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UNIVERSIDADE FRANCISCANA - UFN UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE DIREITO DISCIPLINA DIREITO PENAL I Gabrielli da Costa; Kauany Coimbra; Márcia Barroso Kümmel; Rafaela Ferraz Suanez Teixeira. CAUSAS DE EXCLUSÃO DA TIPICIDADE Orientador: Profª. SANDRO LUIZ MEINERZ SANTA MARIA/RS 2019 CAUSAS DE EXCLUSÃO DA TIPICIDADE Gabrielli da Costa; Kauany Coimbra; Márcia Barroso Kümmel; Rafaela Ferraz Suanez Teixeira. INTRODUÇÃO Em uma primeira compreensão sobre as causas de exclusão da tipicidade, faz-se necessário definir o que seja conduta como o elemento número um que integra o fato típico. Conduta significa ação ou comportamento humano balisar para a definição teórica do nullum crimen sine conducta. Conforme Zaffaroni, Alagia e Slokar apud GRECO (2002), são afastados, dessa maneira, outros julgamentos ou avaliações que não o que está descrito na norma ou passível de ser apreciado normativamente, envolvendo algo que não seja uma ação, como cor, raça, credo, opiniões políticas ou filosóficas, entre outras designações, que não estão no círculo da tutela dos bens jurídicos selecionados pelo Direito Penal. Como resultado de toda a evolução do estudo penal para o finalismo, quando alcança o entendimento de conduta como ação ou omissão humana consciente, através de ação dolosa ou culposa, (sendo que não somente por um movimento físico e corpóreo analisado na doutrina tradicional), define a pessoa física dotada de personalidade como autora dos delitos comuns, atingindo um resultado, ao qual deu causa e previsto na tipicidade. O legislador apenas elegeu a pessoa jurídica como sujeito da ação penal no tocante aos crimes ambientais. A ação regida pela vontade é sempre uma ação final, isto é, dirigida à consecução de um fim. Se não houver vontade dirigida a uma finalidade qualquer, não se pode falar em conduta. De acordo com Zaffaroni (apud Rogerio Greco, pg). “A vontade implica sempre uma finalidade, porque não se concebe que haja vontade de nada ou vontade para nada; sempre a vontade é vontade de algo, quer dizer, sempre a vontade tem um conteúdo, que é uma finalidade.” Se o agente não atua dolosa ou culposamente, não existe ação. Isso pode acontecer quando o sujeito se vir impedido de atuar, como nos casos de força irresistível, por caso fortuito ou de força maior, também a coação física irresistível ou por movimentos reflexos e estados de inconsciência, como sonambulismo e hipnose. A conduta é afastada e some o elemento volitivo (vontade e consciência). 1. INADEQUAÇÃO TÍPICA Como é visto, o conceito analítico de crime que revela a construção de sua noção como uma composição de elementos. São o modelo onde o enquadramento deverá ocorrer para que se reconheça um agir como algo de relevância ante a construção do direito penal. Como afirma Rogerio Greco: “embora o crime seja insuscetível de fragmentação, pois que é um todo unitário, para efeitos de estudo, faz-se necessária a análise de cada uma de suas características ou elementos fundamentais”, ou seja, o fato típico, a antijuridicidade e a culpabilidade, para se falar em crime. O fato típico, conforme a teoria finalista é composto pelos seguintes elementos: conduta dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva, resultado, nexo causal e tipicidade (formal e material), derivados de estudos mais recentes que trouxeram o elemento volitivo para a análise dentro dele. 2. CONDUTAS PENALMENTE IRRELEVANTES 2.1. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR Para o autor Damásio de Jesus, há uma discussão a respeito da natureza jurídico-penal da força maior e também do caso fortuito como sendo excludentes da culpabilidade ou excludentes do nexo de causalidade. Em alguns ordenamentos, como o italiano, que incluem o caso fortuito e a força maior na questão da culpabilidade, cita Bettiol, o qual ensinava que a imprevisibilidade é o “que caracteriza o caso fortuito como acontecimento que acompanha ou que segue a ação de modo a determinar, conjuntamente com esta, um evento lesivo”. Desse modo, o caso fortuito excluiria a culpabilidade, uma vez que, faltando a previsibilidade do evento, desaparece a possibilidade de uma motivação diversa. Para esta visão, toda e qualquer ação lesiva de um bem juridicamente tutelado pode ser declarada não culpável, porque inexigível conduta diversa, no caso de ocorrer um desses dois institutos. Cezar Bittencourt, por sua vez, adota o entendimento de Francisco Assis Toledo, para quem a força maior exclui a própria conduta, enquanto o caso fortuito apresenta-se como excludente de culpabilidade. Assim, “na hipótese de força maior a punibilidade de um fato típico fica afastada diante da impossibilidade de evitar-se o resultado danoso, embora previsível. Na hipótese de caso fortuito, o fundamento da impunidade reside na imprevisibilidade do resultado, embora evitável, que é o mínimo exigível para configurar a culpa consciente”. Opostamente, outros autores, como Grispigni, embasados na teoria objetiva, observam que a verificação do fortuito se traduz em: “sem possibilidade de dúvida, em que um evento não pode juridicamente ser relacionado com uma conduta, que dele seja causa, pois no tocante a essa conduta ele se apresenta como um evento casual e imprevisível”. Segundo as lições de Zaffaroni, que bem definiu o instituto da força maior: “A força física absoluta pode ser proveniente da natureza ou da ação de um terceiro. Há força física proveniente da natureza quando um sujeito é arrastado pelo vento, por uma corrente de água, é empurrado por uma árvore que cai.” Se numa dessas hipóteses, como no caso daquele que foi arrastado pelo vento, o agente esbarra fortemente numa outra pessoa, causando-lhe lesões corporais, não podemos imputar-lhe o resultado causado a título de dolo ou culpa. Damásio entende que a circunstância imprevista, o caso fortuito, não exclui o nexo de causalidade, de modo que a afirmação de que o caso fortuito e a força maior rompem a relação causal não é correta: “esta existe ou não existe, sendo impossível ser extinta depois de sua ocorrência: se o agente está dirigindo um veículo quando há uma rotura da barra de direção, havendo atropelamento e morte de um terceiro, existiu o nexo causal”. Se A não estivesse dirigindo não ocorreria morte da vítima B. A solução, para este autor, segue a teoria de que o dolo e a culpa, de acordo com o finalismo, constituem elementos do tipo, integrando a conduta: esta só é típica quando dolosa ou culposa. Em consequência, quando interferem a força maior e o caso fortuito, não há crime por ausência de conduta dolosa ou culposa (primeiro elemento do fato típico). Fernando Capez também considera não haver crime na hipótese de caso fortuito e de força maior, os quais “excluem a própria conduta, por ausência de dolo ou culpa”. Concluindo, não havendo conduta dolosa ou culposa, não há conduta típica. Hoje, adotada a teoria da imputação objetiva, para a maior parte dos autores, o caso fortuito e a força maior devem ser considerados hipóteses de exclusão da tipicidade do fato. 2.2. HIPNOSE A ausência de conduta existente nos três casos de coação física absoluta, movimentos reflexos e estados de inconsciência, que por sua vez, divide-se em três hipóteses sendo elas: sonambulismo, embriaguez letárgica e hipnose, conforme o texto de Rogerio Greco são casos de total inconsciência e têm o condão de eliminar a conduta do agente. Nesta parte da pesquisa sobre a hipnose ou hipnotismo, investigou-se que tem seu campo de estudo de forma delimitada na psicologia e que, segundo Hippolyte Bernheim (1840-1919), “a hipnose pode se confundir com a sugestão, pois aquela nada mais seria senão o despertar da sugestibilidade, atividade normal do cérebro”. Para Jean-Martin Charcot (1825-1893): ”a hipnose não passava de um estado de histeria obtido artificialmente”.A conduta pode acontecer de forma involuntária, ou com consentimento do agente hipnotizado, o que vem sendo motivo muitas divergências doutrinárias sobre se no momento do fato a pessoa estaria hipnotizada ou não, ou, ainda, se estaria sofrendo somente por um induzimento do hipnotizador. E ainda, se de alguma forma vir a ser comprovado que a conduta foi culposa e que o agente não produziu resultado sozinho, se exclui a conduta pelo fato da inconsciência do agente. Nucci define o hipnotismo como “estado mental semelhante ao sono, provocado artificialmente por alguém”. (Nucci 2011, p. 207). Cabe também mencionar que a hipnose ou inconsciência do agente fica resguardada pelo ordenamento jurídico como excludente de ilicitude sempre que comprovada a involuntariedade da conduta e que não foi realizada de forma que o agente induzisse o resultado no final. Nesse ponto, Zaffaroni e Pierangeli (2011, p. 377 e 378) assim explicam: “Os pressupostos nos quais, não obstante deles participar um home, não há conduta, ou seja, de fatos humanos em que não há ações, por faltar a voluntariedade, são aqueles em que medeia uma força que provoca os movimentos sem o controle da vontade e uma força que impede a realização dos movimentos de conformidade com a vontade, bem assim também aqueles em que a pessoa se encontra em estado psíquico natural [...] que, no geral, são casos de inconsciência.” Se prevalecer a opinião acerca da existência da conduta por parte do agente, e se também constatado o estado de inconsciência pela questão de o agente estar totalmente hipnotizado, ainda se percebe muitas divergências quanto à hipnose, se induzida com ou sem consentimento do hipnotizado, resultando em diferentes consequências na avaliação do elemento volitivo. 2.3. SONAMBULISMO Seguindo na seara dos casos de total inconsciência que levam a anular a conduta como elementos do fato típico, tem-se o sonambulismo, um “sono patológico” que faz com que agente aja ou fale durante o sono tornando seus sentidos obtusos, o que acaba por se tornar uma excludente da tipicidade penal, pela falta do elemento de vontade e consciência. O doutrinador Guilherme de Souza Nucci cita em seu tratado de Direito Penal o caso que ocorreu em York, na Grã-Bretanha, em que um jovem de 22 anos, após sair com sua amiga, a convidou para ficar em sua casa oferecendo seu quarto enquanto ele dormiria na sala. Dias depois, a mulher foi à polícia reclamando ter sido acordada quando o jovem a estuprava. Ele alegou ao juiz não se lembrar do que aconteceu, relatando a presença de sonambulismo desde os 13 anos. A justiça, então, convocou um especialista, o qual atestou que o jovem era mesmo sonâmbulo, sendo esse o motivo pelo qual não recorda das coisas que fez quando está dormindo, desse modo logrando a absolvição. Para determinar a exclusão da tipicidade nos casos de sonambulismo, o agente não pode ter nenhuma consciência de tal ato, nem saber que pode causar perigo com suas atitudes, pois aplicando - se a teoria da actio libera in causa, se ação foi livre (se o sonâmbulo souber que já cometeu tal situação decorrente do sonambulismo e gerado dano a outra pessoa), deverá o agente ser responsabilizado pelos resultados dela decorrente. Ilustra a matéria a seguinte jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, de nº 70035154962, na oitava Câmara Criminal da Comarca de Lajeado. Tem-se a Apelação Crime envolvendo Atentado Violento ao Pudor, em que o Tribunal promoveu a manutenção do decreto condenatório frente ao recurso da defesa alegando cerceamento de defesa do réu, presença de sonambulismo e crise convulsiva. Os fatos foram: “No dia 03 de fevereiro de 2003, mediante violência presumida, em razão da idade do ofendido, menor de 14 anos, constrangeu seu filho a permitir que com ele praticasse ao libidinoso diverso da conjunção carnal, introduzindo seu dedo no ânus da vítima valendo-se de uma visita do filho à sua residência. Diante da situação, a vítima pôs-se a chorar copiosamente, fazendo com que seus tios ouvissem se deslocassem até o local, para verificar o que acontecia, momento em que o denunciado cessou sua prática abusiva”. Diante disso o réu apresentou que no momento de sua conduta estava em estado de sonambulismo, porém não foi configurado, considerando que o Laudo Psiquiátrico produzido pelo Instituto Psiquiátrico Forense foi conclusivo quanto à plena capacidade do réu de compreender o caráter ilícito e que inclusive o agente referiu que no dia do delito lembrava-se de tudo o que havia ocorrido, afastando por unanimidade o cerceamento de defesa.” O acórdão revela a manutenção do decreto condenatório, a consideração das provas existentes como suficientes para o julgamento de procedência do pedido condenatório deduzido na denúncia. Os relatos do menor ofendido e de sua genitora foram avaliados como firmes e seguros, corroborados pela prova testemunhal e por Laudo Psicológico, sendo o depoimento da vítima adquire extraordinário valor probatório em casos de investigação de cometimento de crimes contra a liberdade sexual. Portanto, para haver a exclusão da tipicidade aos casos de sonambulismo, o agente deve estar em estado de total inconsciência, devendo ser atestado através de laudo pericial. De acordo com Cezar Roberto Bitencourt, “quando ocorrer que as funções mentais não funcionarem adequadamente, estando em estado de inconsciência, que é incompatível com a vontade, sem esta não há ação”. 2.4. MOVIMENTOS REFLEXOS Seguindo a linha de raciocínio que para a caracterização da conduta são indispensáveis vontade e consciência, temos os movimentos reflexos como outra das reações motoras, secretórias ou fisiológicas, produzidas pela excitação de órgãos do corpo humano sem que se estabeleça controle ou existência de comando volitivo. Segundo Cezar Bitencourt, os movimentos reflexos são interações corpóreas ou a sua ausência, dirigidos pelo sistema nervoso, no qual o estímulo exterior é recebido pelos centros sensores e transmitido diretamente às demais terminações e órgãos, sem intervenção da vontade. É algo físico, que incide no mundo material, situações em que o organismo reage a determinados impulsos e, em virtude disso, podem gerar danos ou lesões. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, da Sexta Câmara da Comarca de Cruz Alta, nº 7004513539, envolvendo Roubo Impróprio. Trata-se de Apelação Criminal em que o roubo impróprio restou não caracterizado e obtida a absolvição do réu, com animus furandi não esclarecido. Acordaram os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo da defesa para absolver o réu Eliackim Lopes Murussi das acusações que lhe foram imputadas na denúncia. Nos autos consta que: “O agente ingressou na garagem de condomínio e foi surpreendido pelo vigilante do local, que mandou que se retirasse, momento em que o réu tentou investir contra o funcionário, mostrando-lhe uma faca, mas, diante da reação deste, fugiu, sem nada levar. Assim, não se sabe o que pretendia o acusado, não sendo a prova probatória para subtrair bens de terceiros, permanecendo inconteste o fato de tentar agredir o vigilante, porém, não se podendo afastar a possibilidade de que tal agir limitou-se a uma reação automática diante da presença do vigilante, portanto, por falta de prova probatória, já que não houve questionamentos ás testemunhas acerca da localização da faca. Segundo Guilherme de Souza Nucci, a título de exemplo é um motorista de um veículo é picado por uma vespa perto do olho, move-se bruscamente no volante por um instintivo de movimento de defesa causando um acidente, mas por seu movimento é reflexo devido pela dor originária da picada, não existiria conduta penalmente relevante, portanto trata-se de uma atitude involuntária, tornando-se o movimento reflexo uma excludenteda tipicidade”. Em uma decisão marcada pela existência de dúvidas que favoreceram o réu, foi considerado que este realmente tentou agredir o vigilante, porém, não se podendo afastar a possibilidade de que tal agir limitou-se a uma reação automática diante da presença do mesmo. Por questão de falta de provas suficientes e não se consumar a descoberta do paradeiro da faca, não existiria conduta penalmente relevante, considerando-se que o ato ocorreu por uma atitude involuntária e o movimento reflexo é considerado excludente da tipicidade. 2.5. COAÇÃO FÍSICA IRRESISTÍVEL A vontade é um dos elementos sem o qual o dolo não persiste, pois, junto com a consciência, forma sua estrutura. Nos casos de força física irresistível, aquele que causa o dano ou a lesão em terceira pessoa é apenas um instrumento nas mãos do agente coator. Este é coagido a acabar com a vida de outra pessoa, não atuando com vontade de matá-la. Quando falamos na força irresistível praticada por terceiros, ou seja, pelo homem, entramos na seara da coação física (vis absoluta), bem como quando o agente é jogado por uma terceira pessoa de encontro a objetos ou mesmo a outras pessoas, vindo com isso, respectivamente, a danificá- los ou a lesioná-las. Nessas hipóteses, o agente não responde pelos danos ou mesmo pelas lesões que vier a causar a outras pessoas. Greco, ao citar Zaffaroni, esclarece que, quando a ação provém de um terceiro, a ausência de ato só se dá quanto àquele que sofre a força física irresistível. Aquele que a exerce atua com vontade, é autor de uma conduta cuja tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade deverão ser investigadas. É o caso daquele que, depois de colocar o dedo do coagido no gatilho de uma arma de fogo, faz o movimento de disparo, puxando-lhe o dedo para trás e, com isso, causa a morte da vítima. A coação física afasta a própria conduta do agente, por ausência de dolo ou culpa. Já a situação muda no caso da coação irresistível e da obediência hierárquica, as quais foram previstas no art. 22 do Código Penal: “Art. 22. Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.” A coação mencionada no citado artigo acima é aquela de natureza moral (vis compulsiva), e não física (vis absoluta). No caso de coação moral irresistível, o coagido pratica, geralmente, um fato típico e antijurídico: o injusto penal por ele cometido é que não lhe poderá ser imputado, pois, em virtude da coação a que foi submetido, acaba por se configurar inexigibilidade de outra conduta. É o caso do pai que é obrigado a causar a morte de alguém, pois, do contrário, seu filho seria morto por sequestradores em cujas mãos estava, naquele instante. 3. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL O convívio em sociedade ocasiona riscos, e pode não haver interferência do Direito Penal, levando em consideração que esta sociedade deve viver de forma mais harmônica possível. Há exemplos de situações que são perigosas e trazem risco à sociedade, porém são socialmente adequadas como, por exemplo, o trânsito das grandes cidades que, na maioria das vezes, produz risco para as pessoas a todo instante. Transporte aéreo e as usinas atômicas também são exemplos de como a sociedade tem contato diariamente com questões que podem causar algum risco e que, porém, é algo socialmente adequado e aceito (GRECO, 2017, p 105). Tendo como conhecimento que todo comportamento que seja considerado criminoso referente à lei, porém podendo não afrontar o sentimento de justiça na sociedade, existem as coisas que as pessoas consideram justas ou não, estas não podendo então, ser consideradas como algo criminoso (CAPEZ, 2013, p 35). Em relação à venda de CDs e DVDs falsificados, levando em conta ser uma conduta constantemente questionada em relação ao princípio da adequação social, o Supremo Tribunal de Justiça se posicionou por meio da súmula nº 502, publicada em 28/10/2013, destacando que: “Não se aplica o princípio da adequação social na hipótese de expor à venda mídias falsificadas, pois a conduta prevista no art. 184, § 2º, do Código Penal é típica, formal e materialmente, afigurando-se inviável, comprovadas a materialidade e a autoria, o afastamento da consequência penal prevista em lei. (Súmula nº 502 do STJ)”. Este princípio tem como finalidade de se enquadrar condutas que possuam um grau elevado de relevância para a sociedade. O tipo penal faz uma seleção minuciosa destas condutas, escolhendo as que produzem um viés mais contraditório e nocivo ao interesse público e, por este motivo, as condutas assim aceitas e consideradas comuns não podem sofrem valoração negativa, possuindo uma lei incriminadora, podendo até mesmo causar um vício de inconstitucionalidade (CAPEZ, 2013, p 35). A adequação social tem como objetivo limitar a interpretação do tipo penal, fazendo uma exclusão de condutas socialmente aceitas. Há uma limitação ao legislador e tem como finalidade orientar, no momento em que estiver selecionando as condutas para torná-las proibitivas ou de impor algo com o intuito de proteger bens que entende por mais importantes. Se determinada conduta é socialmente considerada aceita e justa, o legislador não pode reprimir levando em conta somente o Direito Penal, este deve se orientar a partir do princípio da adequação social (GRECO, 2017, p 107). Desse modo, tem esse princípio relação direta com o Princípio da Intervenção Mínima, que ocorre quando a seleção dos bens jurídicos relevantes a serem protegidos são selecionados pelo tipo penal. Há críticas em relação ao princípio, no sentido de não permitir que o juiz se coloque no lugar do legislador e dê como revogada uma lei que se encontra em total vigência no momento do fato, tendo conhecimento do princípio constitucional da separação dos poderes. Ademais, a adequação social permite diversas interpretações, sendo algo muitas vezes impreciso, possibilitando uma incerteza em relação ao tema e um conjunto distinto de ideias no estudo do material do tipo (CAPEZ, 2013, p 36). 4. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA O processo de insignificância se deu pelo doutrinador Claus Roxin, sendo introduzido ao Direito Penal, primeiramente na Alemanha e posteriormente se expandiu por diversos países. A vinda ao Brasil por meio do Supremo Tribunal Federal – STF deu ao Princípio da Insignificância uma das formas de argumentar sobre a lei, sendo possível afastar a incidência da norma. Por mais que seja ilícita, a conduta não afeta o bem jurídico de forma significativa (MENDES, 2018, p 19). São necessários alguns requisitos para que se enquadre ao princípio, apontados preliminarmente em decisões realizadas pelo Supremo Tribunal Federal, sendo eles: mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; inexpressividade da lesão jurídica provocada. É de melhor compreensão este princípio a partir da análise da jurisprudência logo a seguir: trata-se de uma Apelação, crime contra o patrimônio e furto, processo da Comarca da Cachoeira do Sul. O réu teria furtado três plantas de bromélias e uma planta de pingo d’ouro no dia 27 de maio de 2016, e subtraído para si as plantas do consultório da vítima. Foi flagrado no local do ocorrido por uma testemunha que estava presente no momento, e a mesma teria perseguido e abordado o réu. Após, comunicou a vítima e acionou a Brigada Militar e os objetos foram apreendidos, avaliados em R$ 110,00. Verificou-se a sentença em 11/02/2019, considerando a denúncia como procedente e condenando o réu nas sanções do art. 155, caput, do Código Penal, tendo como pena um ano e quatro meses de reclusão, sendo regime inicial semiaberto e quinze dias-multa, que substituiria a pena privativa de liberdade, aplicando-se entãoduas penas restritivas de direito. Prestaria serviço à comunidade e teria uma limitação no fim de semana, frequentar semanalmente o CAPS AD, durante todo o período da pena substituída e teria de comprovar, reconhecendo o direito do mesmo recorrer em liberdade. A defesa do réu após sentença e insatisfeita com a mesma, insurgiu-se e sobreveio com Recurso de Apelação nº70081493397, em 26/02/2019, sendo que os argumentos ao recurso foram os seguintes: insuficiência probatória, reconhecer a minorante de tentativa e o afastamento da pena de multa aplicada ao réu. A insurgência defensiva se deu alegando o Princípio da insignificância aplicável à espécie, tendo em vista: “...a mínima ofensividade da conduta, a ausência de periculosidade social da ação, que, inclusive, tangencia ao crime impossível, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do acusado e a inexpressiva ameaça da lesão jurídica provocada, observada a ausência de relevância econômica da res furtiva, que foi avaliada em quantum correspondente a pouco mais de 2% do valor do salário mínimo vigente à época do fato e que, aliás, foi restituída na integralidade à vítima. Assim, porque as peculiaridades do caso concreto amoldam-se às exigências elencadas pela jurisprudência consolidada das Cortes Superiores para configuração do crime de bagatela, não tendo as circunstâncias de violação de domicílio e reincidência, o condão de afastar a incidência da atipicidade material da conduta, pois a análise do fato aponta para a ausência do desvalor da conduta. Atipicidade material da conduta reconhecida. Absolvição com fundamento no art. 386, inciso III, do CPP. O resultado do recurso foi de apelo provido por unanimidade, sendo um dos votos com o seguinte teor: “Observo ter restado efetivamente comprovado por esses rova que o réu subtraiu uma planta do tipo pingo d’ouro. [...] Inexiste, por outro lado, prova no sentido de demonstrar que o réu subtraiu as demais plantas descritas na denúncia [...] nesse sentido, o STF sedimentou o entendimento de que, à aplicação do princípio da insignificância. [...] Observo que a planta subtraída foi avaliada em R$20,00, quantum correspondente a pouco mais de 2% do salário mínimo vigente à época do fato, qual seja, R$880,00. [...] Em face ao exposto, voto no sentido de dar provimento ao apelo defensivo, para absolver o réu MARCOS ROBERTO POLL DUTRA da imputação que lhe foi feita pertinente à prática do crime de furto, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código Penal. [...] (TJRS, 2019, p 4).” Há uma corrente que possui uma visão mais radical na doutrina, sendo ela denominada como, permissa vênia, tendo como entendimento que qualquer bem é digno de proteção em relação ao direito penal, desde que exista uma previsão legal, não levando em conta o seu valor (GRECO, 2017, p 144). Finalmente, é importante ressaltar que este princípio não leva somente em conta o valor do objeto, como requisito para aplicação do princípio da insignificância, para que ocorra sua aplicação é necessário demais requisitos já comentados anteriormente. Este princípio não é aplicado no plano abstrato, é importante não segurar que todas as contravenções penais são insignificantes, pois depende do caso concreto para tal afirmação, de grande relevância avaliar o princípio em cada caso concreto, levando em conta a especialidades de cada caso, por exemplo, o furto por si só não se caracteriza insignificância ou bagatela, porém se for o furto de um chiclete, seria possível a aplicação do princípio neste caso concreto (CAPEZ, 2013, p 30). CONCLUSÃO A presente pesquisa se propôs a esclarecer as causas que impedem a tipicidade, de acordo com o conceito analítico de crime e com os requisitos do Fato Típico, de acordo com a teoria finalista. Inexistindo a atuação humana dolosa ou culposamente, não existe ação, tendo isso a ver também, com previsibilidade, que proporcionaria o cuidado. Como visto, pode acontecer o afastamento da conduta e a excludente de tipicidade quando o sujeito se vir impedido de atuar, como nos casos de força irresistível, caso fortuito ou de força maior, movimentos reflexos e estados de inconsciência, como sonambulismo e hipnose. Logo, não havendo encaixe dentro das noções e valorações necessárias ao enquadramento de uma ação humana considerando-a penalmente relevante (aquela selecionada pelo tipo, de modo a proteger os bens jurídicos), em qualquer dos itens componentes do fato típico, ocorre, por óbvio, e de antemão, a excludente de tipicidade e, consequentemente, do crime. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal Volume 1 - Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2017. CAPEZ, Fernando. Curso De Direito Penal - Parte Geral - Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2019. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, parte geral. Niterói: Impetus, 2017. JESUS, Damásio de. Direito penal, volume 1 : parte geral.32 ed. — São Paulo: Saraiva, 2011. NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017. PRADO. Rodrigo Murad do. As excludentes da conduta humana no contexto finalista de ação (significativa). Disponível em https://jus.com.br/artigos/34658/as- excludentes-da-conduta-humana-no-contexto-finalista-de-acao-significativa.Acesso em 28/11/2019. ZAFFARONI, Eugenio Raul; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro, v.1, Parte Geral. 9. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. https://www.google.com/aclk?sa=l&ai=DChcSEwjv_dvM1JjmAhUMDpEKHf-eBZoYABAUGgJjZQ&sig=AOD64_0j1gJKvJIntrbshy16aVBsiAh2Wg&ctype=5&q=&ved=0ahUKEwjjgdjM1JjmAhVTILkGHZYYBVMQpysIFQ&adurl= https://jus.com.br/artigos/34658/as-excludentes-da-conduta-humana-no-contexto-finalista-de-acao-significativa https://jus.com.br/artigos/34658/as-excludentes-da-conduta-humana-no-contexto-finalista-de-acao-significativa
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