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Brasília-DF. Técnicas Modernas de Biologia Molecular Elaboração Joci Neuby Alves Macedo José Luiz de Souza Lopes Luis Fernando Reyes Julio Cesar Pissuti Damalio Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO .................................................................................................................................. 5 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA ..................................................................... 6 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 8 UNIDADE I BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO .......................................................................................... 11 CAPÍTULO 1 UM POUCO DE HISTÓRIA ....................................................................................................... 11 CAPÍTULO 2 A DESCOBERTA DO DNA COMO TRANSMISSOR DA INFORMAÇÃO GÊNICA E O SURGIMENTO DA ENGENHARIA GENÉTICA ........................................................................................................ 16 UNIDADE II A MANIPULAÇÃO DO DNA ................................................................................................................. 19 CAPÍTULO 1 REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR) .......................................................................... 19 CAPÍTULO 2 SEQUENCIAMENTO DE DNA................................................................................................... 25 CAPÍTULO 3 ENZIMAS DE RESTRIÇÃO E LIGASE: “MONTANDO O DNA” ........................................................ 30 CAPÍTULO 4 EXTRAÇÃO, PURIFICAÇÃO DE DNA E ELETROFORESE .............................................................. 35 CAPÍTULO 5 TRANSFORMAÇÃO BACTERIANA ............................................................................................ 39 CAPÍTULO 6 VETOR DE CLONAGEM MOLECULAR – PLASMÍDEOS ............................................................... 42 CAPÍTULO 7 BIBLIOTECA DE DNA GENÔMICO E DE cDNA ......................................................................... 45 UNIDADE III TÉCNICAS DE HIBRIDIZAÇÃO .............................................................................................................. 50 CAPÍTULO 1 SOUTHERN BLOT, NORTHERN BLOT E WESTERN BLOT ............................................................... 51 CAPÍTULO 2 MICROARRANJOS DE DNA E DE PROTEÍNAS ........................................................................... 56 UNIDADE IV RECENTES AVANÇOS DA BIOLOGIA MOLECULAR ................................................................................. 61 CAPÍTULO 1 DUPLO HÍBRIDO EM LEVEDURAS ............................................................................................. 61 CAPÍTULO 2 IMPRESSÃO DIGITAL DO DNA - MEDICINA FORENSE ................................................................ 65 CAPÍTULO 3 TESTE DE PATERNIDADE .......................................................................................................... 71 CAPÍTULO 4 USO DA BIOINFORMÁTICA NA ANÁLISE DE SEQUENCIAS DE DNA E PROTEÍNAS ......................... 74 CAPÍTULO 5 A ERA DAS “ÔMICAS” E A GERAÇÃO DE INFORMAÇÕES EM GRANDE ESCALA ........................ 80 PARA (NÃO) FINALIZAR ...................................................................................................................... 82 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 83 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do aluno. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 7 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Exercício de fixação Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/ conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não há registro de menção). Avaliação Final Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso, que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber se pode ou não receber a certificação. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 Introdução Este caderno de estudos foi elaborado com o propósito de oferecer conhecimentos sobre as principais técnicas da Biologia Molecular e suas aplicações, além de fornecer informações sobre alguns temas recentes desta área da ciência. Iniciaremos nosso curso fazendo uma rápida viagem pela história da Biologia Molecular, conhecendo as principais descobertas no meio científico que consolidaram esta área da Ciência. Após um pouco de história, vamos abordar as principais técnicas utilizadas em biologia molecular que representam “A tecnologia do DNA recombinante”, como por exemplo, a PCR. O que seria desta área da ciência sem essa ferramenta? Vocês verão que, depois desta técnica, tudo aconteceu mais rápido. Agora já estamos prontos para aprofundarmos nossos conhecimentos com técnicas específicaspara a identificação de uma molécula de DNA, RNA e proteína entre milhões de moléculas, assim como procurar uma agulha no palheiro. Vamos introduzir os conceitos de uma técnica para identificação de interação entre proteínas, e o porquê da busca de parceiros proteicos. Como nós, as moléculas da vida convivem interagindo entre si. Exploraremos o que veio depois da dupla hélice, a busca por informação em grande escala, não pensamos em um gene, mas sim no genoma; uma proteína é pouco para todo conhecimento que já armazenamos. Chegou a era das “ômicas”, e assim pensamos com todas biomoléculas. Vamos entender a importância da impressão digital do DNA, sua aplicação no teste de paternidade e na Medicina Forense. Por fim, serão fornecidas informações básicas sobre Bioinformática, vamos conhecer os principais bancos de dados de sequências e as várias ferramentas para análises de sequências de DNA e proteína. Bons estudos! Objetivos » Introduzir os principais acontecimentos históricos que deram origem a biologia molecular. » Apresentar os grandes cientistas que contribuíram para o desenvolvimento da biologia molecular. » Conhecer as principais características do DNA como a molécula que armazena as informações da vida. » Introduzir os fundamentos das principais técnicas da Biologia Molecular. 9 » Contextualizar as aplicações das técnicas. » Reconhecer as diferenças entre as bibliotecas de DNA genômico e de cDNA. » Apresentar e estabelecer diferenças entre as técnicas de hibridização e suas aplicações. » Introduzir o novo conceito de pesquisa: as “ômicas”. » Compreender a importância da impressão digital do DNA para a Medicina Forense e o teste de paternidade. » Entender a importância da Bioinformática para a Ciência. » Apreender os conceitos básicos sobre genômica e seus derivados “ômicos”. » Reconhecer o envolvimento do Brasil neste tipo de pesquisa. » Definir e classificar os bancos de dados biológicos e entender sua função. » Familiarizar-se com ferramentas para análise de sequencias de DNA e proteínas. 11 UNIDADE I BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO CAPÍTULO 1 Um pouco de história O termo Biologia Molecular foi usado pela primeira vez por Warren Weaver em 1938, num relatório enviado para a Fundação Rockefeller: “Entre os estudos para os quais esta fundação dá suporte, há um grupo, em um campo relativamente novo, que pode ser chamado de Biologia Molecular”. O marco inicial da história da Biologia Molecular moderna foi a descoberta do DNA por Friedrich Meischer em 1869, como uma nova substância química presente no núcleo de células de glóbulos brancos, que foi inicialmente chamada de nucleína. A partir de então, vários acontecimentos no meio científico contribuíram para consolidar está área da ciência, que hoje pode ser definida como uma forma de abordagem de um problema em nível molecular, onde a combinação de técnicas e teorias provindas da genética microbiana, microbiologia, bioquímica e biofísica auxiliam na busca das respostas. Abaixo, apresentaremos algumas das descobertas que contribuíram para a consolidação da Biologia Molecular como uma área das ciências biológicas: » 1869 - Friedrich Miescher: bioquímico suíço que isolou do núcleo de células de glóbulos brancos provenientes de pus, um composto de caráter ácido que foi denominado de nucleína. Esse composto era constituído por hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e fósforo. Mais tarde, ele conseguiu isolar o mesmo composto de células de esperma de salmão. Este composto era resistente à ação da enzima pepsina, uma protease. O próprio Miescher acreditava que as proteínas fossem as moléculas da hereditariedade, ele não sabia que estava dando o pontapé inicial para elucidar esta questão. » 1882 - Walther Flemming: considerado o criador da ciência da citogenética, foi o primeiro pesquisador a descrever o comportamento dos cromossomos durante o processo da divisão celular. Os termos mitose e cromatina foram primeiramente usados por ele. » 1915 - Thomas Hunt Morgan: Biólogo norte americano que formulou a teoria cromossômica da hereditariedade por meio dos seus trabalhos com a mosca Drosophila melanogaster. Ganhou o prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina em 1933. 12 UNIDADE I │ BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO » 1928 - Frederick Griffith: identificou o princípio transformante e hereditário, que, mais tarde, seria chamado de DNA. No clássico experimento realizado com Diplococcus pneumoniae, Griffith demonstrou que: › Camudongos morreram após receberem uma injeção de uma estirpe virulenta de Diplococcus. › Camundongos permaneceram vivos após injeção de uma estirpe avirulenta de Diplococus. › Camudongos conservaram-se vivos após injeção da estirpe virulenta morta por aquecimento. Tudo bem até aqui! › Camudongos morreram após injeção de uma mistura composta por estirpe virulenta morta por aquecimento juntamente com uma estipe avirulenta viva. Griffith isolou do sangue destes camudongos a estirpe virulenta da bactéria viva. Como isso pode acontecer, visto que a estirpe virulenta estava morta? › Conclusão: alguma coisa foi transferida da bactéria virulenta morta para a bactéria avirulenta viva, conferindo-lhe a capacidade de matar os camundongos. A esta “coisa”, foi dado o nome de princípio transformante. No entanto, ele não conseguiu responder o que seria este princípio. Por outro lado, Griffith também estava descobrindo a transformação bacteriana. › Fiquem atentos, pois este enigma começa a ser elucidado em 1944. » 1941 - George Beadle e Edward Lawrie Tatum: foram os primeiros a fazer a relação [um gene → uma enzima] a partir de trabalho com o fungo Neurospora. Eles observaram que a mutação em um gene alterava a atividade de uma enzima. Este trabalho resultou nas bases da Genética Bioquímica. Juntos, ganharam o prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina em 1958. » 1944 - Frederick Sanger: Bioquímico inglês que desenvolveu um método de sequenciamento de proteínas e determinou a sequência completa de aminoácidos da insulina. Em 1958, recebeu o prêmio Nobel em Química graças a este trabalho. Sanger aparecerá em nosso histórico mais uma vez ganhando um prêmio, agora em trabalhos com o DNA. » 1944 - Oswald Avery, Colin McLeod e Maclyn McCarty: apresentaram as primeiras evidências de que as informações hereditárias estariam armazenadas no DNA e não nas proteínas, como ainda se pensava na época. Dessa forma, responderam a pergunta que Griffith não tinha elucidado em 1928: o princípio transformante é o DNA. Eles demonstraram que o princípio transformante era degradado pela ação de uma desoxirribonuclease pancreática (DNAse), mas não pela atividade 13 BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO │ UNIDADE I de ribonuclease pancreática (RNAse) ou de enzimas proteolíticas (proteases). O mundo já começava a relacionar o DNA com a hereditariedade, mas mesmo assim, ainda havia os que não acreditavam nesta proposição. » 1950 - Rosalind Franklin: biofísica britânica que obteve o primeiro padrão de difração de raios-X para o DNA, o qual foi fundamental para a proposição da estrutura em dupla hélice para o DNA por Watson e Crick. Muitos dizem que ela foi negligenciada por Watson e Crick, que não a mencionaram por este feito em seu trabalho sobre a estrutura do DNA, visto que, a imagem por ela obtida do DNA foi de fundamental importância para que eles chegassem à estrutura de dupla hélice para o DNA. Independente do que a história relata, aqui nós daremos a ela a importância merecida pelo seu trabalho. » 1950 - Erwin Chargaff: bioquímico austríaco demonstrou uma razão constante entre as bases nitrogenadas adenina/timina e citosina/guanina no DNA, independente do DNA analisado. » 1951 - Linnus Pauling: Propôs as estruturas de alfa hélice e folha beta para proteínas. » 1952 - Alfred Hershey e Martha Chase: provaram que o DNA, e não a proteína, é o material genético. Colocaram um ponto final nesta questão no experimentoconhecido como experimento do liquidificador. Eles adicionaram o isótopo radioativo P32 (fósforo) em uma cultura de bacteriófagos (um tipo de vírus que infecta bactérias), e em outra cultura adicionaram o isótopo radioativo S35 (enxofre). Lembre-se que o DNA não possui enxofre e que as proteínas não possuem o elemento fósforo. Após infecções de E. coli com os bacteriófagos marcados, as amostras foram agitadas em um liquidificador para separar os bacteriófagos das bactérias. Eles observaram que no precipitado formado pelas bactérias havia apenas P32, enquanto no sobrenadante, onde se encontravam os bacteriófagos, estava presente apenas S35. Dessa forma Hershey e Chase constataram que o DNA dos bacteriófagos tinha sido transferido para o interior das bactérias. » 1953 - James Watson e Francis Crick: determinaram a estrutura tridimensional do DNA. Este é o marco principal da Biologia Molecular. No próximo capítulo, discutiremos esta descoberta. Estes pesquisadores receberam o prêmio Nobel em Medicina e Fisiologia em 1962. » 1957 - Francis Crick: postulou o “dogma central” da Biologia Molecular: [DNA → RNA → Proteína]. Maiores detalhes já foram apresentados no curso: “Dogma Central da Biologia Molecular e Introdução à Bioinformática”. » 1957 - Arthur Kornberg: bioquímico americano que isolou a enzima DNA polimerase e foi o primeiro pesquisador a sintetizar DNA in vitro. Foi agraciado com o prêmio Nobel em Medicina e Fisiologia em 1959. As ferramentas da tecnologia do DNA recombinante começam a surgir. 14 UNIDADE I │ BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO » 1958 - Matthew Meselson e Franklin Stahl: demonstraram que o DNA se duplica de forma semiconservativa, em um experimento considerado um dos mais bonitos da Biologia Molecular. Assim como já visto detalhadamente no curso: “Dogma Central da Biologia Molecular e Introdução à Bioinformática”. » 1961 - François Jacob e Jacques Monod: biólogos franceses que decifraram os mecanismos de regulação gênica em procariotos – o operon. Atualmente, a expressão de proteínas heterólogas em bactérias tem como fundamentos os operons. Receberam o prêmio Nobel em Medicina e Fisiologia em 1965. » 1966 - Marshall Nirenberg e Phil Leder: biólogos americanos que juntos decifraram o código genético. Nierenberg ganhou o prêmio Nobel em Medicina e Fisiologia em 1968, com estudos que culminaram na descoberta de que cada aminoácido é codificado por pelo menos uma trinca de nucleotídeos. » 1966 - Bernard Weiss e Charles Richardson: pesquisadores americanos que isolaram a enzima DNA ligase do bacteriofago T4, uma ferramenta essencial para a tecnologia do DNA recombinante. » 1968 - H.O. Smith, K.W. Wilcox, e T.J. Kelley: isolaram a primeira endonuclease de restrição específica. Tal fato permitiu o início da consolidação da tecnologia do DNA recombinante, pois as endonucleases são uma das principais ferramentas nessa área. » 1971 - David Baltimoree e Howard Temin: identificaram uma transcriptase reversa viral – enzima capaz de sintetizar DNA a partir de um molde de RNA. A partir de então, houve uma reavaliação do dogma central e novas expectativas para a Biologia Molecular: [DNA↔RNA→Proteína]. Receberam o prêmio Nobel em Medicina e Fisiologia em 1975. » 1972 - David Jackson, R.H. Symons e P. Berg: produziram a primeira molécula de DNA recombinante. Estaria o homem começando a brincar de “deus”? » 1975 - Edwin Southern: desenvolveu um método de detecção de sequência específica de DNA – Southern blot. Assim começavam a surgir as técnicas da Biologia Molecular. » 1976 - Robert Swanson e Herber Boyer: fundaram a empresa Genentech de biotecnologia na Califórnia. A Biologia Molecular começa a se tornar rentável. » 1977 - Frederick Sanger e Walter Gilbert: independentemente, desenvolveram métodos para determinar a sequência exata do DNA. Olha o Sanger retornando ao nosso histórico e, junto com Gilbert e Berg (DNA recombinante), ganhou mais um prêmio Nobel, agora em Química, em 1980. » 1985 – Kary Mullis: inventou a técnica da Reação em Cadeia da Polimerase – PCR, fato pelo qual foi agraciado com prêmio Nobel em Química em 1993. Podemos 15 BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO │ UNIDADE I dizer que, as pesquisas em engenharia genética e biologia molecular só chegaram ao nível de complexidade em que estamos atualmente graças a esta técnica. É difícil imaginar a manipulação do DNA sem a PCR. » 1986 - Leroy Hood: desenvolveu o sequenciamento automático. A partir de então se podia pensar em projetos genomas. » 1988 - NIH (National Institutue of Health) e DOE (Department of Energy): lançam nos EUA o consórcio do projeto genoma humano (PGH). » 1995 - TIGER (EUA): finalizam o sequenciamento do primeiro genoma sequenciado: Haemophilus influenzae. » 1996 - Ian Wilmut: criador do primeiro clone de um mamífero adulto, a ovelha Dolly. Aqui fica novamente a questão: será que o homem está brincando de “deus”? » 2000 - Consórcio PGH: publica um rascunho do genoma humano com 30 mil genes. » 2003 - Consórcio PGH: conclui o sequenciamento do genoma humano. » 2003 - Pesquisadores brasileiros concluem o sequenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, a causadora da doença do amarelinho em cítricos. » 2009 - O genoma bovino é publicado em um trabalho conjunto de cientistas de 25 países. » 2010 - Criação da primeira célula controlada por DNA sintético A doença do amarelinho é causada devido à oclusão de vasos do xilema por agregados da bactéria Xylella fastidiosa. Isso impede a passagem de água e sais minerais até as folhas, causando um estresse hídrico. O sequenciamento do genoma da Xylella envolveu 192 pesquisadores em 34 laboratórios distintos. O resultado desse sequenciamento foi capa da revista científica Nature, aliás, foi a primeira vez que um trabalho desenvolvido nos laboratórios brasileiros foi capa dessa prestigiada revista. Este histórico ilustra a corrida científica na área da Biologia Molecular para elucidar os mecanismos moleculares que governam a vida, inclusive vários deles receberam o prêmio Nobel por isso. Há 60 anos não se conhecia a estrutura do DNA, na atualidade manipulamos está molécula com uma facilidade inimaginável naqueles tempos. Muitas perguntas ainda estão sem respostas, mas os conhecimentos acumulados pelos biologistas moleculares na atualidade são essenciais para futuras descobertas. vanessa.pereira Nota Marked definida por vanessa.pereira 16 CAPÍTULO 2 A descoberta do DNA como transmissor da informação gênica e o surgimento da Engenharia Genética A história da Biologia Molecular tem como marco inicial a descoberta do DNA em 1869. Desde então, várias perguntas foram a motivação para elucidar a importância desta molécula para o ser vivo e a conservação de suas características ao longo de gerações. Essas perguntas só começaram a ser respondidas há sete décadas, com o clássico experimento de Oswald Avery, Colin McLeod e Maclyn McCarty, onde eles demonstraram que o chamado princípio transformante era o ácido nucléico. E o ponto culminante das descobertas, que enfim forneceram os conhecimentos necessários para entender como a informação genética era armazenada e transmitida, foi a elucidação da estrutura do DNA, há quase 60 anos. O evento considerado o mais importante da biologia do século passado, foi a elucidação da estrutura do DNA por Watson e Crick em 1953. A simplicidade das palavras dos autores no início da publicação dos dados não mensurava a importância de tal feito: “We wish to suggest a structure for the salt of deoxyribose nucleic acid [DNA]. This structure has novel features which are of considerable biological interest” (Nós queremos sugerir uma estrutura para o sal de ácido desoxirribonucleico [DNA]. Esta estrutura tem novas características que são de considerável interesse biológico). É importante ressaltar que outros pesquisadores contribuíram com informações importantes para este feito, como Maurice Wilkinse Rosalind Franklin, entre outros. Assim, hoje sabemos que o DNA (ácido desoxirribonucleico) é a molécula da vida, na qual toda a informação necessária para o desenvolvimento de um organismo está armazenada na forma de um código formado por 4 unidades, chamadas de desoxinucleotídeos (nucleotídeos). Esses nucleotídeos são simplificadamente abreviados pelas letras A (adenina), T(timina), C(citosina) e G (guanina) e são constituídos por um grupo fosfato ligado a uma pentose (desoxirribose – açúcar de cinco carbonos) que por sua vez encontra-se ligada a uma das quatro bases nitrogenadas (adenina, timina, citosina e guanina). A estrutura do DNA foi então demonstrada ser formada por duas cadeias de nucleotídeos que se polimerizam por meio de ligações fosfodiéster entre os nucleotídeos. Essas cadeias encontram-se pareadas em uma orientação antiparalela e unidas por ligações de hidrogênio entre as bases nitrogenadas complementares (A/T e C/G). Essas duas cadeias formam uma hélice que lembra uma escada em espiral onde os degraus são as bases nitrogenadas e o corrimão é formado pelas desoxirriboses e os grupos fosfatos (figura 1). Os autores fazem uma importante observação no texto que será mais tarde confirmada: “It has not escaped our notice that the specific pairing we have postulated immediately suggest a possible copying mechanism for the genetic material” (Não nos passou despercebido que o pareamento específico, que nós postulamos imediatamente sugere um possível mecanismo de cópia para o 17 BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO │ UNIDADE I material genético). Logo em seguida, o mecanismo de replicação semiconservativa do DNA foi descrito por Matthew Meselson e Franklin Stahl (1958), mostrando assim que a informação contida em uma molécula de DNA era passada para novas moléculas. Com todos esses eventos, surgiu a Engenharia Genética, que podemos dizer ser toda manipulação do DNA que resulte em uma molécula de DNA recombinante, por este motivo é também conhecida por tecnologia do DNA recombinante. Mas, o que é esse tal de DNA recombinante? O DNA recombinante é o termo utilizado para definir uma molécula de DNA que sofreu alguma modificação quando comparada com a molécula de origem, seja uma clivagem com endonucleases de restrição, inserção em um plasmídeo, substituição ou inserção de um ou mais nucleotídeos, entre outras. Desta forma, as técnicas que permitem gerar um DNA recombinante constituem a tecnologia do DNA recombinante ou a engenharia genética. Figura 1. Estrutura do DNA. (A) Representação das duas cadeias da molécula de DNA interligadas por ligações de hidrogênio entre as bases nitrogenadas complementares (A/T e C/G). S corresponde à pentose e P ao grupo fosfato. (B) Estrutura da molécula de DNA na forma de uma hélice, como descrita por Watson e Crick. Fonte: Figura modificada do site: <http://www.guianet.com.br/vegetarianismo/era10.html>, retirada em 17/9/2011. Várias descobertas favoreceram a manipulação do DNA, como por exemplo, a descoberta de enzimas tais como as endonucleases, a DNA polimerase, a T4 DNA ligase; o desenvolvimento de protocolos para extração de DNA de vários organismos, a manipulação de bactérias como vetores de propagação de DNA recombinante, a descoberta dos plasmídeos bacterianos (moléculas de DNA circular), a invenção das técnicas de PCR e de sequenciamento do DNA, entre outras. Hoje, a Engenharia Genética é essencial para os estudos na grande área da Biologia que em algum momento envolvam a molécula de DNA. Por mais simples que sejam as análises, alguma ferramenta da Engenharia Genética será aplicada para auxiliar nas investigações, seja na simples análise do padrão de restrição de uma molécula de DNA, seja nas mais complexas formas de clonagem molecular em plasmídeo. Esse último, sempre tem início com a busca do gene de interesse dentro do genoma de um determinado organismo, a identificação de sua sequência de nucleotídeos até a inserção no plasmídeo, gerando assim uma molécula de DNA recombinante. 18 UNIDADE I │ BIOLOGIA MOLECULAR: BREVE HISTÓRICO Enriqueça seus conhecimentos lendo o artigo “O modelo de DNA e a Biologia Molecular: inserção histórica para o Ensino de Biologia” de Mariana Soares de Andrade e Ana Maria de Andrade Caldeira, disponível em: <http://www.abfhib. org/FHB/FHB-04/FHB-v04-05-Mariana-Andrade-Ana-Maria-Caldeira.pdf> e o artigo “History of Molecular Biology”, disponível em: <http://www.biology-nation.com/ History_of_Molecular_Biology.html>. 19 UNIDADE IIA MANIPULAÇÃO DO DNA CAPÍTULO 1 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) A reação em cadeia da polimerase (PCR, Polymerase Chain Reaction), foi inicialmente desenvolvida por Saiki e colaboradores em 1985, e em seguida foi aprimorada por Kary Mullis, que tentou publicar seus experimentos nas duas revistas científicas mais importantes do mundo, a Science e a Nature, as quais não reconheceram a importância de tal conquista. Desta forma, Kary Mullis publicou seus dados sobre a amplificação do gene da β-globina humana em uma revista de fator de impacto imensamente menor, a Methods in Enzymology, e mais tarde, em 1993, sua criação foi reconhecida e ele foi agraciado com o premio Nobel em Química. Mullis é conhecido como o criador da técnica de PCR, pois ele a idealizou da forma que é realizada atualmente, introduzindo o uso de uma enzima termoestável e os conceitos de oligonucleotídeos (primers) e consequentemente de especificidade do produto amplificado. O fator de impacto de uma revista é uma medida que reflete o número médio de citações de artigos científicos publicados naquela revista. É empregado frequentemente para avaliar a importância de uma dada revista em sua área, sendo que aqueles com um maior fator de impacto são considerados mais importantes. Saiki, que descreveu a técnica precursora da PCR, a realizava de forma “rústica” e onerosa, adicionando a enzima DNA polimerase de Escherichia coli, que possui ótima atividade a 37oC, a cada ciclo da reação. Pois a mesma era inativada durante as etapas de elevação de temperatura para 94oC. Com Mullis duas mudanças fundamentais foram adicionadas a técnica, tornando a viável do ponto de vista científico e econômico: 1. O uso da enzima, recém-identificada, Taq, uma DNA polimerase termoestável isolada da bactéria de fontes termais, Thermus aquaticus, que se mantém estável em temperaturas próximas a 117oC e tem como ótima temperatura 72oC. 20 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA 2. E as pequenas sequências de DNA, conhecidas como oligonucleotídeos, que delimitam a região a ser amplificada do DNA alvo, tornando assim o produto amplificado específico. Logo em seguida, o interesse comercial pela técnica resultou no desenvolvimento dos termocicladores, máquinas que variam a temperatura e controlam o tempo, repetindo o ciclo por várias vezes, permitindo assim automatizar a técnica, eliminando as exaustivas etapas de transferência dos tubos com a reação por vários banhos-maria de temperaturas diferentes. A técnica de PCR veio para resolver um grande problema nas análises de DNA, a baixa quantidade de DNA nas células, pois ela visa amplificar uma região específica do DNA a partir de uma única molécula, de tal forma que após inúmeros ciclos de amplificação tenhamos quantidade de DNA suficiente para ser detectado e manuseado para diversos fins (tabela 1). A PCR é um processo de replicação do DNA in vitro, com uma diferença básica em relação a este processo na célula, apenas uma região desejada do DNA é amplificada, diferente do que acontece na célula que a replicação é de todo o DNA celular. Tabela 1. Componentes necessários para a PCR. Componentes Função DNA Alvo a ser amplificado. Temperatura: 94oC. Temperatura para separação das fitas do DNA alvo. Um par de oligonucleotídeos. Delimitar a região a ser amplificada. Temperatura: 58 a 66ºC Temperatura para o pareamento dos oligonucleotídeos no DNA alvo. Nucleotídeos* (C, G, A e T), Taq etemperatura: 72oC. Polimerização da nova fita de DNA. *Na PCR utilizamos a nomenclatura dNTPs para a mistura dos quatros nucleotídeos. Os oligonucleotídeos são pequenos fragmentos de DNA de aproximadamente 17 a 35 pares de bases que são complementares as regiões que delimitam a sequência de DNA de interesse. Cada nucleotídeo pareia com uma das fitas do DNA. Estes podem conter além da sequência complementar ao DNA alvo, pequenas sequências de DNA que caracterizam sítios de reconhecimento para enzimas (como endonucleases). Estas sequências serão incorporadas nas novas moléculas de DNA amplificadas (figura 2). Figura 2. Exemplos de oligonucleotídeos. (A), Sequência de DNA alvo. (B) e (C) Oligonucleotídeos (em negrito) pareados na sequência alvo. (C) Oligonucleotídeos contendo sequência adicional (letras minúsculas). vanessa.pereira Nota Marked definida por vanessa.pereira 21 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II A PCR ocorre em três etapas de forma automatizada em um equipamento chamado de termociclador: 1. Desnaturação: corresponde à separação da dupla fita de DNA por elevação da temperatura para 94oC durante 1 a 5 minutos. 2. Anelamento: com as fitas de DNA separadas a temperatura é reduzida para valores entre 58 e 66oC, favorecendo o pareamento dos dois oligonucleotídeos nas fitas complementares do DNA, desta forma delimitando a região do DNA a ser amplificada. 3. Extensão: a 72oC a enzima Taq posiciona-se próximo aos oligonucleotídeos e recruta os nucleotídeos para a síntese da nova fita de DNA. Finalizado o ciclo da reação composto por estas três etapas, o ciclo é repetido por aproximadamente 35 vezes até que se obtenha o DNA amplificado em quantidades suficientes para as futuras análises (figura 3). A quantidade de DNA amplificado segue uma função exponencial: N= N0 x 2 n, onde N = quantidade final de DNA amplificado N0 = quantidade inicial de DNA molde n = números de ciclos da reação Desta forma, para uma molécula de DNA alvo teremos, no final de 35 ciclos, 235 moléculas. Figura 3. Reação em cadeia da polimerase (PCR). A reação inicia com uma molécula de DNA que no final de dois ciclos originam 4 moléculas de DNA idênticas a molécula molde. Fonte: Figura modificada do site <http://acccn.net/Bio/book/BearFlag45/Biology1A/LectureNotes/lec24.html>. 22 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Uma variável da técnica de PCR é a RT-PCR, que é composta por duas partes: a primeira corresponde à reação da transcrição reversa, e a segunda a PCR. A diferença básica entre a PCR e a RT-PCR é que na última sintetiza-se moléculas de DNA a partir de moléculas de RNA mensageiro (mRNA) como molde, diferente do PCR que o molde é DNA. Desta forma, podemos obter apenas a região codificadora de um gene eucarioto. Ou seja, a sequência que tem a informação final para a codificação de uma proteína. Recordando: 1. O gene eucarioto é formado por sequências de DNA codificantes chamadas de éxons e por sequências não codificantes chamadas de íntrons. No processo de transcrição do gene, teremos um mRNA chamado de transcrito primário. Este transcrito passará por algumas etapas de processamento, sendo uma delas a retirada dos íntrons originando o mRNA maduro, o qual será responsável pela codificação de uma proteína no processo de tradução (figura 4). A partir do mRNA maduro que ocorre a síntese da molécula de DNA na RT-PCR. 2. A descoberta da enzima transcriptase reversa resultou na reavaliação do “dogma central”, o qual postulava que o fluxo da informação genética era unidirecional: [DNA → RNA → Proteína]. Após tal descoberta, observou-se que [DNA ↔ RNA→ Proteína]. Figura 4. Transcrição do gene eucarioto e o processamento do mRNA. Fonte: Modificado a partir de: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/acidos-nucleicos/acidos-nucleicos-8.php>. Na primeira etapa da RT-PCR, moléculas de mRNA são moldes para a síntese de uma fita de DNA complementar a sua sequência, chamada de cDNA. Nesta etapa, utiliza-se apenas um oligonucleotídeo que geralmente não é tão específico quanto no PCR, pois este é formado por uma sequência de Timinas (oligo-dT) que irá anelar na cauda poli-A presente nos mRNAs. A polimerização da cadeia de cDNA é realizada pela adição dos nucleotídeos (dNTPs) complementares a fita de mRNA pela enzima transcriptase reversa. Após a síntese do cDNA, o mRNA molde é degradado pela ação da enzima RNAse-H e o DNA fita simples fica disponível para iniciar a PCR (figura 5). 23 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II Figura 5. Primeira etapa da RT-PCR. Síntese da fita de cDNA a partir de mRNA como molde pela ação da enzima transcriptase reversa. Após esta etapa o cDNA está disponível para iniciar a PCR. A segunda etapa da reação é uma PCR, onde dois oligonucleotídeos específicos para o gene determinarão a região a ser amplificada. No primeiro ciclo da reação, temos apenas DNA fita simples, logo, apenas um dos nucleotídeos terá sua fita complementar para parear. No final deste ciclo teremos como produto DNA fita dupla. Nos próximos ciclos a reação ocorre seguindo uma progressão exponencial, como já descrita anteriormente. Fonte: Modificado a partir de: <http://users.med.up.pt/med05009/bcm/bibliocdna_frame.htm>. Mas qual o porquê de se obter DNA a partir de RNA? Como já mencionado acima, esta é a forma que temos de obter apenas a sequência codificadora de um gene eucarioto. Mas você poderia perguntar: e daí? Em primeiro lugar, este é um dos motivos mais importante para o uso desta técnica, pois grande parte dos estudos em biologia molecular é realizado em bactérias, expressando-se proteínas de eucariotos neste organismo e subsequentemente purificando-as. Bactérias, diferente de eucariotos, não possuem íntrons em seu DNA, e desta forma, não possuem a maquinaria necessária para, após a transcrição, retirar os íntrons do mRNA. Por isso a RT-PCR veio para resolver este problema, pois agora conseguimos obter apenas a sequência codificante dos genes eucariotos para então expressá- los em bactérias. Mas você ainda poderia questionar: não se pode expressar genes em organismos eucariotos? Sim, mas muitos genes eucariotos são muito grandes para serem manipulados de forma a gerarem DNA recombinante para este fim. Em segundo lugar, os cDNAs nos permitem avaliar o padrão de expressão dos genes, de um organismo ou de partes deste organismo, em diferentes condições ambientais ou de estresse, por exemplo. A técnica de PCR continua tendo como uso principal o processo de amplificação de sequências específicas de DNA, mas atualmente várias novas aplicações são dadas a esta técnica, tais como: sequenciamento de DNA, análise de polimorfismo, diagnóstico de doenças genéticas e infecciosas, é aplicada nos testes de paternidade e na Medicina Forense, como também na criação de organismos transgênicos. 24 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Se a PCR é um processo de replicação do DNA in vitro, então: » Na célula, quem é responsável pela função da elevação da temperatura para 94oC? » Quem é o análogo dos oligonucleotídeos na célula e qual a diferença básica entre eles? » Compare as etapas da PCR e a replicação do DNA na célula, e você entenderá o quanto foi merecido o prêmio Nobel que Mullis recebeu. Animações para o melhor entendimento da PCR: <http://www.youtube.com/watch?v=HMC7c2T8fVk&feature=related> <http://www.dnalc.org/resources/animations/pcr.html> <http://www.youtube.com/watch?v=_YgXcJ4n-kQ> <http://www.youtube.com/watch?v=rd1-QpJNTF8&feature=related> 25 CAPÍTULO 2 Sequenciamento de DNA A primeira pergunta que deve ser respondida neste capitulo é: o que é o sequenciamento de DNA? É uma técnica que tem por finalidade determinar com fidelidade a sequência dos nucleotídeos que compõem um determinado DNA, independente de sua origem e, desta forma, dando as moléculas de DNA uma marca digital, ou seja, um registro que pertence só a ela. Trabalhando independentemente, Frederick Sanger e Walter Gilbert desenvolveram as primeirastécnicas de sequenciamento do DNA. O primeiro método de sequenciamento de DNA foi desenvolvido em meados da década de 1970 e é conhecido como sequenciamento químico ou Maxan-Gilbert. O segundo, e mais utilizado, é o sequenciamento enzimático também conhecido como método de Sanger, método dideoxi ou método de terminalização. Sanger utilizou sua técnica para sequenciar o genoma do bacteriófago φX174 (5.375 nucleotídeos), podendo ser considerada a primeira descrição do genoma completo de um organismo. Já Gilbert sequenciou um operon de um genoma bacteriano. Juntos Gilbert e Sanger compartilharam com Paul Berg o prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina, em 1980. A metodologia do sequenciamento de DNA, nos dias atuais, tem como fundamentos o método de Sanger, com várias modificações que permitiram automatizar a técnica. Para explanarmos o sequenciamento automático do DNA baseado no método de Sanger, é necessário relembrarmos alguns conceitos importantes referentes ao DNA. Na síntese do DNA, temos como precursores os desoxinucleotídeos ou nucleotídeos (dNTP) que possuem a seguinte estrutura (figura 6). Figura 6. Esquema ilustrativo da estrutura de um desoxinucleotídeo ou nucleotídeo (dNTP). P corresponde ao grupo fosfato; BN, base nitrogenada que pode ser adenina ou timina ou guanina ou citosina. E no centro a pentose na qual os carbonos estão numerados de 1’ a 5’. Estes nucleotídeos polimerizam por meio de ligação fosfodiéster entre a hidroxila na posição 3’ de um nucleotídeo e o grupo fosfato na posição 5’ do nucleotídeo a ser adicionado. A nova fita de DNA é estendida a partir da hidroxila 3’ (figura 7). 26 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Figura 7. Esquema ilustrativo da polimerização da cadeia de DNA. A seta indica ligação fosfodiéster entre a OH 3’ e o grupo fosfato 5’. No método de sequenciamento automático de DNA, utiliza-se desoxinucleotídeos (dNTP) e os análogos, chamados de didesoxinucleotídeos (ddNTP), que se diferenciam dos dNTPs pela ausência da hidroxila na posição 3’ (figura 8). O que acarreta essa alteração veremos a seguir. Figura 8. Esquema ilustrativo da estrutura de um didesoxinucleotídeo (ddNTP). P corresponde ao grupo fosfato; BN, base nitrogenada que pode ser adenina, timina, guanina ou citosina. E no centro, a pentose na qual os carbonos estão numerados de 1’ a 5’. A seta indica a ausência da hidroxila no carbono 3’. Neste método de sequenciamento de DNA realiza-se uma reação de PCR onde são adicionados os componentes básicos da PCR (enzima, DNA molde, os quatros dNTPs e apenas um oligonucleotídeo). Além dos dNTPs são adicionados em quantidades menores (1%) os quatros ddNTPs. Estes ddNTPs encontram-se marcados com sondas fluorescentes distintas, que permitem distingui-los um dos 27 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II outros quando excitados com laser. Durante a reação de PCR, de forma aleatória, um ddNTP é inserido na cadeia no lugar do respectivo dNTP e a polimerização da cadeia é finalizada, parando assim a reação (figura 9). Figura 9. Esquema ilustrativo da interrupção da polimerização da cadeia nucleotídica devido a adição de um ddNTP. A seta indica a ausência da hidroxila na posição 3’, sendo assim impedindo a formação de uma ligação fosfodiéster com o próximo dNTP. Logo, é fácil imaginar que se temos quantidades iguais dos ddNTPs competindo com os dNTPs para serem inseridos durante a polimerização da cadeia, o resultado da amplificação após os ciclos da reação, será uma mistura de fragmentos de DNA de diferentes tamanhos e que foram finalizados pela adição de um ddNTP. Ou seja, os fragmentos diferenciam-se por um nucleotídeo até atingir o tamanho total do fragmento de DNA molde (figura 10). Concluída a PCR, a próxima etapa é a separação dos fragmentos de DNA amplificados por tamanho em eletroforese em gel de poliacrilamida em placa (sequenciadores mais antigos) ou em microcapilares (sequenciadores modernos). À medida que os fragmentos de DNA migram pelo gel eles são separados por ordem de tamanho crescente. A sonda fluorescente presente no ddNTP, que finaliza o fragmento, é excitada por um feixe de laser e então emite uma fluorescência específica que o caracteriza. Esta fluorescência será capturada por um sistema de detecção que converte esse sinal em um gráfico chamado de eletroferograma (figura 11). Um eletroferograma é composto por uma sequência de picos de quatro cores diferentes e cada cor corresponde a um dos quatros ddNTPs que foram adicionados durante a polimerização da molécula de DNA. 28 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Figura 10. Fragmentos de DNA produzidos após a adição de ddNTPs na PCR. As letras minúsculas e em negrito correspondem ao oligonucleotídeo utilizado na PCR. As letras maiores e em negrito no final de cada fragmento correspondem ao ddNTP introduzido, interrompendo assim a polimerização. O maior progresso na técnica de sequenciamento automático é a utilização do laser e o uso de programas de computadores específicos para converter o sinal da fluorescência para uma linguagem por nós compreendida. O desenvolvimento do sequenciamento automatizado do DNA foi essencial para o surgimento da era dos genomas, na qual vários projetos de sequenciamento de genomas de organismos diferentes foram desenvolvidos, entre eles o humano. Antes de o sequenciamento ser automatizado, o sequenciamento de DNA manual era utilizado apenas em pequena escala e era inimaginável decifrar um genoma tão complexo quanto o humano. Novos aperfeiçoamentos foram adicionados à técnica de sequenciamento automático, como o Shotgun e o pirosequenciamento, tornando-a mais eficaz e rápida. O sequenciamento do DNA e os projetos genomas foram os responsáveis pelo crescimento de uma nova área da ciência biológica, a Bioinformática. A partir de então, surgiram os bancos de dados de sequências, várias ferramentas para análises de sequências foram desenvolvidas e toda está tecnologia encontra-se disponível para qualquer pessoa em sites na web. 29 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II Figura 11. Etapas do sequenciamento automático do DNA, baseado no método de Sanger. Fonte: Figura modificada do site: <http://www.papociencia.ufsc.br/bio5.htm>. Pesquise as diferenças entre o método de Sanger e o método automático de sequenciamento de DNA. Animação sobre o sequenciamento de DNA: <http://www.dnalc.org/resources/animations/cycseq.html> <http://www.youtube.com/watch?v=ezAefHhvecM&feature=related> 30 CAPÍTULO 3 Enzimas de restrição e ligase: “montando o DNA” Enzimas de restrição Um processo de defesa das bactérias contra infecções virais é chamado de restrição/modificação. Neste processo, os vírus bacterianos (bacteriófagos), ao invadirem a bactéria, têm seu DNA reconhecido por nucleases (enzimas) bacterianas e estas clivam o DNA viral de maneira específica, interrompendo o ciclo de replicação viral, que causaria a lise ou destruição da bactéria. Mas, por que o DNA da bactéria não é picotado? Simples, para cada enzima de restrição as bactérias produzem uma enzima modificadora, que protege seu DNA da ação das nucleases, marcando-o para diferenciá- lo do DNA do vírus, geralmente por metilação. A enzima modificadora adiciona um grupo metil em uma ou duas bases, geralmente dentro do sítio de reconhecimento da enzima de restrição. Desta forma a molécula de DNA “camuflada” não é reconhecida pelas nucleases (figura 12). Este processo ocorre em diferentes espécies e linhagens de bactérias. Figura 12. Nucleases clivando DNA viral em um processo de proteção da célula bacteriana contra a infecção viral. Fonte: Figura modificada do site: <http://www.biochem.arizona.edu/classes/bioc471/ pages/Lecture2/Lecture2.html>. Estas nucleases são conhecidas como enzimas de restrição ou endonucleases (endo= dentro, nuclease=quebra) de restrição, são proteínas que reconhecem uma sequência específica dentro da dupla hélice do DNA e clivam em um ponto específico. As enzimas de restrição são classificadas em trêstipos, I, II e III: » Tipo I - reconhecem uma sequência específica assimétrica e bipartida e clivam o DNA a mais de 1000 pares de bases depois. » Tipo II - São as mais importantes para a Engenharia Genética e possuem algumas características interessantes: 31 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II 1. não precisam de ATP para realizar sua função; 2. reconhecem uma sequência simétrica (palíndroma) específica de 4, 6 ou 8 nucleotídeos. Sequencias palíndromas são lidas simetricamente, ou seja, em ambas as direções se ler a mesma coisa, como exemplo: OVO, ANA, ARARA, RADAR, e REVIVER; 3. clivam dentro do sítio de reconhecimento; 4. clivam a ligação fosfodiéster; » Tipo III – reconhecem uma sequência assimétrica de 5 a 7 nucleotídeos e clivam aproximadamente 24 a 26 pares de bases depois. Após reconhecer as sequências específicas, as enzimas do tipo II fazem dois cortes na molécula de DNA, um em cada fita. Existem dois tipos de cortes (figura 13): 1. Os dois cortes são feitos no eixo de simetria da sequência específica, gerando extremidades chamadas de abruptas. 2. Os dois cortes são feitos assimetricamente, mas no mesmo local, nas duas fitas do DNA, resultando em extremidades coesivas. Figura 13. Tipos de extremidades produzidas no DNA pela ação de endonucleases do tipo II. (A) Extremidades coesivas geradas pela ação da endonuclease EcoRI. (B) Extremidades abruptas produzidas após clivagem com a endonuclease EcoRV. Em negrito a sequência de reconhecimento das endonucleases. Atualmente, já foram isoladas mais de 1000 enzimas de restrição de diferentes bactérias (tabela 2). Padronizou-se uma nomenclatura para as enzimas baseada na abreviação do nome do microrganismo do qual a enzima foi identificada e isolada: » Primeira letra maiúscula = gênero; » Segunda e terceira letras = espécie; » Letra adicional = cepa da bactéria. 32 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Número em algarismo romano = número da enzima descoberta ou a linhagem da qual ela foi isolada: Por exemplo: HindIII é isolada da Haemophilus influenzae, linhagem d III » EcoRI é isolada de Escherichia coli, linhagem RY13 e foi a primeira enzima de restrição identificada nesta espécie. » EcoRV é isolada de Escherichia coli, linhagem RY13 e foi a quinta enzima de restrição identificada nesta espécie. Tabela 2. Enzimas de restrição comumente utilizadas na engenharia genética. Visto que o DNA é formado por 4 nucleotídeos (A, T, G e C) e assumindo que estes nucleotídeos são distribuídos ao acaso dentro da sequência, a frequência de reconhecimento de uma enzima de restrição é 4n, onde n é igual ao número de nucleotídeos que a enzima reconhece, desta forma, enzimas que reconhecem: » 4 nucleotídeos cortam o DNA uma vez a cada 44= 256 nucleotídeos; » 6 nucleotídeos cortam o DNA uma vez a cada 46= 4096 nucleotídeos; » 8 nucleotídeos cortam o DNA uma vez a cada 48= 65536 nucleotídeos. Porém, estes valores podem sofrer variações significativas, dependendo principalmente da composição de bases do DNA analisado. Uma importante consequência da ação destas enzimas é que quando uma determinada molécula de DNA é clivada com uma endonuclease, ela vai clivar sempre nos mesmos pontos, gerando assim sempre o mesmo conjunto de fragmentos de DNA, ou seja, terá um padrão de restrição específico, permitindo, desta forma, o isolamento de fragmentos de DNA de interesse. Os sítios das enzimas de restrição são distribuídos de forma randômica dentro da molécula, implicando na geração de fragmentos de DNA de vários tamanhos após a sua ação. 33 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II Outra consequência que é de fundamental importância é o fato que após a clivagem do DNA, este passa a ter extremidades de fita simples (coesivas) que permitem a ligação de outra molécula de DNA que possua extremidade de fita simples e complementar. Ou seja, se tivermos dois fragmentos de DNA produzidos pela ação da mesma enzima de restrição, estes fragmentos podem ser unidos gerando uma molécula de DNA recombinante. Estas duas características, junto com a facilidade de se obter estas enzimas, fazem com que as enzimas de restrição sejam um dos pilares do desenvolvimento da Engenharia Genética. Esta é uma das ferramentas que permitiu manipular o DNA com extrema precisão. Além da construção de moléculas de DNA recombinantes, estas enzimas são utilizadas nos testes de paternidade, na Medicina Forense, na construção de bibliotecas genômicas como as usadas nos projetos genomas. Poderíamos estudar alterações na sequência do DNA por análise do seu padrão de restrição? Conhecendo melhor as enzimas de restrição: <http://www.dnalc.org/resources/animations/restriction.html> Ligases E agora que já mencionamos anteriormente que podemos ligar dois fragmentos de DNA gerando um DNA recombinante, estudaremos como isso acontece no laboratório. Vamos primeiro lembrar qual a molécula na célula é responsável pela ligação de fragmentos de DNA durante o processo de replicação. No processo de replicação do DNA, uma das fitas é sintetizada de forma contínua e a outra descontínua. Nesta última, são sintetizados fragmentos de DNA, chamados de fragmentos de Okazaki, que serão ligados pela ação da enzima DNA ligase. Da mesma forma que ocorre na célula, nós realizamos a ligação de moléculas de DNA no laboratório (in vitro), utilizando a enzima DNA ligase, só que neste caso, a enzima é codificada pelo bacteriófago T4 e é conhecida como T4 DNA ligase. Esta enzima catalisa a ligação fosfodiéster entre a hidroxila 3’ de um nucleotídeo e o grupo fosfato 5’ do próximo nucleotídeo. Ela pode ligar fragmentos de DNA com extremidades coesivas ou abruptas, porém extremidades abruptas são ligadas com baixa eficiência. Os requisitos necessários para a ação da T4 DNA ligase são (figura 14): » uma hidroxila livre na extremidade 3’ de um dos fragmentos do DNA; » um grupo fosfato livre na extremidade 5’ do outro fragmento de DNA; 34 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA » temperatura baixa (de 16 a 22 °C) para favorecer o encontro das moléculas de DNA e o pareamento das bases nitrogenadas complementares. Figura 14. Reação de ligação promovida pela T4 DNA ligase. Em negrito, os nucleotídeos que foram unidos por ligação fosfodiéster promovida pela ligase. Estamos agora montando um quebra cabeça, pois moléculas de DNA com extremidades coesivas só podem ser unidas se as extremidades forem complementares. Porém, moléculas com extremidades abruptas não são tão seletivas para se unirem, basta a hidroxila 3’ e o grupo fosfato 5’ e tudo pode acontecer. Pensando em construir uma molécula de DNA recombinante, qual é a melhor opção, extremidades coesivas ou abruptas? E por quê? Pensem nesta questão como se estivessem montando um LEGO®. Enzimas de restrição e DNA ligase trabalhando juntas: <http://www.youtube.com/watch?v=aA5fyWJh5S0&feature=related> 35 CAPÍTULO 4 Extração, purificação de DNA e eletroforese Até o momento, já aprendemos que podemos: » amplificar um fragmento de DNA por meio da técnica de PCR; » clivar o DNA em regiões específicas; e » unir fragmentos de DNA. Mas nos falta saber como obter a amostra de DNA para iniciarmos qualquer estudo. Sendo esta molécula alvo de análises em exames de paternidade, em projetos genomas, em Medicina Forense, em estudos evolutivos, na Engenharia Genética. E, lembrando que há diferentes fontes de DNA, desde pequenos microrganismos, até os diversos tecidos e secreções de organismos superiores, além de fósseis, seria difícil a existência de apenas um protocolo para a extração do DNA. Independente da fonte, alguns princípios são válidos para todos os procedimentos de purificação, mas não podemos deixar de mencionar que algumas particularidades são adicionadas ao procedimento dependendo da fonte do DNA. Abaixo estão descritas as etapas básicas da extração de DNA (figura 15): 1. Primeiro, o DNA tem que ser liberado de dentro da célula para ser purificado, desta forma, aprimeira etapa é a lise das membranas plasmáticas e nucleares. Para este fim, utilizam-se agentes, como detergentes, que rompam interações hidrofóbicas e destruam a bicamada lipídica. Para organismos que possuem parede celular, é necessário o uso de enzimas associadas a processos mecânicos para destruí-la. 2. Degradação das proteínas, inclusive nucleases que possam degradar o DNA. Geralmente utiliza-se proteinases (enzimas que degradam proteínas), ou até mesmo alteração do pH deixando-o muito alcalino para assim inativar as enzimas. 3. Isolamento do DNA, esta etapa pode ser realizada de diversas formas, desde a mais antiga e eficiente, que consiste na precipitação do DNA na presença de sal e álcool (etanol ou isopropanol), até com o uso dos diversos kits de purificação que se encontram no mercado. Estes kits têm como principio o uso de uma resina, que por afinidade, o DNA se liga a ela e depois é liberado pela passagem de uma solução (por exemplo, água) a qual o DNA é mais afim. Figura 15. Etapas da purificação de DNA. (1) Rompimento das células com liberação do material celular. (2) Precipitação de proteínas e outros componentes celulares. (3 e 4) Precipitação do DNA após adição de sal e álcool. 36 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Estas etapas também são realizadas nos procedimentos de purificação de RNA, mas com alguns cuidados adicionais, pois a molécula de RNA é muito instável e de fácil degradação. DNA, sal e álcool = precipitação do DNA. Por quê? Eletroforese Já extraímos e manipulamos o DNA. Agora chegou a hora de apresentarmos a vocês a técnica que nos permite monitorar tanto a qualidade do DNA extraído, como confirmamos que a amplificação do DNA foi eficiente, ou então, que a ação das enzimas de restrição resultou no padrão de restrição esperado. A eletroforese do DNA em gel é a técnica mais utilizada dentro de um laboratório de biologia molecular, pois com ela todas as etapas do processo de clonagem molecular são monitoradas. A técnica tem como base o fato das moléculas de DNA serem carregadas negativamente devido aos grupos fosfatos presentes ao longo da cadeia. Recordando: um corpo com carga (negativa ou positiva) quando submetido a uma diferença de potencial, por exemplo, os polos de uma bateria conectados à solução contendo este corpo, ele irá migrar no sentido do polo com carga contrária a sua. Desta forma, um corpo com carga negativa migrará para o polo positivo e um corpo com carga positiva, para o polo negativo. Então, quando submetemos moléculas de DNA a uma diferença de potencial elétrico, elas irão migrar para o polo positivo do campo elétrico. A essa migração de moléculas quando submetidas a uma diferença de potencial chamamos de eletroforese. Vários são os problemas que não tornam viável a realização de eletroforese em solução, como a migração das moléculas dispersamente durante o processo, perturbações mecânicas e movimentos do líquido durante o processo. Atualmente, para contornar estes problemas, as eletroforeses são realizadas em sistemas que utilizam um suporte que, geralmente, é formado por uma matriz rígida de papel ou gel que permite a migração da molécula. Na eletroforese do DNA utiliza-se como suporte um gel de agarose e, em algumas análises mais específicas, gel de poliacrilamida. A escolha da matriz de agarose ou de poliacrilamida depende do tamanho dos fragmentos de DNA a serem analisados. Géis de agarose formam poros maiores que o de poliacrilamida. Desta forma, ele é ideal para fragmentos que variam de 200 pares de bases (pb) a 50.000 pb (50 Kpb). Já o gel de poliacrilamida tem ótima resolução para fragmentos de até 1.000 pb. A desvantagem em utilizar a acrilamida como rotina para eletroforese de DNA é o seu caráter neurotóxico quando em solução, e por ser mais laborioso o preparo do gel. 37 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II A agarose é um polissacarídeo que forma uma malha cuja porosidade é dependente da sua concentração. O tamanho dos poros desta matriz é inversamente proporcional à concentração de agarose e diretamente proporcional ao tamanho dos fragmentos de DNA que se deseja separar (tabela 3). Tabela 3. Concentração de agarose em eletroforese de DNA Concentração de agarose (% P/V) Tamanhos de fragmentos separados com boa resolução (pares de bases) 1 500 – 10.000 1,2 400 – 6.000 1,5 200 – 3.000 2,0 100 - 200 Fonte: Tabela adaptada de Sambrook, 2001. Após o preparo do gel, as amostras de DNA são aplicadas em pequenos poços presentes em uma das extremidades do gel, onde será aplicada a carga negativa. Na extremidade oposta temos o polo positivo. Assim, o DNA irá migrar na direção do polo positivo. A malha de agarose funciona como uma barreira para as moléculas de DNA, de forma que as moléculas menores migram mais rapidamente pelo gel e as maiores são parcialmente retidas e migram mais lentamente. Logo neste procedimento o DNA é separado por seu tamanho em pares de bases. Alguns fatores influenciam na mobilidade das moléculas de DNA durante a eletroforese: » Intensidade da voltagem aplicada: quanto maior for a intensidade, maior será a velocidade com que as cargas se dirigem para o polo com carga oposta a sua. » Quanto maior for a carga total da molécula, maior será a atração eletrostática da molécula pelo polo de carga oposta, dessa forma mais rápida será sua migração. » Por outro lado, quanto maior for a molécula, mais lenta será sua migração devido a barreira que será imposta pela malha do gel. Para finalizar, é necessário visualizar o DNA. Para este fim o gel é corado com uma solução de brometo de etídio que se intercala entre as bases nitrogenadas do DNA. Em seguida, o gel é exposto à luz ultravioleta e o brometo de etídio emite fluorescência. Neste procedimento, utiliza-se uma amostra de DNA composta por fragmentos de tamanho conhecido como padrão para comparação com as amostras em análises (figura 16). 38 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Figura 16. Eletroforese de DNA em gel de agarose. (A) Estrutura do polímero de agarose e da molécula de brometo de etídio intercalada na no DNA. Cargas negativas do DNA e malha do gel de agarose. (B) Foto de um gel de eletroforese de DNA após excitação do brometo de etídio com luz ultravioleta. Fonte: Figura modificada do site: <http://2008.igem.org/Team:Heidelberg/Human_Practice/ Phips_the_Phage/Technical_ Backround>. Vídeo que expõe todo o procedimento de eletroforese no laboratório. <http://www.youtube.com/watch?v=6mQGNDnOyH8&feature=related> 39 CAPÍTULO 5 Transformação bacteriana O processo de transformação consiste em inserir um DNA recombinante ou não na célula de bactéria. Este processo normalmente confere novas características às bactérias, como por exemplo, a resistência a antibiótico. Griffith em 1928 foi o primeiro a observar este processo em bactérias. Os principais procedimentos de transformação bacteriana são: choque térmico e eletroporação. Transformação de bactéria por choque térmico O método mais antigo e ainda mais utilizado para “persuadir” a bactéria a recolher o DNA exógeno é o método da transformação por choque térmico descrito por Mandel e Higa em 1970. Desde então, o método já sofreu algumas modificações visando maior eficiência, mas os fundamentos permaneceram. Estes pesquisadores observaram que células de Escherichia coli, quando tratadas com solução de cloreto de cálcio e, em seguida, submetidas a um curto choque térmico, a eficiência da transformação era maior. Nesse processo, as células precisam ser tratadas para se tornarem cálcio-competentes. As células na fase de crescimento exponencial (log) passam por etapas de lavagens para eliminar as impurezas e em seguida passam por pelo menos uma etapa de incubação em solução de cloreto de cálcio (CaCl2) e no final do processo são mantidas nesta solução a baixa temperatura. A mistura de células e DNA que se encontra incubada em gelo é então submetida a um rápido choque térmico, aproximadamente 1 minuto a 42oCpara promover a entrada do DNA na célula. Finalmente as células são colocadas em meio de cultura para se recuperarem do choque e em seguida são distribuídas em meio de cultura contendo o agente seletivo (antibiótico) para a seleção das células que foram eficientes em receber o DNA exógeno. O mecanismo pelo qual o DNA é captado pela célula ainda não é bem conhecido, mas uma das hipóteses que tenta explicá-lo sugere que: 1. as moléculas do DNA passem através de canais situados nas zonas de adesão, que são locais onde as membranas interna e externa da célula bacteriana unem-se formando poros. A necessidade das células na fase exponencial é justamente porque estes poros só estão presentes nesta fase de crescimento; 2. a entrada do DNA nas células é dificultada pela repulsão eletrostática entre as cargas negativas dos grupos fosfatos do DNA e as cargas negativas dos fosfolipídeos que compõem a membrana bacteriana. Os íons de cálcio (Ca2+) estariam interagindo com as cargas negativas criando um ambiente eletrostaticamente neutro; 3. a baixa temperatura (0oC, banho de gelo) congela os lipídeos resultando na perda da fluidez da membrana celular. Quando as células são submetidas ao choque térmico geram um desbalanço térmico entre o interior e o exterior da célula provocando a dilatação dos poros da zona de adesão e o DNA passa através deles. 40 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Transformação de bactéria por eletroporação A eletroporação tem como fundamentos a aplicação de pulsos elétricos que aumentam a capacidade de transporte através da membrana pela formação de poros transitórios na bicamada lipídica permitindo a migração de macromoléculas através destes poros. Está técnica é rápida e amplamente utilizada para introduzir moléculas de DNA recombinantes tanto em bactéria quanto em leveduras. As células devem inicialmente ser tratadas para se tornarem eletrocompetentes, ou seja, tem que se tornarem capazes e eficientes na formação dos poros após a submissão a pulsos elétricos de forma a permitir a entrada do DNA. Este procedimento é muito simples e consiste em obter as células na fase de crescimento exponencial e em seguida submetê-las a várias etapas de lavagem para eliminação principalmente de íons e impurezas provindas do cultivo. Para transformar as células por eletroporação basta aplicar o choque elétrico a uma mistura contendo as células e o DNA, as membranas serão então desestabilizadas e o DNA penetra na célula (figura 17). Em seguida, as células são transferidas para o meio de cultura sob as melhores condições de temperatura, para que as mesmas possam se recuperar do choque e, finalmente, serem selecionadas. O choque elétrico é dado em um equipamento chamado de eletroporador. Após toda a explicação acima vocês poderiam questionar: qual a importância da transformação bacteriana para a biologia molecular? Esta técnica esta entre as mais usadas na biologia molecular, pois as bactérias funcionam como “máquina” para a multiplicação de moléculas de um DNA recombinante e em outra situação como “máquina” para a síntese de proteínas exógenas. Em ambas as situações são necessárias inserir moléculas de DNA na bactéria. Figura 17. Princípios da transformação de bactéria por eletroporação. Após um choque elétrico poros são formados na membrana plasmática favorecendo a entrada das moléculas de DNA. Fonte: Figura modificada do site: <http://www.byreginatorres.com/2011/08/eletroporacao.html>. 41 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II Animação sobre a transformação bacteriana: <http://www.dnalc.org/resources/animations/transformation2.html> 42 CAPÍTULO 6 Vetor de clonagem molecular – plasmídeos O objetivo inicial da tecnologia do DNA recombinante é gerar um grande número de uma molécula de DNA recombinante. Mas para isso não é suficiente apenas ligar duas moléculas, ou alterar a sequência de uma molécula de DNA. Para que se possa alcançar este objetivo, é necessário propagar este DNA em células hospedeiras. Mas como fazer isso? Inicialmente, precisamos inserir o DNA de interesse em um vetor de clonagem, que nada mais é do que moléculas de DNA que funcionam como um veículo que transporta um fragmento de DNA de interesse para o interior de uma célula hospedeira, que geralmente é uma bactéria, embora outras células possam ser utilizadas, como leveduras. Estas moléculas de DNA possuem duas características principais para sua função como vetores de clonagem: » multiplicam-se dentro da célula hospedeira, gerando várias cópias idênticas; e » propagam durante a divisão das células hospedeiras para as novas gerações. Abaixo citaremos as características do principal vetor de clonagem utilizado na atualidade: » Os plasmídeos são moléculas de DNA circular que se encontram separadas do DNA cromossômico da célula. Este DNA circular geralmente ocorre naturalmente em células bacterianas e leveduras. Ele geralmente representa uma pequena fração do DNA total da célula hospedeira, mas que pode ser facilmente separado devido seu pequeno tamanho. Como o DNA cromossomal, o plasmídeo também é replicado durante a divisão celular, mas de forma independente do cromossomo, garantindo a propagação do mesmo através das gerações da célula. » Os plasmídeos mais comumente utilizados na Biologia Molecular são oriundos de bactérias e foram modificados para atuarem mais efetivamente como veículo de propagação. Por exemplo, o tamanho foi reduzido quando comparado ao plasmídeo selvagem para facilitar sua manipulação. Desta forma, eles carregam, quase sempre, pouco DNA a mais que o necessário para sua função. Estes plasmídeos possuem: 1. uma origem de replicação (ORI), que lhes confere a capacidade de se replicarem dentro da célula hospedeira; 2. um ou mais genes que conferem resistência a antibióticos. As células hospedeiras passam a ter resistência ao antibiótico (por exemplo, ampicilina, cloranfenicol, canamicina) quando carregam estes plasmídeos. Estes genes são conhecidos como marca de seleção, pois são essenciais para a seleção das células que contém o plasmídeo; 43 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II 3. outra forma de seleção, o sistema azul e branco da β-galactosidase. Quando um fragmento de DNA é inserido no plasmídeo, ele quebra o gene lacZ da β-galactosidase não permitindo que a bactéria expresse esta enzima. Se o processo de clonagem não for eficiente, o gene da β-galactosidase não será interrompido. Logo, a bactéria produzirá esta enzima que, quando entrar em contato com seu substrato que é incolor, ela o degradará e gerará um produto azul. Sendo assim, neste sistema, a presença de colônias de bactérias azuis significa que o fragmento de DNA de interesse (inserto) não foi clonado, e nas colônias brancas, o inserto foi inserido no plasmídeo. Devem possuir um ou mais sítios de reconhecimento para enzimas de restrição. Normalmente, os plasmídeos possuem uma pequena região onde são encontradas sequências para enzimas de restrição, a esta região dá-se o nome de múltiplo sítio de clonagem (MSC). Neste local, o plasmídeo será clivado por endonucleases, tornando-se linear de forma a permitir a inserção de um fragmento de DNA, que após a ação da DNA ligase retorna a condição circular. Origem de replicação (ORI) – região específica de 50 a 100 pares de bases que determina o ponto de início da replicação do DNA. Uma vez que a maquinaria de replicação da célula reconhece a ORI, a replicação do DNA inicia e segue continuamente, independente do restante da sequência de nucleotídeos. Desta forma, qualquer sequência que for inserida no plasmídeo será replicada com ele. Os plasmídeos são de fácil introdução na célula hospedeira e podem carregar fragmentos de DNA de até 10.000 pares de bases. Eles podem ser propagados em diferentes células hospedeiras, como bactérias e leveduras, para isto eles carregam as marcas de seleção adequadas para cada organismo e a capacidade de se replicarem (figura 18). Figura 18. Plasmídeo de clonagem.Esquema representativo de uma plasmídeo com seus componentes essenciais, onde: (ori), origem de replicação; (MSC), múltiplo sítio de clonagem; (ampR) gene que confere resistência ao antibiótico ampicilina e (lacZ’), gene da β-galactosidase, para o sistema de seleção branco-azul. Em destaque o múltiplo sítio de clonagem identificando as sequências de reconhecimento para algumas endonucleases. Fonte: Figura adaptada do site: <http://www.engenhariageneticabioq.page.tl/Sequencia%E7%E3o-de-DNA.htm>. 44 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA Os plasmídeos podem ser apenas vetores para a manutenção de uma informação genética na sua composição, com o propósito de armazená-la e propagá-la dentro da célula hospedeira. Sendo assim, os nomeados plasmídeos de propagação. Além destes, há também os plasmídeos de expressão que, além da função primordial, também atuam como vetores para a expressão de um gene de interesse na célula hospedeira. Os vetores de expressão podem ser: plasmídeos de expressão procarioto, cuja célula hospedeira para expressão do gene é a bactéria, ou plasmídeo de expressão eucarioto, podendo ser células hospedeiras de expressão leveduras, células de mamíferos, vegetais, entre outras. Para este fim, além das características já mencionadas anteriormente os plasmídeos de expressão devem possuir: 1. uma região promotora facilmente reconhecida pela RNA polimerase, para assim iniciar o processo de transcrição; 2. sítio de ligação do ribossomo (RBS); 3. sítios que determinam o início e o término do processo de tradução; 4. um sistema de indução da expressão, que geralmente ocorre pela adição de um agente indutor. Normalmente, nestes plasmídeos o gene de interesse encontra-se fusionado a uma sequência codificadora para uma cauda (por exemplo: resíduos de histidina) que facilitará a purificação da proteína de interesse. Para recordar, leia sobre os processos de transcrição e tradução e fique atento às sequências de reconhecimento para a realização destes processos. 45 CAPÍTULO 7 Biblioteca de DNA genômico e de cDNA Em humanos, existem aproximadamente 35.000 genes distribuídos entre bilhões de pares de bases do complexo genoma. Os genes podem originar um ou mais tipos de mRNA, cujas as informações neles contidas serão traduzidas em proteínas. Além disso, alguns genes podem representar uma pequena fração do DNA total, como, por exemplo, os genes que possuem apenas uma cópia dentro do genoma. Para estudar qualquer um destes genes, é necessário identificá-lo e isolá-lo dos demais genes do organismo. As bibliotecas de DNA e cDNA surgiram para solucionar este problema. As bibliotecas são coleções de fragmentos de DNA de organismos clonados num vetor e propagados em células hospedeiras, que devem ser representativas para aquele organismo ou tecido. De acordo com a origem do DNA, essas bibliotecas recebem nomes distintos: 1. Biblioteca de DNA genômico: como o próprio nome indica, os fragmentos de DNA são oriundos do DNA genômico do organismo. 2. Biblioteca de cDNA: o DNA origina-se do mRNA (por meio da transcriptase reversa), geralmente de tecidos do organismo, sendo assim representativa para aquele tecido. Um gene pode representar apenas um pequeno fragmento de 3000 pb dentro de um genoma de aproximadamente 3x109 pb e, por outro lado, um mRNA raro pode constituir apenas 1 entre 106 mRNAs. Assim o maior problema na criação de uma biblioteca é gerar uma população enorme de clones, suficiente para garantir a representatividade destas espécies raras. Abaixo, abordaremos pontos importantes no preparo das bibliotecas que garantam essa representatividade. Biblioteca genômica É uma coleção de clones que representam a totalidade do genoma de um organismo. Como os genomas, em geral, são muito grandes, estas bibliotecas são montadas em vetores que permitam a clonagem de fragmentos grandes de DNA, por exemplo: fago, cosmídeo, YAc e BAC. Espera-se que uma biblioteca genômica contenha todas, ou quase todas, as sequências do genoma alvo. Logo, estas bibliotecas são preparadas pela fragmentação do DNA alvo e pela inserção dos fragmentos em um vetor de clonagem. A fragmentação do DNA genômico foi a solução encontrada para resolver o problema de como estudar e montar genomas tão grandes. Mesmo os mais simples possuem um tamanho incompatível com qualquer vetor de clonagem. A fragmentação do DNA tem algumas características: 1. é aleatória; 2. contém cópias representativas de todo o genoma; e 46 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA 3. gera fragmentos sobrepostos. As regiões que se sobrepõem aos fragmentos e determinam a posição deles dentro do genoma, consequentemente permitindo a montagem do genoma (figura 19). Figura 19. Fragmentação do DNA gerando fragmentos sobrepostos. Basicamente, são dois os métodos de fragmentação do DNA: » Quebra mecânica: › Sonicação: o DNA é quebrado pela ação de ondas sonoras de alta frequência. › Nebulização: a quebra do DNA é realizada pela ação do gás de nitrogênio. » Quebra enzimática: a quebra do DNA é realizada pela ação de enzimas de restrição. A fragmentação geralmente é parcial, de forma que nem todos os sítios para uma determinada enzima sejam cortados. Isso é possível controlando a quantidade da enzima e o tempo da reação. A digestão parcial é importante para gerar os fragmentos sobrepostos, o que não acontece se a digestão for completa (figura 20). Figura 20. Digestão completa e parcial do DNA genômico. 47 A MANIPULAÇÃO DO DNA │ UNIDADE II Uma biblioteca genômica de boa qualidade tem que conter essencialmente todas as sequências do DNA genômico. Para garantir a representatividade de um determinado gene de interesse, é necessário produzir milhares de clones. Mas como determinar a quantidade suficiente de clones? Supondo que todas as sequências de DNA têm chances iguais de serem inseridas em um vetor de clonagem, após a fragmentação do DNA, a probabilidade (P) de uma sequência específica estar presente é dada por: In(1 P)N IIn 1 G − = − onde: N: número necessário de clones; I: tamanho médio dos fragmentos clonados (pares de bases); e G: tamanho do genoma do organismo (pares de bases). Logo, para uma probabilidade de 99% de isolar um gene do genoma de um mamífero que possui 3x109 pares de bases usando um vetor fago (capacidade para fragmentos de até 2x104), será necessário 690.000 clones. 4 9 In(1 0,99)N 2x10In 1 3 x10 − = − Em geral, esta equação mostra que para alcançar 99% de chance de isolar uma sequência específica, o número total de clones deverá corresponder, em pares de bases, a um total de 4,6 vezes o tamanho do genoma. Este corresponde à cobertura mínima do genoma para se identificar uma sequência específica. Basicamente, os passos para montagem de uma biblioteca são 4: 1. Purificação do DNA genômico. 2. Fragmentação do DNA genômico. 3. Ligação dos fragmentos em vetor de clonagem (fago ou cosmídeo ou BAC ou YAC). 4. Propagação dos DNAs recombinantes em células de bactéria. Finalmente, você pode se perguntar: Qual a utilidade prática para a montagem de bibliotecas genômicas? 48 UNIDADE II │ A MANIPULAÇÃO DO DNA As bibliotecas genômicas são as fontes das informações dos projetos genomas. Nestes projetos, monta-se a biblioteca e, após a propagação em bactéria, extraem-se os DNAs recombinantes das células transformantes para então serem sequenciados. Em seguida, com o uso da bioinformática, monta-se o genoma identificando todos os genes que o constitui, incluindo as regiões não codificantes. A sobreposição dos fragmentos permite a montagem do genoma. Quando se quer estudar uma região não codificante do DNA, mais importante para a regulação da transcrição, por exemplo, estas bibliotecas são a fonte para o material de estudo. Pois, a partir deste tipo de biblioteca, pode-se identificar e isolar sequências de interesse por meio de técnicas de hibridização e PCR. Biblioteca de cDNA As bibliotecas de cDNA, diferentemente das genômicas,
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