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AULA 3 COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA NO ENSINO DE LÍNGUAS Profª Helenice Ramires Jamur 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula vamos conversar sobre as diferentes interfaces digitais e como elas podem contribuir para o processo educativo de leitura e escrita. Provavelmente, o tema desta aula traz um elemento novo para o seu vocabulário docente, afinal, o que seriam estas interfaces digitais? Estaríamos apresentando uma ideia da área da tecnologia de informação ou do design e trazendo para a educação? De certa forma, podemos dizer que sim. Trata-se de uma temática das tecnologias digitais. Entenderemos por interfaces as representações gráficas das plataformas digitais. Você vai entender que já faz uso dessas interfaces há algum tempo, e verá o quanto é importante compreender a linguagem que elas trazem e como podem contribuir para suas aulas de línguas. Iniciaremos nossa conversa discutindo os novos suportes para leitura que esta era digital trouxe para nossa prática de leitura e escrita. Abordaremos as características das interfaces digitais, dos ambientes virtuais de aprendizagem e suas contribuições para o ensino de línguas. Também vamos refletir sobre o uso das redes sociais como recurso pedagógico para o ensino de língua materna ou estrangeira e traremos, além de alguns exemplos que deram certo, alguns desafios desse uso. No tema 3, vamos entender melhor as diferenças sensíveis entre ler e navegar; veremos como alguns autores entedem essas diferenças e o que isso significa na nossa prática docente. Em seguida, falaremos dos jogos digitais, discutindo os tipos de jogos e práticas possíveis diantes deles. Por fim, abordaremos alguns aspectos para o planejamento das aulas de línguas nessas interfaces digitais, discutindo características relevantes para a construção de um bom projeto que considere o uso dessa linguagem. Ficou animado(a)? CONTEXTUALIZANDO Uma prática comum das aulas de línguas é fazer a diferenciação entre a oralidade e a escrita. Você já deve ter feito com seus alunos o exercício de transpor um texto oral para o formato escrito (e o contrário também). Fazemos isso para demonstrar que cada gênero textual tem suas próprias características, pois queremos que entendam que a oralidade não é uma linguagem caótica, mas tem características próprias que, quando transcritas para a escrita, parecem não 3 fazer muito sentido, ao passo que, quando se ouve o mesmo texto, a percepção é de total clareza. Hoje, temos mais um elemento nesta discussão sobre gêneros textuais que não podemos deixar de lado: as interfaces digitais. Será que as práticas de leitura têm se modificado diante esses ambientes digitais? Ler um texto seria a mesma coisa que navegar por ele? É possível navegar por um texto impresso? É sobre essas questões que precisamos discutir, ou nossas aulas correm o risco de estarem presas às gramáticas do século passado, deixando de lado questões mais pertinentes deste século. Afinal, o que mudou na língua escrita com as novas tecnologias digitais? Para ilustrar essa conversa, vou contar uma história verídica sobre uma senhora (chamada aqui de Marie). Marie sempre foi uma pessoa identificada pelos seus familiares como à frente de seu tempo. Assim que surgiu a possibilidade de pagar as contas por fax, ela o fez. Depois, começou a usar internet banking quando ninguém ainda confiava nesse sistema. A internet ainda era discada e ela já comprava produtos por lojas virtuais e consultava receitas de comidas em sites especializados. Hoje, Marie já compra passagens aéreas, reserva hotéis e está nas principais redes sociais utilizadas via web. Recentemente, Marie ganhou um celular de última geração, instalou um app (aplicativo) conhecido para mensagens instantâneas e... Sabe o que ela disse sobre essa experiência? – Que negócio complicado! Como você explicaria essa situação? Será que há algo tão diferente que fez Marie se assustar com o recurso? A nova interface digital teria confundido Marie? Veremos que alguns autores utilizam o termo “grámatica das interfaces digitais”, defendendo que, ao se deparar com uma nova estrutura digital, o leitor teria de compreender um novo padrão e regras próprias daquela composição gráfica para, então, fazer uso dela com facilidade. Fique tranquilo, Marie já aprendeu a usar o aplicativo. Ela já envia emoticons e fotos das suas viagens em tempo real, apropriou-se da gramática daquele sistema e fazer lives passou a ser parte do seu cotidiano. 4 TEMA 1 – AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM (AVAs) NO ENSINO PRESENCIAL E A DISTÂNCIA Certamente, esse é um tema muito amplo e não teríamos como analisar em profundidade cada boa prática ou todas as pesquisas científicas sobre o assunto. Nosso objetivo aqui será apenas trazer dois aspectos principais sobre os AVAs que considero essenciais para o trabalho docente no ensino de línguas: as principais caracterísicas e recursos dessas plataformas e os possíveis usos para as nossas aulas. Os ambientes virtuais de aprendizagem nasceram na educação a distância. Seus primeiros modelos se espelhavam nos métodos tradicionais e presenciais de ensino, ou seja, apenas tinham espaços para transmissão de conteúdos, sem muitas oportunidades para diálogo ou contribuições dos alunos. Ainda assim, dependiam do acesso e do interesse dos alunos em realizar seus estudos, portanto, embora tivessem recebido críticas por reproduzirem a passividade dos alunos diante das aulas presenciais, não eram espaços completamente “bancários” – relembrando a crítica de Freire (1996) para essa proposta educacional, que se pauta na mera “transmissão” de conteúdo. Com o tempo, esses ambientes deixaram de ser apenas um local para postagem de materiais didáticos e começaram a considerar o processo interativo de ensino e aprendizagem, abrindo espaços para a troca entre os alunos, postagens e contribuições. Hoje, já falamos em ambientes personalizáveis, que sugerem automaticamente novas leituras e exercícios conforme os interesses e/ou dificuldades do aluno. Também já são computadas as horas de estudos e tempo que passam em cada conteúdo, quantidade de interações nas aulas, resultados nas avaliações. Toda essa informação contribui para o planejamento das aulas, o acompanhamento individual dos alunos e a avaliação geral do desempenho do próprio aluno. Já é possível verificar se as questões avaliativas foram bem elaboradas, uma vez que esses ambientes podem trazer estatísticas sobre o resultado de cada questão, informando quantos acertos e erros e quais as alterativas mais marcadas em provas objetivas, por exemplo. Sim, os sistemas estão cada vez mais sofisticados. Mas por que estou trazendo essas informações a você? 5 Os AVAs, além de representarem o principal recurso para mediação da aprendizagem na educação a distância, também têm sido utilizados pelo ensino presencial com muito sucesso, e é nesse aspecto que as modalidades se misturam e se fundem, transformando as aulas presenciais em propostas híbridas. As aulas não ficam mais restritas ao ambiente físico da sala de aula, pois a discussão, o estudo e a comunicação continuam nos ambientes especialmente criados para esse fim. Portanto, se você ainda não sabe por onde começar, vamos falar sobre esses ambientes, os quais estão disponíveis até mesmo gratuitamente. Basta pesquisar e você encontrará algumas boas possibilidades para apoiar suas aulas; além disso, verá que até alunos mais tímidos nas aulas presenciais poderão ser os mais interativos nos momentos a distância. Será uma oportunidade de conhecer uma nova forma de trabalhar, na qual a troca poderá ser, finalmente, o elemento fundamental. Como já vimos, os AVAs foram evoluindo rapidamente e se difundindo até mesmo no ensino presencial. Mas o que caracteriza um ambiente virtual de aprendizagem?São plataformas com diferentes recursos que visam a troca e a comunicação entre professores e alunos. Entre os principais recursos, podemos selecionar as seguintes categorias: Ferramentas para interação: fórum, chat, mensagens privadas, wikis, videoconferências. Repositório de documentos: materiais didáticos, postagens de trabalhos. Ferramentas de gestão: desempenhos dos alunos, resultados das avaliações, agendamentos. Considero a primeira desta lista de categorias como a mais importante de qualquer ambiente educativo, seja digital ou não, uma vez que será pela interação que a construção do conhecimento acontecerá. Veja o que Belloni (2008, p. 45), citando Paul (1990), diz sobre o que ela chama de ”sistemas ensinantes”: O primeiro grande desafio a ser enfrentado pelas instituições provedoras de educação aberta e a distância refere-se, portanto, mais a questões de ordem socioafetiva do que propriamente a conteúdos ou métodos de cursos; mais estratégias de contato e interação com os estudantes do que sistemas de avaliação e de produção de materiais. (grifo meu) Diante disso, é importante salientar que esses recursos poderão dar o tom da aula. A partir das discussões e produções dos alunos nesses recursos de 6 interação poderão ser implementadas novas atividades, práticas ou debates. Vamos ver algumas dessas ferramentas e seus possíveis usos? Acompanhe abaixo: Fóruns – Recurso para promover o debate; logo, é essencial que sejam apresentadas situações que demandem um posicionamento crítico dos alunos. Não basta apenas solicitar nessa ferramenta uma opinião ou definição de um termo, é preciso fomentar a polêmica que provocará a busca e o aprofundamento de todos que entrarem na conversa. Além disso, o papel do professor como mediador nos fóruns é de manter o bom relacionamento entre os alunos e oferecer feedbacks durante as participações. Chat – São os famosos “bate-papos”. Para as aulas de língua portuguesa, vale muito para debater a linguagem que é própria da ferramenta, com abreviaturas e recursos que substituem certas expressões da oralidade. Nas aulas de língua estrangeira pode-se fazer um paralelo com as características da língua portuguesa e ainda exercitar a escrita e a argumentação. Mas não se esqueça de organizar esses momentos previamente; sempre é bom fazer um teste antes para não correr o risco de ter pouca participação. Videoconferência – Quer trabalhar a oralidade, pronúncia ou apenas solicitar um trabalho que explore a linguagem do vídeo? Use e abuse desse recurso. Contudo, assim como o chat, um teste prévio é obrigatório. Trata- se de uma ferramenta enriquecedora que depende de uma boa conexão de todos os envolvidos, o que nem todo AVA possui. Hoje é possível fazer vídeos a partir dos diversos aplicativos disponíveis. Independentemente do recurso ou da ferramenta em si, é preciso sempre estudar este recurso/ferramenta, pesquisar boas práticas e estar atento ao objetivo da atividade proposta, a qual deve sempre ter um sentido muito claro para não ser um momento desperdiçado. Como pode se tratar de uma nova interface para quem está começando a utilizá-la, lembre-se de fazer uma primeira aula explicando cada recurso e pedindo atividades simples que possam exemplificar o uso adequado, assim você evita cotratempos durante o precurso. Cuidado ao supor que estudantes que já fazem uso de outros sites estejam habilitados a acessar a ferramenta, pois pode não ser tão intuitivo assim, mesmo nos casos de ambientes muito bem planejados. 7 Ficou animado(a) para utilizar o AVA nas suas aulas? Experimente pesquisar sobre algumas redes sociais para professores e alunos disponíveis gratuitamente na web, estude as melhores possibilidades para suas aulas e inove sempre. TEMA 2 – USO DE REDES SOCIAIS PARA O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA E ESTRANGEIRA Você já deve ter conhecimento de colegas que optaram pelo uso das redes sociais como se fossem ambientes de aprendizagem. Após nossas discussões, talvez você esteja pensando que seria uma ótima opção, já que grande parte das funções dos AVAs é encontrada nas redes sociais digitais. (Estou inserindo “digitais” no termo “redes sociais” para lembrar que redes sociais não são exclusividade do meio digital. Os sociólogos há muito tempo nos lembram que estamos inseridos em redes sociais ao longo da vida em sociedade, e as redes sociais digitais trazem esse conceito para a web, além de apresentar recursos de interação que nos aproximam até mesmo de grupos geograficamente distantes.) Há diferentes estudos que fazem exatamente essa defesa, afinal, se os alunos já frequentam as redes sociais, seria uma forma de trabalhar em uma interface amplamente conhecida pelos estudantes e ganhar a atenção desejada. Mas será tão simples assim? De fato, o trabalho educativo com os recursos desenvolvidos para outras finalidades não é de agora. Por exemplo, além dos livros didáticos, utilizamos em nossas aulas outros livros e materiais, como revistas, jornais; também promovemos visitas a locais que não são espaços exclusivos da escola, como parques, museus e teatros. Da mesma forma, podemos e devemos frequentar outros espaços digitais e utilizar o que é mais relevante desses ambientes. Quer um exemplo interessante? Pesquise o caso do professor de história que utilizou o Facebook para ensinar sobre o Renascimento. Você verá que foi uma brilhante ideia que recebeu participação ativa dos estudantes. Como esse, há outros relatos de sucesso, mas será necessário ter atenção a alguns cuidados que vamos listar a seguir: 1. Alguns alunos podem não ter acesso, portanto, cuidado com atividades promovidas exclusivamente nessas redes, a fim de evitar a exclusão de alguns alunos. Diferentemente dos AVA, nos quais o acesso é dado pela 8 instituição ou pelo professor, as redes sociais são opcionais; desse modo, ao preparar algo para ser desenvolvido nestas condições, lembre-se de questionar ao grupo se todos têm acesso, caso contrário, será necessária uma adaptação na proposta. 2. O fantasma da dispersão – Sempre nos persegue a possibilidade de que alguns alunos podem não trabalhar na missão a eles atribuída como desejaríamos, mas uma boa dica é a criação de algumas regras para o trabalho nas redes, e muita mediação. O trabalho não pode acontecer solitariamente, deve haver troca entre os estudantes, e entre estudantes e docente permanentemente. 3. Os alunos vão me adicionar – Isso é quase certo. Os alunos vão adicionar o professor, fazendo o pedido de conexão com ele; aceitá-los ou não deve ser uma escolha do docente. Alguns colegas montam um perfil somente para interação com alunos, o que tem funcionado bem quando o perfil pessoal não é adequado para ser dividido com a turma. Contudo, se eu particularmente penso que pode ser um problema adicionar os alunos no meu perfil pessoal, há um contraponto: Se posto apenas aquilo que pode ser visualizado por qualquer pessoa na rede, qual o problema? Só está na rede aquilo que publicamos. Também verifique se a escola ou sistema de ensino ao qual você está vinculado não possui regras próprias. Há relatos de locais que proíbem esse vínculo por redes sociais. Sugiro que agora você faça uma pesquisa sobre o uso das redes sociais como suporte e ferramenta para o ensino de línguas e busque as melhores ideias para suas aulas. Talvez esteja se perguntando se é mesmo necessário ter um AVA. Essa resposta vai depender da sua prática. Caso deseje dados para realizar a gestão das aulas, pretenda fazer avaliações formais ou tenha um grupo grande de alunos, será primordial o uso de um AVA. Aliás, em grandes instituições, o AVA precisa inclusive estar perfeitamente integrado com os sistemas de gestão acadêmica para os quais as notas e outros dados dos alunos são enviados, portanto, você terá de verificarem que situação se encaixa a sua realidade. TEMA 3 – LEITURA E NAVEGAÇÃO: DISTÂNCIAS E APROXIMAÇÕES Se estamos falando de novas plataformas para o processo educativo, precisamos discutir as práticas de leitura nesses novos ambientes de mediação. 9 Iniciei esta aula questionando sobre leitura e navegação: Seriam a mesma coisa em diferentes suportes ou é possível verificar alguma diferença? Neste ponto, vamos primeiro discutir o papel das interfaces gráficas. Para isso, é válido citar a pesquisa da Novais (2012, p. 12) que demonstrou a complexidade que envolve o uso de interfaces digitais na identificação de signos próprios dessas novas plataformas. A autora diz que “As interfaces gráficas nos permitem usar o computador sem a necessidade de conhecer os códigos e os processos digitais mais complexos”. Em outras palavras, não fossem pelas estruturas gráficas criadas por profissionais de web design, não seria possível que fizéssemos a leitura nesse meio digital, porque seriam os códigos que estão por trás das interfaces a serem lidos, e não a visualização agradável com a qual nos deparamos, repleta de botões, figuras e barras de rolagem. É exatamente por isso que, além de habilidades com a leitura, ao se deparar com um texto digital, é preciso acessar algumas outras habilidades de navegação próprias da web: Cada leitura é única porque cada leitor é único, com suas experiências e expectativas. Os leitores precisam buscar estratégias para entender e dar sentido à atividade que estão realizando no computador, acionando as instruções e marcas deixadas pelos autores e acessando seus sistemas de conhecimento, de crenças e de culturas. Essa é, talvez, a maior dificuldade dos usuários: buscar referências de outras práticas de leitura e de escrita. (Novais, 2012, p. 14) Diante disso, é inegável que cada leitor terá desafios próprios para fazer a leitura no meio digital, isto é, não terá apenas de identificar as pistas deixadas pelo autor do texto, mas também terá de se deparar com as escolhas de design, cores, ícones, tamanho de fonte e toda a gama de opções que foram desenvolvidas apoiadas nos estudos do design. Tanto os estudos linguísticos quanto de design de interface têm perseguido respostas para sistemas amigáveis, intuitivos e de fácil diálogo. No entanto, Novais (2012) e Ribeiro (2008) alertam para a ausência de integração entre essas duas ciências que se isolam em si mesmas ao invés de trabalharem na intercessão de seus objetos de estudo. E a resposta àquela questão sobre as diferenças entre ler e navegar? São processos diferentes? Diante dessa discussão sobre os elementos que invadem o texto por meio das interfaces, o que você diria? Coscarelli (2016, p. 62) nos ajuda nessa questão de forma muito clara: “Embora a leitura online possa ser vista como um todo, a leitura na internet requer duas principais competências que se entrelaçam: a navegação e a leitura”. Diante 10 disso, fica definido que são processos diferentes, embora dependentes quando se trata de leitura no meio digital. Ao realizar uma leitura em um ambiente virtual, seja específico de aprendizagem ou não, o leitor precisa desenvolver as habilidades listadas por Azevedo (2013, p. 58 citado por Coscarelli, 2016), conforme apresentarei a seguir: Reconhecer e saber usar os mecanismos de busca e de busca avançada; Selecionar palavras-chave adequadas; Avaliar se a informação é pertinente ao objetivo da pesquisa (se o link é relevante); Reconhecer elementos (gráficos e linguísticos) que sinalizam a presença de um link; Localizar-se nas várias camadas de que se compõe um hipertexto; Inferir o conteúdo do link a partir do seu nó; Selecionar conteúdos pertinentes aos objetivos de leitura; Relacionar o link ao conteúdo ou endereço ao qual leva. (Azevedo 2013, p. 58 citado por Coscarelli, 2016) Essas seriam algumas habilidades básicas para a ampla navegação pela internet, porém, se formos avaliar como se dá a navegação por cada ambiente digital, veremos outros itens relacionados à parte visual e de localização das estruturas que os alunos deverão dominar amplamente para fazer uso de seus recursos. Portanto, ao trabalhar as práticas de leitura em ambientes digitais, é preciso incluir, no planejamento, o trabalho com essas novas competências necessárias para a leitura em meio digital. Embora possamos encontrar pontos de contato entre ler e navegar, já que se repetem as habilidades de leitura de um texto impresso, há a leitura de mensagens não verbais, além de recursos em multimídia que apoiam essa prática de leitura, trazendo um novo sentido ao texto e, muitas vezes, dando o sentido a ele. TEMA 4 – JOGOS DIGITAIS NO PROCESSO EDUCATIVO Você acha possível ensinar línguas por meio de jogos? Você já deve ter feito uso de algum recurso lúdico nas suas aulas, já elaborou cartas com imagens para trabalhar o vocabulário de língua estrangeira com os alunos, criou simulações ou até aproveitou um jogo de tabuleiro para ilustrar suas aulas. E um jogo digital? Sim, estou falando dos famosos games, aqueles que nossos alunos já conhecem dos momentos de entretenimento, que jogam no videogame ou no computador; eles conhecem cada regra, e até estudam sobre o jogo para passar 11 de uma fase para outra. Acha que fui longe demais? Então veja o que diz Mattar (2010): O aprendizado baseado em jogos digitais está fundamentado em duas premissas: (1) os aprendizes mudaram em diversos pontos essenciais; e (2) são de uma geração que experimentou profundamente enquanto crescia, pela primeira vez na história, uma forma radicalmente nova de jogar – computadores e videogames. Assistimos então a uma descontinuidade, inclusive na maneira como essas gerações aprendem. (Mattar, 2010, p. 29) Mattar (2010) defende a ideia de que as crianças e mesmo os adultos gostam de aprender, sempre gostaram, isso porque o gosto pelo aprendizado faz parte da natureza humana. Contudo, o modelo estagnado do ensino contemporâneo é pouco atrativo e motivador, ainda mais nesta cultura digital na qual nasceu a geração atual, imersa em jogos eletrônicos, computadores e celulares. Portanto, os games seriam uma excelente alternativa para trabalhos de experimentação e uma aprendizagem com significado para os alunos. Esse autor alega ainda que os jogos digitais conseguem ir além dos jogos tradicionais, porque têm uma capacidade de criar um mundo virtual no qual o jogador “mergulha” e descobre as regras, explorando os ambientes e colocando-se em uma postura até de cientista que levanta hipóteses, pesquisa e cria verdadeiras teses sobre a experiência do jogo. No entanto, nem sempre são jogos assim que encontramos quando buscamos jogos “educativos”. Na maioria das vezes, são meros jogos de tentativa e erro, seguindo uma concepção behaviorista de aprendizagem, isto é, se o aluno acertou uma resposta a uma pergunta (sem contextualização, sem significado, sem aplicação prática), são dados pontos a ele; se errou a resposta pré- programada, perdem-se os pontos, até que chega o fim do jogo. Esse tipo de jogo, assim como outros que seguem lógicas pouco interessantes para um processo educativo que objetive promover sujeitos críticos, talvez ajude apenas a ocupar um tempo livre; no entanto, para terem um sentido educativo, é essencial que tragam para o aluno experiências significativas. Como resolver isso? Podemos utilizar jogos que não tenham sido desenvolvidos para fins educativos? Para o ensino de línguas/memorização de vocabulário seriam válidas essas iniciativas de estímulo-resposta? Podemos dizer que, até certo ponto, sim, afinal, seria uma dentre várias estratégias para trabalhar com línguas. Mas, se você reparar nos jovens jogadores, verá que aprendem expressões da língua inglesa, por exemplo, por 12 meio de jogos sem que esse seja oobjetivo do jogo; é mais pelo desafio que exige a habilidade de pesquisa ou o levantamento de hipóteses que pelo contexto do jogo em si. Portanto, seria mais produtivo trabalhar com jogos que trouxessem à tona as principais habilidades deste século, como define Chris Dede (citado por Mattar, 2010, p. 53): [...] compreender e resolver situações complexas e novas colabora com uma equipe diversificada tanto cara a cara quanto a distância; e produzir conhecimento filtrando e sintetizando informações. Isso requer fluência em tecnologia da informação para colaboração, síntese de informações e tomada de decisões. As escolas de educação deveriam tornar esses tipos de experiências de aprendizagem centrais para a preparação dos professores. Diante disso, fazem-se necessárias reflexões amplas sobre os games não somente como recurso, mas como estratégia de ensino. Para isso, já existem plataformas dedicadas ao ensino por meio de jogos, o que possibilita a integração desse universo lúdico aos sérios ambientes de aprendizagem. Esse tema é bastante amplo, portanto, sugiro que, se estiver instigado a trabalhar com jogos para o ensino de línguas, busque aqueles que melhor se adaptam à sua realidade e que, de fato, tragam contribuições para as aulas. Assim como qualquer nova estratégia, é necessário estudar profundamente o que será trabalhado, caso contrário, o resultado poderá ser desastroso. TEMA 5 – O PLANEJAMENTO DAS AULAS DE LÍNGUAS NAS NOVAS INTERFACES DIGITAIS Em meio a tantos recursos e estratégias novas e diversificadas, talvez você esteja pensando em como organizar a sua aula com ambientes virtuais de aprendizagem, games e redes sociais. Acertei? Vamos pensar de forma prática nas configurações mais simples para fazer deste momento algo prazeroso e tranquilo. O primeiro passo é distribuir o tempo de curso que você terá com a turma: Será um mês, dois ou um semestre? Essa divisão é necessária para compor bem o tempo de cada atividade. A utilização de um AVA pode transformar o seu planejamento quando, por exemplo, você propõe uma atividade no primeiro dia de aula e ela vai sendo construída, com o seu acompanhamento, até o final do semestre, quando finalmente é feita a entrega ou apresentação dos resultados. Como qualquer planejamento, você deverá listar os objetivos de cada aula e, logo em seguida, as estratégias que pretende criar para alcançar tais objetivos. 13 É importante que esses objetivos, bem como as atividades de cada tópico que será abordado, sejam divididos com a turma, incluindo até mesmo as formas de avaliação de cada um dos conteúdos. Ainda que seja a produção de um trabalho bastante subjetivo, a própria postagem dele no ambiente poderá ser o seu critério para avaliação, por exemplo. Após a distribuição das atividades, existe uma etapa – cansativa, mas fundamental – para trabalhar com esses recursos: a organização dos materiais (textos, vídeos, animações) e a avaliação (enquetes, provas, trabalhos, produções). Dessa forma, apenas ficarão para o processo aqueles materiais específicos para as demandas da turma, aquele conteúdo que gerou mais dúvidas ou teve maior interesse. Como estamos falando de ambientes digitais, é preciso lembrar que os recursos próprios desse meio devem ser explorados, pois não faz sentido trabalhar meramente com texto se é possível fazer postagem de vídeos, de imagens e de outros recursos. Além disso, quando falamos de ensino de língua e estamos usando a linguagem digital, é necessário colocar em debate a própria linguagem utilizada. No caso das redes sociais, seja como apoio para uma conversação com alunos estrangeiros de outra instituição ou como principal plataforma, uma conversa prévia poderá esclarecer as regras das atividades e a certificação de que todos estão utilizando e têm familiaridade com a plataforma. Por fim, o uso dos games pode ser um grande desafio, mas sugiro que até os jogos preparados para puro entretenimento possam ser bons instrumentos para suas aulas. Basta que você encontre aquele que fará sentido naquele momento. FINALIZANDO Nesta aula, vimos algumas mudanças da era digital e como nossas aulas de línguas podem ser enriquecidas com todo esse debate. Estudamos os ambientes virtuais de aprendizagem como opções interessantes até mesmo para a modalidade de ensino presencial. Discutimos a possibilidade de uso das redes sociais digitais tendo em vista a familiaridade dos nossos alunos nesses espaços, além das trocas entre línguas que as redes possibilitam. Conversamos sobre as interfaces digitais e as diferenças entre leitura e navegação. Trouxemos importantes pesquisadores da linguística para entender 14 quais aspectos são comuns entre ler o texto impresso e ler o texto digital e quais as novas habilidades necessárias para a leitura em ambientes virtuais. Para finalizar, conferimos o uso dos games como recursos e estratégias de ensino de línguas, e ainda pensamos no planejamento das aulas com o uso de AVAs, games, aplicativos e redes sociais. Bastante desafiador, não é mesmo? Espero que tenha aproveitado e já tenha dado início às pesquisas sobre os temas pelos quais mais se interessou. Até breve! LEITURA COMPLEMENTAR Texto de abordagem teórica Acesse este artigo que apresenta as teorias da aprendizagem baseadas em games e estratégias de gamificação, e como elas podem ser incorporadas à educação. MATTAR, J.; NESTERIUK, S. Estratégias do Design de Games que podem ser incorporadas à Educação a Distância. RIED. Revista Iberoamericana de Educación a Distancia, Espanha, n. 19, 2016. Disponível em: <http://revistas.uned.es/index.php/ried/article/view/15680>. Acesso: 9 abr. 2018. Texto de abordagem prática Este artigo apresenta resultados de uma investigação qualitativa que observou as interações dos alunos durante atividades com jogos educativos nas aulas de língua inglesa. ARAÚJO, M. A. F. Percepções de uma professora e seus alunos sobre o uso de jogos nas aulas de LE/Inglês. In: ENCONTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUA ESTRANGEIRA – ENFOPLE, 12., 2016, Inhumas. Disponível em: <http://www.anais.ueg.br/index.php/enfople/article/viewFile/7658/5799>. Acesso: 9 abr. 2018. Saiba mais Confira esta notícia sobre o professor que usa o Facebook para ensinar história: http://www.redalyc.org/articulo.oa http://www.redalyc.org/articulo.oa 15 CARNEIRO, F. Professor de Recife recria linha do tempo do Facebook para ensinar história. UOL Tecnologia, São Paulo, 18 dez. 2013. Disponível em: <https://tecnologia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/12/18/professor-usa- timeline-do-facebook-para-ensinar-segunda-guerra- mundial.htm?cmpid=copiaecola>. Acesso: 9 abr. 2018. 16 REFERÊNCIAS BELLONI, M. L. Educação a distância. 5. ed. Campinas: Autores Associados, 2008. COELHO, I. M. W. S.; PINHEIRO, M. L. O. As contribuições do WhatsApp no ensino do espanhol: uma perspectiva de aprendizagem significativa e colaborativa. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 12, n. esp. 2, p. 1287-1312, ago. 2017. COSCARELLI, C. V. Tecnologias para aprender. 1. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2016. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. PIAGET, J. Pedagogia. Lisboa: Instituto Jean Piaget, 1998. PRIMO, A. Quão interativo é o hipertexto? Da interface potencial à escrita coletiva. Fronteiras: Estudos Midiáticos, São Leopoldo, v. 5, n. 2, p. 125-142, 2003. _____. 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