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ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES ASPECTOS OBSERVADOS EM PROCESSOS JURÍDICOS RESUMO O abuso sexual infantil é um problema de saúde pública, devido à elevada incidência epidemiológica e aos sérios prejuízos causados no desenvolvimento das vítimas. A dinâmica desta forma de violência conta com aspectos psicológicos, sociais e legais. Este estudo mostra o mapeamento dos fatores de risco para abuso sexual intrafamiliar, baseado em processos jurídicos de abuso sexual, do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Consiste na análise de 71 expedientes, apresentando o perfil das vítimas e caracterizando a violência sexual, os agressores e as famílias, no período de 1992 e 1998. Os resultados apontaram que o desemprego, famílias reconstituídas, abuso de álcool e drogas, dificuldades econômicas e a presença de outras formas de violência constituíram como os principais fatores de risco associados ao abuso sexual. DESENVOLVIMENTO O abuso sexual de crianças e adolescentes têm sido considerados um grave problema de saúde pública, devido aos altos índices epidemiológicos e aos graves danos causados no desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da vítima e de sua família. Esta forma de violência pode ser definida em qualquer forma de contato físico ou interação entre uma criança, ou adolescente, e qualquer pessoa em estágio psicossexual mais avançado, que esteja utilizando da vítima para sua própria estimulação sexual. A interação sexual pode incluir toques, carícias, sexo oral ou relações com penetração (digital genital ou anal). O abuso sexual também inclui situações em que não há contato físico, tais como voyeurismo (desordem sexual que consiste na observação de uma pessoa no ato de se despir, nua ou realizando atos sexuais e que não se sabe observada), assédio e exibicionismo. O abuso sexual também pode ser definido, de acordo com o contexto da ocorrência, em categorias diferentes. Fora do ambiente familiar, ele pode ocorrer em situações em que crianças ou adolescentes são envolvidos em pornografia e exploração sexual. No entanto, a maioria dos abusos sexuais contra crianças e adolescentes ocorrem dentro de casa, ou de algum ambiente familiar, e são perpetrados por pessoas próximas, e que desempenham o papel de cuidadoras da vítima. Nesse caso, os abusos são denominados intrafamiliares ou incestuosos. Dessa forma, as relações sexuais, mesmo sem consanguinidade, envolvendo uma criança e um adulto responsável (tutor, cuidador, membro da família ou familiar) são consideradas incestuosas. A familiaridade entre a criança e o abusador envolvem laços afetivos fortes, positivos e negativos, colaborando para que aos abusos incestuosos causem maior impacto cognitivo-comportamental para a criança e família. A dinâmica por trás do abuso intrafamiliar envolve dois aspectos interligados: a “Síndrome do Segredo”, que está ligada diretamente com a psicopatologia do agressor (pedofilia) e, por gerar um grande repúdio social, faz com que se mantenha em uma teia de segredos da parte da criança, por via de ameaças e barganhas do abusador; e a “Síndrome de Adição” que conta com comportamento compulsivo do descontrole de impulso frente ao estímulo gerado pela vítima, ou seja, o abusador, por não se controlar, usa da criança para obter excitação sexual e alívio da tensão, gerando dependência psicológica e, por consequência, a negação da mesma. Muito comumente, as crianças e adolescentes vítimas de abuso intrafamiliar são também vítimas de negligência, abusos emocionais e físicos. As famílias incestuosas apresentam relações interpessoais assimétricas e hierárquicas, que geralmente contam com uma desigualdade e/ou subordinação. Alguns fatores de risco vêm sendo constantemente verificados nestas famílias: pai e/ou mãe abusados ou negligenciados em suas famílias de origem; abuso de álcool e drogas; papéis sexuais rígidos; falta de comunicação entre os membros da família; autoritarismo; estresse; desemprego; indiferença; mãe passiva e/ou ausente; dificuldades conjugais; famílias reestruturadas; isolamento social; pais que sofrem de transtornos psiquiátricos; doença, morte ou separação do cônjuge; mudanças de comportamento da criança, incluindo conduta hipersexualizada, fuga do lar, diminuição no rendimento escolar, uso de drogas e conduta delinquente. O impacto do abuso sexual está ligado a fatores intrínsecos à criança, tais como vulnerabilidade e resiliência (temperamento, resposta ao nível de desenvolvimento neuropsicológico) e a existência de fatores de risco e proteção extrínsecos (recursos sociais, funcionamento familiar recursos emocionais dos cuidadores e recursos financeiros, incluindo acesso ao tratamento). Algumas consequências negativas são exacerbadas em crianças que não possuem uma rede de apoio social e afetiva. Os fatores que influenciam o impacto do abuso sexual são: saúde emocional prévia, crianças com saúde emocional positiva tendem a sofrer antes do abuso tendem a sofrer menos efeitos negativos; tipo de atividade sexual, alguns dados sugerem que formas de abuso mais intrusivas, como penetração, podem causar mais efeitos negativos; duração e frequência dos episódios abusivos; reação dos outros, a resposta negativa da família ou dos pares à descoberta do abuso acentuam efeitos negativos (atribuir a responsabilidade à criança); dissolução da família após a revelação; criança responsabilizando-se pela interação sexual; e quando a vítima recebe recompensa pelo abuso e o perpetrador nega que o abuso aconteceu. A literatura aponta que crianças e adolescentes podem desenvolver quadros de depressão, transtornos de ansiedade, alimentares, dissociativos, hiperatividade e déficit de atenção e transtorno de personalidade borderline (transtorno mental grave caracterizado por um padrão de instabilidade contínua no humor, no comportamento, autoimagem e funcionamento). Entretanto, a psicopatologia decorrente do abuso sexual mais citada é o transtorno de estresse pós-traumático. Alguns estudos epidemiológicos estão sendo desenvolvidos com os objetivos de investigara incidência e a prevalência do abuso sexual, analisando indicadores psicológicos e sociais ligados a esse fenômeno. Os resultados mostram que a maioria dos abusos sexuais ocorre dentro das casas das vítimas e são considerados incestuosos, sendo que o pai biológico e o padrasto são os principais perpetradores. Ocorre também uma prevalência maior em meninas, principalmente entre os abusos incestuosos. A maioria dos casos concentra-se na faixa etária de 5 a 8 anos de idade. A mãe é a pessoa mais procurada na solicitação de ajuda e a maioria dos casos é revelada somente um ano após o início dos abusos.
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