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INSFRAN_artigo sobre empatia e educação_2019 (6)

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Como citar: INSFRAN, F.F.N. Empatia na educação: buscando a superação de 
antigos entraves a experiências significativas de aprendizagem. In TASSINARI, 
Marcia e DURANGE, Wagner. (Orgs.) Empatia: a capacidade de dar luz à 
dignidade humana. Curitiba: CRV, 2019. 
 
 
Empatia na educação: buscando a superação de antigos entraves a experiências 
significativas de aprendizagem 
 
Fernanda Fochi Nogueira Insfran1 
 
INTRODUÇÃO 
 Escrever sobre empatia na educação foi um exercício ao mesmo tempo instigante 
e desafiador, pois escolhi rememorar minha trajetória como pesquisadora da área de 
educação para entender como fomos atravessados (eu e minha produção) por este 
conceito e pelas contribuições de Carl Rogers (1972; 1977; 1983; 2001; 2002). 
Rogers trouxe importantes contribuições para pensarmos um novo paradigma na 
relação professor aluno. Por ter passado muitas décadas atuando como psicólogo clínico 
e professor universitário, pode refletir sobre as semelhanças e diferenças entre o papel do 
psicoterapeuta e do professor e escreveu ao longo de sua obra algumas considerações 
sobre o lugar que o professor deveria ocupar, além de ter tecido muitas críticas ao modelo 
tradicional e autoritário de educação, que mantém o professor como protagonista do 
processo ensino aprendizagem e detentor do poder-saber absoluto, onde o aluno é mero 
receptor de conteúdos (ROGERS, 2001). 
Além das reflexões que Rogers traz no livro “Liberdade para Aprender” (1972) e 
ao longo de toda a sua obra acerca do modelo de Ensino Centrado no Aluno e da 
importância de desenvolvermos uma aprendizagem significativa – e não uma mera 
memorização de conteúdos depositados –, considero muito importante refletir sobre a 
atitude de compreensão empática (ou simplesmente empatia), uma das atitudes 
 
1 Psicóloga e professora adjunta da Universidade Federal Fluminense, nos cursos de formação de 
professores e no Programa de Pós Graduação em Ensino, primeiro programa de mestrado em Ensino do 
interior Fluminense. 
[Digite aqui] 
 
facilitadoras que servem tanto à relação terapeuta-cliente quanto à relação professor-
aluno. 
Num capítulo especialmente dedicado a falar sobre empatia, no livro “A Pessoa 
como Centro”, Rogers (1977) critica a forma caricaturada como esta atitude vinha sendo 
entendida pelos críticos da Abordagem Centrada na Pessoa e enfatiza a importância da 
mesma: 
Os dados de pesquisa continuam a se acumular, levando-nos à conclusão de que 
um alto grau de empatia talvez seja o fator mais relevante numa relação, sendo, 
sem dúvida, um dos fatores mais importantes na promoção de mudanças e de 
aprendizagem. Por isso, acredito que é chegado o momento de esquecer as 
caricaturas e deturpações do passado e mirar a empatia com novos olhos 
(ROGERS, 1977, p.71). 
 
Mas afinal, o que é empatia para Rogers e qual a importância dela para a 
educação? O termo cunhado por Rogers como compreensão empática foi publicado pela 
primeira vez em 1957, quando ele descreveu as “Condições necessárias e suficientes para 
uma mudança terapêutica de personalidade”2: 
O estado de empatia ou ser empático consiste em aperceber-se com precisão do 
quadro de referências interno de outra pessoa, juntamente com os componentes 
emocionais e os significados a ele pertencentes, como se fossemos a outra 
pessoa, sem perder jamais a condição de ‘como se’. Portanto, significa sentir as 
mágoas e alegrias do outro como ele próprio as sente e perceber suas causas 
como ele próprio as percebe sem, contudo, perder a noção de que é ‘como se’ 
estivéssemos magoados ou alegres, e assim por diante. Se perdermos esta 
condição de ‘como se’, teremos um estado de identificação (ROGERS, 1957 
apud ROGERS, 1977, p.72) 
 
Essa capacidade de colocar-se no lugar do outro “como se” fosse o mesmo, faz 
com que este outro saiba que está sendo compreendido e respeitado, mesmo que haja uma 
gama de diferenças de valores, visões de mundo, realidade social, cultural etc entre as 
duas pessoas. Assim, quando propomos que haja empatia na educação, estamos propondo 
que haja espaço para escuta e respeito à diversidade, entre as pessoas que se relacionam 
nos espaços educativos – não passa somente pela relação professor aluno, conforme 
veremos mais adiante. 
 
2 ROGERS, C.R. The necessary and sufficient conditions of therapeutic personality change. Journal of 
Consulting Psychology, 1957, 21, 95-103. 
[Digite aqui] 
 
Da mesma forma que Rogers, entendo que ser empático ao outro é ser capaz de 
ouvi-lo verdadeiramente. Gosto muito de um exemplo simples que Rogers traz de suas 
vivências ainda como aluno da escola básica e que apesar de remeter ao início do século 
XX, ainda é comum vermos esse tipo de dificuldade de comunicação nas salas de aula 
contemporâneas: 
O primeiro sentimento básico que gostaria de partilhar com vocês é a minha 
alegria quando consigo realmente ouvir alguém. Acho que esta característica 
talvez seja algo que me é inerente e já existia desde os tempos da escola primária. 
Por exemplo, lembro-me quando uma criança fazia uma pergunta e a professora 
dava uma ótima resposta, porém a uma pergunta inteiramente diferente. Nestas 
circunstâncias, eu era dominado por um sentimento intenso de dor e angustia. 
Como reação, eu tinha vontade de dizer: “Mas você não a ouviu!” Sentia uma 
espécie de desespero infantil diante da falta de comunicação que era (e é) tão 
comum (ROGERS, 1983, p.4-5). 
 
Há quase duas décadas me dedico a estudar educação e apesar de não ter formação 
inicial na área, fiz um mergulho profundo para entender teorias e práticas da educação 
pública básica e superior no Brasil, a fim de encontrar respostas para as eternas mazelas: 
baixa qualidade do ensino ofertado, fracasso escolar, desinteresse dos alunos, frustração 
dos professores, conflitos na relação professor-aluno e na relação família-escola, entre 
muitas outras questões para as quais ainda não temos respostas e soluções definitivas – e 
creio que talvez nunca tenhamos. 
 Portanto, com as contribuições de Rogers e diversos outros autores que me 
ajudaram ao longo dos anos a pensar nas problemáticas citadas no parágrafo acima, decidi 
apresentar minhas produções anteriores para entender como a falta de empatia – que está 
presente em quase todas as falas e experiencias relatadas nas minhas pesquisas – pode 
prejudicar as relações escolares e consequentemente o propósito educacional. 
Complemento esse capítulo com reflexões que visam superar a falta de empatia e entraves 
a experiências significativas de aprendizagem. 
 
Empatia e educação, por que e para que? Apresentando elementos oriundos das 
minhas buscas como pesquisadora 
Permitam-me localizar meu lugar de fala a partir de um breve memorial das 
minhas buscas/ encontros/ rupturas com a educação brasileira, a psicologia humanista e 
o conceito de empatia. 
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Sou uma psicóloga e professora universitária que há quase duas décadas busca 
entender o que falta para a educação brasileira dar certo. Na minha primeira graduação, 
em economia, comecei estudando a relação entre educação e emprego, analisando 
indicadores sociais e educacionais, como e onde se investia e se deveria investir para que 
todos pudessem ter acesso a uma educação de qualidade que possibilitasse um caminho 
profissional bem sucedido (INSFRAN, 2001). Mais adiante, em uma pós graduação em 
educação, procurei entender como uma fraca formação de professores em nível médio (o 
curso Normal) aliada a “apadrinhamentos” políticos na conquista de cargos em escolas 
públicas estavam colaborando para os baixos índices de aprovação de alunos das séries 
iniciais de escolas públicas (INSFRAN, 2003). 
Mergulhei na História da Educação no Brasil, conheci leis e políticas 
educacionais, li muitos autores clássicose me entusiasmei muito com as ideias de Paulo 
Freire, Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira, só para citar alguns cânones. Já no mestrado em 
Psicologia, descobri Carl Rogers e considerei a Abordagem Centrada na Pessoa e mais 
especificamente sua obra “Liberdade para aprender” (ROGERS, 1972), a revolução que 
faltava à educação. Pensava eu, no alto dos meus vinte e poucos anos: “se todos os 
professores tiverem acesso a essa obra, a esse jeito de ser empático, autêntico, 
compreendendo as dificuldades dos alunos, valorizando e facilitando a aprendizagem 
significativa, resolveremos 90% dos problemas da educação”. Como nesta época, eu 
trabalhava como voluntária em um pré vestibular popular, passei a utilizar os 
ensinamentos de Rogers nas minhas aulas e atividades realizadas com os pré 
vestibulandos e fiz uma extensa discussão sobre essas contribuições de Rogers – e 
também de Paulo Freire (2000), já que a essa altura eu já tinha percebido a semelhança 
entre as contribuições de ambos, conforme o próprio Rogers (2001) atesta no livro “Sobre 
o poder pessoal” – na minha dissertação de mestrado (INSFRAN, 2004). 
Pouco tempo depois, em 2006, quando eu realizava a pesquisa de campo do meu 
doutorado em Psicologia, o objetivo da minha pesquisa migrou de uma discussão sobre a 
formação de professores para a compreensão das relações estabelecidas nos ambientes 
educativos. Inicialmente eu acreditava que o foco deveria ser a formação e capacitação 
dos professores para atuar em um modelo de ensino mais democrático e facilitador da 
autonomia do saber – utilizando tudo que eu havia lido e experimentado das contribuições 
de Rogers e Freire. Porém, a prática de observação participante em uma escola municipal 
da zona norte do Rio de Janeiro, ainda no primeiro ano do doutorado, foi culminante para 
a mudança de objeto e objetivo da pesquisa. 
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Foi a partir de uma escuta descompromissada, mas nem por isso desatenta, nesta 
escola, que percebi um sentimento comum a todos os profissionais de educação – 
professores, diretoras, coordenadoras e auxiliares: estão cansados de serem cobrados por 
todas as mazelas da escola pública. Assim, percebi que se me aproximasse destes 
profissionais com aquela velha “roupagem de especialista”, que detém um saber mais 
apropriado, um saber dissipador de conflitos e pronta a propor soluções revolucionárias, 
mais uma vez, conforme os próprios professores deixaram claro no nosso primeiro 
contato, minha contribuição – por mais bem intencionada que fosse – seria repudiada por 
eles, como a maioria das “novas ideias” que vem de cima para baixo, no sistema 
educacional brasileiro vigente, e que são vistas pelos profissionais de educação do chão 
de escola, como mais cobranças do sistema. Entendi que impondo uma nova prática – 
mesmo que inovadora e motivante, na minha opinião – estaria desqualificando o saber-
fazer destes profissionais, e assim, aprofundando ainda mais o distanciamento entre teoria 
e prática docente. Optei, portanto, em focar na escola como um todo, nas relações 
interpessoais construídas no ambiente escolar. 
Abaixo apresento algumas passagens do artigo intitulado “Grupo de reflexão na 
escola: aproximando o novo aluno da velha escola” (INSFRAN, 2007), que relatam 
grupos realizados com professores e alunos nesta escola municipal da zona norte do Rio 
de Janeiro, onde utilizamos como referencial teórico para a intervenção a obra “Grupos 
de Encontro” (ROGERS, 2002) e a experiência de Rocha (1999) com supervisão de apoio 
psicológico também fundamentada na Abordagem Centrada na Pessoa. Considero esta 
experiência um divisor de águas na minha atuação como pesquisadora da área de 
educação. 
Grupos realizados com professoras e professores: 
Só há professoras na sala neste momento. Elas começam a relatar que estão 
insatisfeitas com a profissão. Uma delas diz que só trabalha ali porque precisa 
pagar suas contas. Tinha uma expressão de muito descontentamento ao falar dos 
alunos e da sala de aula. (...) Reclamam que as medidas adotadas pela Secretaria 
(Secretaria Municipal de Educação) são de cima pra baixo, que os professores 
são simplesmente comunicados sobre essas mudanças e que não são preparados 
para receber as mudanças impostas. Acreditam que a situação vai piorar ainda 
mais, já que ninguém mais será reprovado, após a implementação do 2º ciclo, de 
5ª à 8ª séries. Uma professora diz: “eu sou de tudo na sala de aula: mãe, amiga, 
psicóloga, médica... No final, o que eu passo de conteúdo é só esse pouquinho 
aqui” – faz um gesto com a mão, que simboliza uma quantidade mínima de 
conhecimento. E completa: “não fui capacitada para lidar com tudo isso” 
(INSFRAN, 2007, p.14). 
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Durante o pré-COC [pré Conselho de classe, o qual eu e uma colega psicóloga 
fomos autorizadas a assistir], os professores se referem aos alunos que estão 
sendo citados como possíveis reprovados com expressões faciais e palavras de 
desprezo: “esse é horrível”; “o que fazer com aquela criatura?”; “burro elevado 
à milésima potência!”. Um professor é perguntado sobre alguns alunos, se ele 
quer reprová-los. Ele diz: “D., quem é? Não conheço. Preciso justificar porque 
ele está sendo reprovado?”” (IBID., p.16) 
 
Outra professora fala do “choque de cultura” que sofrem ao se depararem com a 
realidade dos alunos: “eles trazem a favela pra dentro da sala de aula”. Eu digo 
que eles parecem não conseguir acessar esses alunos (me remeto a uma fala 
anterior, de uma outra professora, num encontro antecedente) e esta professora 
diz: “não acesso e nem quero!”. (...) Num outro momento, um professor fala que 
achava interessante que alguém da CRE (Coordenadoria Regional de Educação 
– órgão subordinado à Secretaria Municipal de Educação) também pudesse vir à 
escola para ouvi-los. Começam a falar sobre a questão do ciclo, dizendo que veio 
imposto de cima pra baixo. Eles dizem que a secretaria “ainda teve a cara-de-
pau” de dizer que o sistema de ciclo foi “amplamente debatido” com todos os 
professores. Todos se dizem confusos com muitas informações contraditórias 
que vem de cima pra baixo. Uma professora comenta: “quando os alunos 
souberem que não serão mais reprovados... vai ser uma festa!”. (IBID., p.17) 
 
Realizamos grupos com alunos de duas turmas de 6ª série (atual 7º ano do ensino 
fundamental), que eram consideradas por toda a escola como as piores turmas. Abaixo 
passagens do artigo que apresentam um resumo do que foi trabalhado durante os dois 
meses de 2006 em que realizamos esses grupos: 
Trabalhamos com eles os sentimentos de vergonha que alguns disseram ter por 
pertencerem às piores turmas da escola. Em alguns momentos, nosso trabalho 
com eles foi questionado, pois alguns alunos se preocuparam se realmente eram 
malucos, já que estavam sendo tratados por psicólogas. Disseram-nos que um 
professor disse que nós estávamos tratando somente dessas duas turmas por isso; 
além da vergonha, eles relataram sentirem-se excluídos por serem dessas piores 
turmas. Não puderam participar da gincana da festa de aniversário da escola; 
sentem-se também injustiçados por pagarem pelo mau comportamento de alguns 
da turma (que não estavam participando do nosso grupo). As meninas disseram 
que acham que são prejudicadas por pertencerem a essa turma. Pensam que 
poderiam render mais se estivessem em outra turma, mais bem comportada; se 
sentem desrespeitados por alguns professores, que “descontam tudo em cima da 
gente”. Falam que alguns professores dizem que eles são “animais”, que são 
“burros”. Uma menina relata que um professor lhe falou que ela era “um atraso 
para a turma”. Outra conta que outro professor lhe disse para não andar mais 
com a amiga de turma, por que esta ia leva-la “para o mal caminho” (INSFRAN, 
2007, p.18) 
 
Demos espaço para que eles escolhessem o que gostariam de falar e fazer no 
intervalo de tempo que tínhamos disponível. Umadas turmas escolheu fazer um 
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torneio de basquete – que se mostrou bastante interessante para discutirmos a 
negociação entre eles, ou seja, como negociar o que querem fazer, ao invés de 
partir para a violência física e verbal. A outra turma escolheu assistir a um vídeo. 
Sobre esta liberdade, uma aluna comentou que estava achando interessante o 
grupo, porque nunca ninguém deixou que eles escolhessem o que fazer e também 
decidir não ficar ali se não quisessem. Sentiram-se satisfeitos por terem um 
espaço onde estavam sendo ouvidos. Disseram que nunca poderiam falar 
abertamente com os professores sobre o que estavam nos contando (IBID., p.18) 
 
Dentre os assuntos mais discutidos, tivemos: a violência dentro e fora da escola 
e suas implicações com o tráfico de drogas; a relação conflituosa entre 
professores e alunos (desrespeito de ambos os lados); a forma de relacionamento 
entre pares (como eles se organizam em grupos – chamados por eles de “bondes” 
– para se protegerem dos outros grupos rivais); a escola vista como um ambiente 
de socialização mais seguro que a rua (por exemplo: brigar na escola não é 
perigoso, visto que ao brigarem na rua eles podem estar se “metendo com 
bandido”); problemas familiares (por exemplo: pais que batem; pais que cobram 
muito das filhas ajuda na criação dos irmãos menores e nas tarefas domésticas. 
Alguns disseram que preferem ficar na escola, mesmo sem assistir aula, só para 
não ter que trabalhar em casa). (IBID., p.19) 
 
Estas falas e experiências me fizeram refletir muito sobre minha inicial intenção 
de ensinar o modo empático de ser professor para todos. Confesso que aquela minha 
visão, um tanto quanto romantizada, de revolução que o livro “Liberdade para aprender” 
(ROGERS, 1972) poderia realizar na educação ficou abalada. As falas expressam os 
conflitos na relação professor aluno, a falta de empatia (principalmente dos professores 
que afirmam não quererem acessar o mundo dos seus alunos), a falta de voz dos alunos e 
a insatisfação dos professores. Mas também nos apresentam “sintomas” de um sistema 
educacional que dificilmente será modificado (e modificará as relações que o constituem) 
enquanto seguir profundamente marcado por relações hierárquicas muito rígidas e 
burocráticas (que submetem não só alunos, mas também profissionais de educação às 
mudanças perpetradas de cima para baixo pelas secretarias de educação). 
Além disso, esta experiência trouxe reflexões sobre as possibilidades de atuação 
dos psicólogos escolares, pois entendo que 
o papel do psicólogo atuante na instituição escolar seria, portanto, de criar 
espaços de interação onde os atores escolares possam juntos expressar, vivenciar 
e compreender as questões suscitadas no e pelo grupo. E dessa maneira, 
buscariam refletir sobre posturas, valores e atitudes cristalizadas, de modo a 
perceber novas formas de inserção na Escola e no mundo (INSFRAN, 2007, 
p.20). 
 
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Assim, o objeto da pesquisa de doutorado passou a ser as representações sociais 
que os atores escolares – nesta expressão, incluo alunos, professores, direção, 
coordenação e pais – têm da escola, do papel dos educadores, dos objetivos últimos da 
educação oferecida por esta instituição. Por último, mas não menos importante, pedi aos 
participantes da pesquisa que explicassem como achavam que viveriam a experiência de 
estar no lugar das pessoas dos grupos de pertencimento à escola diferentes do seu. Explico 
melhor: pedi aos alunos que descrevessem como vivenciariam a experiência de ser 
professor da escola ou diretor/ coordenador. Solicitei aos pais, professores e funcionários 
que fizessem o mesmo e dessa forma, se colocassem num lugar diferente do seu naquele 
contexto escolar (INSFRAN, 2010). Com a ajuda de colegas psicólogos e estagiários de 
psicologia, realizei grupos de reflexão nas três escolas onde a pesquisa de doutorado foi 
feita e os resultados destes grupos estão apresentados no artigo “Grupos de reflexão na 
escola: contribuições da abordagem centrada na pessoa para a psicologia escolar” 
(INSFRAN, 2011). 
Os resultados desta pesquisa de doutorado, realizada em três escolas com públicos 
bastante distintos – uma era particular, outra municipal e a terceira era escola técnica 
federal – não trouxeram novidades em termos das relações professores-alunos em 
comparação com a experiência na escola da zona norte do Rio (INSFRAN, 2007). Porém, 
ficou claro a falta de uma relação mais afetiva entre professores e alunos, pois isto foi 
insistentemente verbalizado por alunos e apareceu na pesquisa como uma discrepância na 
comparação das respostas de alunos e professores sobre que funções os professores 
deveriam exercer: 
Os professores representavam os alunos como “carentes”, buscando alguém que 
“os compreenda na íntegra”. E os alunos veem os professores como mais 
distantes, que buscam apenas “o reconhecimento do trabalho deles”. Relatos de 
alunos nos grupos focais deixam claro que estes vivenciam, com a maioria dos 
professores, uma relação meramente funcional/ formal, que segundo eles não 
colabora para o sucesso no desempenho das funções de ensino e de 
aprendizagem. Alguns alunos afirmaram aprender mais com professores mais 
flexíveis, que permitem algum tipo de “relaxamento” durante as aulas e não 
impõe que eles tenham que ficar todo o tempo “quietos como um túmulo” 
(INSFRAN, 2010, p.169). 
 
Essa maneira diferente de representar e entender o papel do professor e do aluno 
na escola pode ser fruto de uma visão conservadora dos professores, que esperam que 
comportamentos e atitudes padronizados sejam condutores do bom desempenho escolar 
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(ANDRADA, 2005). Também podemos avaliar através dessas falas e de pesquisas 
anteriores que, na visão da maioria dos professores e professoras, para que haja um bom 
desempenho das funções de professor, a dimensão cognitiva deve prevalecer sobre a 
dimensão afetiva. Duas pesquisas citadas na tese apontam para isso. A pesquisa de Dotta 
(2006) mostra que as representações sociais da função docente estariam relacionadas a 
um modelo pedagógico tradicional – o que fica bem claro na pesquisa, quando tanto 
professores quanto funcionários nos apresentam seu cotidiano de trabalho estritamente 
em termos de cumprimento de funções profissionais. Outra pesquisa (COSTA, 
ALMEIDA, 1998) reafirma essa hipótese, ao evidenciar que dentre os atributos apontados 
por professores para definir o bom professor, foram mais valorizadas as categorias 
profissionais e cognitivas, ficando em segundo plano, as categorias sócio-afetivas e 
políticas. 
Segundo Souza Filho e Corsini (2009), para que o empreendimento educacional 
alcance o desempenho esperado, ambos os lados – professores e alunos – precisam estar 
abertos ao reconhecimento das demandas dos interlocutores. Assim, a proposta que 
defendi (e defendo) com a tese de doutorado, é que possamos nos valer do ferramental 
excelente que nos foi apresentado por Rogers (2002), e passemos a intervir nas escolas 
de forma diferente daquela esperada e demandada pelo paradigma médico-individual-
medicalizante – intervenções individuais, laudos, psicodiagnósticos e encaminhamentos. 
Como psicólogas e psicólogos escolares temos condições de colaborar para uma 
mediação/ facilitação das relações escolares, através de grupos de reflexão que 
possibilitem “desconstruir visões cristalizadas sobre as relações estabelecidas” 
(INSFRAN, 2011, p.116). 
E este processo de mudança, que implica numa modificação no paradigma das 
relações interpessoais na escola, seria desencadeado pelo trabalho de facilitação 
de um psicólogo que tem o papel de “propiciar abertura”, colocando-se, desta 
forma, “como ´auxiliar das forças de atualização´”. Dessa forma, “a autonomia 
é respeitada, porque o tipo de relação é totalmente diferente daquele da 
imposição” (AMATUZZI, 1989, p. 52 apud INSFRAN,2011, p.116). 
 
Falando especificamente sobre Psicologia Escolar, devido ao investimento na 
carreira acadêmica, nunca tive a oportunidade de atuar diretamente como psicóloga 
escolar, porém já são muitos anos atuando como pesquisadora e supervisora de estágios 
em escolas (para formação de psicólogos e de professores) e como professora de 
disciplinas ligadas à área (lecionei Psicologia Escolar para cursos de psicologia em três 
[Digite aqui] 
 
universidades privadas e leciono há 6 anos Psicologia da Educação para cursos de 
licenciatura na Universidade Federal Fluminense - UFF). 
Nestes anos de UFF, como professora de graduação e pós graduação na área de 
educação, busquei desenvolver aulas bastante motivadoras, dando sempre muito espaço 
para discussões que unissem teoria e prática, através de experiências anteriores dos alunos 
nas suas escolas de origem. Acredito que esta rememoração das práticas docentes a que 
foram submetidos na educação básica os ajudou/ ajuda muito a colocarem-se no papel de 
professor e no lugar dos alunos, exercitando assim uma empatia necessária à reflexão 
sobre que educação temos e queremos. 
Trabalhando todos os semestres com textos de Patto [Maria Helena Souza Patto] 
nas minhas aulas e nos grupos de pesquisa e extensão, percebo que as palavras 
da autora desestabilizam, causam mal estar, revolta e às vezes desespero 
naqueles que se percebem como personagens dos casos de (re)provação escolar 
narrados por ela (INSFRAN, 2016, p. 94). 
Assim, busquei desenvolver discussões fundamentadas nas contribuições da 
Psicologia Escolar e Educacional através da visão sócio histórica de autores consagrados 
na área, como Maria Helena Souza Patto (1999), visando desvelar os impactos das teorias 
psicológicas na concepção de tendências pedagógicas. Percebi que as discussões foram 
bastante impactantes para alguns alunos, principalmente no curso de Pedagogia, e de 
imediato, logo na minha 2ª semana de trabalho na UFF, um grupo de 10 alunos me 
procurou perguntando se eu poderia montar um grupo de estudos para aprofundarmos tais 
discussões. E desta forma surgiu o grupo de estudos, que posteriormente se tornou um 
projeto de Desenvolvimento Acadêmico com alunos bolsistas, intitulado “Grupo de 
Pesquisa Educação e Humanismo”, onde estudamos algumas obras de Carl Rogers (1972; 
2001; 2002), de Paulo Freire (1987; 1996), de Patto (1997; 1999; 2005), e autores que 
discutem e apresentam tendências pedagógicas democráticas, como José Pacheco (2011), 
Rubem Alves (2001) e Moacir Gadotti (2007), entre outros autores. 
Durante quase dois anos, mantive o grupo de estudos em concomitância com a 
coordenação de área do PIBID/ CAPES (Projeto Institucional de Bolsa de Iniciação à 
Docência) onde realizei atividades com 19 bolsistas CAPES do curso de Pedagogia em 
escolas municipais e estaduais da Educação Infantil à Formação de Professores em Ensino 
Médio (curso Normal). Aceitar coordenar um projeto PIBID foi um enorme desafio que 
me trouxe muitas e gratas experiências como formadora de professores e pesquisadora. 
Realizamos diversos projetos nas escolas onde atuamos e nos deparamos com 
[Digite aqui] 
 
dificuldades que nos ajudaram muito a repensar a formação de professores inicial e 
continuada. 
Destaco aqui o artigo “Experiências de iniciação à docência na educação infantil” 
publicado em um livro sobre o PIBID UFF, onde eu e dois colegas que atuaram antes de 
mim como coordenadores do mesmo projeto, relatamos que “nossas vivências nos 
sinalizaram a existência de um olhar docente (estigmatizante) que muitas vezes ‘exclui’ 
a criança por não conhecer e respeitar os seus contextos socioculturais” (REIS, 
INSFRAN, GUIMARAES, 2016, p. 47). Assim, percebemos que já na educação infantil, 
os rótulos das dificuldades de aprendizagem se faziam presentes e buscamos 
problematizar com nossos estagiários – futuros professores – as consequências desses 
rótulos (muitos dos quais, equivocados) no processo de aprendizagem e desenvolvimento 
dessas crianças. 
Consideramos o olhar e a escuta comprometida um exercício fundamental aos 
educadores, que não querem incorrer no erro de aprisionar seus aprendizes em 
rótulos estigmatizadores e/ou em tempos espaços escolares sem sentido para as 
necessidades e interesses da infância (REIS, INSFRAN, GUIMARAES, 2016, 
p.50). 
 
É possível perceber que existe uma estreita relação entre a falta de empatia na 
relação professor aluno, valorização do modelo pedagógico tradicional/ normativo e a 
rotulação/ estigmatização dos alunos que não seguem estritamente a norma/ padrão 
esperado de aprendizagem. Assim, considerei muito pertinente desenvolver ensino, 
pesquisa e extensão sobre fracasso escolar e medicalização na perspectiva sócio histórica 
e crítica, seguindo a tradição de Patto (1999) e colaboradores. 
Em suma, este memorial teve como objetivo narrar meu percurso de buscas/ 
recuos/ entusiasmos/ frustrações, ao longo de quase duas décadas tentando entender como 
a educação poderia ser o caminho para a redução da desigualdade social deste país. Neste 
percurso, cruzei com muitos teóricos que me ajudaram a descortinar o complexo sistema 
educacional e vivi experiências prazerosas e dolorosas que fincaram meus pés no chão e 
colaboraram muito para desenvolver minha compreensão empática de todos os 
envolvidos nas relações escolares. 
Assim, coloco como desafio para finalizar este capítulo, um tópico onde, a partir 
dos autores apresentados acima, poderemos refletir sobre a importância da empatia nas 
relações (de maneira geral) de modo a superarmos o paradigma individualizante-
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fragmentado- normativo-neoliberal-indiferente-ao-outro no qual estamos mergulhados... 
e quase submersos. 
 
Considerações Finais: resistência e superação são as palavras de ordem 
 
Conforme vimos no tópico anterior, a falta de empatia nas relações escolares 
compôs todas as cenas do panorama de experiências que apresentei através das minhas 
pesquisas. Retomando o objetivo deste capítulo, um questionamento se faz necessário: 
como superar a pouca empatia observada nas relações escolares – hegemonicamente 
calcadas no paradigma tradicional de educação, que contribui muito pouco para 
experiências significativas de aprendizagem? 
Tanto Paulo Freire como Carl Rogers preconizam que um processo de 
aprendizagem verdadeiramente significativa só será possível se atitudes facilitadoras do 
responsável por oportunizar essa aprendizagem colaborarem para isso. Freire explica em 
seu livro “Pedagogia da Autonomia” que ensinar não é meramente transferir 
conhecimento ou conteúdos. O educador precisa ter bom senso, respeitar a autonomia do 
educando, não confundir autoridade com autoritarismo, estar disponível ao diálogo e à 
escuta, reconhecer que a educação é ideológica (FREIRE, 1996). O autor entende que a 
ação do educador “deve estar infundida na profunda crença nos homens. Crença no seu 
poder criador” (FREIRE, 1987, p.35). 
Na visão de Rogers (1972), o professor deve atuar como facilitador da 
aprendizagem significativa do aluno, ou seja: deve dar liberdade para que a curiosidade 
do aluno o leve para novas direções ditadas pelos seus próprios interesses; deve instigar 
esse interesse em conhecer, abrindo tudo ao questionamento e à exploração; deve, 
portanto, facilitar uma aprendizagem experiencial, que contemple dimensões para além 
da cognitiva (que sempre foi a ênfase do modelo tradicional de aprendizagem, focada nos 
conteúdos). 
O conteúdo da aprendizagem, embora significativo, fica num plano secundário. 
Assim, um curso termina com sucesso não quando os alunos ‘aprenderam tudo 
o que precisam saber’, mas quando fizeram um progresso significativo na 
aprendizagem de como aprender o que querem saber. (...) A direção é auto-
escolhida, a aprendizagem é auto-iniciada e as pessoas estão empenhadas no 
processo de uma forma global, com sentimentose paixões tanto quanto com o 
intelecto (ROGERS, 1983, p. 97) 
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O autor também considera fundamental que o facilitador tenha uma atitude 
autêntica com seu educando, que busque ser ele mesmo com os alunos, tendo uma atitude 
honesta e real quanto ao que sente e pensa em relação àquilo que é produzido pelos alunos. 
“Os líderes, ou pessoas percebidas como representantes da autoridade na situação 
[facilitadores], são suficientemente seguros interiormente e em seus relacionamentos 
pessoais, de modo a confiarem na capacidade das outras pessoas de pensar, sentir e 
aprender por si mesmas” (ROGERS, 1983, p. 96). 
Além disso, na visão de Rogers (1972), um facilitador da aprendizagem, assim 
como um psicoterapeuta, deve ter apreço, aceitação e confiança com relação ao aluno, 
suas opiniões e seus sentimentos. Isso faz com que o aluno se sinta importante, um 
indivíduo diferenciado e não apenas mais um. 
Com relação à compreensão empática, a terceira atitude a qual o professor deve 
recorrer para facilitar a aprendizagem significativa do aluno, Rogers explica que é 
fundamental que o professor possa colocar-se na posição do aluno para compreender suas 
reações frente àquilo que lhe é apresentado no processo de aprendizagem. Fica muito 
claro nas pesquisas apresentadas anteriormente, que esta atitude é almejada pelos alunos, 
mas que o paradigma que rege o projeto educacional vigente não dá conta dessa demanda. 
Paulo Freire cunhou o termo “educação bancária” ao comparar o modelo 
tradicional de educação ao depósitos bancários, já que entende que no paradigma vigente 
de educação o professor deposita conteúdos no aluno, que os aceita passivamente, sem 
reflexões ou questionamentos: “quanto mais se exercitem os educandos no arquivamento 
dos depósitos que lhes são feitos, tanto menos desenvolverão em si a consciência crítica 
de que resultaria a sua inserção no mundo como transformadores dele. Como sujeitos” 
(FREIRE, 1987, p. 34). 
As críticas de Freire (1987; 1996) ao modelo hegemônico e ainda vigente de 
educação desagradam muito àqueles que querem manter o status quo da divisão e 
exploração social entre dominantes e dominados. Há décadas celebrado fora do país, 
Paulo Freire foi perseguido, preso e exilado durante a ditadura militar brasileira (1964-
1985), esteve por algum tempo (pós abertura política) “em moda” na formação de 
professores e nos últimos anos havia caído no esquecimento, até a extrema direita trazer 
seu nome à tona, em meio a manifestações de rua e nas redes sociais com críticas rasas e 
descabidas ao educador, que é patrono da educação brasileira e o terceiro pensador mais 
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citado no mundo em universidades da área de humanas (CALÇADE, 2018). O atual 
presidente da República prometeu, durante sua campanha eleitoral, “expurgar a ideologia 
de Paulo Freire da educação”, por considerar que seus ensinamentos “marxistas” 
atrapalhariam o desenvolvimento dos alunos. 
Já dizia Freire (1987, p.35): 
A questão está em que pensar autenticamente é perigoso. (...) Na verdade, o que 
pretendem os opressores ´é transformar a mentalidade dos oprimidos e não a 
situação que os oprime´, e isto para que, melhor adaptando-os a esta situação, 
melhor os dominem. (...) Na medida em que esta visão ´bancária´ anula o poder 
criador dos educandos ou os minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua 
criticidade, satisfaz aos interesses dos opressores. 
Rogers (2001) ao ter contato com o livro “Pedagogia do Oprimido”, de Freire, faz 
uma constatação importante sobre a ameaça que o obra de Freire e a sua representam para 
líderes autoritários: 
Ele teve apenas cinco anos para trabalhar no Brasil, antes de ser preso; a antiga 
ordem e a junta militar que assumiu o poder, em 1964, temiam-no. Ele foi 
convidado a deixar o país, indo para o Chile, onde, desde então, tem trabalhado 
com várias organizações internacionais. Tenho dito sempre que, caso nosso país 
venha a ser governado por uma ditadura, um de seus primeiros atos – se eles 
forem mesmo inteligentes – será prender a mim e aos outros adeptos de um ponto 
de vista centrado-na-pessoa (ROGERS, 2001, p.122) 
Sim, não foi à toa que Paulo Freire foi perseguido no passado e corre o risco de 
ser “expurgado” atualmente... 
Fazendo um aparte para falar sobre a falta de empatia destes tempos sombrios que 
estamos vivendo no Brasil, ressalto que com a chegada da extrema direita ao poder, no 
final de 2018, valores hegemônicos economicamente ultra liberais e ideologicamente 
conservadores estão sendo apresentados à sociedade como o único caminho possível para 
a sobrevivência e perpetuação do capitalismo, desconsiderando todas as mazelas que a 
manutenção de produção e consumo desenfreados causam ao meio ambiente e às relações 
sociais. Conquistas sociais e políticas de grupos minoritários que até meados dos anos 
2010 eram vistas como legítimas e irrevogáveis, foram (e estão sendo) questionadas, 
direitos e políticas públicas retirados e/ou extintos em prol da redução do Estado e dos 
gastos públicos. Mais privatizações estão em curso (ameaçando inclusive a oferta de 
educação superior gratuita), assim como reformas que podem precarizar ainda mais as 
condições de trabalho e aposentadoria da maior parte da população. Apesar de tantos 
prejuízos anunciados e alguns já em curso, uma parcela significativa da população parece 
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não se importar com tais perdas, porque não se sentem prejudicada e/ou não se sensibiliza 
com as mazelas de grupos sociais alheios ao seu. 
Desta forma, podemos crer que esta dificuldade de se colocar no lugar do outro 
(principalmente um outro bem diferente de mim) está alicerçada num discurso de suposta 
neutralidade ideológica, mas que na verdade é impregnado da ideologia neoliberal que 
valoriza competição, meritocracia e livre arbítrio, desconsiderando o contexto de enorme 
desigualdade social, racial, sexual em que estamos inseridos. 
"Enquanto hegemonia, o neoliberalismo não interfere somente na economia, mas 
estende seu domínio às questões sociais e políticas. Tendo suas bases fincadas 
num mercado altamente competitivo e definido pela concorrência, a ideologia 
neoliberal introjeta no imaginário coletivo a noção moralizante de que aqueles 
que não conseguiram ser assimilados pelo sistema são fracassados e, mais que 
isso, responsáveis por esse fracasso. Exemplo disso é a disseminação da rasa 
ideia do “livre arbítrio”, que, ao desconsiderar todo o contexto social de exclusão 
e marginalização no qual estão inseridos os indivíduos das camadas 
precarizadas, conclui vulgarmente que muitos deles “escolhem” cometer crimes 
ao longo da vida. Nada mais simplista para a análise de um fenômeno tão 
complexo, sobretudo quando consideramos a forte ligação entre violência e 
desigualdade" (ORSOMARZO, 2019)3. 
 
Freire (1996) já alertava, no início dos anos 1990, para o risco de ficarmos míopes 
diante das ideologias e aconselhava os professores a não cair em armadilhas como, por 
exemplo, achar que não existe ideologia no desejo de “matar as ideologias”. O educador 
considera que o antídoto contra as distorções de realidade que as ideologias podem causar 
é o olhar/ reação crítica a todo discurso que se apresenta como verdade absoluta ou único 
caminho. 
Orsomarzo (2019) e Freire (1996) concordam que a ideologia neoliberal buscou 
naturalizar a realidade de exclusão de bilhões de pessoas ao redor do mundo, de modo 
que esta realidade não fosse questionada e problematizada como produção histórica do 
capitalismo globalizado na sua vertente mais agressiva e desumana. Romantizar a 
desigualdade e vende-la como superação é uma potente arma do neoliberalismo para 
resignar as massas. “Em tempos de demonização da “ideologia” por quem se diz “sem 
 
3 Retirado do site da Revista Carta Capital. Referência completa no final destecapítulo. 
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ideologia” (???), urge combatermos aquela que segrega, mata e exclui.” (ORSOMARZO, 
2019). 
Retorno à questão inicial, agora ampliada pelas novas discussões: como superar a 
pouca empatia observada nas relações escolares, quando valores como meritocracia, 
autoritarismo e livre concorrência competem com empatia, solidariedade e democracia? 
Uma fala de Rogers, ainda na década de 1970, quando questionado sobre o 
fracasso de Paulo Freire, que desenvolveu uma revolucionária abordagem educacional e 
foi preso e exilado por isso, joga luz sobre tudo que foi discutido até aqui: 
Vocês poderiam dizer que Freire falhou, visto que foi expulso do país como um 
revolucionário perigoso. Talvez. Mas, de acordo com minha experiência com a 
abordagem centrada-na-pessoa, acho que, para cada pessoa despedida ou 
exilada, surgem inúmeros agentes de mudança, independentes em pensamento e 
ação (ROGERS, 2001, p. 124). 
 Nossa resistência, que talvez se torne re-existência, está em seguir acreditando no 
que aprendemos de forma muito significativa com esses autores e que pudemos 
experienciar enquanto educadores, cidadãos e humanos. As ações de resistência são 
muitas e se multiplicam a cada dia, cada vez que alguém lê um texto como este e reflete 
sobre suas práticas cotidianas. Sigamos! 
 
 
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