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BEUZÁRIO ANTÔNIO DE LACERDA Mestre e Doutor em Direito Administrativo. Juiz do Tribunal de Alçada de Minas Gerais. Professor Titular de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da Fundação Monsenhor Messias de Sete Lagoas. Professor de Direito Administrativo da FUMEC. Professor de Direito Administrativo do Centro de Altos Estudos da Academia de Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. Membro da Banca Examinadora para Procurador Autárquico do CEFET da Universidade Federal de Minas Gerais. DIREITO ADQUIRIDO Gilson Wessler Michels Ru•: ltafae1 Bandeira, 65/701 Florlonópols/SC • F. 222-2207 Belo Horizonte - 1999 Catalogação na Fonte do Departamento Nacional do Livro Ll3ld Lacerda, Belizário Antônio de, Direito adquirido/Belizário Antônio de Lacerda. ·- Belo Horizonte: Dei Rey, 1999. 104p.; 13,5 x 21,0 cm. ISBN 85-7308-273-9 Inclui bibliografia e índice. 1. Direitos adquiridos - Brasil. I. Título. CDD-346.81 Editor Arnaldo Oliveira Conselho Editorial Prof. Antonio Augusto Junho Anastasia Prof. Ariosvaldo de Campos Pires Prof. Aroldo Plínio Gonçalves Dr. Edelberto Augusto Gomes Lima Prof. Hermes Vilchez Guerrero Pro[ Jair Eduarµo Santana Dr. José Edgard Perma Amori.m Pereira Prof'. Misabel Abreu,Machado Derzi Des.Sérgio Lellis.S'arúiago Produção Editorial Alexandre Cardoso Copyright © 1999 by LIVRARIA DEL REY EDITORA LTDA Loja Rua Goitacases. 71 - Lojas 20/24 - Centro - Belo Horizonte - MG - CEP 30190-909 Televendas·0800-314633 -Telefax: (031) 274-3340 Editora Rua Teixeira Magalhães, 80 - Bairro Floresta - Belo Horizonte - MG - CEP 30150-000 Telefax: (031) 422-8066 Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, sejam quais forem os meios empregados, sem a permissão, por escrito, da Editora. Impresso no Brasil Printed in Brazil Livros, artigos e pareceres do autor 1. Do direito e da ação de preferência. São Paulo: Saraiva, 1981 ( edição esgotada). 2. Da retrocessão. Rio de Janeiro: Forense, 1983 (edição esgotada). 3. Natureza jurídica da reaquisição do bem expropriado) doutrina) ju- risprudência prática e legislação. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. 4. Comentários à lei de arbitragem. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. 5. Inovações da Lei n. 6.416 de 24/5/77.Jornal da OAB/MG. 6. Da transformação da separação judicial em separação consensual de cônjuges com até dois anos de casados. Im- possibilidade legal. Considerações. Revista Tribuna da Justiça de São Paulo. 7. Competência do juízo requerido naJustiçaTrabalhista. Re- vista Tribuna da Justiça. 8. A execução por carta na Justiça Trabalhista. Revista Forense n. 272. 9. O direito de preferência como protetor do município na preservação do patrimônio histórico nacional. Revista Foren- se n. 284. 10. Honorários advocatícios no incidente processual. Revista Forense n. 293. 11. Parecer sobre Reaquisição do Hospital dos Servidores Públicos Civis do Estado da Bahia) a pedido da Engenharia da Bahia, Construções e Imóveis Ltda. 12. A responsabilidade administrativa e a denunciação à lide. Revista Jurisprudência Mineira) v. 116, p. 12-22. 13. Aspectos da pena disciplinar. Revista da Amagis (Associação dos Magistrados Mineiros) v. 21, p. 51-57. 14. Execução do crédito alimentar contra a Fazenda Pública. Revista Forense) v. 327, p. 19-24. 15. Da imprescritibilidade da sanção disciplinar nos ilícitos admi- nistrativos contra o patrimônio público. Revista Forense) n. 333. 16. Vinculação odiosa. Jornal da Associação dos Magistrados do Es- tado Minas Gerais-Amagis) set./96, n. 58, p. 14. 17. Valorização do oficial de justiça.Jornal da Associação dos Ofici- ais de Justiça Belo Horizonte. 18. Reforma administrativa. Revista da Associação dos Magistrados Mineiros (a ser publicado). 19. Aposentadoria obrigatória. Revista da Associação dos Magistra- dos Mineiros (a ser publicado). 20. Responsabilidade administrativa do juiz. Revista da Funda- ção Educacional Monsenhor Messias) v. 2, p. 19. 21. Dos fatos jurídicos. Revista Lemi) n. 179, out., 1982. 22. Artigos jurídicos publicados no jornal Estado de Minas du- rante os anos de 1986 a 1994. 23. Parecer sobre Consulta da Associação dos Magistrados de Minas Gerais - Amagis - versando sobre a legitimidade da reinstituição de cobrança de contribuição previdenciária de entidade fechada de assistência à saúde sobre o pagamento feito a seus administradores, trabalhadores autônomos, avulsos e outros, cujos serviços sejam prestados sem víncu- lo empregatício. 24. Tutela antecipada contra a Fazenda Pública. Revista Fo- rense> 1997. Ao ilustrado Amigo, Professor,Jusfilósofo e Mecenas, Dr. Gerson de Britto Mello Boson, a quem a Providência Divina predestinou a nobilíssima missão de ensinar a filosofia do bem viver em sociedade, como pressuposto indeclinável para a formação do futuro profissional do direito. "Entre o receio de erro no enfoque científico de um difícil instituto de direito em ebulição, é preferível assumir o risco do erro, e quiçá contribuir para o continuismo da evolu- ção daquele referido instituto jurídico, do que repetir eterna e enfadonhamente o que já disseram igualmente outros pensa- dores do direito sobre aquele mesmo instituto." (Dr. Belizário Antônio de Lacerda) Apresentação A presente obra é produto de pesquisa longa, cujo início remonta ao ano de 1997, mas que somente agora foi possível concluí-la. Não poderia ter momento mais oportuno para a publica- ção de uma obra sistematizada sobre o direito adquirido, pois o trato científico que tem sido dado ao tema em questão prende- se a artigos esparsos. Agora, com a reforma constitucional pelo Poder Consti- tuinte Originário, que tem limitações, cresce o receio do cida- dão brasileiro em ter mitigado ou mesmo aniquilado seu direito adquirido. Poucos temas, tanto no direito público quanto no direito privado, têm ensejado discussões científicas que constituíram as mais belas páginas de nossos repertórios jurídicos, quer pela dificuldade em si que o tema oferece, quer pelo fundado temor de enfrentar de maneira comprometida o instituto do direito adquirido. Ainda hoje, quando se fala em direito adquirido, os juris- tas não se pejam em exortar a dificuldade do tema, apesar de mostrar uma trajetória histórica em nosso direito constitucio- nal que remonta ao Império. Mas permanece irrefutável o conceito de direito adquiri- do, que tem assento na irretroatividade da lei, e que pode assim ser resumido. Se ela (lei posterior) estendesse os seus efeitos aos fatos pretéritos) isso significaria que ela adquiria existência e eficácia quando ainda não existia. Não foi por outro motivo que o Autor, percebendo esse vácuo na doutrina do direito administrativo e no direito consti- tucional, encorajado lançou-se nessa empresa nada fácil de enfocar sistemática e cientificamente esse importante instituto do direito adquirido. Se tiver conseguido de qualquer modo, pelo menos ter contribuído para a evolução do instituto do direito adquirido o Autor se considera recompensado por todo o trabalho despen- dido com o presente livro. Belo Horizonte, junho de 1998. O Autor. Prefácio O antigo - mas sempre novo-, tema dos direitos adquiri- dos constitui, na estrutura do Estado de Direito, assunto dou- trinário incansável. O fato se deve às características do instituto: temporalidade, arbítrio e segurança, enquanto valores do Direi- to. A vida é uma sucessão de acontecimentos, dos quais o últi- mo é a morte. Nessa sucessão, quando em sociedade, cenário jurídico da realização de valores, não poderíamos agenciar o nosso mundo, o mundo da cultura, se não acompanhássemos os fatos do seu acontecer, racionalizando a sua efetivação medi- ante a normatividade jurídica. Neste particular, costuma-se di- zer que a norma agendi corre atrás dos fatos. É que a atualização normativa deve ser contínua, na continuidade irreprimível da vida. Todavia, forçoso é prevenir o arbítrio dos que, no exercícioda competência legislativa, promovem a atualização jurídica da normatividade, a fim de que se atenham à índole histórica, conseqüentemente à historicidade do Direito. Lex prospicit non respici; já diziam os Romanos. O passado é impensável, pensável é o presente no seu eterno mergulhar no futuro. Se assim não fosse, possível seria a vida dos rebanhos humanos, mas não da sociedade humana, e impossível o Estado de Direito, em face da presença irreprimível do arbítrio. Laborando o assunto, o Dr. Belizário Antônio de Lacerda, com doutorado e mestrado em Direito Administrativo, autor de várias obras jurídicas, professor da disciplina na Faculdade de Sete Lagoas e no Curso de Direito da Faculdade de Ciências Humanas da Fundação Mineira de Educação e Cultura e do Centro de Altos Estudos da Polícia Militar de Minas Gerais, nos dá mais este estudo de excelente cunho,para os juristas, advoga- dos e magistrados e tod~s os 'que seinteressam pelo estudo mais detalhado e mais aprofundado da matéria: Com efeito, além de examinar a problemática do Direito Adquirido na sua concepção patrimonial, definindo a sua índo- le jurídica, a sua conceituação legal, inova a tradição do estudo, colocando-o em face da possível reforma constitucional, com vista aos questionamentos da revogação de atos administrati- vos conclusivos, examinando, outrossim, o servidor público, quando envolvido na questão, com suporte em súmulas e juris- prudências dos Tribunais. Ademais, o Autor, que carrega a vivência do exercício judicante, juiz que ilustra o Tribunal de Alçada de Minas Gerais, ingressa, corajosamente, no mérito de problemas como os que dizem respeito à aquisição de direitos em contrariedade à consti- tuição, o direito adquirido enquanto potencialmente exercitável e a melhor ideação acerca do confronto temático entre "poder constituinte originário" e "poder constituinte derivado", com os significativos concernentes aos direitos adquiridos. Com o presente estudo, que tenho a honra de prefaciar, sábio e suficiente, Minas ingressa nas Bibliotecas jurídicas, com sobriedade e concisão. Gerson de Britto Mello Boson Gilson Wessler Mfchels "ua: "af ae4 Boodelra. 65/701 florion4'polsJSC · F. 222-2207 Sumário Capítulo I - DIREITO ADQUIRIDO E PATRIMÔNIO.... 17 Capítulo II - CONCEITO LEGAL DE DIREITO ADQUIRIDO...................................................... 19 Capítulo III - NATUREZAJURÍDICA DO DIREITO ADQUIRIDO...................................................... 21 Capítulo IV - DIREITO ADQUIRIDO E REFORMA CONSTITUCIONAL ........................................ 23 Capítulo V - DIREITO ADQUIRIDO E REVOGAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO....................... 39 Capítulo VI - O DIREITO ADQUIRIDO DO SERVIDORPÚBLICO...................................... 41 Capítulo VII - SÚMULAS E JURISPRUDÊNCIA................. 53 Capítulo VIII-EMENTA CONCLUSIVA DOS CAPÍTULOS TEMÁTICOS DO PRESENTE ESTUDO SOBRE O DIREITO ADQUIRIDO .................................. 85 Bibliografia................................................................................... 87 Índice alfabético e remissivo.................................................. 93 t i Capítulo I DIREITO ADQUIRIDO E PATRIMÔNIO Cuida o direito adquirido de instituto dos mais contro- vertidos na ciência jurídica. Para que se tenha uma idéia da dimensão dessa contro- vérsia, basta que seja examinado o conceito dado por alguns juristas sobre o referido e tormentoso instituto. A tese segundo a qual não se adquire direito contra· a Constituição Federal, deve ser examinada cum grano salis. 1 Alguns autores associam o conceito de direito adquirido à idéia de patrimônio incorporado ao acervo do titular, de tal modo que não pode ser desse retirado, ainda que seja por força de lei nova.2 Como direito patrimonial também o entende De Plácido e Silva) verbis: "Direito adquirido é o direito que já se incorporou ao patrimônio da pessoa, já é de sua propriedade, já constitui 1 POLETII, Ronaldo. Controle da constitucionalidade das leis. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 163. 2 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 7. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 232. 17 um bem, que deve ser juridicamente protegido contra qual- quer ataque exterior, que ouse ofendê-lo ou turbá-lo."3 Provavelmente tais posições doutrinárias foram influen- ciadas por Gabba que assim definiu os contornos jurídicos do direito adquirido. "Adquirido é todo direito resultante de um fato capaz de produzi-lo segundo a lei em vigor ao tempo em que este fato se verificou, embora a ocasião de fazê-lo valer não se haja apresentado antes da atuação de uma lei nova sobre o mesmo direito, direito este que, de conformidade com a lei sob a qual aquele fato foi praticado, passou, imediata- mente, a pertencer ao patrimônio de quem o adquiriu. "4 Em que pese a tão autorizados conceitos, o fato é que não se pode vincular o direito adquirido à expressão econômica por esse traduzida. Se assim pudesse ser o que dizer do direito de estado, como por exemplo o direito à filiação, ao nome, ao apelido de família. Não seriam tais direitos suscet~veis de aquisi- ção somente porque lhes falta valor econômico? E evidente que não. Não importa a natureza jurídica do direito para efeito de sua aquisição. 3 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário jurídico. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1967, v.2,p.530. , 4 GABBA. Teoria della retroatività delle leggi. 3. ed., Turim, 1891, v. 1, apud RAO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. São Paulo: Max Limonad, v. 1, n. 282. 18 Capítulo li CONCEITO LEGAL DE DIREITO ADQUIRIDO O conceito de direito adquirido decorre da própria lei, em especial o§ 2° do art. 6° da Lei de Introdução ao Código Civil, conforme se pode ver de sua redação: "Consideram-se direitos adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo de exercício tenha termo pré-fixo, ou condi- ção preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. " Esse conceito de direito adquirido é válido tanto para o direito privado quanto para o direito público, pois não se con- cebe, em termos científicos, que um instituto, que tenha uma só natureza jurídica, possa assumir outra natureza apenas por mera divisão dicotômica do direito, a qual se adstringe a critéri- os simplesmente hermenêuticos. Certo ou errado, o direito adquirido no sistema positivo brasileiro, é todo direito que possa ser exercido por seu detentor ou por outrem em seu nome, bem como o direito que tenha tempo prefixado ou condição preestabelecida para o início de seu exercício que não pode ser alterada ao talante de outrem. Essa condição que não pode ser alterada. ao talante de outrem não passa de um direito potestativo do titular, ou seja, 19 do direito que em nada pode ser influenciado por outrem quan- do pleiteado por seu titular. . .. A grande tônica do direito adquirido no sistema pos1t1vo nacional é que não precisa ser exercitado por seu titular, basta que possa ser exercido, ou seja, que tenha potencialidade para ser concretizado por seu titular. Isso quer dizer que o exercício do direito adquirido é mera conseqüência, faz parte de seus efeitos, mas não lhe inte- gra a essência. 1 1 CAMPOS BATALHA, Wilson de Souza. Direito intertemporal. Rio de Janeiro: Fotense, 1980, p. 189-195. Capítulo Ili NATUREZAJURÍDICA DO DIREITO ADQUIRIDO A natureza jurídica do direito adquirido pode ser retirada de seu próprio conceito legal. Assim é que tem o direito adquirido a natureza de um direito potencialmente exercitável. O direito adquirido no sistema positivo nacional está mais afeto ao implemento das condições de fato do que do próprio direito. O que pesa decisivamente para o advento do direito ad- quirido é a reunião das condições de fato segundo a exigência da lei vigente à época do implemento das referidas condições, pouco importando se a lei futura venhaa modificá-las. 20 21 Capítulo IV DIREITO ADQUIRIDO E REFORMA CONSTITUCIONAL O direito adquirido é obra do Poder Constituinte Originá- rio pois é oriundo da vontade do povo que primeiro elegeu ou quis que, em seu nome, fosse o Poder Constituinte Originário exercido. E é exatamente por isso que a Constituição normalmen- te tem como intangíveis de modificação ou reforma certos direi- tos e garantias de cidadania, direitos estes aos quais os constitucionalistas emprestam a denominação de cláusulas pétreas, expressão aliás pouco feliz porque inexiste no reino mi- neral pedra que não se quebre, e sob aquele título pretenderam os autores dizer que os direitos e garantias de cidadania são inquebráveis. O mais correto, para conferir a tais direitos a nature- za de intangibilidade, seria denominá-los de garantias perenes de cidadania) pois aí sim poderiam ser tidos como inquebráveis realmente. Daí se pode inferir, sem censura jurídica, que, por meio de reforma constitucional - Poder Constituinte Derivado-, o direi- to adquirido não pode sofrer modificação, e muito menos aboli- ção, pois se encontra no rol dos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal, conforme salienta seu art. 5°, caput. Ressalte-se que tal artigo está localizado topograficamen- te na Constituição no Capítulo I, o qual cuida Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, Título II- que trata Dos Direi- 23 tos e Garantias Fundamentais e Capítulo I o qual finalmente dispõe a respeito Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos. "Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direi- to à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propri- edade, nos termos seguintes: XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada". E é justamente por isso que a Constituição Federal do Brasil de forma expressa, assegura em seu art. 60, verbis: 24 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seUs membros. § 1 ° A Constituição não poderá ser emendada na vigên- cia de intervenção federal, de estado de defesa ou de esta- do de sítio. · § 2 ° A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. § 3° ·A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem. § 4° Não será objeto de deliberação a proposta de emen- da tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. § 5° A matéria constante de proposta de emenda rejeita- da ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. Sobre o direito adquirido e Poder Constituinte, tem o Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho excelente trabalho, fruto de uma de suas palestras, dessa feita junto ao Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, por ocasião da comemoração dos 30 anos de criação daquela Corte, trabalho que foi veicula- do na Revista dos Tribunais. 1 Sobre tal tema assim discorre o ilustrado Professor das Arcadas: "O tema desta palestra envolve, apesar de sua aparente simplicidade, algumas das questões mais delicadas do di- reito constitucional ou, por que não dizê-lo, da própria teoria geral do direito. Realmente, a problemática do Po- der Constituinte situa-se na raiz do sistema jurídico, pois opera - lembrando a pedra filosofal dos alquimistas - a passagem do fato para o direito. E a esta questão já de per si suficientemente difícil soma-se a complexidade de tudo aquilo que concerne ao chamado conflito de leis no tempo. Parece necessário, para bem examinar - ainda que super- ficialmente - o assunto, desdobrar o estudo em três par- tes. A primeira buscará recordar as linhas mestras da dou- trina do Poder Constituinte; a segunda, analisar de modo geral o impacto no tempo das normas constitucionais; e, enfim, a posição do direito adquirido, em face dessas normas, particularmente no sistema jurídico pátrio. 1 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Poder constituinte e direito adquirido (al- gumas anotações elementares). Revistados Tribunais, v. 86, n. 745, p. 18-26, verbis. 25 26 Embora esta doutrina do Poder Constituinte tenha visto a luz no país da clarté, a França, cada uma das teses que avança importam em obscuridades torno das quais se digladiam os juristas. Daí a extensa e intensa controvérsia que cerca a temática, controvérsia esta ainda acentuada e potencializada pelas implicações circunstanciais - histó- ricas e políticas. Já a indagação sobre a natureza do Poder Constituinte desencadeia a polêmica. Para a maioria - inspirada no positivismo - trata-se de um poder de fato. Quem detém o poder, ou quem vem a deter o poder, com suficiente autoridade para obter a obediência da comunidade mesmo a ordens que contrari- am o ordenamento jurídico estabelecido, edita a Consti- tuição que se torna lei suprema e base de um (novo) ordenamento jurídico se lograr efetividade (cumprimen- to global). Assim, à base do processo constituinte está sempre uma revolução, isto é, a quebra da ordem jurídica anterior. Assim, o Poder Constituinte é exercido por quem exerce um poder soberano. Para outros, o Poder Constituinte traduz a autodetermi- nação, portanto, a liberdade de cada povo ( ou nação, como queria Sieyes, o que não é exatamente a mesma coisa). Esta corrente, se não pode negar o fato histórico de que numerosas constituições foram editadas por mo- narcas ou chefes revolucionários independentemente de qualquer participação popular (salvo o assentimento não raro forçado), entende que idealmente a edição de uma Constituição se deve fazer por meio de representantes .,extraordinários do povo - era a posição de Sieyes - e, como hoje muitos reclamam, a aprovação direta por este em referendum. Claro está que subjacente à discussão em torno da natu- reza, está a da titularidade do Poder Constituinte. Em razão do prevalecimento da democracia - hoje consi- derada como a única forma legítima de governo - é esse titular o povo. Sieyes - o pai da doutrina do Poder Consti- tuinte que pela primeira vez foi exposta no seu livro Qu'est-ce que le Tiers État? - sutilmente propunha à nação, sugerindo duas idéias: a de que cada comunidade nacio- nal é que deveria ser a 'matéria' do Estado que a Consti- tuição conformaria; a de que o interesse da comunidade vista como uma entidade distinta das gerações que pas- sam é que deveria prevalecer. Entretanto, na experiência, todo soberano, ou seja, todo detentor (não mero exercente) do supremo poder num Esta- do - em nome do povo, do partido, da revolução, do direito divino-, pretendeu deter esse Poder Constituinte. Compro- vam-no as outorgas monárquicas (Brasil, 1824), ou revolu- cionárias (Brasil, 1937; Ato Institucional (n. 1) de 1964). Três são os traços característicos do Poder Constituinte: a inicialidade; a incondicionalidade; e a ilimitação. Significa o primeiro que o Poder Constituinte, por esta- belecer a Constituição, dá início ao ordenamento jurídi- co. Esta é, pois, a base do ordenamento que, pela lógica, se há de construir de acordo com ela. Decorre desse traço que tudo o que pertence ao ordenamento antes dela vi- gente logicamente perde eficácia. Mas, de acordo com a conhecida teoria de Hans Kelsen, o que, pertencendo embora ao ordenamento anterior, se coaduna com a nova Lei Magna recobra eficácia, ainda que com novo fundamento. Eo fenômeno da recepção, forma abreviada de criação do direito. A incondicionalidade consiste em não ter o Poder Consti- tuinte um modo especial de manifestação - conquanto a assembléia dos representantes extraordinários do povo, a Assembléia Constituinte, seja o modelo ideal. Nem estar ele preso a formalidades ou procedimentos. É verdade, porém, que o Poder Constituinte às vezes opera em duas etapas. Na primeira, quebra a ordem jurídica anterior; na segunda, pela Assembléia, integra a nova Constituição. É o processo brasileiro de 1889/1891: o Decreto n. 1, de 1889, e a Constituição de 24/2/1891. 27 28 A ilimitação ( ou soberania) do Poder Constituinte é de- corrência lógica de sua inicialidade. Se ele dá início à ordem jurídica, evideµtemente não está sujeito a norma jurídica alguma. A norma jurídica positiva alguma, seria melhor dizer. Com efeito, Sieyes, e com ele os jusnaturalistas, enten- dem ser o Poder Constituinte limitado pelo direito natu- ral. Hoje, os internacionalistas pretendem seja esse Poder limitado pelas normas internacionais, mormente pelas que protegem os direitos do Homem, perdão, os direitos humanos fundamentais. Falou-se até agora de Poder Constituinte no sentido es- trito de Poder que origina a Constituição, ou seja, de Poder Constituinte originário. Este qualificativo serve para distinguir o Poder que estabelece a Constituição do poder que muda a Constituição, de acordo com ela. Este último, poder constituído pelo poder originário, costumeiramente é designado por Poder Constituinte de- rivado, não raro por Poder de Reforma ou Poder de Revi- são. (Sim, porque, embora semanticamente se deva dis- tinguir entre emenda, revisão e reforma da Constituição, não existe uma terminologia firme e rigorosamente ob- servada para designar a mudança da Constituição com a obediência às normas estabelecidas por esta.) E enfatize- se o de acordo com a Constituição, já que a mudança da Constituição 'contra' a Constituição é revolução, que so- mente o Poder oríginário pode efetuar. Em realidade, salvo para minoria de autores que ensina ser o Poder que muda a Constituição, o próprio Poder originá- rio que sobrevive na sua obra, o estatuto jurídico do Poder derivado é análogo ao de qualquer Poder constituído. É ele, em primeiro lugar, um poder derivado - daí o nome - no sentido de que deriva do Poder originário, por inter- médio da obra deste, a Constituição, não vem diretamen- te do povo. Em segundo lugar, é um poder condicionado, quer dizer, não se manifesta senão com a observância das 'condições' postas pela Constituição - os procedimentos, ritos e pra- zos fixados nesta. Por fim, é limitado. Há de respeitar as limitações postas pela Constituição, sejam elas temporais (p. ex., proibição de mudar a Constituição antes de um certo número de anos); circunstanciais (não mudar a Constituição, p. ex., durante estado de sítio); e, sobretudo, materiais. Estas últimas são de todas as mais relevantes. Excluem da mudança determinados pontos os quais, assim intocáveis, se tornam o cerne fixo, o núcleo fundamental, as cláusulas pétreas da Constituição. Estas limitações provocam várias discussões delicadas. A primeira é a sua justificativa. Por que uma Assembléia eleita, de representantes do povo, pode proibir que outra - eleita também e composta de representantes do povo - mude ou suprima um ponto da Constituição? A razão não estaria com a Declaração de 1793, segundo a qual uma geração não pode sujeitar as suas leis às gerações futuras (art. 28)? Carl Schmitt dá para isso um fundamento político. Toda Constituição - ensina ele - traduz uma decisão política, a qual se exprime nos seus pontos fundamentais. Por isso, somente uma nova Constituição, nunca uma simples mudança na Constituição, pode alterá-los, suprimi-los, substituí-los. ~urra concerne~ existência de cláusulas intocáveis implí- citas. Para Schm1tt, a resposta é afirmativa. A existência dessas cláusulas, implícitas ou explícitas, é inerente à idéia de Constituição. Mas o problema se torna mais difícil quando, existindo limitações materiais explícitas, se inda- ga se haverá ainda limitações implícitas. Ao explicitar ... determinadas limitações, não estaria excluída a existên- cia de outras, por uma escolha do próprio Poder Consti- tuinte? Tese que parece preferível. 29 30 Mas - ajuntam alguns - a irreformabilidade da regra de revisão não seria) seguindo-se a lição de Alf Ross, uma impossibilidade lógica? Ao que se pode contrapor a opi- nião de Hart e muitos outros. Enfim) a existência de pontos intocáveis não seria senão um mero agravamento da técnica da rigidez? Ou seja, não exigiria uma dupla revisão? A primeira suprimindo a proibição? É este o ensinamento de Jorge Miranda. Sirva de ponto de partida desta análise uma afirmação que o eminente Conselheiro Acácio - o imortal persona- gem de Eça de Queiroz - não repudiaria. Ou seja) a norma constitucional, em princípio - como qualquer norma ju- rídica-, não incide senão do presente para o futuro. Tem ela) como ensina Roubier e repete o art. 6°) caput) 1 ª parte) da Lei de Introdução) efeito imediato e geral. Ora, isto significa que a lei, salvo exceções que a limitam) se aplica imediatamente, produz efeitos em relação a fa- tos ou atos a partir do momento em que se torna obriga- tória ( Cf Paul Roubier. Le Droit Transitoire.2. ed. Paris: Dalloz et Sirey, 1960. p. 422). Portanto, aplica-se aos facta futura, não se aplica aos facta praeterita, pondo-se de lado, para exame posterior, a ques- tão dos facta pendentia ( o,s que, originados no passado, ainda produzem efeitos no presente e, quiçá, os produzi- rão no futuro). Na verdade, a irretroatividade das normas - evidentemente a irretroatividade in pejus, pois não há objeção contra a irretroatividade in melius - constitui, se- gundo Roubier e outros, um princípio geral de direito. Mas a retroatividade não é vedada à norma constitucio- nal oriunda do Poder originário. Com efeito) dada a sua inicialidade, ou melhor, dada a inexistência de limitação jurídica que a proíba) pode ela colher fatos a ela anteriores. Em conseqüência, pode dar- lhes caráter (lícito ou ilícito) diferente do que tinham na ordem jurídica anterior. Igualmente pode pôr termo a direitos adquiridos. É a lição clássica que registra Pontes de Miranda: 'As Constituições não têm, de ordinário, retroeficácia porque estejam adstritas a isso' (Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda n. 1 de 1969. São Paulo: RT, 1969, t. VI, p. 392). E acrescenta: 'As Constituições têm incidência imediata, ou desde o momento em que elas mesmas fixaram como aquele em que começariam de incidir' (Idem) ibidem). Entretanto, não se deve presumir o caráter retroativo da norma constitucional originária. Insista-se em que o princípio geral de direito é a irretroatividade. Daí a pre- sunção de que a norma não tem retroeficácia. Para fugir disto é necessário que o caráter retroativo decorra inexoravelmente do texto. Quanto à norma constitucional proveniente do Poder derivado, também ela não tem) em princípio, caráter re- troativo. Na verdade, ela só o pode ter se a Constituição não veda a retroatividade. No caso brasileiro, se a Constituição não afirma expressa- mente a irretroatividade, a uma situação equivalente con- duz a garantia aos direitos adquiridos (art. 5°, XXXVI). Ora, existindo esta limitação, é claro que ela importa limitação ao Poder derivado. Conseqüentemente a nor- ma será inconstitucional se retroativa. Esta é a posição que) num importante trabalho escrito antes de haver ascendido ao Supremo Tribunal Federal, sustenta Carlos Mário da Silva Velloso) com elegância e maestria. Aponta o eminente jurista: 'Se é a própria Constituição que consigna o princípio da não-retroatividade, seria uma contradição consigo mes- ma se assentasse para todo o ordenamento jurídico a idéia do respeito às situações jurídicas constituídas e, simultaneamente, atentasse contra este conceito'(Fun- cionário Público - Aposentadoria - Direito Adquirido, em RDP 21/178). 31 32 E conclui: 'Um direito adquirido por força da Constituição, obra do Poder Constituinte originário, há de ser respeitado pela reforma constitucional, produto do Poder Constituinte instituído, ou de 2 ° grau, vez que este é limitado, explíci- ta e implicitamente, pela Constituição' (art. cit., p. 180). Posição diferente aparece, todavia, num acórdão do Su- premo Tribunal Federal, relatado pelo Min. Moreira Alves. Na sua ementa, lê-se: 'Não há direito adquirido contra texto constitucional, resulte ele do Poder Constituinte originário, ou do Poder Constituinte derivado' (R1J 114/23 7). Mas, em verdade, a ementa exagera a posição. Com efeito, no voto o relator vai menos longe, pois explica: 'Em outras palavras, a Constituição, ao aplicar-se de ime- diato, não desfaz os efeitos passados de fatos (salvo se expressamente estabelecer o contrário) ... '. Para completar: 'Mas alcança os efeitos futuros de fatos a ela anteriores ( exceto se os ressalvar de modo inequívoco)'. Assim a Emenda colheria os efeitos futuros dos atos pas- sados, atingiria os facta pfndentia, conquanto só na parte posterior à sua vigência. Note-se, entretanto, entender o Min. Moreira Alves como possível efeito retroativo de norma constitucional exata- mente o que, na lição de Roubier, se traduz por efeito imediato da regra. Com efeito, como se verá logo adiante, o ilustre jurista entende ser a incidência de norma nova sobre efeitos de atos a ela anteriores uma forma de retroatividade, conquanto mitigada. Realmente, em trabalho recente que consubstancia o seu voto naADin 1.081-6-DF, o eminente Ministro explicitou mais claramente o seu pensamento sobre o assunto. De fato, ensina ele, apoiando-se em Matos Peixoto, que há três espécies de retroatividade: a máxima ( ou restitu- tória, que 'restitui as partes ao statu quo ante'); a média ('quando a lei nova atinge os efeitos pendentes de atos jurídicos verificados antes dela'); e a mínima (temperada ou mitigada) ('quando a lei nova atinge apenas os efeitos dos atos anteriores produzidos após a data em que ela entra em vigor') ( Cf 'As leis de ordem pública e de direito público em face do princípio constitucional da irretroatividade', em Revista da Procuradoria-Geral da República. v. I, p. 13 et seq. ). Mais adiante, condena a tese de Paul Roubier de que o efeito imediato da lei não tem caráter retroativo: 'Essas colocações [ de Roubier] são manifestamente equi- vocadas, pois dúvida não há de que, se a lei alcançar os efeitos futuros de contratos celebrados anteriormente a ela, será essa lei retroativa porque vai interferir na causa, que é um ato ou fato ocorrido no passado' (art. cit., p. 14). Ora, a conclusão lógica - que não é expressamente tirada no artigo - dessas premissas é inadmitir-se a aplicação da norma editada pelo Poder Constituinte derivado mesmo com relação aos facta pendentia. Realmente isto seria retroatividade, ainda que mitigada. É de se referir que, no artigo citado, defende o Min. Moreira Alves uma tese irretorquível. Trata-se da repulsa à tese de que leis de ordem pública podem ser aplicadas até retroativamente ( e no rol delas se poderiam tranqüilamen- te incluir as normas constitucionais ... ). Mesmo porque 'todas as leis ... são inspiradas imediata ou mediatamente pelo princípio da pública utilidade' (art. cit., p. 18). É também a posição de Roubier: 'A idéia de ordem pública não pode ser posta em oposição com o princípio de não-retroatividade da lei, por este motivo decisivo de que, numa ordem jurídica fundada sobre a lei, a não-retroatividade é uma das colunas da ordem pública' (op. cit.) n. 83). A Constituição em vigor, como logo anteriormente se apontou, prescreve no art. 5°, XXXVI: 33 34 'A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'. Na verdade, este texto provém da Constituição de 1934, art. 113, § 3°, e foi também adotado pela Lei Magna de 1946 (art. 141, § 3°), pela de 1967 (art. 150, § 3°) e pela Emenda 1/69 (art. 153, § 3°). As Constituições de 1824 (art. 179, § 3°) e de 1891 (art. 11, § 3°) preferiram vedar leis retroativas. Já a Carta de 1937 nada dispunha sobre o assunto, havendo sido editadas durante sua vigência leis retroativas. Na verdade, sob esta última Constituição é que foi promulgada a Lei de Introdução (Decreto-Lei n. 4.657, de 4/9/1942), cujo art. 6° dispunha: 'A lei em vigor terá efeito imediato e geral. Não atingirá, entretanto, salvo disposição expressa em contrário, as si- tuações jurídicas definitivamente constituídas e a execu- ção do ato jurídico perfeito'. Adotava, pois, a teoria das situações jurídicas de Léon Duguit e as lições de direito intertemporal de Paul Roubier, ensinamentos que talvez deixassem menos dúvi- das que a formulação atual, com a invocação do 'direito adquirido'. A redação deste artigo foi, todavia, alterada pela Lei 3.238/57, para que se coadunasse com o preceito consti- tucional que invocava o direito adquirido (Lei Magna de 1946, art. 141, § 3°). Por isso, encontra-se na redação vigente o seguinte§ 2 ° no art. 6° da Lei de Introdução: 'Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo de exercício tenha termo pré-fixo, ou condi- ção preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem'. Há, portanto, em vigor no Brasil uma definição legal de direito adquirido. Esta definição é bastante larga. No fundo, ela identifica direito adquirido com direito existente. De fato, inexiste o direito - há eventualmente a expectativa de direito - se todos os elementos pela lei exigidos para gerar o direito subjetivo não estão presentes. Ora, para a lei brasileira, vindo a existir o direito, é este um direito adquirido. Não é este entender a visão clássica do que seja direito adquirido. Para ela nem todo direito existente é direito adquirido num sentido técnico. A doutrina do direito adquirido - registre-se - nasceu no plano do direito privado, das relações entre particulares; e visando a preservar a autonomia da vontade. Sua primeira formulação é devida ao famoso alemão Lassalle, hoje mais conhecido como rival de Marx nos passos iniciais do socialismo do que como jurista. Assim resume Vicente Ráo o seu pensamento, exposto em livro cujo título seria, em português, 'Teoria sistemática dos direitos adquiridos': 'Para ele [Lassalle], o fundamento e o limite da irretroatividade se identificam com a necessidade de se tutelar a liberdade individual e, assim sendo: a) nenhuma lei pode retroagir e alcançar o indivíduo, atingindo os seus atos voluntários; b) mas retroagir pode qualquer lei, quando alcança o indivíduo fora dos atos de sua vontade, como, por exemplo, com relação às qualidades que ele não adquiriu por si, mas que lhe pertencem em comum, como a toda a humanidade, ou, ainda, quando a lei o alcança, apenas, na medida em que modifica e afeta a própria sociedade, através de suas instituições organiza- das' (RÁO. Direito e a vida dos direitos. São Paulo: Max Limonad, v. 1, n. 282, nota 301). É ao italiano Gabba, todavia, que se reconhece a versão clássica da doutrina. Atente-se para a definição que ele dá: 'Adquirido é todo direito resultante de um fato capaz de produzi-lo segundo a lei em vigor ao tempo em que este fato se verificou; embora a ocasião de fazê-lo valer não se haja apresentado antes da atuação de uma lei nova sobre o mesmo direito; direito este que, de conformidade com a lei sob a qual aquele fato foi praticado, passou, imediatamente, a pertencer ao patrimônio de quem o 35 36 adquiriu' (Teoria della Retroattività delle Leggi.3. ed. Turim, 1891. v. 1, texto traduzido por Vicente Ráo, apud o livro deste, O Direito e a vida dos Direitos. São Paulo: Max Limonad,v. 1, n. 282). Note-se um ponto importante. O direito adquirido, para o principal nome da doutrina dos direitos adquiridos,é sempre direito incorporado ao patrimônio de quem o adquiriu. Isto evidentemente restringe o âmbito dos di- reitos adquiridos. E seguramente - na época - ao plano do direito privado. Confira-se isto com o ensinamento de Clóvis Beviláqua, o pai do Código Civil brasileiro. 'Os direitos adquiridos, que as leis devem respeitar, são vantagens individuais, ainda que ligadas ao exercício de funções públicas' (Teoria Geral do Direito Civil. 6. ed., Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1953. n. 14). De novo, a idéia de patrimonialidade, mas já agora a extensão do direito público, pelo menos no que concerne às vantagens do servidor público. É verdade que nem todos aceitam a transposição do con- ceito de direito adquirido para o direito público. De Ruggiero, por exemplo, pretende, segundo resume Vicente Ráo, que: 'O fato já verificado, considerado em si e em seus efeitos futuros, deve ser governado pela lei em vigor ao tempo em que se verificou, mas só em certas matérias, que são, principalmente, aquelas nas quais predomina a vontade individual e o interesse dos indivíduos; nas matérias, po- ,rém, nas quais predomina o interesse do Estado e a or- dem pública, ocorre a aplicação imediata da lei nova' (Istituzioni di Diritto Civile. v. 1, § 19, apud Ráo, op. cit., v. 2, n. 287, grifei). Sem negar o direito adquirido em matéria de direito pú- blico - o que contrariaria a letra da Constituição, a dou- trina e a jurisprudência brasileiras - não descabe uma posição restritiva quanto a essa questão. Vale restringir o direito adquirido em matéria de direito público a vanta- gens materiais incorporadas ao patrimônio do servidor e espe~ia~mente direitos resultantes de atos negociais da Admm1stração. Or~, neste pas~o, vem à discussão mais um problema delicado. Ou seJa, pode a cláusula de garantia dos direitos ~dquiridos, bem como do ato jurídico perfeito e da coisa Julgada, ser revogada pelo Poder Constituinte derivado? A ~esp?stAa é,. sem dúv~d~, controvertida no plano teórico. A mex1stenc1a de pro1b1ção expressa, subsidiariamente à tese da dupla revisão anteriormente apontada, leva a uma afirmativa;. a possibilidade de fraude à Constituição, a uma negativa. Mas o direito constitucional positivo brasileiro facilita a solução dessa dúvida. Com efeito, convém lembrar que o art. 60, § 4°, IV, da Carta vigente dispõe: '§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emen- da tendente a abolir: ( ... ) IV - os direitos e garantias individuais'. Ora, ninguém negará ser a norma constante do art. 5º, XXXVI, da Constituição uma garantia, garantia essa da segurança das relações jurídicas. Conseqüentemente ela não poderá ser abolida pelo Poder Constituinte derivado. Observe-se, enfim, que, em face da Constituição brasileira d~ 1988, .cuJo art. 5~, ~XXVI, somente proíbe à lei preju- ~1car o direito adqumdo, o ato jurídico perfeito e a coisa Julgada, não será inconstitucional emenda que, colhendo embora fatos passados, não importe em violar qualquer desses três institutos. Este trabalho) sumário e superficial embora) tem a pretensão de haver demonstrado três pontos essenciais. O primeiro) que os atos do Poder Constituinte originário não são forçosamente retroati- vos) apenas podem sê-lo)· o segundo) que) numa Constituição que 37 38 garante o direito adquirido) o Poder Constit~inte deri~ado é f º: ele. limitado) não podendo eliminá-lo; e) terceiro) a noçao de direi- to adquirido há de ser interpretada restritivamente) para não colher senão vantagens patrimoniais. (Destaque do Autor). E seguramente, por outro lado, demonstrou ele a afirma- ção inicial sobre a extrema complexidade do assunto. Quem sabe, porém, abriu uma vereda a ser explorada, com maior profundidade, com maior sutileza, para a cl~- rificação da questão do direito adquirido, o que trana incontestável contribuição para o direito nacional. " Capítulo V DIREITO ADQUIRIDO E REVOGAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO A Administração Pública não pode revogar ato adminis- trativo sem respeitar os direitos adquiridos gerados pelo ato revogado. A revogação do ato administrativo não prejudica os direitos adquiridos durante a vigência do ato. A razão desse respeito está exatamente na natureza do ato administrativo revogável, que é a de ato administrativo válido, e, em assim sendo, as condições de fato implementadas desde a existênçia do ato até sua revogação, devem ser respeitadas pela administração.1 Nesse sentido já decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal em acórdão assim ementado: "O direito à aposentadoria se considera adquirido pela satisfação de seus pressupostos, antes da vigência de lei nova, modificando-os. "2 1 2 WALD, Arnoldo. Irrevogabilidade da aprovação regular de loteamento, que constitui direito adquirido, cabimento de mandado de segurança - Parecer. Da irrevogabilidade do ato administrativo que criou direito adquirido de acordo com a constituição e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Ato admi- nistrativo. Constituição, Brasil ( 1988). Revista de Processo, São Paulo. v. 17, n. 66, p. 169-174, abr/jun., 1992. Revista de Direito Administrativo) 104: 188. 39 Capítulo VI O DIREITO ADQUIRIDO DO SERVIDOR PÚBLICO Como já se ressaltou alhures, em nada difere o conceito legal de direito adquirido quer no direito público, quer no direi- to privado. Se no direito público o direito adquirido tem sua tutela legal - art. 5°, XXXVI, da Constituição Federal, o qual diz textualmente que "A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfei- to e a coisa julgada," no direito privado o direito adquirido tem seu conceito legal no § 2 ° do art. 6° da Lei de Introdução ao Código Civil, o qual diz textualmente que "Consideram-se direitos adquiri- dos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo de exercício tenha termo pré- fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem." Logo, o servidor público adquire direito que pode ser exercido por si mesmo ou alguém em seu nome, ou cujo começo de exercício tenha prazo pré-fixo ou condição preestabelecida inalterável ad nutum de outrem. 1 1 BRITIO, Carlos Ayres. Regime constitucional dos proventos da aposentadoria do servidor público. Efeito. Aposentadoria. Servidor público. Autarquia. Funda- ção (Direito público). Constituição Federal (1988). Direito adquirido. Juiz. Mi- nistério Público. Cargo público. Direito Administrativo. Revista de Direito Admi- nistrativo, Rio de Janeiro. n. 206, p. 143-164, out. /dez., 1996. 41 No caso brasileiro, se a Constituição não afirma expres- samente a irretroatividade, a uma situação equivalente con- duz a garantia aos direitos adquiridos (art. 5°, XXXVI). Ora, existindo esta limitação, é claro que ela importa limitação ao Poder derivado. Conseqüentemente a norma será inconstitu- cional se retroativa. Esta é a posição que, num importante trabalho escrito antes de haver ascendido ao Supremo Tribunal Federal, susten- ta Carlos Mário da Silva Velloso, com elegância e maestria. Aponta o eminente jurista: "Se é a própria Constituição que consigna o princípio da não-retroatividade, seria uma contradição consigo mes- ma se assentasse para todo o ordenamento jurídico a idéia do respeito às situações jurídicas constituídas e, simultaneamente, atentasse contra este conceito." E conclui: "Um direito adquirido por força da Constituição, obra do Poder Constituinte originário, há de ser respeitado pela reforma constitucional, ptüduto do Poder Constituinte instituído, ou de 2 ° grau, vez que este é limitado, explíci- ta e implicitamente, pela Constituição."2 Concedida a aposentadoria ao servidor público, essa as- sume a natureza jurídica de actus perfectus, restando tutelada pela lei vigente ao tempo de sua concessão, com todas as vanta- gens e direitos que lhe foram atribuídas, Depois disso não pode ser a\terada nem modificada, ainda que haja advento de norma posterior, "sujeitando-sepor inteiro à lei antiga" conforme preleciona o Professor Oswaldo Aranha Bandeira de Mello.3 2 VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Funcionário Público -Aposentadoria - Direi- to Adquirido, RDP 21: 180. 3 BANDEIRA D E MEL LO, Oswaldo Aranha. Princípios de direito administrativo) v. 1, p. 268. 42 Continua de forma mais enfática o ilustrado Professor e Magistrado de São Paulo, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello ' dessa vez invocando a lição de Léon Duguit (1859-1928), afir- mando que são: "insuscetíveis de serem apanhadas pela lei nova não só as situações subjetivas ou individuais, como outrossim os fatos realizados no passado, regidos pela lei em vigor no mome1;-to em que foram produzidos".4 E interessante observar que já nos idos de 29/3/1965, pelo voto do Min. Hermes Lima, o STF assim decidiu: "As vantagens que se integram no patrimônio do funcio- nário são as da lei vigente ao tempo do requerimento da aposentadoria."5 Seguindo a mesma linha jurisprudencial que já se esboça-_ va, o Egrégio TJSP, em 31/8/1971, pelo voto do Des. Cordeiro Fernandes, deixou assentado que: "O princípio do respeito ao direito adquirido constitui, sem dúvida, entre nós, uma das categorias integrantes da concepção filosófica que inspirou a Constituição. O direito à aposentadoria se adquire no momento em que se integram os elementos exigidos por lei para que o funcionário faça jus à sua concessão. ''6 Do mesmo erudito voto ainda se extrai a lição seguinte: "O que o direito transitório protege é o próprio fato aqui- sitivo, cuja eficácia jurídica não pode ser eliminada por uma lei diversa daquela sob a qual ocorreu o fato (Cf. Paul Roubier, Le droit transitoire) 2eme édition, 1960, n. 41, p. 185 et seq. )."7 4 BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Op. cit.) v. 1, p. 285. 5 RTf 32/449. 6 RT442/65. 7 RT 442/65. 43 "Lei posterior que viesse a atribuir ao mesmo fato efeitos diversos, ou lhe recusasse a potencialidade de produzir os efeitos segundo a lei do tempo em que se consumou era apto a produzir (sic), estaria pretendendo, precisamente, a retroatividade que a nossa Constituição declara ilegíti- ma" (RT 442/67).8 No volume Direito Administrativo, reuniu o Prof Fran- cisco Campos, muito dos pareceres com que contribuiu para o enriquecimento do Direito Público no Brasil. Formulou-se ao culto jurista a seguinte indagação: "Na mesma data em que adquiriu direito à aposentado- ria, não adquiriu, ipso facto, o direito aos proventos atribu- ídos à inatividade pela lei em vigor na data em que foi adquirido o primeiro desses direitos?" A resposta de Francisco Campos foi incisiva: " ... o funcionário adquire o direito à sua concessão nos ter- mos e com as vantagens constantes da lei então em vigor."9 "Nesse momento (da concessão da aposentadoria), o fun- cionário adquire um direito contra o Estado, ou o direito de ser colocado na inatividade com as vantagens assegu- radas na legislação em vigor ao tempo em que o direito foi adquirido."10 O ilustre professor mineiro alicerçou o seu parecer nos ensinamentos de Ferrara: "Ogni rapporto e conformato secando la legge del tempo della sua nascita." 8 RT739/86. 9 CAMPOS, Francisco. Direito administrativo, v. II, p. 130-131. 10 Op. cit., V. II, p. 131-132. 44 <71 principio della irretroatività non solo lascia incolumi gli ejfetti esauriti e conserva quelli in corso ma mantiene anche la potenzialità del fato giuridico di produrre ulteriori ejfetti anche sotto il dominio della legge successiva))11 Valeu-se ainda o professor mineiro das lições de Léon Duguit (1859-1928), GastonJeze (1869-1953) e Rafael Bielsa.12 O Min. Alfredo Buzaid, então autor de nosso atual Códi- go de Processo Civil, e já como integrante do STF, em lapidar voto, deixou assim assentado, em 28/6/1984, no RE 95.519-DF. "Parece-me, pois, que o v. acórdão do E. TFR ofendeu o direito adquirido do recorrente. A Constituição da Repú- blica, no art. 153 dos direitos e garantias individuais, dispõe que § 3 ° A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. ' Esta cláusula constitucional, enunciada por tal modo, veio resolver cientificamente o conhecido problema da irretroatividade das leis. Com efeito, todos sabem que a lei é feita para valer para o presente e para o futuro, não devendo, de ordinário, atingir atos ou fatos ocorridos no passado. A doutrina fundamen- ta esta regra geral, apresentando argumentos políticos, so- ciológicos e jurídicos. Diz-se que uma lei vale só para o futuro, justamente porque a sua eficácia nasce depois de sua promulgação. Os romanos expressaram esta idéia com as palavras: Quid cumque Jurisprudencia tematica civil post hanc legem rogatam (Cícero, Pro Rabir, VII, 14; D.35.2.1). Se ela estendesse os seus efeitos aos fatos pretéritos) isso significaria que ela adquiria existência e eficácia quando ainda não existia. Portanto, os atos e fatos passados se regem pela lei sob cujo império 11 Op. cit., p. 133, 137. 12 BITTENCOURT, Mário Diney Corrêa. Aposentadoria de servidor público. Ato jurídigo perfeito. Direito adquirido ... RT739/145-155. 45 ocorreram ou tiveram nascimento (Ferrara, Tratatto di Diritto Civile Italiano, I, 257)".13 Prossegue em sua argumentação o Min. Buzaid: "4. Uma sadia política não consente que o legislador possa destruir o passado, tornando inválidos os atos legitima- mente praticados sob o regime das leis então exi;t~ntes, porque criaria grave incerteza sobre o valor e eficac~a das relações jurídicas, instituiria o perigo permanente da insta- bilidade dos negócios e ludibriaria a esperança dos povos, que confiaram na promessa e na mensagem do legislador (Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil) I/342). O Esta- do, sendo o guardião da ordem jurídica, estaria em contra- dição consigo mesmo, se nas relações jurídicas, bem co~o direitos e obrigações criados sob a proteção de suas leis .e sob a sua garantia, quisesse depois, arbitrariamente, desti- tuir-lhes a eficácia (Ferrara, op. cit.) I/257 et seq. ). Diziam os romanos que absurdum esse~ id quod recte factum es~ ab eo quod nondum eratposteasubverti (Nov. 66, cap. I, § 4°)".14 Continua em seu voto o Ministro relator: 1 "Este problema começou a preocupar a civilização ocidental desde o Direito Romano. Foi sob a legislação do Baixo Impé- rio que o princípio recebeu expressa s~n~ão legal, e~ ~ma constituição dos Imperadores Teodosio e Valentmiano (C.1.14.7).Justiniano repete a norma da irretroatividade das leis em várias novelas, a mais importante das quais é a n. 22, cap. I. A regra passou para a legislação moderna através do Direito Canônico (Decretales Gregorii Papae, IX, c.10) e do Direito Feudal e outros direitos particulares formados na Europa ( Gabba, Teoria della Retroattività delle Leggi. 3. ed., I/ 46 13 RT591/259. 14 RT591/260. 46 et seq.; Limongi França, A Irretroatividade das Leis e o Direito Adquirido, p. 25 et seq. ) recebendo uma vigorosa afirmação nos primórdios do século XIX (Henri de Page, Droit Civil Belge, I/267)."15 O direito adquirido tem sua trajetória histórica iniciada com a Carta Política do Império, de 25/3/1824, em seu Tít. VII, ao dispor sobre as garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, a qual assim dispunha: "Art. 179, § 3°. A sua ( da lei) disposição não terá efeito retroativo". Do mesmo teor era a norma do art. 11, 3°, da Constitui- ção da República, de 24/2/1891, a qual vedava aos Estados e à União "prescrever leis retroativas". Por seu turno, a Constituição de 16/7 /1934, em seu art. 113, 3, assim dispôs: "A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada". A Carta Outorgada de 1937 é omissa, no que é compreensí- vel, diante da natureza do regime que então se instalou no País. A Constituição de 1946, que foi o marco por excelência da redemocratização do país, em seu art. 141, § 3 °, repete o texto de 1934. Não puderam trilhar outra rotaa Constituição de 1967 e Emenda n. 1 de 1969. Por fim a Constituição, de 5/10/1988, respeitou a tradição do Direito Brasileiro, em seu art. 5°, XXXVI: "a lei não prejudica- rá o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada." Não se pode olvidar que, para evitar que o ato de legislar se transforme em instrumento de opressão e anarquia, o princí- pio da não-retroatividade exclui a possibilidade de a lei nova vir a ser elemento de desordem, ferindo injustamente situações consolidadas, nascidas sob o império da lei anterior, trazendo ao contrário do que dita a natureza da lei, uma verdadeira intranquilidade à sociedade que rege. 15 RT 591/260. Apud BUZAID, Alfredo. RT 591/257. 47 Veja a propósito a lição de Paulo Dourado Gusmão, em seu livro Introdução ao Estudo do Direito, verbis: "Constitui perigo para a segurança jurídica, ameaçando permanentemente as garantias .individuais, a P:ópria ?r- detn social e os interesses públicos, sendo motivo de m- certeza para as relações jurídicas."16 É também Paulo Dourado Gusmão que ensina haver sido o eminente jurista italiano Gabba: "quem precisou a noção dos mesmos (os direit~s a"dquiri- dos) como sendo o direito que faz parte do patnmomo de uma pessoa, por força da lei, ou de fato voluntário verifi- cado na vigência da lei derrogada, cujos efeitos podem produzir-se ainda no futuro, quando a lei que o constitui já tiver sido abolida."17 Ainda sobre o tema, disserta o ilustre professor: "Procurando fugir às dificuldades criadas pela noção de direito adquirido, alguns juristas preferiram substituí-la pela de 'fato perfeito'. Nesse sentido, a nova lei não deve regular os fatos realizados na vigência da lei abolida.. , A teoria dos fatos consumados parte, portanto, do prmc1- pio de que todo fato jurídico, realizado na vigência. de uma lei, será por ela regulado, mesmo no caso de vir a produzir efeitos sob o império de outra lei."18 Defendendo a mesma tese o Prof. Daniel Coelho de Souza, da Universidade do Pará, em seu livro Introdução ao estudo do Direito, 19 discute a teoria dos direitos adquiridos, seu prestígio na 16 GUSMÃO, Paulo Dourado. Introdução ao estudo do direito> p. 164. 17 Op. cit.) p. 164-165. 18 Op. cit.) p. 165. . . , . . , . 19 SOUZA, Daniel Coelho. Introdução ao estudo de direito: tecmca JUnd1ca, p. 379. 48 obra de Lassale, Gabba e Baudry-Lacantinerie. Faz observações sobre os que a criticam, mas não deixa de concluir: "Lei nova, versando sobre situação jurídica objeto de lei anterior, aplica-se até onde não importe ofensa ao direito adquirido".2º Veja ainda a respeito do atraente tema a doutrina do Prof. Paulino Jacques. Com apoio nos ensinamentos do Min. Carlos Maximi- liano (1873-1960), escreve o Prof. Paulino Jacques, sobre a irretroatividade das leis, em seu Curso de Introdução à Ciência do Direito, Forense, 1967, verbis: "Na antiguidade oriental, nomeadamente no direito chi- nês e hindu, a regra geral era a de retroatividade da lei, mesmo que prejudicasse, porque, sendo ela a expressão da vontade e do interesse do monarca, o seu campo de inci- dência não tinha limites nem temporais nem espaciais. Com o advento do Estado de direito - obras da revolução anglo-franco-americana (1689-1789-1776) - o princípio da irretroatividade foi elevado à categoria de norma cons- titucional". 21 Repete Paulino Jacques a conhecida frase atribuída a Maximilien Robespierre (1758-1794) de que o efeito retroativo dado à lei é um crime. O Prof. Washington de Barros Monteiro,22 ensina a res- peito do tema direito adquirido, ad litteram: "A lei é expedida para disciplinar fatos futuros. O passa- do escapa a seu império. O princípio da não-retroprojeção constitui um dos postulados, que dominam a legislação contemporâ- 20 Op. cit.) p. 415. RT739. 21 JACQUES, Paulino. Cursodeintroduçãoàciênciadodireito. Rio de Janeiro: Forense, 1967, p. 114. 22 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civi~ v. 1, p. 31. 49 nea. Na frase de Grenier, esse princípio é a própria moral da legislação)) Dissertando sobre o princípio da irretroatividade das normas, escreveu Washington de Barros Monteiro: "Esse princípio chegou outrora a ser considerado de di- reito natural, corresponde a uma justiça superior. Bartolo não hesitou em dizer que, embora com preceito expresso em contrário, não podiam as leis projetar seus efeitos no passado. " Prossegue, em sua exposição, o insigne magistrado e pro- fessor, no pertinente às leis retroativas: "Walker, citado por Barbalho, afirmava que leis retroati- vas só tiranos as fazem e escravos se lhes submetem. A retroatividade, proclamou-a Benjamin Constant, arreba- ta à lei seu caráter; lei que retroage não é lei . ... Efetivamente, sem o princípio da irretroatividade, inexistiria qualquer segurança nas transações, a liberdade civil seria um mito, e estabilidade patrimonial desapare- ceria e a solidez dos negócios seria sacrificada, para dar lugar a um ambiente de âpreensões e incertezas, impreg- nado de intranqüilidade e altamente nocivo aos superio- res interesses do indivíduo e da sociedade. Seria a nega- ção do próprio direito, cuja específica função, no dizer de Ruggiero-Maroi, é tutela e garantia".23 Sobre direito adquirido assim já ponderou]. X. Carvalho de Mendonça: "A lógica e a justiça exigem que as leis regulem s?mente as relações jurídicas que surgirem no futuro. E regra 23 Op. cit.) V. 1, P· 31-33, 50 fundamental, garantia de liberdade e dos direitos patrimoniais do indivíduo, a sobrevivência da lei antiga para regular os atos já realizados ou em curso ao tempo da lei nova". 24 Comentando o art. 153, § 3. o, da EC n. 1, de 1969, escreveu o Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho: "Este dispositivo tem por objetivo dar segurança e certeza às relações jurídicas, conseqüentemente aos direitos assu- midos pelos indivíduos. ( ... ) Haveria gravíssima insegurança, a ameaçar os próprios fundamentos da vida social, se tais atos pudessem ter a sua validade, a qualquer tempo, reposta em discussão, se a decisão dos tribunais sempre pudesse ser impugna- da e reimpugnada, se a existência dos direitos fosse a cada passo renegada. Tal ocorreria se se admitissem leis retroativas. Os atos normativos primários não podem aplicar-se a fatos e atos já passados, produzirão efeitos apenas para o futuro". 25 Os únicos a negar a prevalência do direito com assento no princípio da irretroatividade da lei são os partidários do Estado Forte numa tentativa vã de aviltá-lo ou mesmo aniquilá- lo. Por isso mesmo é que os totalitarismos, mesmo antagônicos, dão as mãos em única corrente. Os prosélitos dos regimes de força demonstram instintiva ojeriza à teoria dos direitos adqui- ridos. No Brasil, o exemplo histórico dessa aversão pode ser deduzido do silêncio sepulcral da Carta de 1937, quando dei- xou de cuidar do direito adquirido. 24 CARVALHO DE MENDONÇA,]. X. Tratado de direito comercial> v. 1, p. 214. 25 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira> v. 3, p. 77-78. 51 Logo,, com assento tanto na doutrina mais abalizada qµanto 11a, mais moderna teoria, implementadas as condições d.e fato para aquisição do direito, esse torna-se um actus perfectus (Oswaldo Aranha Bandeira de Mello), criando para o titular o direito adquirido à situação jurídica constituída sob o império da lei ent.ão vigente. 52 Capítulo VII SÚMULAS EJURISPRUDÊNCIA Súmula n. 473 do STF - A administração pode anular seus próprios atos,. quando eivados de vícios que os tornam ile- gais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direit.os adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. Súmula n. 359 do STF - Magistrado - Aposen.tadoria voluntária - Expeáativa de direito e direito adquirido - Proventos da inatividade - Sujeição à lei do tempo em que o servidor público, tendo satisfeito os necessáriosrequisitos, re- quereu a medida declaratória. Recurso não provido. - Aposentadoria - Direito adquirido - Se, na vigência da lei anterior, o funcionário preenchera todos os requisitos exigi- dos, o fato de, na sua vigência, não haver requerido a aposenta- doria não o faz perder o seu direito, que já havia adquirido. Ementa: Recurso extraordinário. Lei n. 7.730/89. Plano Verão. Reajuste de 26j 05%. Direito adquirido. Inconstitucio- nalidade. 1. O Plenário desta Corte reiterou o entendimento de que não há direito adquirido a vencimentos de funcionári- os públicos, nem direito adquirido a regime jurídico instituí- 53 do por lei. Em se tratando de norma de aplicação imediata, esta não alcança vencimentos já pagos, ou devidos pro labore facto. 2. Reajuste de salário pela variação da URP (26, 05%), a ser computada no mês de fevéreiro de 1989. Direito adquirido e conseqüente inconstitucionalidade inexistentes. Recurso ex- traordinário conhecido e provido. Partes (Recte.: Banco Eco- nômico S/ A. Advdos.: José Maria de Souza Andrade e outros Recdo.: Sindicato dos Bancários da Bahia Advdos.: José Eymard Loguércio e outros). Servidor público - Tempo de serviço - Legislação estadu- al que admitia o côtnputo do tempo de serviço prestado a esta- belecimento particular de ensino, para os efeitos de aposenta- doria e disponibilidade - A lei posterior, que revoga essa conta- gem, não pode retroagir para suprimi-la em relação aos que adquiriram esse direito ao cômputo, na vigência da legislação permissiva - Direito adquirido - Precedentes do Supremo Tri- bunal Federal - Recurso extraordinário conhecido e provido em parte - Provido em parte (RTJ v. 86-03, p. 689). Ementa: Constitucional - Administrativo - Servidor pú- blico - Estado de Santa Catarina - Estabilidade financeira - Direito Adquirido. I -A estabilidade financeira do servidor público, que não se confunde com o instituto da agregação, não é ofensiva ao princípio constitucional da vedação de vinculação ou equipara- ção de vencimentos: ADin 1.264-SC, Pertence; RE 88.896-MG, M. Alves, RT]98: 758. n - Os servidores, mediante a satisfação de requisitos inscritos em lei, são titulares do direito à estabilidade financei- ra. Lei posterior pode, é certo, extinguir ou transformar os car- gos ou funções que vinham sendo exercidos ou que foram exer- cidos pelos servidores, não, entretanto, afrontar o direito destes. III - R. E. não admitido. Agravo não provido. (Agte.: Esta- do de Santa Catarina. Agdo.: Mauro da Silva e outros). 54 Ementa: Constitucional - Administrativo - Militar - Gratificação incorporada - Direito adquirido. I - Gratificação incorporada aos proventos, por força de lei. Sua redução ou extinção, por ter sido absorvida numa poste- rior majoração de vencimentos e de proventos. Inexistência de direito adquirido, na forma da jurisprudência do STF. II - Ressalva do ponto de vista pessoal do relator em sentido contrário. III - R. E. conhecido e provido. (STF. Relator Min. Carlos Mário Velloso. Partes: Recte.: União Federal. Recdo.: Edgard Baptista de Mattos e outros). Ementa: Constitucional - Administrativo - Servidor pú- blico - Estado de Santa Catarina - Estabilidade financeira - Direito adquirido. I - A estabilidade financeira do servidor público, que não se confunde com o instituto da agregação, não é ofensiva ao princípio constitucional da vedação de vinculação ou equipara- ção de vencimentos (STF, Relator Ministro Carlos Velloso, ADin 1264-SC, Pertence; RE 88.896-MG, M. Alves, RTJ98/758). II - Os servidores, mediante a satisfação de requisitos inscritos em lei, são titulares do direito à estabilidade financei- ra. Lei posterior pode, é certo, extinguir ou transformar os car- gos ou funções que vinham sendo exercidos ou que foram exer- cidos pelos servidores, não, entretanto, afrontar o direito destes. III - R. E. não admitido. Agravo não provido. (Partes agte.: Estado de Santa Catarina. Agdos.: leda de Araújo Figueiredo e outros. Advdos.: Marcelo Azevedo dos Santos e outros). Ementa: Não fere direito adquirido de policiais militares inativos a lei estadual que suprime o pagamento de "indenização de representação", mediante a incorporação, ao soldo, do respec- tivo valor, em cruzeiros. Recurso extraordinário de que se conhe- ce, e a que se dá provimento por haver o acórdão recorrido, no reconhecer o suposto direito adquirido, violado o art. 153, § 3 °, da Constituição de 1967 (Supremo Tribunal Federal. Ministro Rel. Min. Octavio Gallotti, RT_h v. 1646-3, p. 429). 55 Ementa: 1. Promoção ou qualquer vantagem prevista na carreira do funcionário público não constitui direito ad- quirido enquanto não subjetivada. Extinta a carreira, não se pode cogitar de. direito à promoção ou vantagem se esta não foi atribuída ao sujeito. 2. Lei de introdução ao Código Civil, art. 6, § 2 °. 3. Expectativa de direito. 4. Agravo regimental a que o STF nega provimento. (STF Proc.: Ag53498 -Ag. de inst. ou de petição - São Paulo. Relator: Ministro Antonio Neder. Julgamento: 1973/8/31 - Segunda turma. D] 19/10/73). - Aposentadoria - Direito adquirido - Se, na vigência da lei anterior, o funcionário preenchera todos os requisitos exigidos, o fato de, na sua vigência, não haver requerido a aposentadoria não o faz perder o seu direito, que ja havia adquirido -"' Embargos recebidos - Alteração da Súmula 359, para se suprimirem as palavras, inclusive à apresentação do requerimento, quando a inatividade for voluntária - STF - Proc.: ERE 72509 classe: ERE - embargos em recurso extraordinario. Uf/País: PR - Paraná. Relator: Ministro Luiz Gallotti. julgamento: 1973/2/14 - Tribu- nal pleno. Publicações: D] 30/3/73 p. 1921; ement v. 904-01, p. 285, RI]; v. 64-03, p. 408. Observação: Conhecidos por maioria e recebidos por unanimidade, os atos administrativos de que resul- tam direitos, a não ser quando expedidos contra disposição ex- pressa de lei, são irrevogáveis. (STF Proc.: MS 12512 - Mandado de Segurança - Distrito Federal. Relator: Ministro Lafayette de Andrada - Julgamento: 1964/7 /22, publicações: D] 1/10/64 p. 3543, ement; v. 596-01, p. 296. Observação: Por maioria - Resul- tado: Concedido). Ementa: Funcionário público - Aposentadoria - Se na vigência da lei anterior o servidor (no caso magistrado) preen- chera todos os requisitos exigidos, o fato de na sua vigência não haver requerido a aposentadoria não o fez perder o seu direito que já estava adquirido. Recurso extraordinário conhecido tnas não provido. (STF-Rtl v. 48-01, p. 392). 56 A Administração pública pode rever os próprios atos; o que não pode é, com isso, violar os direitos adquiridos (RDA, 47: 72). Preenchidas as condições previstas em lei, o funcionário público adquire o direito à aposentadoria (RDA, 109: 112). O direito à aposentadoria se considera adquirido pela satisfação de todos os seus pressupostos, antes da vigência de lei nova, modificando-os (RDA, 104: 188). O funcionário público adquire direito à aposentadoria com a satisfação de seus pressupostos ainda que a requeira após o advento de lei nova que os modifique (RDA, 111: 191). Acidente do trabalho - Lei n. 8.213/91 - Vigência - Retroação a 5 de abril daquele ano - Inadmissibilidade - inconstitucionalidade do seu art. 145. A retroatividade prevista no art. 145, caput, da Lei n. 8.213/91 é constitucionalmente vedada, porque agressora do direito adquirido à equivalência salarial. 2 ° Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Ap. s/ Rev: 344.872 - 4ª Câm. - Rel. Juiz Rodrigues da Silva- ].26/7/93,]TA (LEX) 150: 321). Acidente do trabalho - Servidor público federal - Siste- ma protetivo - Evento ocorrido quando protegido pela Lei n. 6.367 /76 - Posterior incorporação ao serviço público federal - Irrelevância - Direito adquirido à aplicação da lei vigente na data do infortúnio. Se à época do acidente o obreiro estava sob a proteção acidentária da Lei n. 6.367/76, este é o regime jurídico que deve orientar a concessão do benefício,pouco importando sua poste- rior incorporação ao Serviço Público Federal por disposição da Lei n. 8.162/91. Assim sendo, o INSS é parte legítima para figurar no pólo passivo da demanda e descabida a denunciação da lide à União Federal. (2 ° Tribunal de Alçada Cível de São Paulo Ap. s/Rev. 405.878 - 11 ª Câm. - Rel. Juiz Clovis Castelo - J.23/6/94 Acervo Jurídico para Informa 4 For Windows, Edição 13). 57 Locação - Contrato - Trato sucessivo - Superveniência do plano real - Aplicação imédiata. Em contrato de execução continuada é admissível a inci- dência de lei nova que altere a substância da moeda desde que não seja vulnerado o ato jurídico perfeito e o dieito adquirido. (2° Tribunal de Alçada Cível de São Paulo MS 435.207 - 2ª Câm. - Rel. Juiz Batista Lopes - 7 /8/95 Acervo Jurídico para Informa 4 For Windows, Edição 13). Recurso - Preparo - Intimação da sentença anterior à Lei n. 8.950 de 13/12/94 - Deserção relevada Intimado da sentença na vigência do sistema anterior à Lei n. 8.950/94, ao réu assegura-se o direito adquirido de ter processado seu recurso segundo as regras do sistema anterior, incluídas as do preparo, e não segundo as regras novas. (2 ° Tribunal de Alçada Cível de São Paulo Ap. s/ Rev. 440.473 - 4ª Câm. - Rel. Juiz Celso Pimentel - J.21/11/95 Acervo Jurídico para Informa 4 For Windows, Edição 13). Locação - Direito de preferência - Contrato registrado antes da vigência da Lei n. 6.698/79 - Direito adquirido reco- nhecido - Inaplicabilidade do§ l O do art. 25 da Lei n. 6.649/79. -A exigência contida no§ 1 ° do art. 25 da Lei n. 6.649/79 não incide sobre o contrato' de locação levado a registro anteriormente à vigência da Lei n. 6.698/79, que acrescentou o referido parágrafo ao artigo citado. A lei não pode prejudicar o direito, em face do disposto no art. 153, § 3° da CF. Em tal circunstância, o direito real de preferência do locatário na aqui- sição do imóvel locado torna-se· exercitável de acordo com o disposto no caput do art. 25 da Lei do Inquilinato. (2 ° Tribunal de Alçada Cível de São Paulo Ap. 145.949 - 3ª Câm. - Rel. Juiz Roberto Grassi - J.22/6/82, ]TA (RI) 77: 283. Referência: Paul Roubiep - Le Droit Transitoire, págs.304/305 Paulo De Lacerda - "Manual", págs.138/139 e 142). Ementa: Militar - Promoção - Ato de bravura. A promo- ção do militar por ato de bravura, prevista nos arts. 48, 49 e 50, 58 da Lei n. 5.940/69, constitui direito adquirido do servidor e, uma vez demonstrado o suporte fático pela comissão de sindicância, com o reconhecimento do direito à promoção não pode o administrador público negar o benefício. (TJPR, Ap; n. : 10418-Rel.: Des. Walter Borges Carneiro, 4ª Câmara Cível, Acer- vo Jurídico para informa 4 for windows, edição 13). Ementa: Ação rescisória - Funcionário público estadual - Gratificação pela prestação de serviço extraordinário - Incor- poração aos proventos da inatividade - Aplicação da Lei n. 6.794/76 - Direito adquirido. Colhe-se dos autos que o réu preencheu todos os requisitos previstos em lei, para fazer jus a incorporação que lhe foi deferida no julgado que o autor objeti- va desconstituir - Dita lei poderia, como sucedeu, ser irtterpre- tada retroativamente, considerando que o servidor aposentado anteriormente à entrada em vigor da lei, já se encontrava na situação por ela prevista. Ação improcedente (Ação rescisória n. 2236 - Relator: Des. Plínio Cachuba, Acervo Jurídico para Infor- ma 4 For Windows, Edição 13). Direito adquirido por força da Constituição) obra do Poder Cons- tituinte originário) há de ser respeitado pela reforma Constitucional) produto do Poder Constituinte instituído) ou de segundo grau) uma vez que este é limitado e condicionado pela Constituição. 1 Ementa: Certidão negativa de débitos - CND - Receita Federal e INSS - Pessoa jurídica alienante - Direito adquirido""'" Ato complexo - Tempus regit actum - Princípio de inscrição - Fonte: 035714-0/0 - Data: 24/2/97 - Localidade: Osasco - Relator: Márcio Martins Bonilha - Legislação: Lei n. 8.212/91. 1. O título notarial lavrado anteriormente à Lei da Previ- dência Social, em que é alienante pessoa jurídica, quando leva- do a registro acarretará a necessidade de apresentação da CND 1 CRETELLAJÚNIOR,José.Jurisprudência administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 76. 59 do INSS e da Receita Federal, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal do serventuário. 2. O registro sendo ato complexo ( título somado a registro), somente gerará direito adquirido se decorrido por inteiro, com todos os seus elemen- tos constitutivos, na pendência da lei a que é contemporânea: tempus regit aâum. 3. A CND do INSS poderá ser dispensada se o Instituto figurou no título como anuente à venda. Ementa Oficial: Registro de Imóveis,... Dúvida - Escritu- ra de venda e compra lavrada no ano de 1986 - Apresentação a registro na vigência da Lei n. 8.212/91 - Necessidade de apre- sentação de certidão negativa de débitos junto à Receita Federal - Inexistência de direito adquirido, em ato complexo não con- sumado por inteiro - Aplicação da lei vigente ao tempo do registro .e: Registro inviável - Recurso improvido.2 STF - Execução - Penhora - Imóvel residencial - Aplica- ção da Lei n. 8.009 /90 para tornar o bem impenhorável - Admissibilidade, pois antes da alienação do imóvel o credor só tem a mera expectativa de direito - Inexistência de ofensa ao direito adquirido.3 STJ - Fraude à Execução - Inocorrência - Ausência de regis- tro no cartório competente da penhora incidente sobre o imóvel - Inexistência de má-fé do adquirente, uma vez não demonstrado que este tinha ciência da constrição sobre o bem adquirido.4 STF - Contrato - Avença que se submete à legislação vigente na época de sua celebração - Atojurídico perfeito prote- gido pelo princípio do direito adquirido - Inteligência do art. 5°, XXXVI, da CF. Contrato - Aplicação de lei nova sobre os efeitos futuros de avença preexistente - Inadmissibilidade - 2 Site da Internet www. webvoice. com. sosforense 3 Site Jurídico www.rt.com.br 4 Site Jurídico www.rt.com.br 60 Cláusula constitucional que tutela a intangibilidade das situa- ções jurídicas consolidadas - Contrato - Intervenção do Estado no domínio econômico em face de lei de ordem pública superveniente à avença - Motivo que não justifica o desrespeito estatal à CF, por tratar-se de ato jurídico perfeito protegido por norma constitucional -Aplicação da norma do art. 5°, XXXVI, da Carta Política - Caderneta de poupança ~ Contrato de depó- sito - Celebração antes da vigência da Lei n. 7.730/89 - Irretroatividade - Inteligência do art. 5°, XXXVI, da CF.5 STF - ICMS - Isenção - Acordo entre contribuinte e União celebrado sob o pálio da Constituição pretérita - Benefí- cio que não pode ser revogado pela atual Carta Magna - Exis- tência de direito adquirido por tratar-se de isenção de natureza contratual - Inteligência do art. 41, § 2°, do ADCT e art. 5°, XXXVI, da CF.6 STF - Contrato Administrativo - Reajustamento de pre- ço - Edição de norma retroativa alterando suas regras em bene- fício de particular - Admissibilidade - Princípio do direito ad- quirido que não constitui causa de impedimento da medida - Ausência de ofensa ao art. 5°, XXXVI, da CF.7 TJPR - Mandado de Segurança - Impetração contra ato de Prefeito - Revogação de lei que concedia isenção de impostos por determinado lapso temporal - Admissibilidade da via da segu- rança, tendo em vista a violação ao princípio constitucional do direito adquirido - Mantida a sentença que concedeu a segurança - Inteligência dos arts. 5°, XXXVI; da CF e 178 do CTN. 8 TRF - Servidor Público - Vencimentos - Exclusão das vantagens pessoais para fins do teto constitucional - Irretroati- 5 Site Jurídico www.rt.com.br 6 Site Jurídico www.rt.com.br 7 Site Jurídico www.rt.com.br 8 Site Jurídico www.rt.com.br 61 vidade da Lei n. 8.852/94, que não pode atingir quem já tenha adquirido direito a tal exclusão
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