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28.Pancreatite Aguda (1)

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PANCREATITE AGUDA
Dr. Osvaldo José Luporini
A Pancreatite Aguda (PA) é um processo inflamatório de aparecimento súbito (agudo) e de etiologia variada, geralmente acompanhado de comprometimento sistêmico. Conceitua-se pancreatite aguda como aquela caracterizada, pela possibilidade de restituição anátomo-patológica do pâncreas e recuperação clínica e bioquímica do paciente, se a causa da agressão à glândula for removida. 
O evento que dá início ao processo está relacionado a uma agressão direta da glândula, geralmente por deficiência na drenagem e escoamento do suco pancreático. Ocorre, uma auto-digestão da glândula pelas enzimas pancreáticas. Alguns autores acreditam que, uma vez deflagrado o processo de autólise pancreática, a evolução da pancreatite (se leve ou severa) já está pré-determinada.
Os critérios de severidade incluem a presença de insuficiência orgânica (choque, insuficiência pulmonar e insuficiência renal) ou a presença de complicações locais (especialmente necrose pancreática). Nestas circunstâncias, a evolução natural (quer na modalidade edematosa, intersticial ou necrosante) faz-se para a cura ou, nas formas graves, para a morte.
ETIOLOGIA/FISIOPATOLOGIA
A impactação de cálculos biliares é ainda a causa mais comum de pancreatite aguda. Outras condições que provocam a obstrução da ampola são: tumor ampular, tumor pancreático e ascaridíase. O mecanismo proposto consiste no refluxo de bile para o interior do ducto pancreático, desencadeando a autodigestão pancreática. O alcoolismo é outra causa comum de PA; o álcool pode atuar aumentando a síntese de enzimas responsáveis pelo processo inflamatório, com lesão tóxica direta do etanol e formação de cilindros proteináceos que obstruem os dúctulos. A hiperlipidemia é responsável por PA sobretudo em pacientes diabéticos mal-controlados e em alcoolistas; acredita-se que a lipase pancreática metabolize triglicérides em ácidos graxos livres, nocivos ao tecido pancreático. A hipercalcemia é causa pouco comum de PA, sendo uma complicação rara em pacientes portadores de hiperparatireoidismo; o mecanismo é desconhecido. Outras causas de PA são descritas no quadro abaixo:
PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA
A incidência anual da pancreatite aguda é de quase 10 casos por 100.000 habitantes na população adulta. As manifestações iniciais e as exacerbações da pancreatite crônica podem ser indistingüíveis das crises de pancreatite aguda e devem ser tratadas como tais.
A pancreatite aguda biliar é mais comum no sexo feminino (2:1), em obesos e na faixa etária entre 50 a 70 anos, devido a características inerentes da doença litiásica biliar em geral.
DIAGNÓSTICO
Diagnóstico clínico: Quase todos os pacientes com pancreatite aguda apresentam dor abdominal, que geralmente se localiza no epigástrio, irradiando-se para o dorso (dor em “faixa”) em aproximadamente metade dos casos.
Diagnóstico diferencial: isquemia ou infarto mesentérico, úlcera gástrica ou duodenal perfurada, obstrução intestinal e gravidez ectópica rota.
Recursos auxiliares:
Laboratório: Leucocitose e hiperglicemia são alterações comuns na PA, refletindo o grau de inflamação sistêmica. Aumento dos valores de uréia e creatinina podem ocorrer devido insuficiência pré-renal (hipovolemia). Aumento da fosfatase alcalina e bilirrubinas sugerem pancreatite biliar. A amilase pancreática costuma elevar-se no primeiro dia e mantém-se elevada por 7-10 dias. A amilase pode estar normal em casos de pancreatite crônica agudizada. Na PA a amilase pode elevar-se em três vezes ou mais o limite da normalidade (>400UI/L). A lipase pancreática também se eleva na PA, porém permanece por mais tempo elevada que a amilase (até 15 dias). Apresenta uma sensibilidade igual à da amilase (85%), porém uma especificidade maior (80%). 
Imagem: A radiografia simples de abdômen é sempre um importante exame a ser pedido nos quadros de abdome agudo. A PA pode determinar uma série de alterações no RX:
Dilatação de alças;
Íleo localizado (alça sentinela);
Aumento da curvatura duodenal (aumento da cabeça do pâncreas);
A ultrassonografia de abdômen pode ser utilizada no diagnóstico de PA, entretanto é um método de baixa sensibilidade para a detecção de patologias pancreáticas devido à interposição de alças repletas de gás. 
A tomografia computadorizada com contraste é um excelente exame para avaliação de pacientes com PA moderada ou grave, podendo não evidenciar modificações em 20% dos casos de PA leve. Tem alta sensibilidade e especificidade e pode esclarecer as dúvidas diagnósticas. O principal uso da TC, entretanto, baseia-se na avaliação do prognóstico, já que evidencia a presença de necrose no tecido pancreático e outras complicações da PA, como os pseudocistos.
PROGNÓSTICO
Os preditores precoces de severidade nas 48 horas iniciais de hospitalização servem como primeiro aviso de que é provável ser um episódio severo (Critérios de Ranson); o Escore de Balthazar correlaciona os achados da Tomografia Computadorizada com a gravidade da pancreatite:
O escore APACHE II é outro método estudado para estimar o prognóstico, usando critérios que levam em conta diversas funções orgânicas, totalizando 12 variáveis fisiológicas (respiratória, renal, circulatória, cerebral, etc). Sua interpretação não é simples e deve ser abreviada pelo cálculo em sistema específico.
CONDUTA DO SERVIÇO
Nas pancreatites leves, o tratamento clínico geralmente é suficiente. A tomografia computadorizada (TC) será solicitada conforme necessidade. Na presença de evidências de vigência de obstrução da via biliar, a descompressão endoscópica precoce está indicada. Durante a primeira semana de internação, febre e leucometria alterada podem estar relacionadas à Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS) e antibioticoterapia profilática não se faz necessária. Descontaminação colônica pode diminuir a chance de contaminação da necrose pancreática por translocação bacteriana. Após a primeira semana de evolução ou em caso de piora clínica ou laboratorial evidente, novo exame de imagem deverá ser solicitado (TC). Antibioticoterapia poderá ser iniciada nesse momento se houver deterioração de parâmetros clínicos e/ou laboratoriais. Caso haja alguma coleção pela TC, esta deverá ser puncionada em ambiente asséptico e o material enviado para bacterioscopia e cultura. Caso a bacterioscopia seja positiva, o paciente passa a ter indicação cirúrgica mandatória. O planejamento terapêutico é resumido no quadro abaixo:
TÉCNICA CIRÚRGICA
Das muitas técnicas propostas, a necrosectomia da região pancreática e peripancreática,com drenagem ampla da cavidade pode trazer benefícios, caso haja indicação de necrose da glândula ou de coleção intraperitonial contaminada. A incisão de escolha é a subcostal bilateral.
As opções de realizar-se a MARSUPIALIZAÇÃO da retrocavidade dos epíplons ou da confecção de aberturas laterais no flanco esquerdo para drenagem dependerão do aspecto individual do caso. Muitas vezes, reintervenções programadas serão necessárias, tendo em vista a progressão da necrose peripancreática. 
RESUMO ESQUEMÁTICO DE CONDUTA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Beckingham IJ, et al. ABC of diseases of liver, pancreas and biliary system. Acute pancreatitis. BMJ 2001; 322: 595
Dervenis C, et al. Evidence-based assessment of severity and management of acute pancreatitis. Br J Surg 2000; 87: 257
Abu-Zidan FM, et al. Severity of acute pancreatitis: a multivariate analysis of oxidative stress markers and modified Glasgow criteria. Br J Surg 2000; 87: 1019
Gumaste V. Prophylactic antibiotic therapy in the management of acute pancreatitis. J Clin Gastroenterol 2000; 31: 6
Doença do trato biliar
Alcoolismo-ingestão aguda
Obesidade e dietas gordurosas
Hiperlipidemia
Induzida por fármacos (corticóides, diuréticos, sulfonamidas, anti-convulsivantes)
Refluxo do conteúdo duodenal no ducto pancreático
Infecção (caxumba, hepatite B, CMV, herpes simples)
Hipercalcemia
Traumatismos
Isquemia pancreática
Neoplasia pancreática
Fibrose cística
Iatrogênica (CPER)
ETIOLOGIA
Ativação da tripsina e enzimas pancreática
Prejuízo da microcirculação pancreática
Possibilidade de progressão da pancreatite leve para uma necrosante severa
PATOGÊNESE
Critérios de Gravidade de Pancreatite Aguda segundo Ranson
Critérios da apresentação inicial:
Idade > 55 anos
Leucócitos > 16000/μL
Glicemia > 200 mg/dL
DHL sérico > 350 UI/L
TGO > 250 UI/dL
Critérios que se desenvolvem nas 48 horas iniciais:
Queda do Ht > 10%
Elevação da Creatinina sérica > 5 mg/dL
Ca+ sérico < 8 mg/dL 
PO2 arterial < 60 mmHg
Déficit de base > 4 mEq/L
Pancreatite não Biliar
Critérios da apresentação inicial:
Idade >70 anos
Leucócitos > 18000/μL
Glicemia > 220 mg/dL
DHL sérico > 250 UI/L
TGO > 250 UI/dL
Critérios que se desenvolvem nas 48 horas iniciais:
Queda do Ht > 10%
Elevação da Creatinina sérica > 2 mg/dL
Ca+ sérico < 8 mg/dL 
Seqüestro de líquido > 4 litros
Déficit de base > 4 mEq/L
Pancreatite Biliar
Mortalidade associada aos critérios:
< 3 sinais: 0,9%
3 a 4 sinais: 16%
5 a 6 sinais: 40%
>6 sinais: 100%
Classificação: Pancreatite leve: 0 – 2 sinais na admissão; Pancreatite grave: 3 ou mais sinais na admissão
Escore de Balthazar
índice de gravidade = grau da pancreatite + grau de necrose
Grau da Pancreatite
Normal: 0
Somente aumento pancreático: 1
Edema do pâncreas e gordura subjacente: 2
Uma coleção líquida: 3
Duas ou mais coleções líquidas: 4
Grau de necrose
Nenhuma: 0
Um terço do pâncreas: 2
Metade do órgão: 4
Mais da metade: 6
Índice de Gravidade
< 2 pontos: 4% morbidade e 0% de óbito;
3 a 6 pontos: 35% morbidade e 6% de óbito;
7 a 10 pontos: 90% morbidade e 17% de óbito
PLANEJAMENTO TERAPÊUTICO
Tratamento Clínico
Pancreatite Aguda Leve:
Jejum
SNG (apenas se vômitos freqüentes)
Hidratação endovenosa
Antieméticos
Analgesia (Antiespasmódicos e dipirona)
Antibiótico Profilático (por 24 horas; usar Cefalotina) apenas em:
Idosos
Imunossuprimidos
Esplenectomizados
Doenças debilitantes
Patologias associadas
Icterícia progressiva
Pancreatite Aguda Grave:
Jejum
SNG
Hidratação endovenosa
Antieméticos
Analgesia 
Monitorização
Acesso venoso Central (P.V.C.)
N.P.P. (se jejum > 6 dias)
Antibióticos (opções):
1ª - Ciprofloxacino + Metronidazol
2ª - Imipenen
3ª - Segundo resultados de cultura
Tratamento Invasivo
Colangio-Pancreatografia Endoscópica Retrógrada (C.P.R.E.) de urgência: se houver indícios de obstrução da via biliar (por elevação das enzimas canaliculares ou dilatação da via biliar ao Ultra-som).
TC com contraste
Tratamento Cirúrgico
(Formas Graves) Pacientes com piora progressiva e rápida do quadro clínico
Infecção confirmada em punção guiada por Tomografia Computadorizada.
Confirmação diagnóstica
USG abdomen
Critérios de Ranson
LEVE
(0 – 2)
Prognóstico
GRAVE
(3 ou mais)
Tratamento clínico
Identificação de sinais clínicos; 
Exame físico minucioso
Hemograma/enzimas específicas
Urina I
RX rotina de abdome agudo
ADMISSÃO DO PACIENTE
Tomografia Computadorizada
(Critérios de Balthazar)
Tratamento Clínico
Necrose > 40%
Suporte clínico
Antibioticoterapia
Tratamento Cirúrgico – Indicado geralmente na segunda semana de internação, por
Necrose infectada
Piora do estado geral