que
seja, retira boa parte dos atributos do vinho, junto com as substâncias
que se quer retirar, de modo que édispensada para muitos vinhos de
qualidade.
1.18. Estabilização em barricas de madeira
Esta prática é recomendada para os vinhos tintos ou brancos
(principalmente tintos) cuja estrutura química seja suficientemente
complexa de modo a beneficiar-se da oxidação controlada que
possibilita o contato com a madeira.
Pela sua morfologia e composição química, o carvalho é a madeira
empregada por excelência em enologia. O tempo de estabilização do
vinho em barricas de carvalho é proporcional à estrutura química natural
deste. Assim, quanto mais estruturado o vinho, mais tempo o mesmo
pode permanecer na barrica. Usualmente, a estabilização em barricas
dura de três meses a dois anos.
1.19. Cortes
Os vinhos são elaborados sem mistura de variedades e assim
permanecem até o final da estabilização. Nessa fase, podem ser
engarrafados como tal (são os chamados vinhos varietais) ou podem ser
misturados com o objetivo de obter um produto mais harmônico,
remediando o excesso ou a deficiência de certos componentes.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 55
1.20. Engarrafamento e arrolhamento
As garrafas de vidro de 750 mL de capacidade são os recipientes
utilizados por excelência em todo o mundo. No engarrafamento de
grandes volumes de vinho, são utilizadas máquinas engarrafadoras com
controle de nível. Ao proceder ao enchimento das garrafas, a máquina
injeta gás nitrogênio, substituindo o ar da garrafa. Este procedimento
evita a ocorrência de oxidação na garrafa e prepara o produto para a
fase de envelhecimento.
As rolhas de cortiça natural são, ainda hoje, a melhor vedação para
tampar garrafas de vinho. Antes de serem usadas, devem ser
conservadas em embalagens fechadas, com dióxido de enxofre.
O diâmetro das rolhas é maior que o diâmetro da boca da garrafa para
permitir uma boa vedação, de modo que necessitam ser comprimidas
para a introdução na garrafa. Existem vários tipos de rolhas para vinhos
tranqüilos. Para espumantes, as rolhas são de um só tipo, específicas
para o tipo de garrafa utilizado e para a pressão que devem suportar.
1.21. Envelhecimento em garrafa
Na garrafa, o vinho deixa de estar sob um ambiente oxidante e passa a
estar sob um ambiente redutor. Nessas condições, desenvolve o aroma
terciário, ou de envelhecimento. Este aroma, por ser bastante complexo
e sentido na degustação buco-nasal, é denominado buquê. Com o
tempo a matéria corante muda paulatinamente de cor, passando de um
vermelho-violeta a um vermelho-amarronado, com reflexos alaranjados.
Esta mudança é o resultado visível de uma série de reações químicas
naturais e é tanto mais lenta quanto maior for a longevidade do vinho.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 56
O tempo de envelhecimento dos vinhos em garrafa é determinado pelo
potencial de cada vinho, variando de alguns meses a vários anos. Todos
os vinhos apresentam um ponto ótimo de envelhecimento a partir do
qual a qualidade diminui.
2. Elaboração de vinhos
espumantes
2.1. Espumantes tradicionais
São aqueles obtidos após duas fermentações. A primeira é uma
fermentação normal de uvas não aromáticas (Chardonnay, Riesling
Itálico, Pinot Noir, etc.), executada para obter-se um vinho tranqüilo,
normalmente branco, denominado vinho base. A segunda pode ser
realizada de duas formas: na própria garrafa (método champenoise ou
tradicional) ou em grandes recipientes resistentes à pressão,
denominados autoclaves (método Charmat).
Cada forma tem sua seqüência de procedimentos, que podem ser assim
resumidos: clarificação do vinho base, adição de açúcar e leveduras
selecionadas, realização da segunda fermentação alcoólica em ambiente
hermético (para evitar o escapamento do gás carbônico), filtração,
correções finais (SO2 e açúcar) e engarrafamento.
No sistema champenoise, o engarrafamento é precedido da colocação
das garrafas em estruturas inclinadas chamadas pupitres. Nessas
estruturas, um movimento giratório das garrafas, executado diariamente
manual ou mecanicamente, conduz as borras de fermentação ao bico da
garrafa. Os bicos das garrafas são então resfriados e as mesmas são
abertas. No processo, a borra é expelida, pela ação da pressão do gás
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 57
carbônico. A correção final de açúcar é feita pela adição de licor,
denominado licor de expedição, e procede-se em seguida ao
arrolhamento definitivo.
2.2. Espumantes moscatéis
São obtidos através de uma única fermentação parcial do mosto de
uvas brancas aromáticas, do grupo dos moscatos. Quando o vinho
atingir pelo menos 7,5ºGL de álcool (nesse momento o mosto contém
ainda de 50 a 80 g/L de açúcar), o mesmo é resfriado, filtrado e
engarrafado. Está pronto o vinho espumante moscatel, um produto de
aroma delicado, apto a ser consumido ainda jovem. O método de
elaboração aqui descrito resumidamente chama-se método Asti, pois foi
concebido na região produtora de Asti, no norte italiano.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 58
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 59
Tópicos de Degustação de
Vinhos e Espumantes
_______________________________
Mauro Celso Zanus
Vocabulário
Abaixo são apresentados alguns termos para a descrição do aspecto,
aroma e sabor dos vinhos.
Exame visual
Lágrimas: observa-se a intensidade de formação junto à parede da taça.
Sua origem deve-se ao fenômeno denominado efeito Marangoni, de
tensão superficial em líquidos. A composição química das lágrimas é
principalmente água (e não álcool ou glicerina) – porém, sua formação é
tanto mais intensa quanto maior a quantidade de álcool no vinho.
Limpidez: vinhos defeituosos apresentam partículas em suspensão,
sendo denominados de turvos, opalescentes, velados. Aqueles de
melhor qualidade são límpidos, brilhantes, cristalinos. Ocasionalmente,
vinhos tintos de qualidade envelhecidos por longo tempo podem
apresentar partículas em suspensão – neste caso o emprego de um
decanter é fundamental.
Intensidade: a coloração pode ser leve, fraca, média ou intensa
(profunda).
Tonalidade: vinhos brancos podem variar de incolor ao dourado,
passando por um esverdeado, amarelo claro, palha. Vinhos tintos
podem se apresentar clarete, carmin, vermelho-rubi, violeta e púrpura.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 60
Vinhos tintos envelhecidos tendem a apresentar uma coloração menos
intensa, com reflexos de cor tijolo ou telha. A tonalidade depende do
grau de maturação das uvas, do processo de elaboração, da variedade e
da idade do vinho.
Exame olfativo
Intensidade: nulo (neutro), fraco, pobre, rico, aromático.
Característica: varietal (ver Tabela 2), especiarias, animal, vegetal,
essências, frutado, floral, tostado, químico.
Qualidade: aroma primário (associado à variedade de uva empregada);
aroma secundário (proveniente da fermentação); buquê (associado com
o envelhecimento).
Exame gustativo (paladar)
Acidez: baixa (chato), fresco, vivaz, acerbo, ácido, acídulo.
Doçura: seco, doce, licoroso (obs.: o etanol aumenta a percepção de
doçura proveniente do açúcar residual e também, por si só, apresenta
um certo grau de doçura).
Salgado: pouco ou nada perceptível (são poucos os vinhos capazes de
provocar a sensação de salgado).
Amargor: depende principalmente do conteúdo de taninos e compostos
fenólicos.
Persistência: fugaz, curta, média, prolongada.
Sensações tácteis
Adstringência (tanino): vazio, rugoso, áspero, adstringente, tânico.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 61
Gás carbônico: nulo, gaseificado, agulha.
Álcool: lavado, fraco, capitoso, cáustico.
Temperatura: gelado, frio, tépido, quente.
A técnica da degustação
Em degustações técnicas empregam-se taças de cristal padrão ISO,
para favorecer apercepção olfativa. Contra uma superfície luminosa
observa-se a presença de lágrimas, a limpidez, a intensidade de cor e a
tonalidade. A profundidade de cor pode ser avaliada através do exame
do disco (olhando a taça de cima para baixo contra uma superfície
branca). Observa-se, também, a presença de gás carbônico que,
principalmente em vinhos tintos, é considerado um defeito.
O exame olfativo é feito inicialmente com o copo em repouso, em
seguida com um leve movimento giratório e, posteriormente, com um
movimento giratório mais intenso. A agitação da taça favorece o
desprendimento das substâncias voláteis do líquido para a fase gasosa,
sobre a superfície.
Em boca, coloca-se uma quantidade adequada, distribuindo em todo o
palato. Atenta-se para o ataque (primeira impressão), a evolução do
sabor (com o aquecimento em boca o desprendimento dos aromas
muda), o equilíbrio álcool/acidez, as sensações tácteis da mucosa, a
persistência (tempo) e a sensação de final de boca (qualidade).
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 62
Características dos vinhos de
elevada qualidade
A qualidade de um vinho depende da harmonia de todos os seus
componentes. Além das substâncias voláteis que definem o aroma, são
fundamentais os compostos que participam na definição da cor, dos
gostos (ácido, doce, salgado, amargo) e das sensações tácteis. Mais do
que a concentração, é o balanço entre todos os componentes que
define se um vinho é de excelente qualidade ou apenas medíocre.
Muitas vezes um vinho aparenta ser agradável na primeira taça e,
posteriormente, se mostra enjoativo ou demasiado ácido ou
adstringente, ou com algum sabor desarmônico (ex.: dominância da
madeira).
Vinhos de elevada qualidade, independente das diferentes categorias ou
estilo, apresentam-se sem defeitos (odores estranhos), com elevada
nitidez e fineza de aroma e sabor, boa intensidade de paladar e
expressão varietal (vinhos varietais), harmônicos na relação
álcool/acidez e persistência média/alta. Os níveis de adstringência e
amargor são baixos; a acidez jamais é intensa. O gosto final é
agradável, sem defeitos e sem o domínio de uma única sensação.
Descrevendo vinhos varietais
Vinhos varietais de qualidade apresentam um aroma e sabor expressivos
– não, necessariamente, intensos – e devem apresentar características
peculiares de aroma que permitam distinguí-los dos demais vinhos
varietais.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 63
Sob o ponto de vista da bioquímica e da genética, faz bastante sentido
comparar o aroma dos vinhos com outros frutos ou vegetais.
A natureza, apesar da ampla heterogeneidade de tipos, se repete ao
sintetizar seus aromas. O metabolismo secundário das plantas,
responsável pela grande quantidade de produtos naturais e essências no
reino vegetal, não é tão diverso quanto se pensa. Muitas rotas
metabólicas são comuns a diferentes grupos de plantas. Assim, a rota
metabólica responsável pela formação de compostos terpênicos,
presente nos frutos cítricos (laranja, limão, pomelos), não difere em
essência daquela presente nas variedades de uva do tipo moscatel ou
Riesling Itálico. Pequenas variações na configuração das moléculas
deste grupo, podem, no entanto, determinar uma diferente
característica aromática.
Porém, não é somente a genética que controla a qualidade e quantidade
dos aromas. A intensidade e diversidade destas substâncias também
depende da localização do vinhedo, do grau de maturação atingido pelos
frutos (determinado pelas condições climáticas e de cultivo do vinhedo),
do processo de vinificação empregado e das condições de conservação
e da idade dos vinhos.
Para descrever os aromas e sabores de uma maneira mais objetiva,
apresentamos como caráter sugestivo alguns descritores que
eventualmente aparecem nos vinhos varietais. Com um pouco de
atenção, você poderá encontrar muitas outras associações.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 64
Tabela 2. Descritores sensoriais para vinhos varietais.
Vinhos varietais brancos:
Chardonnay: maçã verde, melão, pêssego, amêndoas, abacaxi, pêra, frutos
cítricos, tabaco, manteiga (malolática). Quando em contato com carvalho:
tostado, baunilha, caramelo, côco, cravo-da-índia.
Chenin Blanc: goiaba, damasco (apricot), abacaxi, maçã, camélia.
Gewürztraminer: citronela, especiarias (cravo-da-índia), gerânio, rosas, papaia,
pomelo, lichia.
Moscatos: floral, frutos cítricos, papaia, jambo.
Pinot Gris/Grigio: frutado, queijo romano.
Riesling Itálico: limão, tangerina, casca de laranja, flores brancas, carambola.
Riesling Renano: rosas, pinus, frutado, limão, jasmim, abacaxi.
Sauvignon Blanc: pimentão verde, aspargos, floral, herbáceo, maracujá,
pomelo, pêra, arruda.
Sémillon: figo, melão, tabaco.
Viognier: pêssego, damasco, casca de limão ou laranja.
Vinhos varietais tintos:
Cabernet Franc: frutos vermelhos (amoras, cereja, ameixas), pimentão-verde
(ocasional).
Cabernet Sauvignon: cassis, pimentão verde, eucalipto, amora preta,
framboesa, azeitona preta, carvalho, fumo.
Gamay: framboesa, banana (associado ao processo de maceração carbônica).
Merlot: cassis, ameixa, eucalipto, anis, fumo, chocolate, café, azeitona preta,
amora preta.
Nebbiolo: violeta, rosa, trufas, menta, eucalipto.
Pinot Noir: cereja, framboesa, menta, violeta, tomate maduro.
Syrah/Shiraz: violeta, geléia de amoras ou framboesa, pimenta preta.
Tannat: vegetal, champignon, amoras, framboesa, cereja, hortelã, eucalipto,
pinus, marmelo, damasco, figos secos, couro (animal), chocolate.
Tempranillo: frutas vermelhas (escuras) incenso, geléia de amoras ou
framboesa, trufas, chá-preto.
Touriga Nacional: cereja, amora, frutas silvestres, passas de uva.
Zinfandel: framboesa, geléia de amoras ou framboesa, pimenta preta, uva
passa, ameixa, café.
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 65
A degustação dos espumantes
Espumantes tipo Champanhe (método tradicional ou Charmat)
Exame visual: limpidez, tonalidade, efervescência, coloração e
quantidade de espuma, tamanho de borbulha, colar. Um espumante de
qualidade apresenta uma moderada efervescência, formando uma
espuma delicada. Nas bordas da taça forma-se um colar de espuma, que
apresenta boa persistência graças à constante emissão de borbulhas
provenientes da base e da lateral da taça. As borbulhas são de tamanho
pequeno e persistentes ao longo do tempo.
Atenção: o desprendimento de borbulhas é extremamente dependente
da qualidade da taça e da presença de microscópicas partículas de
poeira que funcionam como núcleos de inicialização de borbulhas.
Resíduos de detergentes nas paredes do cristal também prejudicam
enormemente a formação das borbulhas. Caso um espumante não
apresente boa efervescência, verifique a presença de gás carbônico pelo
paladar, através do desprendimento do gás em boca. Se houver uma
liberação intensa de gás (pequenas explosões) o problema é da taça,
não da qualidade do espumante.
Olfativo: intensidade, nitidez, fineza, complexidade, caráter varietal,
odores indesejáveis.
Gustativo (paladar): intensidade (expressão de sabor), desprendimento
de gás carbônico em boca (explosão), nitidez, acidez (frescor), fineza,
amargor, complexidade, persistência.
Descritores (aroma e sabor): frutos cítricos, abacaxi, pêssego, melão,
maçã verde, maçã cozida, frutado (do Pinot Noir ou variedades tintas),
Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos 66
levedura, pão, pão tostado, baunilha, chá-preto, feno seco, caramelo,
uvas passas, manteiga, amêndoa, café, fumaça, mel, couro.
Moscatéis Espumantes
Exame visual: ocorre uma maior efervescência e formação de espuma
do que em vinhos espumantes tipo champanha. A cor da espuma é
predominantemente branca.
Exame gustativo: frescor (acidez),

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