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Aula 5 - Psicologia institucional

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Aula 5 – Psicologia Institucional
Escola e Cidadania
Objetivos
 Ao final desta aula, você será capaz de:
1. Compreender as principais discussões contemporâneas relacionadas à área temática das instituições nela inserida, o estudo sobre escola e cidadania.
De forma geral, a sociedade costuma reproduzir alguns mitos sobre o significado da instituição escolar. Igualdade social, oportunidades para todos, neutralidade e cientificidade, estão entre estes mitos que colocam a Escola à parte da luta de classes. Coimbra, educadora e psicóloga, mostra que o objetivo, nesta situação, é político-ideológico.
Um dos motivadores desta situação, segundo ela, refere-se à vários tópicos, tais como, ênfase na relação professor/aluno,  melhoria dos currículos,  modernização das técnicas e métodos de ensino que, desvinculados do contexto histórico, social, político e econômico reforça o ponto de vista predominante, como se a formação social não fosse necessária.
Para uma visão integral da Escola, enquanto instituição, para a autora cabem algumas perguntas:
“Estamos sendo formados para servir a quem”? Para propiciar e desenvolver o quê? Para reforçar o poder de quem? Somos levados a refletir criticamente sobre o mundo que nos cerca? Sobre como nos inserimos neste mundo e como poderíamos dele participar de forma mais ativa e transformadora? 
Para responder às questões levantadas, a autora apresenta um histórico da Instituição Escolar. Aponta que nas formações sociais mais antigas todos os adultos ensinavam (Aprendia-se fazendo, o que tornavam inseparáveis o saber, a vida e o trabalho):
O marco para o início da instituição Escola foi a Idade Média, especialmente na Europa, onde religiosos se responsabilizavam pelo ensino reservado às elites, fossem crianças ou adultos. Nesta época, a ênfase não era referida à disciplina.
No século XVII, surge a Escola como instituição, de modo semelhante ao contemporâneo. Este surgimento é concomitante à Revolução Industrial, (por volta de 1750). A necessidade principal foi a formação de um número maior de pessoas que soubessem ler, escrever e contar, habilidades necessárias para a mão de obra das indústrias.
Inspirada em vários autores clássicos tais como Althusser, Bourdieu, Passeron, Baudelot, Establet, Poulantzas, Coimbra, com a burguesia no poder percebeu-se, também, a necessidade no âmbito atitudinal. A massa trabalhadora existente nos grandes centros urbanos teria que ser socializada e educada de acordo com os parâmetros burgueses. Supunha-se, nesta época, que isto seria formar "bons" cidadãos e trabalhadores disciplinados.
A ideia predominante aqui é o surgimento da Escola com a função de inculcar os valores, hábitos e normas da ideologia burguesa e, com isso, mostrar a cada “educando” o lugar que deve ocupar na sociedade, segundo sua origem de classe.
Essa ideia fundamenta a visão “Escola como Aparelho Ideológico de Estado”. Na sequência, é possível concordar com a autora quando reforça que a família e os meios de comunicação, também, são elementos reforçadores da visão mencionada.
Sobre a influência das instituições na subjetividade humana, Martin-Baró (1998), reconhecido por seu comprometimento com as maiorias populares, à quebra do fatalismo e a desideologização para a liberdade das massas, destaca três grandes categorias que se encontram extremamente relacionadas entre si: 
1) as condições materiais da existência, 
2) a estrutura social e 
3) a trama ideológica.
Estas três categorias se entrelaçam num determinado regime político que, para Martín-Baró, compreende uma ideologia, constituída num sistema, que organiza e regula as formas de vida, de um conglomerado social em um determinado tempo e circunstância. Neste sentido, o regime político se forma a partir de três componentes essenciais: 
1) a ideologia, 
2) a organização/ regulação e 
3) a historicidade.
O argumento principal que amplia a visão de Coimbra refere-se a outro estudo de Martín-Baró (1983) em que ele aponta que as pessoas incorporam psiquicamente a ideologia social, em forma de atitudes, como um conjunto psicológico de crenças sobre o mundo, nas quais três instituições funcionam como catalisadores: 
1) a família, 
2) a escola e 
3) a moral. 
Estes elementos contribuem para formar o que o autor denomina de "mentalidade fatalista".
A família, desde o tradicional corte patriarcal, expressa, através de suas atitudes, padrões dinâmicos e dicotômicos que transcendem sua realidade enquanto indivíduos. Neste espectro, a figura do pai é habitualmente machista, autoritária e psicologicamente ausente do lar e dos trabalhos domésticos, enquanto a mãe mantém uma postura feminina, dadivosa e presente no lar e tarefas domésticas.
Estes padrões vão configurando o estado atual da família e dificultam a maturidade emocional dos filhos, produzindo uma insegurança psíquica, que culmina num padrão de dependência física e emocional. A segunda instituição abordada por este autor é a escola, com sua estrutura bancária, vertical e seletiva, na qual se destacam dois traços importantes: a competitividade (individualismo) e a verticalidade autoritária.
Estes traços geram uma visão de mundo fatalista, determinista e a-histórica. A moral, segundo este pensador, é composta pelas normas que determinam as atitudes (pensamento, sentimento e julgamento).
Se, de um lado, estas três instituições têm importância na determinação da mentalidade fatalista, por outra, aponta Martín-Baró, que a ruptura desta mentalidade fatalista se dá através da consciência histórica, desideologização e manutenção de uma atitude altruísta.
Para Coimbra, este histórico leva à identificação de alguns mitos questionáveis.
1) a Escola surge para fortalecer e garantir o poder de uma classe social que é dominante numa determinada formação social;
2) a Escola não é neutra, na medida em que  tem por finalidade universalizar os valores, hábitos e costumes de uma determinada classe social. Essa visão hierárquica vertical define disciplina como o conjunto de punições e castigos.
3) a Escola não assume responsabilidade pelos fracassos escolares. O grande número de repetências e evasões passa a ser explicado como responsabilidade dos alunos e suas famílias. Essas práticas, que excluem os alunos segundo sua classe social, estão concretizadas nos currículos, nos conteúdos, nos métodos de avaliação, nos testes psicológicos.
Se educadores acreditam nesses mitos, eles próprios acatam a neutralidade como natural e, segundo Coimbra, fica reforçada a ideia de que educadores se configuram como instrumentos importantes na transmissão da ideologia dominante. E assim, a Escola cotidianamente coloca em funcionamento a ideologia dominante, utilizando o aval técnico e científico da Educação.
Para a autora, entretanto, há “luz no fim do túnel” porque “apesar de a Escola ser uma instituição fortemente articulada com o Estado” (COIMBRA, 1986, p. 16), há espaços possíveis para a atuação contra ideológica com base na pedagogia da emancipação. E, nessa atuação, é possível fazer mais do que denunciar as funções da instituição escolar.
As concepções influenciadas pelas ideias de Gramsci apontam para uma concepção caracterizada pela pluralidade ideológica, em que o conjunto de instituições civis (Igreja, partidos políticos, meios de comunicação, sindicatos, entidades etc) e a Escola influenciam de forma efetiva a construção da Sociedade Civil.
Sendo assim, na concepção da autora, se a Escola é uma instituição fundamental para a formação da cidadania, é preciso que esta tenha um papel fundamental no desenvolvimento do processo social mais amplo com ideias transformadoras. 
E isso é possível através da ação organizada de setores sociais que atuem dentro dessas instituições.
Um dos objetivos da Escola é a formação do comportamento crítico e, para isso, é essencial o desenvolvimento das competências lógica, linguística e moral.
Neste sentido, o planejamento (currículos e programas escolares) da Escola deve estar de acordo com as características e necessidades da população atendida.
Outro ponto a ressaltarnesta discussão sobre o papel da Escola na formação da cidadania é a necessidade de se assegurar a permanência das crianças durante os anos básicos escolares.
Para isso, há, atualmente, indicadores para avaliar a educação básica no Brasil, como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – Ideb, criado em 2007. Ele sintetiza dois conceitos para a qualidade da educação: aprovação e média de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e matemática. O indicador, que avalia em uma escala de zero a dez, é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e médias de desempenho nas avaliações propostas pelo MEC.
Com base nestes dados concretos, é possível verificar que o enfrentamento dos fatores extraescolares depende da superação dos principais problemas socioeconômicos que afetam a população.
Setores organizados têm possibilitado a organização dos setores sociais para permitir o atendimento dos interesses da maioria da população, principalmente as parcelas historicamente marginalizadas.
Assim, a questão inicial em discussão nesta aula é respondida com a conclusão de que a escolarização tem um papel decisivo no processo de formação da cidadania.
E para dar continuidade à evolução, é preciso aprofundar os estudos em relação ao fracasso escolar incluindo, sobretudo, a explicação dentro da própria Escola, às condições de oferta do ensino básico, ao contexto social concreto e não somente responsabilizar as dificuldades do aluno e da família.
Para saber mais sobre este assunto, leia o texto: 
A escola e a formação da cidadania ou para além de uma concepção reprodutivista.
O interessante artigo da psicóloga Cecília Maria B. Coimbra, "As funções da instituição escolar: análises e reflexões", publicado nesta edição, sugere uma série de questões bastante polêmicas, a respeito das diferentes concepções sobre o papel da Escola no desenvolvimento da sociedade brasileira. No sentido de colaborar para o debate, apresento algumas reflexões que julgo oportunas.
Para se discutir a questão proposta, gostaria de iniciar colocando a pergunta central: a Escola é uma instituição fundamental para a formação da cidadania?
Obviamente, estamos entendendo cidadania no seu sentido mais amplo possível, ou seja, o exercício pleno dos direitos e deveres de cidadão numa sociedade democrática, incluindo a participação efetiva em todo o processo social como sujeito histórico, de forma crítica e consciente. Além disso, a questão colocada pretende enfocar principalmente a Escola pública atual, com os problemas que todos já conhecem.
Esta questão nos leva a discutir sobre o papel da Escola. Isto porque entendo que a atuação dos profissionais da Educação depende muito da concepção que se tem sobre o papel da Escola em nossa sociedade. Por exemplo: a concepção de que a Escola tem pouca participação no processo de transformações sociais, implicará um engajamento político-social onde a ação transformadora não priorizará o espaço intra-escolar. Por outro lado, entendendo-se que a Escola tem um papel fundamental no desenvolvimento do processo social mais amplo, o espaço intra-escolar será visto como um dos locus prioritários para a ação de grupos e profissionais comprometidos com ideias transformadoras ou revolucionárias.
Ao analisarmos a literatura, tentando identificar como as várias correntes teóricas ou diferentes autores interpretam o papel da Escola nos diversos momentos históricos, vamos perceber que a concepção de Escola caracteriza-se pela pluralidade ideológica e, mesmo analisando-se uma determinada concepção, percebe-se que ela nunca é estática, sofrendo constantes transformações, em função de dados de pesquisas e aprimoramento de análise que ajudam o desenvolvimento de uma determinada teoria. Uma excelente amostra dessa pluralidade é descrita no capítulo 1 do livro. Escola, Estado e Sociedade, de Bárbara Freitag.
Assim, dentre essas várias teorias ou concepções sobre o papel da Escola, temos, por exemplo, a visão idealista-liberal, em que a Escola é vista como instrumento de democratização e integração, na medida em que, sendo de boa qualidade, poderia garantir uma condição de igualdade de oportunidades para todos os indivíduos. Tal concepção mostrou-se inviável, pelo menos até hoje, uma vez que não se pode falar em igualdade de oportunidades sem que exista igualdade de condições, o que não caracteriza o nosso sistema capitalista. A própria autora do artigo citado, Cecília Maria Coimbra, aponta alguns mitos que devem ser superados visando a uma melhor compreensão da Escola em nossa sociedade.
Num outro extremo, encontramos uma visão um tanto quanto anárquica, tirando da atual Escola qualquer possibilidade de colaborar no processo de transformação social. Como exemplo, cita-se Ivan IIlich, em sua obra Sociedade sem Escolas.
As teorias, porém, que mais nos interessam agora são as concepções crítico-reprodutivistas, que têm dominado o cenário acadêmico nos últimos anos, representadas por autores como Establet, Baudelot, Passeron e Bourdieu, destacando-se ainda Akhusser e Gramsci, que interpretam a Escola como aparelho ideológico do Estado, através do qual os setores dominantes tentam exercer seu poder hegemônico. Neste sentido, o sistema educacional é visto como um instrumento de transmissão ideológica, ou seja, da ideologia dominante, subjacente ao capitalismo, que tem por função levar os cidadãos a aceitarem passivamente as formas de produção, de organização e de reprodução do sistema. A Escola seria um dos instrumentos que o Estado utiliza para essa tarefa.
Grosso modo, poderíamos identificar dois grandes grupos nesse grande conjunto de teorias crítico-reprodutivistas. Um deles, mais fiel às concepções marxistas, interpreta a Escola como um mero aparelho do Estado, submetida, portanto, ao controle direto dos setores dominantes. Nesta perspectiva, o sistema educacional transformar-se-á somente a partir do momento em que as forças progressistas e/ou revolucionárias assumirem o controle efetivo do Estado. Como consequências desta concepção, a possível ação político-transformadora intra-escolar não é priorizada, embora sua importância não seja totalmente negada.
Num segundo grupo, encontram-se as concepções modernamente influenciadas pelas ideias de Gramsci, que visualiza, de um lado, a existência da Sociedade Política, representada pelo Estado e todos os seus instrumentos legais, persuasivos e repressivos, e de outro, a Sociedade Civil, caracterizada pela pluralidade ideológica, formada pelo conjunto de instituições civis como a Igreja, os partidos, os meios de comunicação, os sindicatos, as entidades, etc..., e a Escola. Nesta concepção, a Sociedade Política, através de ação direta ou indireta dos grupos dominantes, tenta exercer o controle ideológico da Sociedade Civil, buscando o máximo de influência sobre suas instituições. Porém, a consecução dessa tarefa dependerá da existência de contra-ideologias, antepondo-se à dominante, através da ação organizada de setores sociais, atuando dentro dessas instituições. Assim, o confronto ideológico, na visão gramsciana, dar-se-á efetivamente na Sociedade Civil. Como consequência, a ação de grupos progressistas e ou de revolucionários nas instituições civis, como a Escola, passa a ser fundamental para o processo das transformações sociais.
A questão central que gostaria de apresentar e debater é que essas concepções reprodutivas estão começando a ser revistas e ampliadas em função principalmente de novos estudos e pesquisas que estão ajudando a perceber de forma mais clara o papel da Escola, principalmente para os setores mais pobres da população. Tais estudos, se por um lado não negam o papel ideologizante da Escola, têm demonstrado, por outro lado, que a Escola tem funções muito importantes para as populações marginalizadas, representando talvez uma das poucas oportunidades que esses setores teriam para o desenvolvimento de algumas condições fundamentais para a formação da cidadania.
Gostaria de tomar como exemplo desses novos trabalhos, a pesquisa realizadapor Bárbara Freitag, publicada no seu livro Sociedade e Consciência- Um Estudo Piagetiano na Favela e na Escola. Essa autora pesquisou as relações entre a escolarização e o desenvolvimento das estruturas lógica, linguística e moral, tomando como referencial a teoria de Piaget. Em seu procedimento, que não cabe aqui detalhar, avaliou o desenvolvimento dessas três estruturas, em crianças e jovens, com e sem escolarização (oito anos do ensino de primeiro grau), selecionando sujeitos de três níveis sociais (classes A, B e C), em diferentes idades.
Dentre os vários resultados observados, os que nos interessam são os seguintes: a) a escolarização regular (oito anos) favorece plenamente o atingimento dos níveis mais altos nas escalas psicogenéticas de linguagem, moralidade e pensamento lógico; b) os jovens sem escolaridade, comparados com os seus pares no final da oitava série, demonstraram defasagens de 6 a 8 anos, nas três classes sociais; c) os dados indicam que oito anos de escolarização apagam as diferenças de desempenho cognitivo, moral e linguístico, observadas no início da escolarização, certamente devido às diferenças de origem socioeconômica. Ou seja, a distribuição dos alunos no final da oitava série é homogênea, independente da classe social a que pertencem.
Um dado interessante, é que não há correlação entre as notas escolares e os níveis de competência, isto é, o fato dos alunos demostrarem desenvolvimento nessas estruturas não implica que obtenham notas melhores, o que sugere que os currículos escolares não estão adaptados aos diferentes níveis de desenvolvimento ou que existem outros fatores intra-escolares que interferem nesse processo.
Diante desses resultados, a autora conclui que a Escola tem um efeito democratizante sobre o desenvolvimento psicogenético e sócio-linguístico, independente dos conteúdos que desenvolve. As hipóteses que a autora apresenta tentam explicar tal efeito devido provavelmente às relações sociais proporcionadas pela Escola, ou seja, as relações informais que os jovens experienciam dentro da Escola, principalmente com os seus pares, seriam de fundamental importância para o desenvolvimento daquelas estruturas avaliadas.
Uma outra conclusão, esta mais relacionada com o nosso tema, é que tais resultados levam necessariamente à revisão das concepções reprodutivas sobre a Escola: esta, apesar de ser um mecanismo de seletividade e de reprodução de classes sociais, é ao mesmo tempo uma instituição social que funcionaria, ao nível da formação das estruturas da consciência, como instrumento democratizante, como coloca Bárbara Freitag.
Em outras palavras, significa que jovens com oito anos de escolarização, apresentariam, independente da origem social, estruturas cognitivas que os possibilitariam assimilar e processar adequadamente as experiências externas.
A importância disto para a nossa discussão é óbvia: se assumirmos que um dos objetivos da Escola deveria ser a formação do comportamento crítico, tal processo implica necessariamente o desenvolvimento das competências (estruturas, na linguagem piagetiana) lógica, linguística e moral; colocando a questão de forma inversa, não se desenvolve o comportamento crítico, sem que essas estruturas, investigadas por Freitag, se desenvolvam.
Delineia-se, portanto, uma nova contradição: se por um lado a Escola tem transmitido uma ideologia hegemônica, por outro, a escolarização tem desenvolvido o repertório básico que é fundamental para a formação da cidadania e talvez para a própria superação da condição de alienação. Obviamente, isto não significa que estamos defendendo a Escola tal qual se apresenta hoje, mas reconhecendo uma consequência da escolarização que até então não estava claramente colocada. Além disto, poder-se-ia imaginar que o papel da Escola poderia ser muito mais importante se estivesse planejada de acordo com as características e necessidades da população atendida; por exemplo, se os currículos e programas escolares fossem planejados, respeitando-se o repertório inicial da população e direcionados numa perspectiva de formação do comportamento crítico, certamente teria um efeito de grande relevância para a formação da cidadania.
Os resultados de estudos como este permitem ainda outras conclusões que levariam à revisão de certas concepções. Assim, se a origem social é um dos co-determinantes do desenvolvimento cognitivo, pode-se supor que tal processo não é irreversível, ou seja, a escolarização pode atuar, principalmente para as classes socialmente marginalizadas, como mecanismo de reequilibração dessa defasagem.
Outra conclusão geral possível é que o processo de reprodução de classes, atribuído ao sistema escolar, ocorre concretamente pelas relações de acesso / não acesso e permanência / não permanência. Daí, as conclusões práticas que podem ser tiradas desses trabalhos: tão importante quanto a oferta de escolas, é a necessidade de se assegurar a permanência das crianças durante oito anos básicos, ou seja, não basta que exista Escola, é preciso que os alunos possam frequentá-la durante esse período. Tal necessidade é maior quanto mais pobre é a origem social do aluno, assumindo-se que o desenvolvimento global é, em grande parte, função das condições concretas de vida.
Diante desse quadro, resta questionar o seguinte: se a Escola tem um papel fundamental, mesmo na situação em que se encontra, por que não se tem garantido a permanência da maioria da população durante o primeiro grau? O que tem determinado o fracasso escolar (repetência e evasão) dos quase 80% das crianças que iniciam a primeira série e não terminam o primeiro grau?
Muito já se escreveu e pesquisou sobre o assunto. Em outro trabalho síntese (Alfabetização e Fracasso Escolar-EDION, 1988), tivemos a oportunidade de agrupar todos os fatores identificados pela pesquisa em dois grupos: os fatores extra e intra-escolares. No primeiro, situam-se as variáveis relacionadas com as condições de vida, determinadas pela situação socioeconômica, que constituem condições concretas que impedem uma criança de frequentar regularmente uma Escola. No segundo grupo, há uma série de determinantes conhecidos, desde currículos e programas inadequados, até formação do professor, passando pelas condições internas como organização e a burocratização escolar.
A questão que se coloca é: essa situação tem solução? É possível alterar certas condições e diminuir ou erradicar o fracasso escolar?
Entendo que a resposta a esta pergunta é afirmativa, mas qualquer proposta apresenta implicações de ordem política. Assim, vejamos: o enfrentamento dos fatores extraescolares depende da superação dos principais problemas socioeconômicos que afetam nossa população e isto dependerá fundamentalmente da capacidade de organização dos setores sociais comprometidos com mudanças que atendam os interesses da maioria da população, principalmente as parcelas historicamente marginalizadas.
Por outro lado, a superação dos fatores intra-escolares também implica a questão política. Por exemplo: as decisões que são tomadas nos diversos níveis das secretarias de Educação, dependem de quem ocupa os postos-chave, seja nos órgãos centrais, seja dentro da Escola. Dependem também do nível de organização dos educadores e do tipo de compromisso que eles assumam. Vejamos uma questão concreta: um dos grandes problemas que nossa Escola apresenta diz respeito à falta de continuidade curricular observada nas diversas disciplinas, entre as diversas séries. Este é um problema cuja solução implicará necessariamente a transformação da estrutura e funcionamento concreto da Escola, pois implica a participação dos professores nos níveis de decisão com relação às questões dos conteúdos e das práticas escolares. Em outras palavras, implica a busca de novas formas de organização dos educadores na Escola, o que exigirá uma divisão de poder, atualmente centrado nas mãos do diretor. Sem que se tenha clareza desse processo, dificilmente conseguir-se-á resolver a questão da continuidade curricular, independente das propostas de funcionamentoque os níveis centrais das secretarias de Educação venham sugerir. Da mesma forma, a análise de cada fator intra-escolar responsável pelo fracasso escolar exigirá, para sua solução, decisões de cunho basicamente político-pedagógico, discutidas e assumidas pelos educadores, no interior das instituições escolares.
Finalmente, retomando-se a questão inicial apresentada neste trabalho, podemos concluir que a escolarização tem um papel decisivo no processo de formação da cidadania, principalmente para os alunos oriundos dos setores mais pobres da sociedade. Além disso, a ação escolar poderia ser muito mais eficiente e relevante neste sentido. Isto vai depender da clareza política dos setores sociais e de seu poder de organização para atuar como grupo de pressão visando à alteração dos fatores extra e intra-escolares responsáveis pelo fracasso escolar. O mesmo vale para os profissionais que atuam diretamente na área educacional, incluindo os psicólogos, que aqui é nossa audiência majoritária.
Para estes profissionais, apresento uma questão para discussão: estarão os psicólogos preparados e conscientes para participar desse processo político que visa transformar a realidade de nossa Escola pública?
1- O estudo de Martín-Baró (1983) aponta que as pessoas incorporam psiquicamente a ideologia social, em forma de atitudes, como um conjunto psicológico de crenças sobre o mundo, nas quais três instituições funcionam como catalisadores. Quais são essas três instituições?
R.: A família, a escola e a moral.
Nesta aula, você:
· Percorreu as seguintes questões: A escola é uma Instituição fundamental para a formação da cidadania? Qual o papel da Escola no desenvolvimento da sociedade brasileira? Estão os profissionais da área preparados e conscientes para participar do processo político que visa transformar a realidade de nossa Escola pública? É viável a visão idealista-liberal, para explicar a Escola como instrumento de democratização?
· Compreendeu a discussão sobre as concepções crítico-reprodutivistas que interpretam a Escola como aparelho ideológico do Estado, através do qual os setores dominantes tentam exercer seu poder hegemônico.
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO
1. Uma ligação estreita e continuada entre os professores e os pais leva pois muita coisa mais que a uma informação mútua: este intercâmbio acaba resultando em ajuda recíproca e, frequentemente, em aperfeiçoamento real dos métodos. Ao aproximar a escola da vida ou das preocupações profissionais dos pais, e ao proporcionar, reciprocamente, aos pais um interesse pelas coisas da escola, chega-se a uma divisão de responsabilidades [...] (PIAGET,2007,p.50) A partir dessa citação, qual das afirmativas a seguir está de acordo com o que foi dito pelo autor:
R.: Reconhecendo que a aprendizagem é construída a partir da interação de conhecimentos, na realidade e vivência social e familiar, as instituições, escola e família, fazem parte e dividem o processo de ensino-aprendizagem;
Explicação:
Escola e família devem ser parceiras no processo formativo, abrindo-se espaço para o diálogo, cada parte com a sua função; no caso da escola contribuindo com as funções pedagógicas e a família no acompanhamento do desenvolvimento dos filhos.
2. A família burguesa (ou moderna) dava ao homem o papel de provedor, responsável por sua manutenção e sustento. À mulher cabia o papel de educadora dos filhos, gerente do lar e da privacidade. Entretanto, essa estrutura familiar não corresponde ao observado atualmente. Analise as afirmativas abaixo quanto à estrutura familiar na atualidade.
I. Há uma nova assunção de valores e papéis sociais no núcleo familiar, quando a mulher sai para as ruas e passa a receber por sua força de trabalho um salário tal como o homem.
II. Essa troca de papéis produz lacunas na criação dos filhos; da mãe-educadora surge a mãe-trabalhadora e com isso todas as variáveis implícitas nela.
III. A crença de que a família não mais satisfazia suas funções mais básicas impediu a expansão das escolas e dos serviços de bem-estar social.
IV. A escola assume para si o cargo de educadora e disciplinadora das crianças, pois a família já não consegue dar conta da transmissão de valores.
Estão CORRETAS as afirmativas
R.: apenas I, II e IV.
	Explicação:
À saída da mulher para o mercado de trabalho, trouxe nova configuração para a família e a escola passou a ter que dar conta da educação das crianças.
3. Apesar da Escola ser uma instituição fortemente articulada com o Estado, encontramos em seu interior espaços onde as lutas podem acontecer. Como instituição fundamental para a formação da cidadania a escola deve:
I-servir para fortalecer e garantir o poder de uma classe social que é dominante numa determinada formação social;
II-priorizar a formação do comportamento crítico, com base no desenvolvimento das competências lógica, linguística e moral;
III-Contribuir para a construção da cidadania ativa, entendendo as unidades educacionais como espaços de organização da sociedade para a defesa de direitos conquistados e criação de novos.
Estão corretas as afirmativas:
R.: Somente a II e III.
	Explicação:
Priorizar a formação do comportamento crítico, com base no desenvolvimento das competências lógica, linguística e moral;
Essa opção não pode ser considerada correta porque o comportamento critico não deve ser priorizado apenas com relação a essas competências, mas segundo o desenvolvimento integral do sujeito que implica em seu engajamento social.
4. Junto com a família a escola é, a instituição social que maiores repercussões tem para a criança. Analise as afirmativas abaixo quanto aos aspectos da escola como instituição social.
I- As crianças, em suas relações com iguais, descobrem que é necessária a reciprocidade, para agir conforme as regras, levando em conta que as regras são efetivas, se as pessoas concordarem em aceitá-las.
II- A entrada e o percurso pelo âmbito escolar vão constituir para a criança um acúmulo de experiências ricas e interessantes, pois a escola é um microcosmo da sociedade.
III- A criança chega à escola levando consigo aspectos constitucionais e vivências familiares, e o ambiente escolar será uma peça inerte em seu desenvolvimento.
Estão CORRETAS:
R.: apenas as afirmativas I e II.
Explicação:
I- As crianças, em suas relações com iguais, descobrem que é necessária a reciprocidade, para agir conforme as regras, levando em conta que as regras são efetivas, se as pessoas concordarem em aceitá-las. VERDADEIRO, DE FATO, A ESCOLA PROMOVE ESSE ENCONTRO ENTRE OS ALUNOS, ABRE ESPAÇO PARA QUE OS ALUNOS SE RELACIONEM RESPEITANDO REGRAS
II- A entrada e o percurso pelo âmbito escolar vão constituir para a criança um acúmulo de experiências ricas e interessantes, pois a escola é um microcosmo da sociedade. VERDADEIRO, AS EXPERIÊNCIAS ESCOLARES SÃO FUNDAMENTAIS NA FORMAÇÃO DO SUJEITO.
III- A criança chega à escola levando consigo aspectos constitucionais e vivências familiares, e o ambiente escolar será uma peça inerte em seu desenvolvimento. DE FATO, A CRIANÇA CHEGA A ESCOLA COM SUA HISTÓRIA DE VIDA, MAS, ISSO NÃO QUER DIZER QUE A ESCOLA, O SEU AMBIENTE NÃO INFLUENCIARÁ EM SEU DESENVOLVIMENTO. FALSA.
5. A instituição família apresentou grandes mudanças a partir do século XIX. O casamento, especialmente, foi o receptor da maioria destas transformações. Analise as afirmativas abaixo quanto à evolução histórica da família como instituição.
I- Sai de cena o casamento por amor e a escolha do parceiro pelos próprios indivíduos e tem lugar a união por contrato, escolhida pelos pais dos cônjuges.
II- Com o advento do capitalismo e da industrialização, a família passou a representar um refúgio ante as ameaças do mundo. Ela diminuiu em número de membros, tornou-se patriarcal, hierarquizada, com a divisão do trabalho sendo sexualmente definida.
III- A família burguesa (ou moderna) dava ao homem o papel de provedor, responsável por sua manutenção e sustento. À mulher cabia o papel de educadora dos filhos, gerente do lar e da privacidade.
IV- O homem era a figura pública, aquele quetrabalhava fora, lidava com o mundo externo. A mulher era o privado, a zeladora do bem-estar do marido e dos filhos, a defensora da intimidade familiar.
Estão CORRETAS as afirmativas
R.: apenas II, III e IV.
Explicação:
A família passou a ser considerada um porto seguro frente as ameaças do mundo; houve uma certa consciência acerca da importância de um número reduzido dos filhos, tendo em vista dificuldades para colocá-los na escola, cursos e etc, oferecer uma formação digna; em geral, o pai assumiu o papel de provedor e a mulher se dedicava mais aos filhos e marido.
6. Rossi e Hofling (2009) observam que a relação escola e comunidade podem contribuir para: MARQUE A INCORRETA:
R.: potencializar práticas educativas;
7. NÃO é correto afirmar que a escola como instituição fundamental para a formação da cidadania deve:
R.: servir para fortalecer e garantir o poder de uma classe social que é dominante numa determinada formação social;
8. A escola como instituição fundamental para a formação da cidadania deve:
R.: colaborar com os movimentos de luta pela melhoria da qualidade sociocultural e socioambiental, entendendo as unidades educacionais como espaços de organização da sociedade para a defesa de direitos conquistados e criação de novos.
Explicação:
A escola que está envolvida com a formação de cidadãos deve adotar práticas educativas democráticas, não priorizar classes sociais dos estudantes sobre outras; o compromisso não deve ser apenas com o conhecimento científico; é preciso pesquisar sobre educação e não apenas sobre o conhecimento específico, das disciplinas em si; é preciso conhecer, pesquisar a escola, suas tramas.

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