Buscar

BASES DA PATOLOGIA EM VETERINARIA pdf_part_2

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 1835 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 1835 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 1835 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Fig. 13-4 Hematopoiese normal, aspirado de medula óssea de cão.
Coloração de Wright. ESE, estágio eritroide precoce; ESM, estágio mieloide precoce; LSE, estágio
eritroide avançado; LSM, estágio mieloide avançado.
(Cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee.)
Regulação da hematopoiese
O controle da hematopoiese é complexo, apresentando muitas redundâncias,
mecanismos de feedback e vias que tangenciam outros processos fisiológicos e
patológicos. Muitas citocinas influenciam células de diferentes linhagens e estágios de
diferenciação. O objetivo desta seção não é explicar as vias regulatórias em detalhes;
mas, em vez disso, fornecer ampla visão geral e, assim, uma base para o
entendimento dos mecanismos das doenças que envolvem o sistema hematopoiético.
Eritropoiese
Eritropoiese — de erythros (vermelho, em grego) — se refere à produção de glóbulos
vermelhos do sangue, ou eritrócitos, cuja principal função é a troca gasosa (oxigênio
[O2] e dióxido de carbono [CO2]). O regulador dominante da eritropoiese é uma
glicoproteína, convenientemente denominada eritropoetina (Epo). A Epo atua sobre
as células progenitoras eritroides nos estágios mais iniciais juntamente com outras
citocinas, incluindo interleucinas (IL-3, IL-4 e IL-9), fator estimulante de colônia
granulocítica-monocítica (GM-CSF) e fator de crescimento semelhante à insulina. A
Epo é sintetizada principalmente nos rins e exerce seus efeitos promovendo a
proliferação e inibindo a apoptose dos precursores eritroides em desenvolvimento
que expressam receptores para Epo. A hipóxia é o estímulo para aumentar a
produção de Epo. Devido ao fato de os eritrócitos sintetizarem hemoglobina, da qual
o ferro é um componente essencial, a eritropoiese necessita de disponibilidade
adequada de ferro. Existem sistemas fisiológicos para conservar e reciclar o ferro,
como será discutido adiante.
O precursor eritroide em estágio mais precoce identificável por meio de
microscopia de luz é o rubriblasto, que sofre divisões no processo de maturação para
produzir uma progênie de 8-32 células. Os precursores eritroides no estágio tardio,
conhecidos como metarrubrícitos, expulsam seus núcleos e tornam-se reticulócitos, que
são células no estágio de maturação imediatamente anterior ao eritrócito maduro. Os
reticulócitos iniciam sua maturação na medula óssea e a terminam na circulação
sanguínea periférica e no baço (os equinos são uma exceção, pois não liberam
reticulócitos na circulação, mesmo em situações de demanda aumentada). O tempo
de transformação de rubriblasto até eritrócito maduro é de aproximadamente 1
1836
semana. Diferentemente dos eritrócitos maduros, que não possuem organelas, os
reticulócitos ainda mantêm ribossomos e mitocôndrias, principalmente para dar
suporte à finalização da síntese da hemoglobina. Essas organelas remanescentes
conferem um tom aproximadamente azul-púrpura aos reticulócitos (policromasia)
observados em esfregaços sanguíneos corados pelas técnicas de rotina e, quando
corados com corante como o novo azul de metileno, precipitam agregados azul-
escuros e irregulares (Fig. 13-5). Os gatos também têm uma forma mais imatura de
reticulócito na circulação, o reticulócito pontilhado, que apresenta um padrão de
coloração mais fino quando corado com o novo azul de metileno, mas não aparece
azul-púrpura (policromatofílico) quando se realizam colorações de rotina em
esfregaços sanguíneos (seção Anemia).
Fig. 13-5 Reticulocitose, esfregaços sanguíneos de cão.
A, Reticulócitos (setas) aparecem policromatofílicos em esfregaços corados pelas colorações de rotina.
Coloração de Wright. B, Reticulócitos. Precipitação de RNA na forma de agregados é corada de azul
(setas) pelo novo azul de metileno.
(Cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee.)
Os eritrócitos maduros circulam por longo tempo quando comparados com outras
células sanguíneas. A média de vida dos eritrócitos varia entre as espécies:
aproximadamente 150 dias em equinos e bovinos, 100 dias em cães e 70 dias em
gatos. Eritrócitos, portanto, têm de ser células altamente resilientes, capazes de
suportar contínuas tensões mecânicas e bioquímicas. Na maioria dos mamíferos, os
eritrócitos têm forma de disco bicôncavo, algumas vezes denominado discócito.
Espécies nas quais o discócito não ocorre incluem caprinos (eritrócitos irregulares e
achatados), camelídeos (eritrócitos ovais) e alguns cervídeos (eritrócitos em forma de
foice). Algumas raças de cães (Akita e Shiba) possuem eritrócitos menores do que
outras; os eritrócitos nessas raças também apresentam alta concentração de potássio,
diferentemente dos eritrócitos de outros cães.
Uma das propriedades-chave dos eritrócitos é sua deformabilidade; essas células
1837
alteram sua forma enquanto se movem pela microvasculatura. Essa deformabilidade
decorre da interação entre a membrana plasmática, o citoesqueleto e o conteúdo
intracelular. Os eritrócitos maduros de mamíferos não apresentam núcleo e
organelas, sendo incapazes de realizar transcrição, tradução e metabolismo oxidativo.
Entretanto, os eritrócitos requerem energia para a realização de várias funções,
incluindo a manutenção da forma e deformabilidade, o transporte ativo e a
prevenção de danos oxidativos. Essa energia necessária é gerada inteiramente
através da glicólise (também conhecida como via Embden-Meyerhof). As vias
bioquímicas antioxidantes em eritrócitos são discutidas com mais detalhes na seção
Mecanismos de Defesa.
A concentração de eritrócitos circulantes tipicamente decresce no período pós-
natal e mantém-se abaixo dos níveis observados em animais adultos durante o
período de rápido crescimento corporal. A idade na qual o número de eritrócitos
começa a aumentar e a idade na qual os níveis observados em animais adultos são
alcançados variam entre as espécies. Em cães, os valores adultos são comumente
alcançados entre 4-6 meses de idade; em equinos, isso acontece aproximadamente
com 1 ano de idade. Na maioria das espécies, os eritrócitos são maiores ao
nascimento e seu volume médio diminui à medida que os eritrócitos fetais são
substituídos.
Granulopoiese e monocitopoiese (mielopoiese)
Os granulócitos (neutrófilos, eosinófilos e basófilos) e os monócitos têm funções
imunológicas essenciais, incluindo fagocitose e atividade microbicida (neutrófilos e
macrófagos derivados de monócitos), atividade parasiticida e participação em
reações alérgicas (eosinófilos e basófilos), processamento e apresentação de
antígenos e produção de citocinas (macrófagos). Mediadores inflamatórios, como ILs
e fator de necrose tumoral α (TNF-α), estimulam fibroblastos, macrófagos e células
endoteliais a produzirem citocinas, como o fator estimulante de colônia granulocítica
(G-CSF) e o GM-CSF, que aumentam a granulopoiese e a monocitopoiese.
As células granulocíticas e monocíticas são, às vezes, chamadas coletivamente de
células mieloides. (OBSERVAÇÃO: Essa terminologia pode causar confusão porque
“mieloide” também tem outros significados. Em sentido mais geral, refere-se à
medula óssea. No contexto da hematologia, o termo “mieloide” é algumas vezes
utilizado para se referir a qualquer célula hematopoiética de origem não linfoide,
uma distinção reiterada na classificação das leucemias, como será discutido mais
tarde neste capítulo. Em neuroanatomia, os prefixos “mielo-” ou “miel-” podem se
referir à medula espinhal ou mielina.) O precursor granulocítico ou monocítico mais
precoce que pode ser identificado pela avaliação de rotina por meio de microscopia
1838
de luz é o mieloblasto, que sofre divisões para produzir uma progênie de 16-32
células. O tempo de transformação de mieloblasto até neutrófilo maduro é de
aproximadamente 5 dias. Além disso, uma reserva de neutrófilos completamente
maduros é mantida na medula óssea. O tamanho do chamado compartimento de
reserva depende da espécie animal (as diferenças entre as espécies e a significância
clínica de armazenamento são discutidas com mais detalhes adiante).A concentração de granulócitos mensurada no sangue depende da velocidade de
produção e liberação da medula óssea, e da proporção de células livremente
circulantes dentro da vasculatura versus aquelas transitoriamente aderidas à
superfície endotelial (marginadas) e da velocidade de migração desde a vasculatura
até os tecidos. Os neutrófilos normalmente são os tipos predominantes de leucócitos
no sangue da maioria das espécies domésticas. Eles permanecem na circulação
apenas por um curto período de tempo (menor que 12 horas).
Trombopoiese
Trombopoiese — que tem como origem a palavra thrombos (coágulo, em grego) —
refere-se à produção de plaquetas, que têm um papel central na hemostasia primária
e também participam nos processos de coagulação e inflamação. A trombopoietina
(Tpo), sintetizada principalmente no fígado, é o regulador dominante da
trombopoiese. Diferentemente da Epo, que é regulada para haver maior produção
pela hipóxia, a Tpo é produzida a uma taxa relativamente constante
(constitutivamente). Assim, o mecanismo de regulação da produção é diferente. As
plaquetas e seus precursores expressam o receptor da Tpo, que se liga à Tpo na
circulação. Quando a massa plaquetária é diminuída, menos Tpo está ligada aos
receptores plaquetários e a concentração aumentada de Tpo livre no plasma estimula
a trombopoiese.
A trombopoiese difere fundamentalmente de outras formas de hematopoiese. As
plaquetas (às vezes chamadas de trombócitos) são células anucleadas formadas não
por divisão maturacional, mas pela eliminação de fragmentos citoplasmáticos ligados
à membrana oriundos de células precursoras chamadas megacariócitos.
(OBSERVAÇÃO: Aves e répteis produzem trombócitos da mesma forma que outras
células sanguíneas, e seus trombócitos e eritrócitos são nucleados.) Como o nome
sugere, megacariócitos são células muito grandes, muito maiores do que quaisquer
outras células hematopoiéticas (Fig. 13-6). Os megacariócitos surgem das células
progenitoras e sofrem endomitose para se tornarem poliploides (usualmente 8N-
32N). À medida que essas células se tornam maduras, os megacariócitos aumentam
de tamanho e seu citoplasma torna-se mais abundante. Eles alteram o seu padrão de
coloração (em aspirados corados pelo Wright) de intensamente basofílico para
1839
eosinofílico, e seus núcleos mudam de redondos para altamente lobulados. Os
megacariócitos estendem os processos citoplasmáticos para dentro dos lúmens dos
sinusoides venosos da medula óssea, onde as plaquetas são eliminadas na circulação.
O tempo de vida das plaquetas na circulação é de aproximadamente 6 dias nos cães.
Fig. 13-6 Megacariócito, aspirado de medula óssea de cão.
Observe o grande tamanho da célula, o núcleo lobulado e o citoplasma abundante e granular.
Coloração de Wright.
(Cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee.)
As plaquetas normalmente circulam em estado quiescente, como discos
achatados. A ativação das plaquetas é disparada por agonistas solúveis, como a
trombina, ou por agonistas insolúveis, como o colágeno. As plaquetas expressam
receptores de superfície para fibrinogênio, fator de von Willebrand (vWF), colágeno
e outros ligantes. Outras características-chave das plaquetas incluem uma rede de
invaginações da membrana conhecida como sistema canicular aberto (não presente
nos bovinos), que facilita a expansão da área de superfície e a liberação do conteúdo
dos grânulos em resposta à ativação; retículo endoplasmático especializado,
conhecido como sistema tubular denso, que age como reservatório de cálcio; e os
componentes citoesqueléticos envolvidos na mudança de forma, liberação do
conteúdo dos grânulos, interações com receptores e retração de coágulo. Quando
ativadas, as plaquetas mudam para formas mais esféricas com pseudópodes e
participam de diversos processos que ocorrem nos locais onde há dano vascular:
• Aderência ao colágeno subendotelial exposto
• Secreção de conteúdo bioativo de grânulos (incluindo cálcio, adenosina difosfato
[ADP], fibrinogênio, vWF, histamina, serotonina e outros)
• Agregação com outras plaquetas
1840
• Ao final, fusão com outras plaquetas para formar um tampão plaquetário
Fosfolipídios (especialmente fosfatidilserina) expressos na superfície das
plaquetas ativadas também auxiliam a localizar a coagulação (formação de um
coágulo de fibrina insolúvel) em focos de dano vascular.
Linfopoiese
Linfopoiese refere-se à produção de novos linfócitos. Os linfócitos T e os linfócitos B
são as principais células efetoras da imunidade mediada por células e da imunidade
humoral, respectivamente. A linfopoiese é discutida com mais detalhes no Capítulo 5,
mas uma breve introdução geral é fornecida nesta seção. Os linfócitos T originam-se
na medula óssea e migram para o timo, onde sofrem os processos de diferenciação,
seleção e maturação antes de migrarem para o tecido linfoide periférico como células
efetoras. O desenvolvimento dos linfócitos B ocorre em duas fases: primeiro, em uma
fase independente de antígeno na medula óssea e nas placas de Peyer no íleo (local
de desenvolvimento dos linfócitos B nos ruminantes); e, depois, em uma fase
dependente de antígeno nos tecidos linfoides periféricos (como baço, linfonodos e
tecido linfoide associado à mucosa [MALT]). O tráfego de linfócitos ocorre sob
orientação de quimiocinas (citocinas quimioatrativas). Uma vez que os linfócitos
tenham migrado para o tecido linfoide periférico, essas células podem sofrer
expansão clonal em resposta a estímulos antigênicos.
Diferentemente de outras células hematopoiéticas, que circulam somente em
vasos sanguíneos, os linfócitos transitam tanto nos vasos sanguíneos quanto nos
vasos linfáticos, continuamente recirculando entre os dois sistemas. Em muitas
espécies, a maior parte dos linfócitos na circulação sanguínea são linfócitos T.
Notoriamente, os bovinos têm, em geral, quantidades maiores de linfócitos do que
neutrófilos na circulação. No entanto, trabalhos recentes sugerem que vacas
holandesas no meio da lactação podem fugir a essa regra, provavelmente por causa
de mudanças na genética e na pecuária.
Hemostasia (coagulação e função plaquetária)
A hemostasia — que tem como origem as palavras haima (sangue, em grego) e stasis
(parado, em grego) — refere-se à parada do sangramento. Os principais
componentes responsáveis pela hemostasia são as plaquetas, os vasos sanguíneos e o
sistema de coagulação. Hemorragias podem surgir caso qualquer um desses
componentes esteja alterado. Embora os fatores da coagulação sejam sintetizados
principalmente no fígado, são incluídos neste capítulo em razão da sua ligação
inseparável com o sistema hematopoiético.
1841
A hemostasia envolve processos coordenados: a formação de um tampão
plaquetário no local do dano vascular (hemostasia primária), o desenvolvimento de
uma rede insolúvel de fibrina entrecruzada que produz um coágulo estável
(hemostasia secundária), e retração e degradação enzimática do coágulo (hemostasia
terciária). Os principais componentes desses processos são resumidos no Capítulo 2 e
nas Figuras 2-12 a 2.17. Resenha, histórico e sinais clínicos são importantes na
avaliação de qualquer paciente com suspeita de tendência a sangramento, porém os
testes laboratoriais são necessários para, definitivamente, identificar os defeitos
hemostáticos específicos. Os exames de rotina para a avaliação da hemostasia estão
resumidos no Apêndice Web 13-1 no site VetConsult em
www.elsevier.com.br/vetconsult.
Vasos Sanguíneos
Os vasos sanguíneos apresentam numerosas funções na hemostasia. As células
endoteliais produzem e metabolizam muitas moléculas envolvidas na promoção e
regulação da hemostasia (Fig. 2-16). Por exemplo, produzem moléculas pró-
trombóticas, como vWF e tromboxano A2; moléculas antitrombóticas, como
prostaciclina (PGI2), trombomodulina e óxido nítrico; e moléculas fibrinolíticas, como
o ativador tecidual do plasminogênio. Quando um vaso sanguíneo é danificado,
ocorre rápida e transitória vasoconstrição neuromecânica como resposta.O colágeno
subjacente ao endotélio danificado fornece um suporte estrutural para a aderência
plaquetária e a formação do coágulo, e também age como fundamental ativador
bioquímico de plaquetas e da via intrínseca do sistema de coagulação (ver a próxima
seção).
Sistema de Coagulação
O processo de estancar a hemorragia de um vaso sanguíneo danificado basicamente
depende da formação de um coágulo estável de fibrina. Esse processo depende, por
sua vez, de várias proteínas plasmáticas, ou fatores de coagulação, que normalmente
circulam em estado inativo como proenzimas. Esses fatores de coagulação,
juntamente com outras moléculas, incluindo proteínas não enzimáticas, cálcio e
fosfolipídios plaquetários, são conhecidos coletivamente como sistema de coagulação.
A ativação do sistema de coagulação inicia uma série de reações enzimáticas
interligadas, que resulta na produção de trombina. A trombina converte a proteína
solúvel do plasma, o fibrinogênio, em fibrina; por sua vez, as moléculas de fibrina
são submetidas enzimaticamente a ligações cruzadas para formar um coágulo
insolúvel. Para facilitar o entendimento e a interpretação dos resultados dos testes,
considera-se o sistema de coagulação, convencionalmente, como constituído por três
1842
http://www.elsevier.com.br/vetconsult
vias inter-relacionadas. Essas vias – a intrínseca, a extrínseca e a comum – são
resumidas na Figura 2-13.
As vias anticoagulante e fibrinolítica fornecem “verificações e balanços” críticos.
Essas vias são iniciadas simultaneamente com a ativação do sistema de coagulação.
As vias procoagulantes e anticoagulantes são reguladas em múltiplos níveis e,
normalmente, mantêm-se em equilíbrio que evita estados hipercoaguláveis ou
hipocoaguláveis. Alguns reguladores-chave da hemostasia estão listados no Quadro
Web 13-1 no site VetConsult em www.elsevier.com.br/vetconsult. Os mecanismos
contrarregulatórios são críticos para a prevenção de coagulação inapropriada ou
excessiva e para a final dissolução do coágulo (fibrinólise) após sua formação. A
fibrinólise resulta da ação da plasmina sobre a fibrina ( Figs. 2-14, 2-16 e 2-17). O
plasminogênio, uma proenzima inativa, é convertido em plasmina por várias
moléculas, incluindo o ativador tecidual do plasminogênio, o fator XII e a trombina.
Observa-se que algumas dessas moléculas (p. ex., o fator XII e a trombina)
apresentam ambos os efeitos pró-coagulante e anticoagulante. Há também
reguladores da fibrinólise, incluindo inibidores de plasminogênio e plasmina. A
fibrinólise resulta nos produtos de degradação da fibrina (PDFs). O dímero D é um
tipo específico de PDF que resulta da degradação da ligação cruzada da fibrina
insolúvel. Os produtos fibrinolíticos (PDFs e dímero D) no sangue são frequentemente
mensurados para detectar coagulação inadequada e são também de importância
clínica, pois podem prejudicar a hemostasia pela inibição da polimerização da fibrina
e da função das plaquetas.
Plaquetas
Os princípios básicos da função plaquetária foram descritos na seção anterior,
Trombopoiese. As plaquetas normalmente circulam em estado quiescente, como
discos achatados. A ativação das plaquetas é disparada por agonistas solúveis, como
a trombina, ou por agonistas insolúveis, como o colágeno. As plaquetas expressam
receptores de superfície para o fibrinogênio, o vWF, o colágeno e outros ligantes.
Outras características-chave das plaquetas incluem uma rede de invaginações da
membrana conhecida como sistema canicular aberto (não presente nos bovinos), que
facilita a expansão da área de superfície e a liberação dos grânulos em resposta à
ativação; o retículo endoplasmático especializado, conhecido como sistema tubular
denso, que age como reservatório de cálcio; e os componentes citoesqueléticos, que
medeiam a mudança da forma, a liberação dos grânulos, as interações com receptores
e a retração do coágulo. Quando ativadas, as plaquetas mudam para formas mais
esféricas com pseudópodes e participam de diversos processos que ocorrem nos locais
de dano vascular:
1843
http://www.elsevier.com.br/vetconsult
• Aderência ao colágeno subendotelial exposto
• Secreção de conteúdo bioativo de grânulos (incluindo cálcio, adenosina difosfato
[ADP], fibrinogênio, vWF, histamina, serotonina e outros)
• Agregação com outras plaquetas
• Ao final, fusão com outras plaquetas (processo conhecido como metamorfose
viscosa) para formar um tampão plaquetário
Fosfolipídios (p. ex., fosfatidilserina) expressos na superfície das plaquetas
ativadas também ajudam a localizar a coagulação em focos de dano vascular.
Portas de entrada
As células ou micro-organismos invasores têm acesso à medula óssea ou à circulação
sanguínea por via hematogênica ou por trauma. O trauma pode ser tão óbvio como
uma ferida aberta ou sutil como a picada de um inseto. As portas de entrada para a
medula óssea estão resumidas no Quadro 13-1.
Quadro 13-1 Portas de Entrada na Medula Óssea
Medula óssea
Via hematogênica
Penetração direta (trauma)
Mecanismos de defesa
A medula óssea é envolta por uma carapaça protetora de osso cortical, e o
fornecimento de sangue para a medula dá acesso a defesas sistêmicas humorais e
celulares. Certamente, os próprios leucócitos atuam como parte essencial da
inflamação e função imunológica, conforme discutido brevemente na seção
Granulopoiese e Monocitopoiese, e com mais detalhes nos Capítulos 3 e 5.
As etapas bioquímicas na via glicolítica, ou ligadas a ela, geram moléculas
antioxidantes que capacitam os eritrócitos a resistirem aos insultos oxidativos
durante seus muitos dias em circulação. Somada à produção de energia na forma de
adenosina trifosfato (ATP), a glicólise gera nicotinamida adenina dinucleotídeo
reduzida (NADH), que ajuda a converter a forma oxidada e não funcional da
hemoglobina, conhecida como metaemoglobina, de volta ao seu estado reduzido ativo.
Outra via metabólica antioxidante do eritrócito, o desvio da hexose monofosfato ou
1844
desvio da pentose, gera fosfato de nicotinamida adenina dinucleotídeo reduzida
(NADPH), que ajuda a manter a glutationa no estado reduzido.
Respostas à agressão
Os principais mecanismos de lesão da medula óssea e das células sanguíneas são
mostrados no Quadro 13-2 e serão discutidos em detalhes aqui.
Quadro 13-2 Mecanismos de Doença na Medula Óssea e Células Sanguíneas
Medula óssea
Hipoplasia
Hiperplasia
Displasia
Aplasia
Neoplasia
Mieloptise (fibrose, neoplasia metastática)
Necrose
Inflamação
Células sanguíneas
Destruição aumentada
Hemorragia (especialmente eritrócitos)
Consumo (plaquetas)
Neoplasia
Distribuição alterada
Função anormal
Medula óssea
As respostas da medula óssea às agressões incluem padrões anormais de proliferação
de células hematopoiéticas normais, proliferações de células hematopoiéticas
anormais (neoplásicas ou não neoplásicas), substituição do tecido hematopoiético
normal por células anormais ou tecido fibroso, necrose e inflamação. Cada uma delas
é discutida mais adiante; a relação entre hematopoiese alterada e as concentrações
de células sanguíneas na circulação é discutida em mais detalhes na próxima seção,
Células Sanguíneas.
A nomenclatura clássica para descrever os diferentes tipos de proliferação celular
anormal aplica-se também ao sistema hematopoiético, com algumas exceções e
1845
modificações. Hiperplasia, um aumento no número de células, pode ser obviamente
uma resposta adequada a estímulos (p. ex., hiperplasia eritroide em resposta à
hipóxia ou hiperplasia granulocítica em resposta a estímulos inflamatórios). Em
outras situações, a hiperplasia é um fenômeno secundário para o qual um estímulo
específico pode não estar claro — por exemplo, várias condições (inflamação,
neoplasia, deficiência de ferro, asplenia e outras) estão associadas à trombocitose
reativa, na qual uma concentração aumentada de plaquetas circulantes reflete
hiperplasia megacariocítica. Às vezes, a hiperplasia é idiopática. Por exemplo, a
hiperplasia esplênica nodular, que frequentemente inclui componentes
hematopoiéticos, é muitas vezesum achado incidental.
A hipertrofia, um aumento no tamanho da célula, não é uma descrição
convencional para células hematopoiéticas ou para a medula óssea como órgão.
Células hematopoiéticas anormalmente grandes são consideradas evidência de
displasia ou formação celular alterada (alterações na forma ou organização das
células são também consideradas evidência de displasia). A displasia de células
hematopoiéticas, indicando hematopoiese alterada, pode ser primária (idiopática) ou
secundária a inúmeras condições, incluindo infecção, nutrição inadequada e
intoxicação. Infelizmente, a terminologia pode, algumas vezes, gerar confusão. Por
exemplo, síndromes mielodisplásicas são distúrbios hematopoiéticos clonais de
células-tronco que são de fato neoplásicas (seção Neoplasia Hematopoiética). O
aumento de volume do baço é comumente referido como esplenomegalia e pode
refletir outros processos que não a hiperplasia ou a hipertrofia celular (p. ex.,
congestão). Da mesma forma, o aumento de volume dos linfonodos é tipicamente
referido como linfadenopatia ou linfadenomegalia e pode refletir hiperplasia linfoide ou
outros processos (p. ex., neoplasia, inflamação ou edema).
A substituição de tecido hematopoiético na medula óssea por tecido anormal,
geralmente por tecido fibroso ou células malignas, é conhecida como mieloptise. O
termo metaplasia, usado para descrever a substituição de células que formam
normalmente um tecido por outras também bem diferenciadas, raramente é usado
para descrever tecidos hematopoiéticos em medicina veterinária, apesar de, em
humanos, os nomes metaplasia mieloide e hematopoiese extramedular serem algumas
vezes utilizados como sinônimos. Da mesma forma, o termo atrofia, que significa
uma redução no tamanho de uma célula, tecido, órgão ou parte dele, raramente é
utilizado para descrever alterações na medula óssea. Em vez disso, um decréscimo no
tecido hematopoiético da medula óssea é tipicamente referido como hipoplasia,
conforme discutido mais adiante na seção sobre citopenias. A ausência de tecido
hematopoiético de determinada linhagem celular é tipicamente referida como aplasia
ou, se afeta todas as linhagens, anemia aplásica, denominação equivocada (mais
1846
adequado seria pancitopenia aplásica). A exceção é a “atrofia serosa da gordura”, uma
condição associada à desnutrição, na qual a gordura é catabolizada e as células
reticulares da medula óssea produzem uma substância fundamental mucoide
(consulte a Figura Web 13-1 no site VetConsult em www.elsevier.com.br/vetconsult).
Entretanto, nem as células hematopoiéticas nem a gordura estão necessariamente
ausentes da medula óssea nessa condição, e outros nomes, como transformação
gelatinosa, têm sido sugeridos para descrevê-la. A neoplasia da medula óssea ou de
órgãos linfoides pode ser primária ou secundária (metastática). Neoplasmas podem
originar-se de qualquer linhagem hematopoiética. Tipos específicos de neoplasmas
hematopoiéticos (leucemias, linfomas e outros) serão descritos mais adiante neste
capítulo.
A fibrose (mielofibrose) e a necrose da medula óssea estão associadas com muitas
condições comuns subjacentes e, muitas vezes, ocorrem em conjunto e são descritas
mais extensivamente em cães. Condições conhecidas ou suspeitas de causar
mielofibrose e necrose incluem sepse, câncer (especialmente tumores malignos
hematopoiéticos), toxicidade por drogas e doenças imunomediadas (especialmente
anemia hemolítica imunomediada não regenerativa [IMHA]).
A inflamação da medula óssea pode assumir diferentes formas. Inflamação
granulomatosa em resposta à infecção por fungos (p. ex., histoplasmose) ou
micobacteriose pode ser evidente histologicamente ou como hiperplasia dos
macrófagos em preparações citológicas a partir de aspirados. Os organismos
fagocitados no interior dos macrófagos são detectáveis com qualquer dos dois tipos de
exame. Cães e gatos com IMHA não regenerativa muitas vezes têm inflamação da
medula óssea, além de fibrose e necrose. A inflamação é evidente como deposição de
fibrina, edema e infiltrados neutrofílicos multifocais; citopenias imunomediadas
também estão associadas com hiperplasia linfocitária e/ou plasmocitária da medula
óssea.
Células sanguíneas
As respostas das células sanguíneas circulantes à agressão incluem diminuição da
sobrevida (destruição, consumo ou perda), distribuição alterada e estrutura ou função
(ou ambas) alteradas. Essas respostas não são mutuamente excludentes — por
exemplo, a estrutura dos eritrócitos alterados pode levar à diminuição da sobrevida.
Muitas vezes, mas nem sempre, essas respostas resultam em diminuição das
concentrações de células sanguíneas circulantes.
Concentrações Anormais de Células Sanguíneas
Citopenia — que tem como origem as palavras kytos (vaso oco, em grego) e penia
1847
http://www.elsevier.com.br/vetconsult
(pobreza, em grego) — refere-se a uma diminuição nas células sanguíneas
circulantes, daí aos termos neutropenia, trombocitopenia, linfopenia e assim por diante.
Os mecanismos básicos causadores de citopenias incluem produção diminuída
(hipoplasia), destruição aumentada, perda sanguínea, consumo e distribuições
anatômicas alteradas (p. ex., deslocamento entre os compartimentos marginais e
circulantes no sangue ou entre o baço e a circulação sanguínea periférica). A maioria
desses mecanismos pode causar citopenia em mais de uma linhagem, e alguns
processos afetam várias linhagens simultaneamente. Diminuição prolongada da
produção de todas as três principais linhagens hematopoiéticas da medula óssea
resulta em pancitopenia (anemia, neutropenia e trombocitopenia). A pancitopenia
pode ocorrer devido à mieloptise, em que o tecido normal da medula óssea é
substituído por células ou tecidos anormais (como no caso da obliteração por células
malignas ou tecido fibroso) ou devido a uma anormalidade das próprias células
hematopoiéticas. A destruição das células-tronco hematopoiéticas, ou células
progenitoras, causa uma condição conhecida como anemia aplásica ou pancitopenia
aplásica, que é discutida em mais detalhes na seção de doenças específicas.
O padrão de desenvolvimento das citopenias é parcialmente dependente da
cinética normal das células sanguíneas. O tempo de vida das diferentes células
sanguíneas circulantes varia marcadamente (neutrófilos: horas; plaquetas: dias;
eritrócitos: meses). Assim, neutropenia grave tipicamente desenvolve-se dentro de 1
semana após o término da granulopoiese e após a depleção do compartimento de
armazenamento de neutrófilos da medula óssea, ao passo que trombocitopenia grave
tipicamente se desenvolve na 2a semana após a parada de trombopoiese. A anemia
desenvolve-se muito mais vagarosamente após a parada da eritropoiese,
dependendo, em parte, de quão rapidamente a medula se recupera da agressão e
também da variação do tempo de vida dos eritrócitos nas diferentes espécies de
animais.
O aumento na concentração de muitas células sanguíneas é indicado pelo sufixo -
ose (eritrocitose, linfocitose, monocitose e trombocitose). Aumento no número de
granulócitos é indicado pelo sufixo -filia (neutrofilia, eosinofilia e basofilia). Os
mecanismos básicos causadores do aumento da concentração das células sanguíneas
variam consideravelmente de acordo com o tipo de célula e serão discutidos em mais
detalhes adiante. As neoplasias podem resultar em número aumentado ou diminuído
de células sanguíneas. Em muitos tipos de neoplasmas hematopoiéticos,
especialmente leucemias, há números prontamente detectáveis de células neoplásicas
no sangue. Tipos específicos de neoplasmas hematopoiéticos serão discutidos adiante
neste capítulo. Concentrações elevadas de células sanguíneas podem também ocorrer
secundariamente a muitas formas de neoplasia (i.e., como síndrome paraneoplásica),
1848
incluindo neoplasmas não hematopoiéticos, devido à produção de citocinas
estimulatórias pelo tumor.
Os laboratórios veterinários tipicamente fornecem valores hematológicos de
referência que são específicos a cada espécie, fundamentados em populações de
referênciade animais adultos clinicamente normais. Entretanto, é importante notar
que valores normais podem variar não somente entre espécies, mas em função de
outros fatores, como idade, raça, localização geográfica e diferenças metodológicas
entre os laboratórios.
Os mecanismos de doenças que causam citopenias e concentrações
anormalmente aumentadas de determinados tipos de células sanguíneas são
abordados com mais detalhes na seção seguinte.
Anemia
Anemia refere-se à massa de eritrócitos ou à concentração de hemoglobina abaixo do
normal. A anemia causa sinais clínicos relacionados à diminuição da capacidade de
carregar oxigênio (palidez das membranas mucosas, letargia, fraqueza e intolerância
a exercícios) e pode também resultar em anormalidades detectáveis devido à hipóxia
tecidual (p. ex., atividade aumentada das enzimas hepáticas como resultado do dano
induzido pela hipóxia aos hepatócitos). A anemia também pode causar diminuição da
viscosidade do sangue e, em casos acentuados, frequentemente causa murmúrios
cardíacos como resultado da diminuição do fluxo de sangue laminar.
Classificar a anemia como regenerativa ou não regenerativa é clinicamente útil,
pois fornece informações acerca do mecanismo da doença (Tabela 13-1). A marca
registrada de anemias regenerativas, exceto em equinos, é a reticulocitose (número
aumentado de reticulócitos [eritrócitos imaturos] circulantes), que fica evidente pela
policromasia em esfregaço sanguíneo corado por técnicas de rotina. Em ruminantes,
a reticulocitose é frequentemente acompanhada de pontilhado basofílico (Fig. 13-7).
Tabela 13-1 Classificação da Anemia
1849
Fig. 13-7 Pontilhado basofílico e policromasia, esfregaço sanguíneo de bovino.
Os eritrócitos desse bovino com anemia regenerativa incluem várias células com pontilhados
basofílicos (seta) e duas células policromatofílicas (reticulócitos) (pontas de seta). Coloração de
Wright.
(Cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee.)
A reticulocitose indica eritropoiese aumentada na medula óssea (Fig. 13-8) e
liberação, para a circulação sanguínea, de eritrócitos antes de estarem
completamente maduros (estágios mais precoces na linha de produção). A
reticulocitose é uma resposta apropriada à anemia. Forte resposta regenerativa pode
produzir aumento no volume corpuscular médio (VCM) e diminuição na concentração
de hemoglobina corpuscular média (CHCM) no hemograma, pois os reticulócitos são
maiores e apresentam concentração de hemoglobina mais baixa que os eritrócitos
maduros. O equino é uma exceção nesse esquema de classificação, pois essa espécie
não libera reticulócitos na circulação, nem mesmo quando sua medula está
1850
produzindo número aumentado de eritrócitos. Equinos com resposta regenerativa
podem apresentar aumento no VCM e na amplitude de distribuição eritroide (um
índice de variação no tamanho da célula). No entanto, a determinação definitiva de
regeneração em equinos requer exame da medula óssea, pelo qual a evidência de
regeneração é a hiperplasia eritroide, ou hemogramas seriados, nos quais a evidência
de regeneração é o aumento do número de eritrócitos com o passar do tempo. Os
reticulócitos pontilhados em gatos são evidentes quando o sangue é corado com o
novo azul de metileno, mas essas células não são interpretadas como reticulócitos no
hemograma porque apresentam a mesma aparência de eritrócitos maduros no exame
de esfregaços sanguíneos.
Fig. 13-8 Medula óssea hematopoieticamente ativa, fêmur, bezerro.
Observe que a medula óssea tem consistência uniforme e é vermelha ou vermelho-escura. Essa
resposta é característica de medula óssea hematopoieticamente ativa.
(Cortesia de Dr. Ramos, Universitat Autónoma de Barcelona; e de Noah’s Arkive, College of Veterinary Medicine, The
University of Georgia.)
Outro dado que pode acompanhar a regeneração, juntamente com a
reticulocitose, é a presença de células eritroides nucleadas (normoblastos).
Entretanto, a presença de normoblastos circulantes (normoblastemia) não é, por si
só, evidência definitiva de regeneração e de fato pode significar diseritropoiese (p.
1851
ex., devido à intoxicação por chumbo ou lesão da medula óssea) ou disfunção
esplênica. Quando os normoblastos estão presentes como parte da resposta
regenerativa à anemia, o número relativo dessas células deve ser menor que o
número dos reticulócitos.
Lembre que o estímulo para aumentar a eritropoiese é a secreção aumentada da
Epo em resposta à hipoxemia. Apesar de a ação da Epo sobre a eritropoiese ser
rápida, a evidência de resposta regenerativa não é imediatamente aparente em uma
amostra de sangue. Um dos principais efeitos da Epo é expandir o compartimento
eritroide em estágio inicial, o que demanda certo tempo para essas células se
diferenciarem até o ponto em que serão liberadas na circulação. No caso de perda
aguda de sangue, por exemplo, normalmente são necessários 3-4 dias até que a
reticulocitose seja evidente no hemograma, e vários dias até o pico da resposta
regenerativa. Um período de tempo similar também é necessário em casos de
hemólise aguda. O termo pré-regenerativo é algumas vezes utilizado para descrever a
anemia com resposta regenerativa que está em formação, mas não ainda aparente no
hemograma. Confirmar uma resposta regenerativa em tais casos requer evidência de
hiperplasia eritroide na medula óssea ou a emergência de reticulocitose nos dias
subsequentes.
Anemia regenerativa ocorre devido à hemorragia ou hemólise. Alguns acreditam
ser útil lembrar os “dois H” (hemorragia e hemólise). No caso de hemorragia,
eritrócitos e outros componentes do sangue escapam dos vasos. A hemorragia pode
ser aguda ou crônica, interna ou externa. As causas de hemorragia incluem trauma,
hemostasia anormal, certas formas de parasitismo, ulceração e neoplasias. Portanto,
anemias regenerativas geralmente ocorrem não devido a um problema eritropoiético,
mas por um processo que afeta eritrócitos que já foram liberados na circulação
sanguínea. Entretanto, é importante observar que hemorragia crônica causa depleção
dos estoques de ferro do corpo, levando a uma anemia por deficiência de ferro, que
pode tanto ser regenerativa quanto não regenerativa. Uma resposta regenerativa
pode ocorrer quando a deficiência estiver resolvida ou temporariamente compensada
(p. ex., quando a hemorragia cessa ou quando o paciente subitamente tem acesso a
um aumento dietético ou parenteral de ferro). Anemias não regenerativas, e
especificamente a anemia por deficiência de ferro, serão discutidas com mais detalhes
adiante neste capítulo.
A hemólise pode ser intravascular, se os eritrócitos liberarem o seu conteúdo,
principalmente hemoglobina, diretamente na corrente sanguínea, ou extravascular,
se os macrófagos fagocitarem os eritrócitos e pouca ou nenhuma hemoglobina for
liberada na corrente sanguínea. As duas formas (principalmente a hemólise
extravascular) ocorrem como parte da homeostase e envolvem vias para conservar o
1852
ferro e outros componentes reutilizáveis na hematopoiese. Entretanto, algumas
doenças estão associadas a maior destruição de eritrócitos por um ou ambos os
mecanismos. Nas próximas seções, serão discutidos com mais detalhes mecanismos
básicos de hemólise intravascular e extravascular em situações normais e patológicas.
O turnover normal dos eritrócitos ocorre, principalmente, pela hemólise
extravascular, na qual eritrócitos senescentes são fagocitados pelos macrófagos no
baço e, em menor grau, em outros órgãos, como o fígado (células de Kupffer) e a
medula óssea. O controle exato não está bem determinado, mas fatores que
comumente têm alguma participação incluem:
• Exposição dos componentes de membrana que normalmente estão escondidos no
folheto interno da membrana celular, principalmente fosfatidilserina (esse
mecanismo também é importante na apoptose de outros tipos de células).
• Deformabilidade diminuída.
• Ligação de IgG e/ou complemento.
• Dano oxidativo.
Os macrófagos digerem os eritrócitos em componentes reutilizáveis, comoferro e
aminoácidos, e em produto de degradação, a bilirrubina. A hemólise intravascular
ocorre fisiologicamente apenas em níveis extremamente baixos. A hemoglobina é um
tetrâmero que, quando liberado do eritrócito no sangue, divide-se em dímeros e liga-
se a uma proteína plasmática denominada haptoglobina. O complexo hemoglobina-
haptoglobina é captado por hepatócitos e macrófagos. Essa é a principal via para o
processamento da hemoglobina livre. Entretanto, a hemoglobina livre pode ainda ser
oxidada para formar metaemoglobina, que se dissocia para formar metaeme e
globina. O metaeme liga-se a uma proteína plasmática denominada hemopexina, que
é captada pelos hepatócitos e macrófagos de maneira similar à do complexo
hemoglobina-haptoglobina. O heme livre na forma reduzida liga-se à albumina e
então é captado no fígado para formar bilirrubina.
Na anemia hemolítica, os eritrócitos são destruídos em taxa maior. A natureza do
mecanismo, ou seja, intravascular, extravascular ou uma combinação de ambos,
depende do processo específico da doença (doenças específicas serão discutidas
adiante neste capítulo). Uma sequela clássica das anemias hemolíticas, em geral, é a
hiperbilirrubinemia, que é um aumento da concentração de bilirrubina no plasma. A
bilirrubina é um pigmento amarelo, o que explica por que a hiperbilirrubinemia,
quando suficientemente grave, causa icterícia — o amarelamento macroscopicamente
visível do soro sanguíneo ou tecido (Fig. 13-9). A icterícia de membrana mucosa, pele
ou outro tecido é normalmente detectada quando a concentração de bilirrubina no
1853
plasma excede 2 mg/dL. A hemólise é causa de hiperbilirrubinemia pré- hepática,
mas é importante notar que a hiperbilirrubinemia também pode ocorrer como
resultado de condições hepáticas ou pós-hepáticas causando fluxo biliar
comprometido (colestase).
Fig. 13-9 Icterícia, anemia hemolítica imunomediada, tecido adiposo subcutâneo, esplenomegalia,
baço, cão.
A acentuada coloração amarela dos tecidos, mais evidenciada no tecido adiposo subcutâneo, resulta
da alta concentração de bilirrubina da anemia hemolítica.
(Cortesia de Dr. J.A. Ramos-Vara, College of Veterinary Medicine, Michigan State University; e de Noah’s Arkive,
College of Veterinary Medicine, The University of Georgia.)
Os achados laboratoriais e as observações clínicas podem indicar mecanismos
específicos de hemólise. Em pacientes com anemia hemolítica extravascular, a
destruição aumentada de eritrócitos pelos macrófagos esplênicos frequentemente
resulta em esplenomegalia (Fig. 13-10). A esplenomegalia também pode ocorrer em
razão de outras condições, como discutido em outro local deste capítulo. A hemólise
intravascular é macroscopicamente evidente como hemoglobinemia (em que o
plasma ou o soro encontra-se tingido de rosa) se a concentração extracelular de
hemoglobina for maior que 50 mg/dL. A haptoglobina está saturada com
hemoglobina dimérica a uma concentração de aproximadamente 150 mg/dL. Quando
a haptoglobina estiver saturada, qualquer hemoglobina livre remanescente terá peso
molecular suficientemente baixo para passar através do filtro renal glomerular e
1854
então pigmentar a urina (hemoglobinúria), dando coloração rósea ou vermelha à
urina. Assim, a hemoglobina extracelular pode causar coloração macroscópica do
plasma quando está ligada à haptoglobina antes de tornar-se visível
macroscopicamente na urina. A meia-vida da haptoglobina é marcadamente
diminuída quando ligada à hemoglobina, de modo que, quando grande quantidade do
complexo hemoglobina-haptoglobina é formada, a concentração de haptoglobina no
sangue diminui e a hemoglobina pode passar pelo glomérulo até mesmo em
concentrações mais baixas. A hemoglobinúria é um fator contribuinte para a necrose
tubular renal (nefrose hemoglobinúrica), que frequentemente ocorre em casos de
hemólise intravascular aguda (Cap. 11). Lesão similar ocorre nos rins dos indivíduos
com acentuado dano muscular e resultante mioglobinúria.
Fig. 13-10 Esplenomegalia, anemia hemolítica fatal, Mycoplasma suis, suíno.
O baço está extremamente aumentado de volume, carnoso e congesto.
(Cortesia de College of Veterinary Medicine, University of Illinois.)
A hemoglobinúria não pode ser macroscopicamente distinguida da hematúria
(eritrócitos na urina) ou da mioglobinúria; tanto a hemoglobina quanto a mioglobina
causam uma reação positiva para “sangue oculto” na fita-teste. A comparação das
colorações da urina e do plasma pode ser informativa. Em contraste com a
hemoglobina, a mioglobina causa alteração macroscópica da cor da urina antes que a
cor do plasma se altere. Isso ocorre porque a mioglobina é um monômero de baixo
peso molecular, livremente filtrado pelos glomérulos e não se liga a proteínas
plasmáticas em grau significativo. A hematúria pode ser distinguida da
hemoglobinúria por meio de exame microscópico do sedimento da urina (eritrócitos
estão presentes nos casos de hematúria).
Os dados obtidos no hemograma são frequentemente úteis para elucidar os
mecanismos hemolíticos. A concentração total de hemoglobina é, convencionalmente,
medida lisando todos os eritrócitos em uma concentração conhecida e determinando
a concentração da hemoglobina em solução por meio de um espectrofotômetro. O
valor para a hemoglobina corpuscular média (HCM) é calculado com base na
concentração total de hemoglobina e na contagem de eritrócitos. O valor para a
CHCM é calculado com base na HCM e no VCM. Dessa maneira, embora os
eritrócitos não contenham concentração de hemoglobina além do normal, o excesso
de hemoglobina extracelular pode causar aumento artificial da HCM e da CHCM
calculadas. É importante lembrar que aumentos similares podem ocorrer
1855
artificialmente devido à interferência positiva com a medida espectrofotométrica da
hemoglobina, como ocorre na lipemia.
A hemólise extravascular também produz, frequentemente, alterações
características no hemograma que podem refletir o mecanismo da doença. Por
exemplo, a esferocitose e a autoaglutinação são marcas registradas de IMHA.
Esferócitos formam-se quando os macrófagos (principalmente no baço) fagocitam
parte da membrana plasmática do eritrócito ligada aos anticorpos (Fig. 13-11). A
porção remanescente do eritrócito assume forma esférica, preservando, assim, o
máximo de volume. Essa alteração na forma resulta em diminuição da
deformabilidade das células. Os eritrócitos precisam ser extremamente flexíveis para
atravessar a polpa vermelha esplênica e as paredes dos sinusoides (Fig. 13-12); os
esferócitos, portanto, tendem a ser retidos no baço em íntima associação com os
macrófagos, o que aumenta o risco de danos adicionais que podem terminar em
destruição eritrocitária. Em cães, os esferócitos parecem menores do que o normal e
apresentam coloração uniforme (Fig. 13-13, A), em contraste com os eritrócitos
normais, que apresentam uma região de palidez conferida pela sua forma bicôncava.
Essa diferença na coloração entre esferócitos e eritrócitos normais é difícil de
discernir em várias outras espécies domésticas (como gatos, equinos e bovinos), cujos
eritrócitos diferem daqueles do cão por serem menores, apresentarem biconcavidade
menos pronunciada e, portanto, palidez central também menos pronunciada. A
autoaglutinação ocorre devido à ligação cruzada de anticorpos ligados aos eritrócitos.
Ela é evidente microscopicamente como um agrupamento de eritrócitos e,
macroscopicamente, como sangue de consistência granular (Fig. 13-13, B). A
autoaglutinação pode também resultar em falso aumento do VCM e diminuição do
número de eritrócitos quando as células aglutinadas são erroneamente contadas como
uma única célula por um analisador hematológico automatizado.
Fig. 13-11 Representação esquemática dos mecanismos da esferocitose e hemólise extravascular
(HE).
A esferocitose hereditária ocorre em seres humanos (como mostrado aqui) devido às mutações que
enfraquecem as conexões entre o citoesqueleto e as proteínas de membrana. Em casos de anemia
1856
hemolítica imunomediada, a causa mais frequentede esferocitose em animais, o mecanismo subjacente
da doença é diferente — os esferócitos são formados quando porções da membrana dos eritrócitos
ligadas a autoanticorpos são fagocitadas por macrófagos —, mas o resultado obtido (esferocitose e
HE) é semelhante ao que é mostrado nessa figura. GP, glicoproteína.
(De Kumar V, Abbas AK, Fausto N, et al: Robbins & Cotran pathologic basis of disease, ed. 8, Philadelphia, 2009,
Saunders.)
Fig. 13-12 Representação esquemática de um sinusoide esplênico.
Um eritrócito está comprimido pelos cordões da polpa vermelha no lúmen do sinusoide. Observe o
grau de deformabilidade necessário para os eritrócitos atravessarem a parede do sinusoide.
(De Kumar V, Abbas AK, Fausto N: Robbins & Cotran pathologic basis of disease, ed. 7, Philadelphia, 2005, Saunders.)
1857
Fig. 13-13 Anemia hemolítica imunomediada, sangue de cão, cão.
A, Esferocitose. São visíveis numerosos esferócitos (setas) e diversas células policromatofílicas, uma
das quais (ponta de seta) contém um remanescente nuclear conhecido como corpúsculo de Howell-
Jolly. Coloração de Wright. B, Autoaglutinação. Observe a aglutinação nitidamente visível. C,
Esferocitose e aglutinação. Observe os esferócitos (setas) e a aglutinação microscópica dos eritrócitos
em cão que recebeu transfusão de sangue. Essas anormalidades presumivelmente indicam destruição
imunomediada dos eritrócitos do doador. Coloração de Wright.
(A, cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee. B e C, de Harvey JW: Atlas of
veterinary hematology: blood and bone marrow of domestic animals, Philadelphia, 2001, Saunders.)
Os danos oxidativos aos eritrócitos ocorrem quando vias antioxidantes normais
que geram agentes redutores (como glutationa reduzida, NADH e NADPH) são
comprometidas ou saturadas e podem resultar em anemia hemolítica, função anormal
da hemoglobina ou ambas. A hemólise causada por danos oxidativos pode ser
extravascular, intravascular ou uma combinação de ambas (formas predominantes de
hemólise são discutidas adiante na seção de doenças específicas). A evidência de
danos oxidativos nos eritrócitos pode ser aparente no exame de um esfregaço
sanguíneo ou até mesmo em um exame físico geral. Os corpúsculos de Heinz são focos
de globina desnaturada que interagem com a membrana do eritrócito. Essas
estruturas são, em geral, discretamente evidentes por meio da avaliação de rotina do
esfregaço sanguíneo corado com Wright, sendo visualizadas como inclusões pálidas e
circulares ou na forma de protuberâncias arredondadas e rombas nas margens da
1858
célula, prontamente discerníveis por meio do esfregaço corado com o novo azul de
metileno (Fig. 13-14). Os gatos são particularmente suscetíveis à formação dos
corpúsculos de Heinz, e fisiologicamente podem apresentar baixo número de
pequenos corpúsculos de Heinz. Não há unanimidade de opinião, mas alguns
patologistas clínicos acreditam que a presença de corpúsculos de Heinz em até cerca
de 10% de todos os eritrócitos está dentro de limites normais para gatos. Acredita-se
que essa predisposição reflete a característica única do eritrócito felino, cuja
hemoglobina apresenta mais grupamentos sulfidrila (locais preferenciais de dano
oxidativo) do que os eritrócitos de outras espécies e pode ter, também, menor
capacidade redutora intrínseca. É também possível que o baço do gato, que é não
sinusoidal, não possua função eficiente para remover esses corpúsculos, como o baço
sinusoidal do cão (estrutura e função esplênica são discutidas em mais detalhe
adiante neste capítulo). Os excentrócitos, observados como eritrócitos nos quais um
lado da célula apresenta palidez aumentada, são também outra manifestação de dano
oxidativo. Os excentrócitos formam-se pela ligação cruzada das proteínas de
membrana, com adesão de áreas opostas do folheto interno da membrana da célula e
o deslocamento da maior parte da hemoglobina para o outro lado (Fig. 13-15). O
dano oxidativo resulta da conversão da hemoglobina (ferro no estado Fe2+) para
metaemoglobina (ferro no estado Fe3+), que é incapaz de se ligar ao oxigênio. A
metaemoglobina é produzida normalmente em pequenas quantidades, mas é reduzida
de volta a oxiemoglobina pela enzima citocromo-b5 redutase (também conhecida
como metaemoglobina redutase). A metaemoglobinemia resulta da produção excessiva
de metaemoglobina (devido ao dano oxidativo) ou do comprometimento das vias
normais para manutenção de hemoglobina com ferro no estado Fe2+ (como na
deficiência de citocromo-b5 redutase). Quando presente em concentração
suficientemente alta (aproximadamente 10% da hemoglobina total), a
metaemoglobina confere coloração chocolate característica ao sangue.
Fig. 13-14 Corpúsculos de Heinz, esfregaços sanguíneos.
1859
A, Esfregaço sanguíneo de gato. Na coloração de rotina, os corpúsculos de Heinz são observados
como inclusão pálida e circular intraeritrocítica que pode se projetar (setas) além da margem celular.
Coloração de Wright. B, Esfregaço sanguíneo de cão. Na coloração supravital, os corpúsculos de
Heinz são inclusões azuis (setas) e podem ser mais facilmente observados. Coloração de novo azul de
metileno.
(Cortesia de Dr. M.M. Fry, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee.)
Fig. 13-15 Anormalidades morfológicas comuns dos eritrócitos.
A, O sangue de um cão com anemia microcítica hipocrômica por deficiência de ferro foi misturado
com volume igual de sangue de um cão normal antes de o esfregaço sanguíneo ser preparado. As
células hipocrômicas (pálidas) são os leptócitos mostrados em F, pois apresentam diâmetro
semelhante às células normais, apesar de serem células microcíticas. Coloração de Wright-Giemsa. B,
Equinócitos aparecem como eritrócitos com bordas indentadas; consequentemente, o termo antigo
“crenação”, do latim “entalhado”, é utilizado para denominar essas células. Coloração de Wright-
Giemsa. C, Três acantócitos com espículas irregularmente espaçadas e de tamanhos variados no
sangue de um cão com hemangiossarcoma. Coloração de Wright-Giemsa. D, Um queratócito exibindo
estrutura que parece ser uma “vesícula” rompida no sangue de um gato com lipidose hepática.
Coloração de Wright-Giemsa. E, Esquistócito (esquerda), discócito (em cima) e equinócito (embaixo)
no sangue de um cão com hemólise intravascular disseminada. Coloração de Wright-Giemsa. F, Dois
eritrócitos hipocrômicos (leptócitos) com aumento do quociente membrana:volume são observados no
sangue de um cão com anemia grave por deficiência de ferro. O leptócito de baixo está dobrado.
Coloração de Wright-Giemsa. G, Três codócitos no sangue de um cão da raça Cairn terrier com
anemia regenerativa e hemocromatose hepática secundária à deficiência de piruvato quinase. Esses
eritrócitos exibem densidade central e são chamados muitas vezes de células-alvo. Coloração de
Wright-Giemsa. H, Três excentrócitos e um discócito (esquerda) no sangue de um cão com dano
oxidativo induzido pela administração de acetaminofeno. A célula em cima e ao centro é esférica com
pequena ondulação de citoplasma e pode ser denominada picnócito. Coloração de Wright-Giemsa.
(De Harvey JW: Atlas of veterinary hematology: blood and bone marrow of domestic animals, Philadelphia, 2001,
1860
Saunders.)
As anemias não regenerativas são caracterizadas por falta de reticulocitose no
hemograma; entretanto, a reticulocitose não ocorre em equinos, nem mesmo no
contexto de regeneração. Na maior parte das vezes, isso é resultado da produção
diminuída pela medula óssea (i.e., hipoplasia eritroide). Os eritrócitos circulam por
longo tempo; por isso, anemias causadas por diminuição da produção tendem a se
desenvolver lentamente. A forma mais comum de anemia não regenerativa é
conhecida como anemia da inflamação ou anemia da doença crônica. Nessa forma de
anemia, o número de eritrócitos diminui, mas, em geral, eles são normais em
tamanho e concentração de hemoglobina (então denominada anemia normocítica
normocrômica). É conhecido de longa data que pacientes com doença inflamatóriacrônica ou outra doença crônica tornam-se frequentemente anêmicos e que essa
condição está associada ao aumento dos estoques de ferro na medula óssea. O
sequestro de ferro pode ser uma adaptação evolucionária bacteriostática porque
muitas bactérias requerem ferro como cofator para o crescimento. Nos últimos anos,
as pesquisas têm começado a desvendar os mecanismos moleculares que envolvem a
anemia da inflamação. A hepcidina, uma proteína de fase aguda sintetizada no
fígado que foi primeiramente identificada como um peptídeo antimicrobiano, é um
mediador-chave que age limitando a quantidade de ferro disponível. A expressão da
hepcidina aumenta com inflamação, infecção ou sobrecarga de ferro e diminui com
anemia ou hipóxia. A hepcidina exerce seus efeitos causando deficiência de ferro
funcional. Ela se liga à molécula de efluxo de ferro na superfície celular, a
ferroportina, e causa sua degradação, inibindo, assim, tanto a absorção de ferro
dietético pelo epitélio intestinal como a exportação de ferro de macrófagos e
hepatócitos para o plasma (Fig. 13-16).
1861
Fig. 13-16 Mecanismo de ação da hepcidina.
Ligação da hepcidina com a ferroportina causa sua internalização e degradação, inibindo o efluxo de
ferro no plasma.
(Cortesia de Dr. J.F. Zachary, College of Veterinary Medicine, University of Illinois.)
A anemia da inflamação envolve outros fatores além da disponibilidade
diminuída de ferro. Citocinas inflamatórias tendem a inibir a eritropoiese por dano
oxidativo aos eritrócitos e desencadeiam apoptose de células eritroides em
desenvolvimento por diminuírem a produção de Epo e fator de células-tronco, e por
diminuírem a manifestação de receptores de Epo. Além disso, a inflamação estéril
experimentalmente induzida em gatos resultou em sobrevida diminuída do eritrócito,
indicando que a anemia da inflamação provavelmente também resulta da destruição
aumentada de eritrócitos.
A verdadeira deficiência de ferro tem sido reconhecida há bastante tempo como
causa de anemia. Em animais domésticos, a deficiência de ferro ocorre mais
comumente pela perda crônica de sangue, que consequentemente ocasiona a perda
de ferro na forma de hemoglobina e, menos frequentemente, pela deficiência
alimentar. Apesar de a deficiência de ferro frequentemente resultar em anemia não
regenerativa, isso nem sempre é assim, especialmente quando o ferro nutricional não
é um fator limitante. Muitas condições subjacentes podem causar deficiência de ferro
induzida por hemorragia, incluindo doença gastrointestinal (GI) primária ou
secundária (p. ex., ancilóstomos, neoplasias, úlceras) e ectoparasitismo acentuado. O
1862
quadro hematológico clássico na deficiência de ferro é a anemia microcítica
hipocrômica. A microcitose e a hipocromia são sinalizadas no hemograma,
respectivamente, pelos valores de VCM e CHCM anormalmente baixos. A microcitose
e a hipocromia podem ser discerníveis em uma avaliação do esfregaço sanguíneo
como eritrócitos anormalmente pequenos ou corados palidamente devido à sua
concentração de hemoglobina subnormal, respectivamente. Entretanto, o exame
microscópico não é um método confiável de detecção, especialmente no caso de
anormalidades leves. Acredita-se que a baixa concentração de hemoglobina contribua
para a microcitose, pois um dos mecanismos de feedback que sinaliza as células
eritroides a pararem de se dividir é quando se atinge certo limiar na concentração de
hemoglobina. Concentrações de hemoglobina anormalmente baixas durante a
eritropoiese resultam, assim, em mais divisões celulares e, consequentemente, em
eritrócitos menores. A microcitose mais frequentemente se desenvolve antes da
hipocromia.
Outras causas de eritropoiese diminuída incluem:
• Decréscimo da estimulação hormonal (p. ex., insuficiência renal crônica)
• Desnutrição
• Infecção das células eritropoiéticas
• Danos tóxicos à medula óssea
• Outras doenças envolvendo a medula óssea
• Destruição imunomediada dos precursores eritroides
• Condições hereditárias
Os exemplos específicos de doenças causadoras de anemia não regenerativa por
esses mecanismos serão discutidos mais adiante neste capítulo. É importante apontar
que a anemia não regenerativa nem sempre é causada por decréscimo na
eritropoiese. Por exemplo, a IMHA tem por característica ser fortemente
regenerativa, mas há, também, formas não regenerativas de IMHA. Os achados de
medula óssea em cães com IMHA não regenerativa grave variam de completa
ausência de eritropoiese, conhecida como aplasia eritroide pura, até hiperplasia
eritroide na maioria dos pacientes em um estudo. A última situação é um exemplo de
hematopoiese não efetiva (nesse caso, eritropoiese não efetiva), em que as células são
produzidas em taxa anormal ou aumentada, mas são destruídas, presumivelmente
devido ao mecanismo imunomediado, antes que entrem na circulação sanguínea.
Neutropenia
1863
Neutropenia refere-se à diminuição da concentração de neutrófilos circulantes. A
neutropenia pode ser causada pela produção diminuída, distribuição alterada,
demanda por neutrófilos em tecido inflamado que exceda a taxa de granulopoiese,
destruição aumentada ou doença hereditária. Produção diminuída é evidente no
exame da medula óssea como hipoplasia granulocítica. Normalmente, resulta de
danos que afetam múltiplas linhagens de células hematopoiéticas, como dano
químico, radiação, neoplasia, infecção e fibrose, mas pode ainda ser causada por um
processo que, preferencialmente, tem como alvo a granulopoiese. A neutropenia
imunomediada é rara, mas é uma condição reconhecida em animais domésticos. As
alterações observadas na medula óssea variam de aplasia ou hipoplasia granulocítica
até hiperplasia, dependendo de onde as células sob ataque imune estão em seus
respectivos compartimentos de diferenciação. A neutropenia com nenhuma evidência
de produção diminuída e na qual qualquer outra causa de neutropenia tenha sido
excluída pode ser resultado de destruição dos neutrófilos antes que tenham deixado a
medula óssea, condição conhecida como granulopoiese ineficaz. Como outras formas de
hematopoiese ineficaz, essa condição frequentemente é presumida como
imunomediada; em gatos, pode ocorrer como resultado da infecção de células
hematopoiéticas pelo vírus da leucemia felina (FeLV).
Em marcante contraste aos eritrócitos, os neutrófilos têm tempo de vida muito
curto na circulação sanguínea. Uma vez liberado da medula óssea, o neutrófilo
permanece na corrente sanguínea por horas antes de migrar para os tecidos. O
destino dos neutrófilos após terem deixado a corrente sanguínea em condições
normais (i.e., sem um contexto de inflamação) é pouco compreendido. Essas células
migram para dentro dos tratos GI e respiratório, fígado e baço, podem ser eliminadas
através das superfícies mucosas ou sofrer apoptose e ser fagocitadas por macrófagos.
Quando a produção de neutrófilos cessa, uma reserva de neutrófilos maduros na
medula óssea (discutido em mais detalhe adiante) pode ser adequada para manter
normal o número de neutrófilos circulantes por poucos dias; entretanto, após o
compartimento de armazenagem da medula óssea esgotar, a neutropenia
rapidamente ocorre.
Os neutrófilos dentro da vasculatura sanguínea estão em dois compartimentos:
um compartimento circulante, que consiste em células fluindo livremente no sangue; e
um compartimento marginal, consistindo naquelas células transitoriamente associadas
à superfície endotelial (na realidade, os neutrófilos estão em constante deslocamento
entre esses dois compartimentos, mas a proporção de células em qualquer
compartimento normalmente permanece relativamente constante em qualquer
espécie). Os neutrófilos circulantes fazem parte da amostra de sangue coletada
durante a punção venosa de rotina e são, portanto, determinados pelo hemograma,
1864
enquanto os neutrófilos marginados não são. A pseudoneutropenia refere-se à
situação na qual há aumento da proporção de neutrófilos no compartimento
marginal. Isso pode ocorrer em função de fluxo de sangue diminuído ou em resposta
a algum estímulo,como a endotoxemia, que aumenta a expressão das moléculas
promotoras da interação entre os neutrófilos e as células endoteliais.
A neutropenia também pode resultar de aumento na demanda por neutrófilos
pelos tecidos. A rapidez com que essa situação se desenvolve não depende apenas da
magnitude do estímulo inflamatório, mas também da reserva de neutrófilos pós-
mitóticos na medula óssea. O tamanho dessa reserva ou compartimento de
armazenagem depende da espécie. Em cães, esse compartimento contém o
equivalente a 5 dias de produção normal de neutrófilos. Os bovinos representam o
outro extremo, pois apresentam um compartimento de armazenagem pequeno e,
assim, estão predispostos a tornarem-se neutropênicos mais facilmente que os cães.
Equinos e gatos estão entre os dois extremos, mais perto de bovinos e cães,
respectivamente. Conclui-se então que o significado clínico da neutropenia causada
por desequilíbrio no suprimento e na demanda depende da espécie. Em cães, a
neutropenia como resultado de inflamação é um dado alarmante, pois é uma
evidência de demanda massiva do tecido por neutrófilos que exauriu o
compartimento de armazenagem do paciente e está excedendo a taxa de
granulopoiese na medula óssea, enquanto em bovinos a neutropenia é comumente
notada em uma vasta lista de condições envolvendo inflamação aguda e não indica
necessariamente demanda avassaladora.
Eosinopenia/Basopenia
Em muitos laboratórios, os valores de referência do hemograma para eosinófilos e
basófilos são tão baixos quanto zero célula por microlitro de sangue, excluindo a
possibilidade de detecção de eosinopenia ou basopenia. Quando detectável, a
eosinopenia é frequentemente parte de um leucograma de estresse (mediado por
glicocorticoide).
Trombocitopenia
O termo trombocitopenia refere-se à diminuição na concentração de plaquetas
circulantes. Os mecanismos da trombocitopenia incluem diminuição da produção,
aumento da destruição, aumento do consumo, alteração da distribuição e hemorragia.
A diminuição da produção pode ocorrer devido a uma condição que afeta múltiplas
linhagens de células hematopoiéticas, incluindo plaquetas, ou especificamente por
trombopoiese deprimida. Em ambos os casos, a trombopoiese diminuída é evidente
sob exame de uma amostra da medula óssea como hipoplasia megacariocítica. As
1865
causas gerais de hematopoiese diminuída descritas anteriormente nas seções sobre
anemia e neutropenia também se aplicam à trombocitopenia. As doenças específicas
causadoras da trombocitopenia são tratadas mais adiante neste capítulo.
Trombocitopenia imunomediada é uma doença razoavelmente comum em cães e
pode ocorrer também em outras espécies. O consumo aumentado de plaquetas é
característica marcante de coagulação intravascular disseminada (CID), uma
síndrome na qual a hipercoagulabilidade leva ao consumo aumentado tanto de
plaquetas quanto de fatores de coagulação no plasma, com subsequente
hipocoagulabilidade e suscetibilidade a sangramento. O baço, normalmente, contém
uma proporção significativa da massa total de plaquetas (até um terço em algumas
espécies), e anormalidades envolvendo o baço podem levar a uma alteração no
número de plaquetas circulantes. Por exemplo, congestão esplênica pode resultar em
trombocitopenia, e contração esplênica pode resultar em trombocitose. Hemorragia
aguda pode resultar em trombocitopenia leve a moderada. Mecanismos potenciais de
trombocitopenia causada por hemorragia incluem perda e consumo das plaquetas.
Obviamente, a trombocitopenia pode ser causa de hemorragia. Na ausência de outros
fatores complicadores, uma trombocitopenia grave (menos que 50.000 plaquetas/μL
de sangue) é mais propensa a ser a causa do que o resultado do sangramento. Na
avaliação de uma amostra de medula óssea, a hiperplasia megacariocítica é evidência
de resposta trombopoiética regenerativa, e um aumento no valor do volume
plaquetário médio (VPM) no hemograma frequentemente acompanha tal resposta.
Linfopenia
O termo linfopenia refere-se à diminuição da concentração de linfócitos na circulação
sanguínea. É um dado comum no hemograma de animais doentes. Com frequência, o
mecanismo preciso da linfopenia não está bem determinado. Presumivelmente, é
mediada, ao menos em parte, pelo excesso de glicocorticoides endógenos. A
linfopenia pode ser causada por vários mecanismos, incluindo distribuição alterada
de linfócitos (tráfego aumentado de linfócitos para os tecidos linfoides e diminuição
da saída de linfócitos desses tecidos), linfotoxicidade (dano direto aos linfócitos ou
supressão da linfopoiese) de agentes terapêuticos ou infecciosos, perda de linfa rica
em linfócitos ou distúrbios congênitos. O tráfego normal de linfócitos pode ser
afetado em razão de uma alteração na arquitetura normal do tecido linfoide (p. ex.,
devido a neoplasia ou inflamação) ou em resposta a sinais de citocinas. O excesso de
glicocorticoide pode causar linfopenia via redistribuição a partir do sangue para o
tecido linfoide ou via efeitos linfotóxicos diretos. Tratamentos antineoplásicos
(quimioterapia ou radioterapia) e medicamentos imunossupressores podem, também,
ser linfotóxicos. Algumas imunodeficiências hereditárias (como imunodeficiência
1866
combinada grave ou aplasia tímica) podem causar linfopenia.
Eritrocitose
O aumento da massa de eritrócitos acima de valores normais (i.e., o oposto de
anemia) é conhecido como eritrocitose. O termo policitemia é frequentemente usado
como sinônimo de eritrocitose, mas tecnicamente, e para os propósitos deste
capítulo, a policitemia refere-se a um tipo específico de leucemia chamada de
eritrocitose primária ou policitemia vera. A eritrocitose relativa ocorre mais
frequentemente devido à desidratação, quando uma proporção diminuída de água no
sangue resulta em hemoconcentração. Situação similar pode ocorrer como resultado
de contração esplênica mediada por epinefrina. A eritrocitose causada por contração
esplênica ocorre em grau mais pronunciado em equinos e pode ocorrer em menor
grau em outras espécies. Em ambos os casos, a massa eritrocitária total não está de
fato aumentada, mas parece estar assim devido a outros fatores. A eritrocitose
secundária refere-se a um verdadeiro aumento na massa de eritrócitos mediado pela
Epo ou por uma resposta apropriada à hipoxemia (como pode ser observado em
pacientes com doença cardiopulmonar e oxigenação gravemente prejudicada ou
defeitos cardiovasculares causadores de desvio da direita para a esquerda), ou em
casos raros de tumor que secrete a Epo (eritrocitose secundária inapropriada). A
policitemia vera é diagnosticada com base no aumento marcante da massa de
eritrócitos (o hematócrito em cães normalmente hidratados vai de 65% a >80%),
ausência de hipoxemia, ausência de outros tumores e concentração normal ou
diminuída de eritropoetina plasmática. A eritrocitose absoluta, tanto primária quanto
secundária, causa aumento na viscosidade do sangue e resulta em fluxo sanguíneo
prejudicado e distensão da microvasculatura. Os indivíduos afetados apresentam risco
aumentado de hipóxia tecidual e trombose ou hemorragia. Sinais clínicos
relacionados (síndrome de hiperviscosidade) podem incluir membranas mucosas
eritematosas (Fig. 13-17) e tempo de preenchimento capilar prolongado, vasos
escleróticos proeminentes, evidência de trombose ou hemorragia e sinais secundários
(p. ex., neurológicos e cardiovasculares) relacionados a sistemas orgânicos específicos
afetados.
1867
Fig. 13-17 Eritrocitose absoluta, síndrome da hiperviscosidade, mucosas eritematosas, gato.
O eritema das mucosas é um dos sinais associados à síndrome da hiperviscosidade. Nesse caso, a
mucosa oral é mais vermelha (setas) que o normal devido à concentração anormalmente alta de
eritrócitos e seus aglomerados no sangue. Síndrome da hiperviscosidade também pode ocorrer devido
a aumento da concentração plasmática de imunoglobulinas.
(Cortesia de Dr. C. Patrick Ryan, Veterinary Public Health, Los Angeles Departament of Health Sevices; e Noah’s Arkive,
College of Veterinary Medicine, The Universityof Georgia.)
Neutrofilia
A neutrofilia ocorre em resposta a vários estímulos diferentes, que não são
mutuamente excludentes. Os principais mecanismos de neutrofilia são mostrados na
Figura 13-18. O entendimento dos achados do hemograma característicos dessas
respostas é uma parte importante da medicina veterinária clínica. A inflamação pode
resultar em neutropenia, como discutido anteriormente, ou neutrofilia, conforme
discutido adiante. Entretanto, antes de passar para uma discussão sobre a neutrofilia
inflamatória e o denominado desvio à esquerda, é importante relatar duas outras
importantes causas de neutrofilia.
1868
Fig. 13-18 Ilustração esquemática dos mecanismos de leucocitose neutrofílica.
Neutrófilos e seus precursores são distribuídos em cinco compartimentos: um compartimento
precursor na medula óssea, que inclui células progenitoras e outras mais comprometidas, os
precursores mitoticamente ativos; um compartimento de armazenamento na medula óssea, constituído
por células mitoticamente inativas, que incluem neutrófilos maduros e neutrófilos levemente imaturos
(bastonetes); um compartimento marginando o sangue periférico (compartimento marginal); um
compartimento circulante no sangue periférico (compartimento circulante); e um compartimento
tecidual. O tamanho relativo de cada compartimento é representado pelo tamanho do seu quadro
correspondente. A contagem de neutrófilos no sangue periférico mensura apenas o compartimento
circulante, que pode ser ampliado pelo aumento da liberação de células do compartimento de
armazenamento de medula óssea, pela transferência das células do compartimento marginal para o
compartimento circulante, pela diminuição do extravasamento para o tecido ou pela expansão do
compartimento de células precursoras na medula óssea.
(Modificada de Finch SC: Hematology, ed. 3, New York, 1983, McGraw-Hill.)
O excesso de glicocorticoides, tanto pela produção endógena quanto pela
administração exógena, resulta em um padrão hematológico conhecido como
leucograma de estresse, caracterizado por neutrofilia com células maduras (i.e.,
concentração elevada de neutrófilos segmentados), linfopenia e, especialmente em
cães, monocitose. A eosinopenia é outro achado do leucograma de estresse, embora
na maioria das vezes seja difícil de avaliar, pois os valores de referência para
eosinófilos são muito baixos (em alguns laboratórios, o limite inferior do valor de
referência é zero). Os mecanismos que contribuem para neutrofilia mediada por
glicocorticoides incluem os seguintes:
• Liberação elevada de neutrófilos maduros do compartimento de armazenamento
1869
da medula óssea.
• Marginação diminuída de neutrófilos dentro da vasculatura com aumento
resultante no compartimento circulante.
• Diminuição da migração de neutrófilos da corrente sanguínea para os tecidos.
A magnitude da neutrofilia tende a depender da espécie, e os cães apresentam a
resposta mais pronunciada (até 35.000 células/μL de sangue) e, em ordem
decrescente de magnitude de resposta, gatos (30.000 células/μL de sangue), equinos
(20.000 células/μL de sangue) e bovinos (15.000 células/μL de sangue). Com excesso
de glicocorticoides por longos períodos, o número de neutrófilos tende a normalizar,
enquanto a linfopenia persiste.
A liberação de epinefrina resulta em um padrão diferente, conhecido como
leucocitose fisiológica, caracterizado por neutrofilia madura (como na resposta aos
glicocorticoides) e linfocitose (diferentemente da resposta aos glicocorticoides). Esse
fenômeno é de curta duração (menos de 1 hora). A neutrofilia ocorre principalmente
em razão de um desvio das células do compartimento marginal para o circulante. A
leucocitose fisiológica é comum em gatos (especialmente quando são submetidos a
estresse durante a coleta de sangue) e em equinos, menos comum em bovinos e
incomum em cães.
Obviamente, a neutrofilia pode também indicar inflamação, e a variação na
duração e magnitude do estímulo inflamatório pode produzir diferentes padrões de
neutrofilia. Um dado hematológico clássico em pacientes com demanda aumentada
por neutrófilos é a presença de formas imaturas no sangue, conhecidas como “desvio
à esquerda”. Nem todas as respostas inflamatórias têm desvio à esquerda, mas a
presença de tal desvio quase sempre significa demanda ativa por neutrófilos no
tecido. A magnitude do desvio à esquerda é estimada pelo número de células imaturas
e pelo grau de imaturidade. A forma mais leve é caracterizada por número elevado
de bastonetes, os quais são precursores imediatos dos neutrófilos segmentados
normalmente encontrados na circulação. As formas mais graves envolvem
precursores progressivamente imaturos. Um desvio à esquerda é considerado
regenerativo se o número de neutrófilos imaturos na circulação diminuir à medida
que se tornam progressivamente imaturos. A expressão desvio à esquerda degenerativo
é algumas vezes usada para descrever casos em que o número de formas imaturas
excede o número de neutrófilos segmentados. Da mesma forma que na neutrofilia
mediada por glicocorticoides, a magnitude típica da neutrofilia causada por
inflamação varia entre as espécies, e os cães apresentam a resposta mais
pronunciada.
Neutrofilia marcante pode também ocorrer em função de uma condição
1870
hereditária conhecida como deficiência de adesão leucocitária (LAD), na qual o
leucócito não expressa uma molécula de aderência necessária para migração do
sangue para o tecido. Essa condição é descrita com mais detalhes na seção de doenças
específicas.
Pode ser útil pensar na cinética dos neutrófilos em termos de um modelo
produtor-consumidor no qual a medula óssea seja a fábrica, e os tecidos (para onde
os neutrófilos eventualmente vão), os consumidores. O compartimento de
armazenagem da medula óssea é o estoque da fábrica, e os neutrófilos no fluxo
sanguíneo estão em entrega para o consumidor. Dentro dos vasos sanguíneos, os
neutrófilos circulantes estão na autoestrada, e os neutrófilos marginais são
temporariamente empurrados para fora da estrada. Fisiologicamente, há um fluxo
contínuo de neutrófilos do produtor para o consumidor. Assim, o sistema está em
homeostase e o número de neutrófilos permanece relativamente constante dentro de
um nível normal. Entretanto, patologicamente, pode haver perturbação desse sistema
em vários níveis. A granulopoiese diminuída é análoga à produção fabril abaixo do
nível normal. A granulopoiese ineficaz é análoga aos bens de consumo produzidos em
taxa normal a aumentada, mas eles são danificados durante a fabricação e nunca
deixam a fábrica. O desvio à esquerda é análogo à demanda aumentada pelo
consumidor, com a entrega pela fábrica de produtos inacabados. Casos de inflamação
estabelecida e persistente são caracterizados por hiperplasia granulocítica na medula
óssea e por neutrofilia madura, e são análogos a fábricas que têm tido tempo para se
ajustarem à demanda elevada aumentando a produção de forma eficiente.
Eosinofilia/Basofilia
A eosinofilia e, menos comumente, a basofilia (que, quando presente, na maior parte
das vezes ocorre simultaneamente com a eosinofilia) pode ocorrer em resposta ao
parasitismo como parte de uma resposta alérgica, como anormalidade
paraneoplásica (devido à produção de citocinas por células neoplásicas ou outras
células inflamatórias reagindo à neoplasia), como resposta típica a uma doença
infecciosa não parasitária ou em condições idiopáticas raras (p. ex., síndrome
hipereosinofílica).
Trombocitose
Trombocitose, ou concentração de plaquetas no sangue acima dos valores de
referência, é um achado inespecífico comum em medicina veterinária. Na imensa
maioria dos casos, a trombocitose é reativa — uma resposta a outro processo
patológico aparentemente não relacionado. Exemplos de condições associadas a essa
trombocitose incluem doenças infecciosas e inflamatórias, deficiência de ferro,
1871
hemorragia, endocrinopatias e neoplasia. Os fatores que podem contribuir para
trombocitose reativa incluem aumento na concentração de trombopoietina no
plasma, citocinas

Outros materiais