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- -1 METODOLOGIA E PRÁTICA DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NA ALFABETIZAÇÃO CAPÍTULO 1 - MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: UMA QUESTÃO HISTÓRICA OU UMA OCORRÊNCIA ATUAL? Dayana Junqueira Ayres - -2 Introdução Escrever e ler são duas atividades da alfabetização que devem ser realizadas simultaneamente. Costuma-se enfatizar muito mais a escrita do que a leitura, pois é fácil avaliar um aluno pelos seus acertos e erros na escrita. No entanto, ler é uma atividade tão importante quanto escrever textos, e a leitura precede a escrita, pois antes de chegarem às escolas, as crianças já leem o mundo à sua volta. Antes de admitir o valor técnico da leitura para o processo de alfabetização, vale ressaltar que essa prática é uma fonte de prazer, de conquista, de realização, que motiva a criança a desejar sempre ler mais e aprender novas palavras. No âmbito escolar, um dos grandes desafios, nos 1º, 2º e 3º anos, do ciclo de alfabetização é garantir às crianças o direito às aprendizagens básicas deste processo. Para que a alfabetização ocorra com qualidade, as estratégias e métodos de aprendizagem inicial da leitura e da escrita, eleitos pelo professor, são elementos fundamentais que devem ser constantemente avaliados e revisados. Nesse sentido, você conhece a história dos métodos de alfabetização no Brasil? Sabia que existem polêmicas que giram em torno das questões do método, da metodologia e/ou das didáticas de alfabetização? Quais são as concepções atuais indicadas para o processo de aquisição da tecnologia escrita? Essas e outras perguntas são necessárias quando nos lançamos à busca do conhecimento de conteúdos importantes para a nossa formação docente, e é preciso, inicialmente, conhecer suas raízes, sua história, onde tudo começou, como ocorreu sua evolução etc. Assim, neste capítulo você conhecerá a história dos métodos de alfabetização, sua origem, sua evolução através do tempo, as novas aplicações que surgiram com o passar dos anos e as determinações curriculares firmadas pelo Ministério da Educação. Bom estudo! 1.1 Perspectivas históricas e a-históricas da alfabetização Quando se fala da história da escrita e da alfabetização, sabe-se que muitas perspectivas históricas foram desenvolvidas com o intuito de melhorar, com o passar dos anos, a qualidade da alfabetização de crianças. Atualmente muitas discussões têm sido travadas em torno das questões dos métodos de alfabetização apresentados ao longo dos tempos; boa parte dessas, com base na perspectiva construtivista, consideram as discussões em torno de um único método como um retrocesso. Compreende-se que não há um único método, dos que foram desenvolvidos ao longo da história, como modelo a ser seguido, mas vários métodos que devem ser suficientemente flexíveis para que o professor possa adequá-los aos diferentes contextos escolares nos quais estiver inserido. Neste tópico você conhecerá os principais métodos de alfabetização desenvolvidos no decorrer do processo de ensino da escrita, e identificará suas principais características. Quem você acha que inventou as regras de alfabetização? Qual a função das convenções escritas, instituídas pelo homem, no processo interativo dos sujeitos? Na sequência, você encontrará as respostas para essas e outras questões. 1.1.1 Percurso histórico Em toda história da comunicação o homem procurou formas de comunicar-se e, após ter estabelecido convenções ortográficas para a escrita, buscou-se o melhor método para alfabetizar. Atualmente essa busca pelo melhor procedimento para a aquisição da língua escrita permanece latente. É fundamental que os educadores compreendam que não é possível alfabetizar sem método (técnica); por isso, é essencial que conheçam a história dos métodos de alfabetização a fim de identificar permanências e princípios norteadores que os ajudarão na - -3 dos métodos de alfabetização a fim de identificar permanências e princípios norteadores que os ajudarão na prática pedagógica. De acordo com Soares (2018, p. 16), alfabetização é o processo de “[...] aprendizagem inicial da leitura e da escrita”; e os métodos de alfabetização são os conjuntos de metodologias que, fundamentadas em teorias e princípios, orientam esse processo. Para Frade (2005) esses métodos estão em constante mutação desde que houve a necessidade de ensinar uma pessoa a ler e escrever. Por isso, é importante que conheçamos as particularidades metodológicas ao longo da história da alfabetização a fim de que elejamos um método adequado e eficiente para o saber-fazer docente no ciclo de alfabetização. Está curioso(a) para saber como as pessoas aprenderam e escrever e como essas convenções foram passadas de geração em geração? Sobre essas questões, Cagliari (2009, p. 15-16) afirma: Costumo dizer que quem inventou a escrita foi a leitura: um dia, numa caverna, o homem começou a desenhar e encheu as paredes com figuras, representando animais, pessoas, objetos e cenas do cotidiano. Certo dia, recebeu a visita de alguns amigos que moravam próximo e foi interrogado a respeito dos desenhos. Queriam saber o que representavam aquelas figuras e por que ele as tinha pintado nas paredes. Naquele momento, o artista começou a explicar os nomes das figuras a relatar os fatos que os desenhos representavam. [...] acabou descobrindo que podia “ler” os desenhos que tinha feito. Ou seja, os desenhos, além de representar objetos da vida real, podiam servir também para representar palavras que, por suas vezes, se referiam a esses mesmos objetos e fato na linguagem oral. A humanidade descobria assim que, quando uma forma gráfica representa o mundo, é apenas um desenho; mas, quando representa uma palavra, passa a ser uma forma de escrita. Embora a história relatada pelo autor supracitado seja apenas uma sugestiva interpretação de como se deu o processo de alfabetização do ser humano, ela demonstra, claramente, de onde surgiu a necessidade humana de desenvolver símbolos e códigos linguísticos: inicialmente, o homem se comunicava somente por meio dos símbolos e, , começou a desenvolver códigos que representassem os sons da fala. Daí que se percebea posteriori a relação entre os sons e as letras (fonemas-grafemas). Cagliari (2009, p.14) afirma que “[...] quem inventou a escrita, inventou ao mesmo tempo as regras de alfabetização”. Nesse sentido não é difícil percebermos que a habilidade de escrever está diretamente ligada às convenções dos grafemas, outrora inventados e instituídos pelo ser humano, assim como os símbolos, para estabelecer a comunicação/interação social. Dessa maneira, para que as convenções se perpetuassem, os modos de fazer a escrita foram ensinados e passados de geração em geração, por meio de regras de decifração. - -4 Figura 1 - Hieróglifos egípcios na parede são exemplos de símbolos e convenções antigas utilizadas pelo ser humano. Fonte: sisqopote, Shutterstock, 2018. Na Antiguidade, as pessoas se alfabetizavam aprendendo, primeiro, a ler algo escrito e, depois, realizando a cópia desse texto. Esse procedimento, de leitura e cópia de textos, era o segredo de uma alfabetização de qualidade. Também havia aqueles sujeitos que aprendiam a ler sem jamais terem frequentado a escola. Bastava que desejassem aprender a ler e escrever, e se relacionassem com aqueles que possuíam o conhecimento para, então, adquirir essas habilidades de forma simples, como um procedimento natural (CAGLIARI, 2009). - -5 Assim, a disseminação do código escrito, desenvolvido pelos povos semitas e adaptado pelos gregos, disseminou- se na sociedade. Primeiro, os romanos assimilaram tudo que puderam a respeito do conhecimento alfabético ortográfico criado pelos gregos; depois, realizaram eles mesmos as alterações que julgaram adequadas: ao invés de sugerirem nomes às letras, tais como Alfa, Beta, Gama, passaram a chamá-las pelo som que era enunciado – “a”, “bê”, “cê”, “dê” etc. – a fim de facilitar o uso da alfabeto e o processo de alfabetização (CAGLIARI, 2009). Vimos que em decorrência do desenvolvimento da escrita surgiu a necessidade deque esses códigos fossem passados de geração para geração; por isso, convenções eleitas pelo homem foram instituídas de modo a facilitar a comunicação entre os povos. Na Idade Média (séculos V a XV), a alfabetização ocorria no berço familiar sob orientação da família ou de preceptores que eram contratados para cumprir esta função. Logo, alfabetizar-se não era considerado um processo que competia apenas ao ambiente escolar, pois nesse momento, compreendia-se que memorizar o nome das letras era suficiente para que o sujeito fosse dotado da capacidade de ler escrever. Com o período renascentista (séculos XV e XVI) e o desenvolvimento da imprensa, na Europa, a produção de livros difundiu-se e saiu do coletivo para alcançar público cada vez mais singular; surgiram cada vez mais inquietações com a alfabetização e desenvolveram-se materiais que auxiliassem nesse processo, tais como cartilhas e gramáticas (CAGLIARI, 2009). Ainda em conformidade com os estudos de Cagliari (2009), as primeiras obras de alfabetização que surgiram, na Europa, entre os séculos XV e XVIII, foram a de Jan Hus, que criou uma sequência de frases religiosas que eram iniciadas na sequência das letras do alfabeto, como uma espécie de acróstico, e tinham como função alfabetizar o povo; a de Valetim Ickesalmer, cartilha que continha o alfabeto, sílabas simples, além de algarismos, 10mandamentos e orações. Através do educador Comênius, em 1658, publicou-se a primeira obra que continha as letras iniciais do alfabeto, acompanhadas de desenhos que ilustrassem e motivassem às crianças no processo de alfabetização. Notamos, até o presente momento, que até os idos dos anos 1600, embora já houvesse iniciado as perturbações com relação às metodologias de ensino e aprendizagem do ensino alfabético-ortográfico, ainda não existia um método, propriamente dito, instalado nas sociedades que funcionasse e fosse adequado a todos os ambientes de aprendizagem (CAGLIARI, 2009). VOCÊ SABIA? A energia que o cérebro consome equivale a 25 watts, o necessário para acender uma lâmpada. O cérebro é o órgão mais complexo do corpo humano, afinal, é o responsável por nos manter vivos e pensando. Ele funciona como um centro de comando para o sistema nervoso central, concedendo aos seres humanos capacidades físicas e cognitivas amplas. Para saber mais, acesse o endereço: <https://amigosmultiplos.org.br/noticia/15-fatos-surpreendentes-sobre- >.seu-cerebro-que-talvez-voce-nao-saiba/ https://amigosmultiplos.org.br/noticia/15-fatos-surpreendentes-sobre-seu-cerebro-que-talvez-voce-nao-saiba/ https://amigosmultiplos.org.br/noticia/15-fatos-surpreendentes-sobre-seu-cerebro-que-talvez-voce-nao-saiba/ - -6 Conforme Cagliari (2009), no entanto, essa preocupação começa a surgir quando, a partir de 1720, São João Batista de La Salle detalhou, em sua obra, todo plano de aula a ser desenvolvido pelo professor, inclusive as de cunho alfabético-ortográfico: os alunos principiantes se ocupavam em aprender a tábua do alfabeto com todas as letras e sílabas contidas nela; os alunos do nível intermediário aprendiam a soletrar; e os do nível avançando aprendiam a ler com pausas. Ao mesmo tempo, a tecnologia escrita, em todos os níveis, era apreendida através da cópia de exaustivos textos. Ainda de acordo com Cagliari (2009), em 1789, durante o período da Revolução Francesa, o pedagogo alemão José Hamel descreveu o modo como achava que o método de alfabetização deveria acontecer; para ele, os alunos deveriam iniciar o processo de alfabetização em espaço coletivo, em aulas com tempo de 15 minutos, estudando atividades fáceis, de repetição e em coro. A Revolução Francesa trouxe grandes novidades para a escola: uma delas foi a responsabilidade com a educação das crianças, introduzindo a alfabetização como matéria escolar. [...] A moda das escolas que ensinavam as crianças a ler e escrever espalhou-se pelo mundo (CAGLIARI, 2009, p. 23). Estudos realizados por Soares (2018) e Cagliari (2009) mostram que foi a partir das duas últimas décadas do século XIX que começaram a se consolidar, no Brasil, a história dos métodos de alfabetização. Portanto, é a partir desse momento que a questão dos métodos de alfabetização se expande para o mundo e chega ao Brasil, personificando- se nos estudos e cartilhas de João de Barros e Antonio Feliciano de Castilho, por métodos denominados de sintéticos. E a partir da Cartilha do Maternal, de João de Deus, começa a tomar forma o que ficou conhecido como método analítico. VOCÊ SABIA? Estudos realizados por Magda Soares (2018) comprovaram que os métodos de alfabetização não são exclusividade do Brasil. Segundo essa autora, também em outros países discussões a respeito dos métodos de alfabetização são questões polêmicas, bem como as identificadas no Brasil (SOARES, 2018). - -7 Figura 2 - Trechos da Cartilha de João de Barros, apresentando palavras ilustradas e combinação de vogais e consoantes, formando sílabas. Fonte: CAGLIARI, 2009, p. 25. A partir do final do século XIX e início do século XX, duas vias de evolução se desenvolveram na história da alfabetização a fim de vencer o fracasso escolar das crianças ao dominar a língua escrita (SOARES, 2018). Você já ouviu falar dos métodos de alfabetização sintéticos e analíticos? Sabe qual a diferença entre eles e por quanto tempo eles perduraram no currículo da educação brasileira? Ao estudar os conteúdos apresentados a seguir, você encontrará respostas para essas e outras perguntas sobre os métodos sintéticos e analíticos. 1.1.2 Métodos sintéticos e analíticos O percurso histórico da alfabetização foi marcado pela oposição de dois métodos, os analíticos e os sintéticos, de modo que um surgiu em detrimento da tentativa de melhorar o outro. Para as práticas pedagógicas das modernidades, é importante conhecer as particularidades desses métodos a fim de que o educador conheça os princípios permanentes e construa sua metodologia de alfabetização adequada aos seus alunos. Dentre as duas últimas décadas do século XIX e o início do século XX até os anos de 1980, dois métodos coabitavam o momento histórico, no tocante aos métodos de alfabetização, e eram alternados na prática pedagógica dos professores (SOARES, 2018). Esses métodos, conforme sugere o título que inicia esta seção, denominavam-se sintéticos e analíticos. Os partem das partes para o todo, isto é, das unidades menores tende-se a chegar àsmétodos sintéticos unidades maiores: começam no conhecimento das letras, dos fonemas e das sílabas até chegar às unidades maiores, tais como as sílabas, frases e períodos. Primeiro, o aluno conhece as letras do alfabeto; depois, aprende - -8 maiores, tais como as sílabas, frases e períodos. Primeiro, o aluno conhece as letras do alfabeto; depois, aprende a unir as consoantes com as vogais, formando sílabas e, em seguida, a construir palavras e textos (FRADE, 2005; SOARES, 2018). Esses métodos elegem princípios que privilegiam as relações entre o fonema e o grafema. De acordo com Frade (2005) e Soares (2018), esse método se subdivide em três tendências: • método alfabético: o s aprendizes, inicialmente, a decorar o alfabeto, letra por letra, professor leva o para encontrar as partes que formam a sílaba simples, depois as complexas e, posteriormente, outros segmentos da palavra; • método fônico: o professor ensina às crianças as relações entre sons e letras, para que o aluno relacione a palavra falada com a escrita; • método silábico: a principal unidade a ser analisada pelos alunos é a sílaba, e não as vogais (e encontros vocálicos), para a futura sistematização das sílabas. Diríamos, então, que esse método é o mais adequado para alfabetizar crianças? No que se refere à faceta linguística, esse método é fácil e aplicável a qualquer aluno, mas a sua desvantagem é desconsiderar a faceta interativa e sociocultural das crianças; isto é, ele acontece de modo descontextualizado, por meio do isolamento das partes, em situações que não consideram o significado das palavras e, consequentemente, ocasionao desinteresse dos alunos às práticas de leitura e escrita. Figura 3 - Crianças em idade pré-escolar aprendem o alfabeto por meio da explicação da professora sobre os métodos alfabético e fônico. Fonte: KanKhem, Shutterstock, 2018. Segundo Frade (2005) e Soares (2018), os , por sua vez, partem do todo para as partes, emétodos analíticos • • • - -9 Segundo Frade (2005) e Soares (2018), os , por sua vez, partem do todo para as partes, emétodos analíticos rompem radicalmente com o paradigma da decifração. Os adeptos desse método começam a trabalhar a partir de unidades completas de linguagem para depois dividi-las em partes menores, pois compreendem que a leitura é um ato global e audiovisual. O método analítico também se subdivide em três tendências (FRADE, 2005; SOARES, 2018): • método global de contos: quando o professor apresenta um texto, e o aluno realiza o reconhecimento global a fim de memorizá-lo e reconhecer sentenças, expressões, palavras e, por fim, sílabas; • método de sentenciação: o professor parte da sentença que, depois de reconhecida globalmente e compreendida pelos alunos, será analisada em palavras e, após, em sílabas; • método de palavração: o professor apresenta uma palavra para depois decompô-la em sílabas. A diferença deste método para o silábico, é que no analítico as palavras não se decompõem no início do processo, mas são primeiro aprendidas globalmente – e por reconhecimento (FRADE, 2005; SOARES, 2018). Portanto, o grande avanço percebido com relação à instauração desse método é que ele considera a realidade psicológica e cognitiva da criança, partindo da compreensão da palavra escrita para alcançar ao valor sonoro das sílabas e grafemas. Figura 4 - Ao ler uma história, a professora está alfabetizando as crianças pelo método global de contos, uma subclassificação do método analítico. Fonte: ayelet-keshet, Shutterstock, 2018. • • • - -10 Ambas as modalidades de métodos de alfabetização – sintéticos e analíticos –predominaram durante quase todo o século XX, até 1980: ora os professores optavam pelo princípio da síntese, partindo das menores unidades (letras, fonemas e sílabas) para se chegar às maiores (palavras, frases e textos); ora optavam pelo princípio da análise que,contrariamente, partia das unidades maiores (palavras, frases e textos) rumo às unidades menores (letras, fonemas e sílabas). Vale ressaltar os métodos sintéticos e analíticos tinham o mesmo objetivo: importavam-se com a aprendizagem do sistema alfabético-ortográfico da escrita. Também é importante percebermos que nas duas metodologias, para que a criança desenvolva as habilidades de leitura e escrita, lendo e produzindo textos significativos, é primordial que dominem, antes disso, o sistema da escrita. Por esse motivo, surge em 1980 o paradigma cognitivista, na versão genética de Piaget, sob a denominação de construtivismo. Esse paradigma cognitivista rompe com a perspectiva histórica da evolução dos métodos mais adequados e nos faz crer que as questões dos métodos não estão ligadas a uma única prática eficaz, que evoluiu no decorrer do tempo, mas ao discernimento do professor em identificar quais procedimentos melhor se aplicam ao contexto da sala de aula em que está inserido. Dessa forma, você já ouviu falar no paradigma construtivista? Em linhas gerais, em que se distingue a pedagogia Quais as contribuições que a epistemologia genética de Piagetconstrutivista dos métodos analíticos e sintéticos? oferece para os estudos de alfabetização? Essas e outras questões serão respondidas no próximo tópico. 1.2 Métodos de alfabetização Como já mencionamos, a questão dos métodos de alfabetização tem sido alvo de muitas discussões e polêmicas. Será mesmo que existe um método de alfabetização que mereça ser anulado em detrimento do surgimento de outro? VOCÊ O CONHECE? Jean William Fritz Piaget (1896-1980) foi um dos maiores pensadores do desenvolvimento cognitivo do século XX. Criador da Epistemologia Genética, ele elaborou uma teoria do conhecimento baseado no estudo da gênese psicológica do pensamento humano, estudou a evolução do pensamento de crianças e adolescentes e, também, o processo de interação do indivíduo com o ambiente (BATTISTI, 2017). - -11 Figura 5 - Jean Piaget (1896-1980) foi um dos nomes mais influentes no campo da educação durante a segunda metade do século XX. Fonte: EQRoy, Shutterstock, 2018. Neste tópico abordaremos a concepção epistemológica de Piaget e estabeleceremos relações entre esses estudos e a sua influência no tocante ao desenvolvimento do paradigma construtivista para o processo de alfabetização no âmbito escolar. É muito importante que nós, estudantes de Pedagogia e áreas afins, saibamos como a criança aprende. - -12 1.2.1 Paradigmas metodológicos na alfabetização Em meados dos anos de 1980 surge, na versão epistemológica de Piaget, o , paradigmaconstrutivismo introduzido e divulgado no Brasil pelos estudos de Emilia Ferreiro e concretizado pelos programas de formação de professores e documentos de orientação pedagógica e metodológica (SOARES, 2018). A partir da concepção dessa autora, junto a Ana Teberosky, é que se passa a considerar mais relevante não o paradigma metodológico eleito, mas a compreensão do modo como ocorre os processos de aprendizagem das crianças ao aprender o sistema alfabético-ortográfico (FRADE, 2005). Neste sentido, o foco da discussão deixa der ser o método; e questionamentos como se tornam irrelevantes, pois conhecer o“qual método você usa?” modo como as crianças raciocinam e como ocorre o processo de apropriação da escrita é imperativo. Visto que, desse modo, será possível proporcionar às crianças oportunidades de aprendizagem do conhecimento alfabético e ortográfico, sob a perspectiva do letramento, considerando os aspectos psicológicos e sociais que as envolvem. De acordo com Soares (2018), o paradigma construtivista se opõe aos métodos sintéticos e analíticos e questiona características comuns a eles, pois ambos têm como pressuposto a ideia de que a criança aprende por meio da percepção auditiva ou visual; ou seja, a criança é tratada como um aprendiz passivo que recebe o conhecimento por meio da cartilha elaborada com único fim de atender a um método. Nesse novo quadro teórico e conceitual, os métodos sintéticos e analíticos, agora qualificados como “tradicionais” são rejeitados, por contrariarem tanto o processo psicogenético de aprendizagem da criança quanto a própria natureza do objeto dessa aprendizagem, a língua escrita. Assim, no construtivismo, o foco é transferido de uma ação docente determinada por um método preconcebido para uma prática pedagógica de estímulo, acompanhamento e orientação da aprendizagem, respeitadas as particularidades do processo de cada criança, o que torna inadmissível um método único e predefinido (SOARES, 2018, p. 22). Assim, embora o construtivismo surja, também, com o intuito de a aprendizagem do sistema alfabético- ortográfico da escrita, ele não se configura como um novo método, mas como uma nova concepção do processo de ensino-aprendizagem da língua escrita: ao contrário dos métodos sintéticos e analíticos, que rejeitavam a escrita espontânea, o construtivismo enfatiza o papel da escrita inventada, e não controlada (SOARES, 2018). Dessa maneira, percebe-se que o construtivismo não é um método, mas uma teoria que trata do processo de alfabetização não como algo dado, mas sim construído pelo sujeito a partir de sua interação com o meio. Nesse sentido, você deve estar se perguntando: como é construída essa aprendizagem? Como a teoria piagetiana se aplica no âmbito da alfabetização de crianças? As respostas encontram-se na sequência. VOCÊ O CONHECE? Emilia Ferreiro nasceu na Argentina, em 1937, e há 30 anos mora no México. É doutora em Psicologia Genética e professora/pesquisadora emérita do Sistema Nacional de Investigadores. Além disso, é reconhecida mundialmente por suas pesquisas, que mostraram pela primeira vez a psicogênese das crianças para se compreender oprocesso cognitivo e psicolinguístico da aquisição escrita (FERREIRO, 2013). - -13 1.2.2 Concepção epistemológica A concepção epistemológica de como o ser humano se desenvolve é um dos estudos mais importantes de Piaget e mantém forte influência nas práticas de diversos campos profissionais, tais como o dos psicólogos, pedagogos e educadores. E é fundamental no campo da alfabetização inicial de crianças, pois colabora para que o fazer docente seja realmente produtivo e eficiente. A Epistemologia Genética é uma corrente teórica que assume o posicionamento de que, ao longo da vida, o indivíduo passa por várias etapas de desenvolvimento. Piaget criou essa teoria biológica do conhecimento e descobriu, na psicologia da inteligência, a abertura para desenvolver estudos biológicos e epistemológicos por meio da observação feita com crianças e adolescentes (AZENHA, 2006). Não era intenção de Piaget desenvolver uma teoria para a educação, mas com a chegada da Escola Nova, a Epistemologia Genética foi acionada na perspectiva educacional. A partir da teoria de Piaget, deu-se o movimento que liga a teoria piagetiana ao fazer pedagógico, isto é, o construtivismo, como foi mencionado anteriormente. O ensino, na perspectiva construtivista, admite que os alunos atuem espontaneamente diante das novas experiências, façam interpretações e tenham visões globais, necessitando do professor apenas como mediador desse processo (AZENHA, 2006). Segundo Bezerra e Cunha (2016), conforme os pensamentos piagetianos, as solicitações surgem, e as estruturas da inteligência se constroem e se reorganizam a partir de novas solicitações; instante no qual ocorre a assimilação de novos objetos a esquemas já existentes e em que o conhecimento se amplia, resultando no que Piaget chamou de . O processo cognitivo que insere no sujeito uma nova vivência, que se une àsequilibração experiências já vividas e elabora um novo esquema chama-se .assimilação O desenvolvimento é caracterizado por um processo de sucessivas equilibrações. O desenvolvimento psíquico começa quando nascemos e segue até a maturidade, sendo comparável ao crescimento orgânico; como este, orienta-se, essencialmente, para o equilíbrio (PIAGET, 1995, p. 13). Segundo Piaget (1995), o conhecimento não é inato, ou seja, não está no organismo biológico do indivíduo, e nem, também, apenas no meio; mas é através das interações entre os dois que o conhecimento se constrói. - -14 Figura 6 - Piaget se ocupou dos estudos do desenvolvimento mental. Fonte: Morphart Creation, Shutterstock, 2018. Nos estudos piagetianos sobre as etapas do desenvolvimento mental, descobriu-se que no ato de oamadurecimento da gênese do conhecimento a criança passa por estágios de desenvolvimento psicológico: estágio sensório-motor, de 0 a 18 ou 24 meses; o estágio pré-operatório, de 2 a 6 ou 7 anos; o estágio operatório- concreto, de cerca de 7 a 11 ou 12 anos; e o estágio formal, a partir de 11 ou 12 anos. Essa divisão do desenvolvimento psicológico em estágios acontece para explicitar que cada fase biológica da criança é marcada por novas estruturas e capacidades que divergem das anteriores. Feito isso, Piaget (1995) discorre sobre os fatores que interferem nesse desenvolvimento: [...] existem 4 fatores principais: em primeiro lugar, maturação, uma vez que esse desenvolvimento é uma continuação da embriogênese; segundo, o papel da experiência adquirida no meio físico sobre as estruturas da inteligência; terceiro, transmissão social num sentido amplo (transmissão linguística, educação, etc.); e quarto, um fator que frequentemente é negligenciado, mas que, para mim, parece fundamental e mesmo o principal fator. Eu denomino esse fator de equilibração ou, se vocês preferem autorregulação (PIAGET, 1995, p. 178). Percebe-se que na visão piagetiana somos formados por estruturas biológicas que se alteram com o passar do tempo, e que ao receberem estímulos do meio, respondemos a essas estruturas – e para que esses estímulos aconteçam, é necessário que sejam significativos. Isto é, ocorram por assimilação e alcancem uma resposta por equilibração, principal fato pelo qual se dá o desenvolvimento cognitivo do ser humano. - -15 Assim, Piaget evidenciou que o sujeito epistêmico manifesta aspectos que são comuns em todas as pessoas, suas propriedades permitem a todos nós a possibilidade de desenvolver conhecimentos simples e até mesmo de níveis elevados. Os estudos piagetianos que abordaram a maneira de conceber o desenvolvimento humano contribuíram significativamente para o desenvolvimento de outros estudos que passam a analisar o sujeito a partir da interação com o meio físico e social (BEZERRA; CUNHA, 2016). De acordo com Soares (2018), foi com base no estudo do seu mestre, Piaget, que Emilia Ferreiro desvendou os mecanismos epistemológicos e biológicos que faz com que as crianças aprendam a ler e a escrever, e instigou os educadores a repensarem suas teorias e métodos, a partir de 1980, promovendo no Brasil inquietações a respeito da teoria construtivista no âmbito da alfabetização inicial de crianças. Vimos ao longo desta seção como se efetiva o processo de aprendizagem à luz dos estudos piagetianos e percebemos como ele se aplica no âmbito da alfabetização de crianças. No próximo tópico, abordaremos a concepção de alfabetização na perspectiva do letramento, e analisaremos as contribuições da teoria da psicogênese da escrita para a compreensão do processo de apropriação do sistema de escrita alfabética. VOCÊ QUER LER? Se você deseja examinar os fundamentos metodológicos e raízes epistemológicas de Piaget e Vigotsky, leia o livro “Desenvolvimento e aprendizagem em Piaget e Vigotski: a relevância do social” (PALANGANA, 2015). Nele você conhecerá os processos de aprendizagem e desenvolvimento humano à luz das teorias desses dois autores, e compreenderá as convergências e divergências conceituais entre eles no que diz respeito ao papel da interação social na aprendizagem. O livro está disponível na Biblioteca Virtual Universitária da Laureate: < >.https://eadlaureate.bv3.digitalpages.com.br/users/publications/9788532310378 VOCÊ QUER VER? O filme (1974), do diretor alemão Werner Herzog, retrata aO Enigma de Kaspar Hauser história de um ser humano que vive dentro de uma caverna em situação de isolamento. Por conta disso, teve sérios impactos negativos na sua formação, enquanto indivíduo, por viver alheio ao que se passava ao seu redor e distante da interação com o outro. Você descobrirá que o conhecimento não está no organismo biológico do indivíduo, mas é por meio das interações entre os dois que ele se constrói. Para assistir à obra completa e legendada acesse o endereço: < >.https://www.youtube.com/watch?v=geug75xNoAo https://eadlaureate.bv3.digitalpages.com.br/users/publications/9788532310378 https://www.youtube.com/watch?v=geug75xNoAo - -16 1.3 Alfabetização letramento: o significado de cada versus concepção para a prática de sala de aula É no contexto do construtivismo que desemboca um novo termo: . Você deve estar se perguntando: oletramento que é letramento? Qual a diferença entre alfabetizar e letrar? Qual a função do letramento em sala de aula? Para responder a essas questões, nosso foco neste tópico é entender a concepção de alfabetização, na perspectiva do letramento, no ciclo de alfabetização como uma atividade interdiscursiva e sociointeracional e, assim, estabelecer relações entre a concepção epistemológica e os métodos de alfabetização propostos. E, além disso, perceber a importância da dimensão integradora da alfabetização com as demais áreas do conhecimento em uma perspectiva interdisciplinar para as crianças de 6 a 8 anos de idade. Acompanhe! 1.3.1 Conceito de alfabetização no ciclo de alfabetização É preciso ter a clara compreensão que a criança não chega ao âmbito escolar como uma tábua rasa, mas ela já traz consigo conhecimentos de práticas sociais de leitura e escrita, os quais foram inseridos no seu ambiente familiar. Para formar cidadãos interacionistas e atuantesna sociedade, é preciso discernir as divergências e aproximações dos termos alfabetização e letramento. Segundo Soares (2018), o termo surge em 1980, junto aos estudos de Emilia Ferreiro, e estáletramento associado ao termo . Ele denomina uma aprendizagem inicial da língua escrita não apenas noalfabetização tocante a apreensão do sistema alfabético-ortográfico, mas também na inserção das crianças nas práticas sociais de língua escrita. De acordo com Jung (2007), antigamente, quando ouvíamos alguém dizer “ele é uma pessoa letrada” fazíamos referência ao nível de escolaridade de uma pessoa; dessa forma, o significado do termo se aproximava ao sentido atribuído ao ato de alfabetizar. No entanto, é o termo utilizado para tratar da inserção das pessoasletramento nos diversos espaços sociais, mesmo que não estejam aptos a (de)codificar textos no âmbito da alfabetização. Um exemplo de prática do letramento seria a de uma mãe lendo para seu filho uma história à noite antes de dormir, em que é possível visualizar frequentes padrões de interação (BRASIL, 2012; JUNG, 2007). Assim, ao interagirem em situações nas quais a escrita se faz presente, as pessoas podem se tornar letradas. Nessa perspectiva, admite-se que não há indivíduos iletrados em uma sociedade em que a escrita está presente em todas as relações sociais, pois de um modo ou de outro, todos participam dessas experiências (BRASIL, 2012). Como já vimos, as crianças não são “tábuas rasas” à espera do conhecimento que os professores lhes têm para oferecer; elas chegam ao ambiente escolar imbuídas de algum grau de letramento, mesmo porque desde pequenas já aprendem a interpretar logomarcas de produtos e anúncios, desenhos e outras vivências que lhe são VOCÊ QUER VER? O curta-metragem (2010) é uma metáfora para o processo deO Menino Quadradinho alfabetização. Dirigido por Diego Lopes e produzido com apoio do Ministério da Cultura, exibe as aventuras de um garoto que vivia dentro de um gibi, até que um dia ele acorda e se vê em meio ao nada. Lá encontra palavras desconhecidas e passa, aos poucos, a se relacionar com elas. Quer saber o final dessa história? Assista ao vídeo disponível no endereço: <http://www. >.ogersepol.com/meninoquadradinho/filme.htm http://www.ogersepol.com/meninoquadradinho/filme.htm http://www.ogersepol.com/meninoquadradinho/filme.htm - -17 pequenas já aprendem a interpretar logomarcas de produtos e anúncios, desenhos e outras vivências que lhe são impostas de acordo com o contexto social de cada uma delas. Nessa perspectiva, é preciso afirmar que a escola é apenas um domínio social no qual alunos e professores desempenham papeis sociais que exigem determinado letramento. Não são apenas as crianças que aprendem, tampouco a escola é o único local onde se aprende. Qualquer evento de letramento envolve aprendizagem. Quando ingressam na escola, as crianças precisam aprender a participar dos diferentes eventos que acontecem nesse domínio (JUNG, 2007, p. 88). Por isso, o Ministério da Educação estabelece que, no âmbito escolar, as crianças devam participar de vários eventos de letramento próprios desse domínio, a fim de alcançarem a finalidade da escolarização no tocante à aquisição do sistema de escrita alfabético, visto que isso é um direito básico de aprendizagem estabelecido por lei (BRASIL, 2012). Portanto, o professor deve estar sensível ao planejamento de suas aulas, enriquecendo suas práticas com gêneros textuais que promovam a inserção das crianças às práticas sociais de leitura e escrita. O termo é utilizado para conceber o processo de apropriação do sistema de escrita alfabético, noalfabetização qual o aluno conhece o sistema alfabético, realiza reflexões e promove correspondências acerca das relações fônicas e gráficas das palavras. No entanto, ainda segundo o documento estabelecido pelo Ministério da Educação, esse aprendizado não é suficiente, pois o esperado é que os aprendizes avancem rumo a um sistema de alfabetização que ultrapasse a concepção da aprendizagem (apenas) do sistema escrito, mas considere, também, o aprendizado das práticas, usos e funções da leitura e da escrita, relacionadas ao processo de letramento (BRASIL, 2012). Não basta, portanto, que as crianças adquiram as habilidades de leitura e escrita sem que estas estejam atreladas às suas funcionalidades na sociedade e sem que desenvolvam a criticidade e as habilidades de atuarem em sociedade por meio da leitura e da escrita. Os conceitos relacionados a alfabetizar e letrar, conforme proposta de Magda Soares (2018), são duas ações divergentes, mas indissociáveis, por isso o ideal é ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais de leitura e escrita. Parte-se do pressuposto de que a questão dos métodos de ensino da língua escrita tem sua origem na tendência histórica, que chega à atualidade, de equivocadamente fragmentar o processo: os métodos ou focalizam uma só faceta, ou sequenciam as facetas, como se devessem ser desenvolvidas separadamente. [...] neste livro se reconhece e se defende, como resposta à questão dos métodos, que [...] a aprendizagem inicial da língua escrita deve ser desenvolvida em sua inteireza, como um todo, porque essa é a natureza dos atos de ler e escrever, em que a complexa interação entre asreal práticas sociais da língua escrita e aquele que lê ou escreve pressupõe o exercício simultâneo de muitas e diferenciadas competências. É o que tem se denominado (SOARES,alfabetizar letrando 2018, p. 35). Observe o exemplo descrito no caso a seguir: - -18 Maluf e Cardoso-Martins (2013) afirmam que o ato de ler vai muito além da simples decodificação de palavras, pois envolve, fundamentalmente, a compreensão de textos de modo abrangente. E assim como afirmou Soares (2018), as autoras supracitadas ratificam que “[...] a leitura se constitui de duas instâncias complementares e indissociáveis: a decodificação e a compreensão” (MALUF; CARDOSO-MARTINS, 2013, p. 139). Na perspectiva de Maluf e Cardoso-Martins (2013), a criança, no processo de alfabetização e letramento, sempre desenvolve proposições a partir das que são fornecidas pelo texto ou a partir de se conhecimento de mundo. Assim, alfabetizar, na perspectiva do letramento, admite que o trabalho realizado em sala de aula seja realizado com a diversidade de gêneros textuais, instrumentos culturais que aparecem em textos produzidos, oralmente ou por escrito, para comunicação social e, também, para as situações de aprendizagem na escola (BRASIL, 2012). Cabe ao professor selecionar gêneros textuais significativos, que promovam práticas de alfabetização pautadas na perspectiva do letramento e mobilizem as crianças para a funcionalidade social de suas produções. O processo de ensino-aprendizagem de alfabetização deve estar firmado no trabalho com os gêneros textuais, considerando os usos sociais da leitura e da escrita em todas as áreas curriculares, e não apenas de Língua Portuguesa (BRASIL, 2012). integração da alfabetização com as Logo, percebemos quão importante é que haja a demais áreas do conhecimento, pois aprender a ler e escrever é uma instância que se executa numa perspectiva lementos conceituais einterdisciplinar. Essas e outras questões são pautas do documento que rege os e metodológicos para definição dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento do ciclo de alfabetização, nos três primeiros anos do ensino fundamental, e é sobre isso que trataremos a seguir. 1.4 A escola e as práticas de alfabetização Entende-se por as discussões curriculares que abarcam temas referentes aos conhecimentos escolarescurrículo e aos procedimentos pedagógicos que envolvem a escola e os estudantes. Desde 2015, o currículo dos três primeiros anos do ensino fundamental vem passando por transformações, e é sobre isso que trataremos neste tópico. Qual o percurso histórico traçado na organização escolar por ciclos no país? Qual a atual concepção do ciclo de alfabetização? Como se configura o currículo nos três anos iniciais do Ensino Fundamental? Quais direitosde aprendizagem para o ciclo de alfabetização estão previstos na Lei? As respostas encontram-se na sequência. CASO A professora Joana, ao planejar ações de alfabetização na perspectiva do letramento, seleciona textos para leitura guiada pela decisão de apresentar textos mais simples e curtos, tais como cantigas, trava-línguas, trovas, haicais. E à medida que os alunos avançam nas suas aquisições, ela propõe textos mais complexos e extensos, tais como contos, fábulas e poemas maiores. Também seleciona textos com temas e linguagens próximos da realidade do estudante, que exploram as unidades fonológicas com as quais os seus alunos já são capazes de lidar antes de entrar para a escola, tais como rimas, jogos, cantos e brincadeiras infantis. Ao iniciar o trabalho em sala de aula, a professora sempre parte da leitura de textos diversificados de cada gênero, focaliza a relação grafema-fonema, seleciona trechos para a leitura oral dos alunos e, a partir do texto selecionado, ela inicia o trabalho alfabético-ortográfico de escrita e produção de textos reais pelos alunos. - -19 1.4.1 Ciclo de alfabetização Nas últimas décadas do século XX e, principalmente, a partir do início deste século, nas propostas curriculares dos estados brasileiros há uma supremacia clara da defesa da obrigação de favorecer, desde o início do Ensino Fundamental, a aprendizagem da leitura e da escrita com ênfase na iniciação das crianças em práticas de leitura e escrita de textos que circulam em diferentes esferas sociais de interação. Essas propostas são regulamentadas e instituídas pelo Ministério de Educação com o intuito de uniformizar a garantia dos direitos educacionais para todas as crianças brasileiras, e de regulamentar as práticas docentes a fim de que a aprendizagem inicial de leitura e escrita aconteça de modo igualitário (BRASIL, 2012). Considerando que o ato de se alfabetizar não é algo simples, e tendo percebido que raramente as crianças dão conta de construir todos os saberes fundamentais para o domínio da leitura e da escrita alfabética em tão- somente 200 dias letivos, denomina-se um tempo sequencial de três anos (1.º, 2.º e 3.ºciclo de alfabetização anos), sem interrupções, o período ideal para se assegurar a cada criança o direito às aprendizagens básicas da aquisição de leitura e da escrita (BRASIL, 2012). Assim, com a finalidade de unificar o ensino-aprendizagem de leitura e escrita durante o período do ciclo de alfabetização no âmbito do Estado nacional, alguns aspectos e princípios do currículo precisam ser instaurados e apreendidos pelos professores em suas práticas pedagógicas. Sobre estas questões, trataremos a seguir. 1.4.2 Currículo Muito se tem discutido a respeito do grande desafio que é assegurar às crianças o direito às aprendizagens básicas no período de três anos. Por isso, é muito importante que haja a constante revisão e avaliação da qualidade das propostas pedagógicas, dos espaços, dos materiais, do apoio ofertado às crianças com dificuldade, do investimento na formação inicial e continuada dos professores e nos vários aspectos que influenciam (in)diretamente na aprendizagem das crianças (BRASIL, 2012). Nesse sentido, fica evidente a importância de um trabalho sistêmico multidisciplinar que deve ser realizado e garantido por todos os envolvidos, desde a vigilância de órgãos regulamentadores a professores e familiares das crianças inseridas no processo de alfabetização. Também é importante que o professor esteja sempre atualizado e munido de práticas pedagógicas adequadas ao seu alunado; para isso, a expectativa é que ele seja assíduo às formações contínuas promovidas pelas secretarias de educação. Outro aspecto previsto para o currículo dos 1.º, 2.º e 3.º anos iniciais, considerando as especificidades da infância, é a necessidade de o professor promover ações pedagógicas lúdicas – o brincar –, de modo a estimular a cognição, a psicomotricidade, o raciocínio lógico, a linguagem oral e escrita, o conhecimento científico etc. Logo, o espaço escolar deve se configurar como um ambiente de apropriação e produção de conhecimento, onde afeto, cognição e ludicidade caminhem juntos (BRASIL, 2012). Assim, cabe a nós, professores, compreendermos os benefícios dos jogos no avanço do desenvolvimento cognitivo das crianças para, então, produzirmos materiais dessa natureza e atividades que permitam que elas vivenciem essas experiências em sala de aula. A contação de histórias é outro ponto predeterminado para o currículo das séries iniciais. Entende-se que quando isso ocorre, oportunidades prazerosas se efetivam. Além de ajudar a criança a desenvolver o prazer pela leitura e pela entonação expressiva da língua, amplia-se o uso e a compreensão da linguagem oral, imagética e escrita, bem os conhecimentos de mundo; e, ainda, estimula-se a imaginação e a criatividade (BRASIL, 2012). Portanto, a contação de histórias é fundamental porque permite à criança a livre imaginação, e isso é fator imprescindível para o desenvolvimento infantil; logo, esse tipo de atividade deve ser instigada não somente pelos professores, mas também pela família, em outras situações de letramento. - -20 A respeito das atividades de produção textual, preconiza-se que estas sejam feitas, na maioria das vezes, coletivamente e de maneira diversificada. Dessa forma, cabe aos professores realizá-las de modo contextualizado e significativo, mobilizando conhecimentos prévios e de interesse da turma ou da criança, a fim de enfatizar seu papel de sujeito e elevar sua autoestima, apontando sua rede de pertencimento e construindo sua cidadania (BRASIL, 2012). Figura 7 - Na escola primária, ao levantarem a mão em sala de aula, os alunos buscam a interação, numa perspectiva sociocultural do processo de aprendizagem. Fonte: ESB Professional, Shutterstock, 2018. Considerando que cada aluno tem seu ritmo, há ainda a necessidade de a escola trabalhar com esta concepção VOCÊ QUER LER? O documento “Elementos conceituais e metodológicos para definição dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento do ciclo de alfabetização (1.º, 2.º e 3.º anos) do Ensino Fundamental” é o tipo de leitura imprescindível para professores que anseiam por atuar em classes de alfabetização. Trata-se de uma política de governo criada para assistir as redes de ensino na determinação dos currículos e garantir uma base de alfabetização comum a todos. Para ser o documento, acesse: <http://portal.mec.gov.br/index.php? option=com_docman&view=download&alias=12827-texto-referencia-consulta-publica-2013- >.cne-pdf&category_slug=marco-2013-pdf&Itemid=30192 http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=12827-texto-referencia-consulta-publica-2013-cne-pdf&category_slug=marco-2013-pdf&Itemid=30192 http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=12827-texto-referencia-consulta-publica-2013-cne-pdf&category_slug=marco-2013-pdf&Itemid=30192 http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=12827-texto-referencia-consulta-publica-2013-cne-pdf&category_slug=marco-2013-pdf&Itemid=30192 - -21 Considerando que cada aluno tem seu ritmo, há ainda a necessidade de a escola trabalhar com esta concepção nas práticas pedagógicas, identificando as diferenças das crianças, mas não promovendo posturas excludentes (BRASIL, 2012). Em função disso, não cabe a aplicação de procedimentos prontos, mas sim, suficientemente flexíveis para que possam se adequar a cada contexto escolar de cada comunidade. Dentre os direitos que devem ser garantidos às crianças no tocante à área de linguagens, o documento preconiza que é indispensável promover um ensino com base em planejamento sólido e coeso e que abarque situações favoráveis de aprendizagem. Isto significa considerar os quatro eixos de ensino e aprendizagem das práticas de linguagem e língua: análise linguística, oralidade, leitura e produção de texto escrito (BRASIL, 2012). Fica evidente o papel das instituições escolares no tocante à responsabilidade de assegurar queesses direitos de aprendizagem sejam garantidos. E, para isso, intervenções pedagógicas são imprescindíveis. Após termos conhecido os métodos de alfabetização, a teoria construtivista e o currículo estabelecido para o ciclo de alfabetização, e já sabendo que as crianças chegam à escola com conhecimentos gerados no seio familiar e social, é nosso papel proporcioná-las a garantia do direito de ampliação dos seus universos textuais e linguísticos, fazendo com que adquiram autonomia para ler e escrever, após terem se apropriado do sistema de escrita alfabético-ortográfico. Síntese Chegamos ao final do capítulo, no qual aprofundamos o conhecimento sobre a história dos métodos de alfabetização e suas interfaces. Os fundamentos desse estudo são imprescindíveis para o profissional docente, pois o auxiliarão nas práticas pedagógicas. Neste capítulo, você teve a oportunidade de: • conhecer os métodos de alfabetização na história do ensino da língua escrita; • identificar as principais características dos métodos analíticos e sintéticos; • estabelecer relações entre a concepção epistemológica e os métodos e propostas de alfabetização; • entender a concepção de alfabetização na perspectiva do letramento no ciclo de alfabetização como uma atividade interdiscursiva e de interação; • conhecer a definição de direitos de aprendizagem para o ciclo de alfabetização; • perceber a importância da dimensão integradora da alfabetização na perspectiva interdisciplinar. Bibliografia AMIGOS MÚLTIPLOS. 15 fatos surpreendentes sobre seu cérebro que talvez você não saiba. 22 out. 2014. Disponível em: <https://amigosmultiplos.org.br/noticia/15-fatos-surpreendentes-sobre-seu-cerebro-que- talvez-voce-nao-saiba/>. Acesso em: 07/06/2018. AZENHA, M. G. : de Piaget a Emilia Ferreiro. 8. ed. São Paulo: Ática, 2006.Construtivismo BATTISTI, V. 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