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Psique_A necessidade de ser especial

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Promoção e Realização: Instituições Parceiras: www.cbpabp.org.br
Organização
SECRETARIA EXECUTIVA XXXIV CBP: 
Associação Brasileira de Psiquiatria - ABP
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Instituições Parceiras:
A liada à:
Associação médica Brasileiraapal
ABP nas mídias sociais:
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Primeira comunicação
CONGRESS & EVENTS
BLUMAR
Agência o cial ApoioAfiliada à: Agência oficial:
Sem título-5 1 12/08/2019 18:01
editorial
Notam-me, logo, sou amado!
Gláucia Viola, editora
“A atenção é a mais importante de todas as faculdades para o 
desenvolvimento da inteligência humana.”
Charles Darwin 
M
uitos leitores com certeza lembram de um passado não muito distante em que suas 
avós repetiam: “quer aparecer pendura uma melancia no pescoço”. Hoje a frase per-
deu completamente o tom irônico, afinal a ordem é realmente ser notado. E para 
isso vale usar melancias ou o que for necessário para se mostrar! É um fenômeno 
recente que nasceu na cola do advento da internet e, principalmente, da moda dos youtubers. 
É impressionante como é possível encontrar canais de tudo que é tipo, para todos os gostos, 
curiosidades e desejos de informações. São inúmeros “experts” em culinária, moda, fi-
nanças, comportamento, literatura, relacionamento, jogos, piadas e assuntos dos mais 
variados. O termômetro para avaliar se o canal tem relevância está no número de 
curtidas que ele possui. O conteúdo é um coadjuvante na história. O que vale 
estar sob os holofotes é a quantidade, não a qualidade. No cenário atual ve-
mos o mesmo fenômeno acontecer em outras redes sociais em que os likes 
acentuam o grau de felicidade e sucesso na vida de uma pessoa e massageiam 
o ego. Inicia-se, assim, um vicioso círculo de prazer que precisa ser alimentado, 
criando a dependência no esforço por atenção. 
O artigo de capa desta edição da Psique Ciência&Vida debate esse com-
portamento trazendo uma investigação aprofundada de questões surgidas 
ainda na infância. Para a Psicanálise, a necessidade de chamar atenção do 
outro passa a ser a tentativa de preencher a lacuna gerada lá trás. Segundo 
Freud, a criança ao nascer se depara com uma sociedade neurótica e vai se mol-
dando a essa neurose. A atitude verificada na sociedade moderna de querer ser incessantemente 
admirada é tão somente a busca pelo amor do outro, uma procura pela sensação de valorização 
e pertencimento. Porém, o texto também alerta para o paradoxo de que quanto mais tempo 
conectadas, mais insatisfeitas as pessoas ficam com suas próprias vidas. Pesquisas realizadas em 
universidades americanas mostraram que o ato de comparar a exposição de outra pessoa com 
a sua própria vida estimula o aparecimento de sentimentos de menos valia, incompetência e 
baixa autoestima. A pesquisadora Brené Brown diz que “nascemos para a conexão com o outro, 
mas no decorrer de nossos caminhos essa conexão é rompida e a responsável é a consciência 
de vergonha que carregamos em não nos perceber suficientes bons”. Isso cria uma sensação de 
vulnerabilidade, e a alternativa é justamente a perseguição pela aceitação do outro. Um preen-
chimento feito de forma um tanto quanto frágil, mas momentaneamente eficaz.
Boa leitura! 
Gláucia Viola
www.facebook.com/PortalEspacodoSaber
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CAPA
sumário
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ENTREVISTA
Caroline Arcari revela que mais 
de meio milhão de mulheres são 
vítimas de violência sexual no Brasil, 
e as estatísticas de tratamento 
são irrelevantes para esse número
SEÇÕES
05 NA REDE 
06 NEUROCIÊNCIA
16 IN FOCO 
 18 PSICOPOSITIVA
20 PSICOPEDAGOGIA
22 RECURSOS HUMANOS
32 COACHING 
34 LIVROS
46 PSICOLOGIA JURÍDICA 
64 DIVÃ LITERÁRIO
66 CINEMA
70 PSICOLOGIA SOCIAL
72 UTILIDADE PÚBLICA 
76 PERFIL 
80 EM CONTATO
82 PSIQUIATRIA FORENSE
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É preciso 
ser notado
A importância de ser 
especial numa sociedade 
que valoriza a ostentação 
da felicidade para se 
conectar ao amor do outro
MATÉRIAS
24
DOSSIÊ: Idealizar 
de forma saudável
Não é possível viver uma vida 
sem expectativas, mas é preciso 
tomar cuidado para não gerar o 
fenômeno da ansiedade patológica
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08 O que há por 
trás da fofoca
Para a Psicologia, o 
comportamento de falar dos 
outros pode revelar mais sobre 
o autor do que sobre a vítima
Querido mestre 
A personalidade do educador 
é um dos fatores que mais 
infl uenciam na aprendizagem, pois 
trata de dois temas controversos: 
Psicologia e Educação
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TDAH em pauta
Um transtorno de difícil 
diagnóstico, mas que ainda 
carrega muitos rótulos, como a 
generalidade com que é tratado
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na rede por Nicolau José Maluf Jr.
Nicolau José Maluf Jr. é psicólogo, analista reichiano, doutor 
em História das Ciências, Técnicas e Epistemologia (HCTE/
UFRJ). Contato: nicolaumalufjr@gmail.com
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ELAS NÃO AGEM POR CONTA PRÓPRIA E SUA 
MANIPULAÇÃO FORNECE PODER QUANTO À PRODUÇÃO 
DE SUBJETIVIDADES, PORTANTO SUA RELAÇÃO DE 
CAUSALIDADE É COLOCADA EM QUESTÃO
AS REDES SÃO SOCIÁVEIS?
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o dicionário, o signifi cado do adjetivo “sociá-
vel” é: “próprio para viver em sociedade; que tende 
para a vida em sociedade. De convívio agradável; 
civilizado, urbano, afável: caráter sociável e 
generoso. Que consegue viver socialmente, seguindo regras 
e práticas de convivência”.
Vendo esse conceito, pode-se dizer que as redes são mesmo 
sociáveis? A resposta obviamente é não.
Uma postagem recente no Twitter é útil e vale a pena 
reproduzi-la:
“...Leitor pergunta como seguir saudável nesta maré de obs-
curantismo. Sugiro a sabotagem: ler literatura, assistir a bons 
fi lmes, frequentar exposições de arte, ir à roda de samba, dan-
çar forró, amar. Cultivar subversiva alegria. Contra a pulsão de 
morte, só a anarquia da felicidade...”
Mesmo não concordando que exista pulsão de morte, en-
tendo o que ele propõe e quer dizer. Estaríamos vivendo tem-
pos sombrios. E seguindo a narrativa, podemos inferir que o 
antídoto “alegria e felicidade” diga respeito também às formas 
de relação carregadas de desrespeito e ódio até inclusive (ou 
principalmente) nas redes.
É verdade que, do ponto de vista sociológico, as redes sociais 
retiraram dos grandes meios de comunicação a hegemonia da 
“informação” – colocada entre aspas – e isso não deixa de ter 
um aspecto meritório, benigno, na onda da valorização da orga-
nização espontânea da sociedade civil opondo-se à dependên-
cia exclusiva dos meios institucionais como gerenciadores das 
demandas e necessidades da sociedade.
Mas há também um ciclo pernicioso: posturas e manifesta-
ções esdrúxulas de entes públicos são toleradas e defendidas em 
redes sociais. Os defensores aprovam agressões e preconceitos 
na forma e conteúdo, e o fazem usando não somente linguagem 
virulenta, mas também favorecendo estigmatizações. Isso, por 
sua vez, legitima o ente público. As redes tornam-se assim “ins-
titutos de pesquisa” cotidianos.
Assim se forma o “novo normal”, em queo ódio e a into-
lerância tornam-se lugares-comuns. Não é “direita-esquerda”, 
“conservador-progressista” o elemento central, portanto.
Obviamente as redes sociais não agem por conta própria 
elas mesmas, e sua manipulação fornece poder quanto à pro-
dução de subjetividades só equiparado à propaganda na Ale-
manha nazista.
Mas é novamente a relação de causalidade que é coloca-
da em questão. Seria raso e ingênuo pensar que a virulência 
manifesta nas redes é simplesmente consequência. Assim como 
seria raso e ingênuo adotar um conceito como o da pulsão de 
morte, que seria uma espécie de “pecado original” constituinte 
do psiquismo, como explicação para a espontaneidade das ma-
nifestações de virulência.
na rede
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neurociência por Marco Callegaro
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Efeitos psicológicos 
da NUTRIÇÃO
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PSICOLÓGICOS 
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DOS HÁBITOS 
NUTRICIONAIS
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da NUTRIÇÃO
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da da da NUTRIÇÃONUTRIÇÃONUTRIÇÃO
Efeitos psicológicos 
da NUTRIÇÃO
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LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO LONGA DURAÇÃO 
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EFEITOS EFEITOS EFEITOS EFEITOS EFEITOS EFEITOS EFEITOS 
PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS PSICOLÓGICOS 
SUBJETIVOS SUBJETIVOS SUBJETIVOS SUBJETIVOS SUBJETIVOS SUBJETIVOS SUBJETIVOS 
DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS DOS HÁBITOS 
NUTRICIONAISNUTRICIONAISNUTRICIONAISNUTRICIONAISNUTRICIONAISNUTRICIONAISNUTRICIONAIS
ESTUDO DE 
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frutas e vegetais podem afetar o nível 
de felicidade é através de seus efeitos 
antioxidantes. O estudo apontou uma 
conexão entre o consumo de alimentos 
ricos em antioxidantes e o traço psicoló-
gico do otimismo, que é extremamente 
protetor na saúde mental. A depressão 
e a ansiedade se ampliam quando está 
instalada a desesperança e uma visão ne-
gativa do futuro, e são combatidas pela 
esperança e otimismo.
Segundo os pesquisadores, a introdu-
ção de um consumo de cerca de sete ou 
oito porções de frutas e vegetais por dia 
causa um aumento do bem-estar mental 
da mesma magnitude que eventos nega-
tivos, como um divórcio, só que este fun-
ciona empurrando as pessoas para o ou-
tro lado, para um estado depressivo. Em 
outras palavras, o efeito positivo das oito 
porções de frutas e vegetais diários pode 
contrabalançar eventos estressores, como 
o estresse produzido pela experiência de 
uma separação na balança do humor. 
Outro evento psicologicamente nega-
tivo estudado foi a condição de estar de-
sempregado, que tem um efeito bastante 
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NUTRIÇÃO 
ADEQUADA PRODUZ 
UM PODEROSO 
IMPACTO NO 
AUMENTO DO BEM- 
-ESTAR SUBJETIVO 
E NA REDUÇÃO 
DA DEPRESSÃO 
E ANSIEDADE
Marco Callegaro é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento, 
diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto 
Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo 
Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o 
Modelo do Processamento Mental (Artmed, 2011).
Referências: 
Neel Ocean, Peter Howley, Jonathan Ensor. Lettuce be happy: a longitudinal UK study on the 
relationship between fruit and vegetable consumption and well-being. Social Science & Medicine, 
v. 222, p. 335-345, fev. 2019. 
R
ecente pesquisa realizada na 
Inglaterra e Escócia apontou 
claramente que o consumo de 
mais frutas e vegetais está liga-
do a um menor risco de depressão e de 
ansiedade, que são de longe os trans-
tornos mentais que mais afligem a hu-
manidade atualmente.
Essa pesquisa foi realizada todos os 
anos desde 2001 e abrangeu mais de 7 
mil pessoas, que foram questionadas so-
bre sua dieta e estilo de vida. O estudo 
concluiu que existe uma relação inversa 
entre a probabilidade de uma pessoa ser 
diagnosticada com problemas de saúde 
mental e o consumo de frutas e verdu-
ras. Por exemplo, quanto mais frutas e 
verduras as pessoas comiam, menos ti-
nham depressão. 
Os investigadores procuraram estabe-
lecer conexões entre os padrões alimen-
tares e o impacto de eventos de vida na 
saúde. A ideia era testar a hipótese de que 
os alimentos podem compensar o impac-
to de grandes eventos da vida, como di-
vórcio e desemprego, por exemplo. 
Nesse estudo, foi descoberto que qua-
tro porções de frutas e legumes extras 
por dia podem compensar o impacto de 
grandes eventos da vida, como ficar sem 
emprego ou passar por uma separação. 
Essa porção extra de mais frutas e vege-
tais poderia neutralizar metade da dor de 
se divorciar ou um quarto do efeito nega-
tivo do desemprego. Quando os pesqui-
sadores testaram o impacto sobre o bem-
-estar mental de comer oito porções por 
dia comparado a nenhuma, o resultado 
foi muito mais intenso. 
Esses benefícios psicológicos se so-
mam aos já bem conhecidos efeitos pro-
tetores dos alimentos saudáveis contra o 
câncer e as doenças cardíacas. O efeito 
psicológico de mudanças nutricionais 
é muito mais rápido do que as melho-
ras físicas que ocorrem em uma dieta 
saudável. Segundo os investigadores, os 
ganhos mentais ocorrem em 24 meses, 
enquanto os ganhos físicos não ocorrem 
até os 60 anos.
Um possível mecanismo pelo qual 
ruim e significativo na saúde mental das 
pessoas, aumentando muito o risco de 
depressão e ansiedade. Nesse estudo foi 
descoberto que comer sete ou oito por-
ções de frutas e vegetais por dia pode 
reduzir pela metade o risco de quadros 
depressivos ou transtornos ansiosos.
O aumento da ingestão diária de 
frutas e legumes de zero para oito tor-
na os sujeitos significativamente menos 
propensos a sofrer de depressão ou an-
siedade nos próximos dois anos. O efeito 
de um empurrão para cima no aumento 
do bem-estar é comparável ao efeito de 
empurrão para baixo na redução do hu-
mor causado pela experiência de grandes 
eventos negativos da vida.
As medidas de bem-estar mental e 
do bem-estar subjetivo (satisfação com 
a vida) respondem aumentando de 
forma proporcional à ampliação tanto 
da frequência como da quantidade de 
frutas e verduras consumidas, de forma 
dose-dependente. 
O mais interessante nessa investiga-
ção é a comparação entre efeitos positi-
vos e negativos, tanto em nível biológico 
como psicológico, mostrando o quanto 
nossa vida mental subjetiva está associa-
da ao funcionamento do organismo. As 
fronteiras entre o biológico, psicológico 
e social são meramente didáticas, pois 
na prática temos o cérebro humano li-
dando com o funcionamento biológico 
do corpo, com seus estados mentais e 
mundo subjetivo, e, por outro lado, 
com os estímulos e interações sociais de 
forma integrada. De fato, as evidências 
científicas apontam a sabedoria da fa-
mosa citação do poeta romano Juvenal: 
“Mens sana in corpore sano”.
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CAROLINE ARCARI
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Segundo Caroline Arcari, 
a violência sexual contra 
crianças e adolescentes 
começou a ser enfrentada 
como problema social no Brasil 
na última década do século XX
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Um dosfenômenos sociais que mais pre-ocupa é a violência sexual contra crian-ças e adolescentes. Atualmente, existe na sociedade brasileira um amplo con-
senso no sentido de se considerar essa questão uma 
violação à dignidade sexual desses sujeitos e um 
tipo de violência com consequências significativas 
nas esferas física, sexual, comportamental, psico-
lógica e cognitiva, atentando contra o direito de 
crianças e adolescentes ao desenvolvimento de 
uma vida saudável.
Na avaliação de Caroline Arcari, no entanto, para 
o enfrentamento do problema ainda há um percur-
so que, recentemente, começou a tomar forma nas 
áreas de saúde pública, assistência social, educação 
e outros setores.
Caroline é pedagoga e educadora sexual. Fun-
dadora e atual presidente do Instituto Cores, seu 
trabalho junto à instituição já formou mais de 20 
mil educadores em diversos municípios brasileiros 
e seus projetos beneficiaram mais de 250 mil alunos 
da rede pública desde 2006.
Escritora do livro Pipo e Fifi, seus trabalhos já fo-
ram premiados pela Unicef, Fundação Abrinq e Save 
the Children. É também consultora na área de Edu-
cação Sexual e Enfrentamento da Violência Sexual 
Infantojuvenil para instituições públicas e privadas 
de educação, saúde e promoção social. 
No livro A Conversa sobre Gênero na Escola, publi-
cado pela Wak Editora e organizado pelo educador 
sexual Marcos Ribeiro, Caroline coloca em seu capí-
tulo “Empoderamento de meninas e masculinidades 
positivas”, entre outras questões, que a existência de 
diferenças entre meninos e meninas não é um pro-
blema, mas sim quando as diferenças de socialização 
entre ambos resultam em desigualdades sociais.
E N T R E V I S T A
Lucas Vasques Peña é jornalista e colabora nesta publicação. 
PROBLEMA DE 
SAÚDE PÚBLICA
Por Lucas Vasques Peña
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Caroline Arcari diz que não 
há como negar que a violência 
sexual está relacionada à 
construção histórica e social 
sobre o controle e poder exercidos 
pelos homens sobre o gênero 
feminino, a partir da organização 
social da propriedade
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te sugestivos, uso de pornograf ia, 
voyeurismo, exibicionismo, carícias, 
abordagens maliciosas via redes so-
ciais, masturbação e penetração com 
os dedos ou pênis. A OMS def ine 
violência sexual “como todo envolvi-
mento de uma criança em uma ativi-
dade sexual a qual não compreende 
completamente, já que não está pre-
parada em termos de seu desenvol-
vimento. Não entendendo a situação, 
a criança, por conseguinte, torna-se 
incapaz de informar seu consenti-
mento”.
pode explicar as diferenças en-
tre abuso e exploração sexual de 
crianças e adolescentes?
Caroline: O termo “violência sexual” 
é utilizado nos guias e publicações 
of iciais do governo federal para refe-
rir abusos sexuais e exploração sexual 
comercial. Enquanto o abuso sexual 
se refere a atividades sexuais na maio-
ria das vezes praticadas por pessoas 
conhecidas, no ambiente intrafami-
liar, para a satisfação sexual do adulto IMA
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existe uMa explicação do ponto 
de vista psicolÓgico sobre por que 
crianças e adolescentes são alvos 
fÁceis de violência sexual?
Caroline: A violência sexual contra 
crianças e adolescentes começou a 
ser enfrentada como problema de 
cunho social no Brasil na última dé-
cada do século XX, embora em nível 
internacional as primeiras iniciativas 
nesse sentido tenham ocorrido nas 
décadas de 1960 e 1970. Com grande 
visibilidade nos meios de comunica-
ção, o fenômeno da violência sexual 
assume relevância política e social 
a partir dos anos 90, especialmente 
após a of icialização do Estatuto da 
Criança e do Adolescente, respalda-
do na Constituição de 1988 e na Con-
venção Internacional dos Direitos 
da Criança, ratif icada em novembro 
de 1989. Tais documentos propõem 
a proteção contra negligência, dis-
criminação, exploração, violência, 
crueldade e opressão, estando os res-
ponsáveis passíveis de sanções ou de 
punições de acordo com as leis em 
vigor, legitimando crianças e adoles-
centes como sujeitos de direito. Sabe-
-se que essa trajetória histórica está 
estreitamente ligada às concepções 
de infância e de adolescência em um 
longo processo de construção social. 
Atualmente, existe na sociedade bra-
sileira um amplo consenso no senti-
do de se considerar a violência sexual 
contra crianças e adolescentes uma 
violação à dignidade sexual desses 
sujeitos e um tipo de violência com 
consequências signif icativas nas es-
feras f ísica, sexual, comportamental, 
psicológica e cognitiva, atentando 
contra o direito de crianças e adoles-
centes ao desenvolvimento de uma 
vida saudável. No entanto, para o 
enfrentamento deste problema ainda 
há um percurso que, recentemente, 
começou a tomar forma nas áreas 
de saúde pública, assistência social, 
educação e outros setores. Segundo 
a Organização Mundial da Saúde, 
Podemos observar 
que há milhares 
de anos meninas e 
mulheres têm sido 
mais vitimadas por 
essa desigualdade de 
gênero, concretizada 
na violência 
doméstica, na 
violência sexual, 
na falta de espaço 
na esfera pública, nos 
salários mais baixos
este é um dos maiores problemas de 
saúde pública do mundo. Além disso, 
há que se considerar ainda o impacto 
desse fenômeno nos custos econô-
micos, com assistência médica, tra-
tamento e reabilitação das vítimas, 
com o sistema judiciário e penal e 
outros problemas decorrentes dele, 
que causam um grande impacto indi-
vidual e social a longo prazo. 
quais são as forMas Mais coMuns de 
abuso infantil?
Caroline: A violência sexual é o 
uso de crianças e adolescentes em 
atividades sexuais com adultos ou 
adolescentes mais velhos, que pode 
acontecer com ou sem contato f ísi-
co, havendo uma assimetria de poder 
em uma relação em que a criança ou 
adolescente é usado como objeto se-
xual, sendo incapaz de dar consenti-
mento consciente. Incorporados nes-
sa def inição estão todos os tipos de 
encontros sexuais e comportamentos 
que abrangem aliciamento sexual, 
linguagem ou gestos sexualmen-
A exploração sexual 
envolve fi ns comerciais, 
colocando a criança ou 
adolescente na prática 
de atividades sexuais em 
troca de dinheiro, comida, 
favores ou vantagens
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psique ciência&vida 11www.portalespacodosaber.com.br
siguais de gênero, em que os homens 
recorrem à violência para a realização 
de seu projeto masculino associado 
à concepção do poder de dominação 
sobre a mulher. Ou seja, a violência se-
xual não resulta de um impulso sexual 
irreprimível masculino, que estaria li-
gado a questões hormonais, biológicas 
e genéticas. Esse tipo de violência, na 
maioria dos casos, é uma questão de 
poder, a partir de relações assimétri-
cas entre os gêneros. Assim, perceber 
que esse tipo de maus-tratos é densa-
mente inf luenciado por fatores cultu-
rais que se estabeleceram ao longo do 
desenvolvimento da sociedade e da 
organização da família, pautada nos 
valores machistas, na qual mulheres 
e crianças passam a ser consideradas 
como propriedades do homem, é cru-
cial. Jamais deslegitimando a violência 
sexual contra meninos, essa mesma ló-
gica dos valores machistas é respon-
sável pela subnotif icação desse tipo 
de agressão contra meninos, cuja ver-
gonha de ter sofrido o abuso faz com 
que o segredo seja mantido e a vio-
lência nunca seja revelada. A maioria 
autor da violência, a exploração sexual 
envolve f ins comerciais, colocando a 
criança ou adolescente na prática de 
atividades sexuais em troca de di-
nheiro, comida, favores ou vantagens. 
Exploração sexual é um termo que 
substitui o que se chamava de “prosti-
tuição infantojuvenil”. Esse termo caiu 
em desuso.
MachisMo e desigualdade de gêne-
ro são fatores que colaboraM para 
esse tipo de violência?
Caroline: No cenário brasileiro, a 
f igura do agressor também tem sido 
poucoexplorada em pesquisas e tra-
balhos acadêmicos. Não há como 
negar que os dados são ref lexo da 
construção histórica e social sobre o 
controle e poder exercidos pelos ho-
mens sobre o gênero feminino, a partir 
da organização social da propriedade, 
das condutas sobre os corpos e, por 
conseguinte, sobre a sexualidade. Por 
outro lado, os papéis sociais atribuí-
dos à mulher como f igura amorosa, 
frágil, afetiva e cuidadora camuf lam a IMA
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Só no Brasil estima-se 
que meio milhão 
de mulheres são 
vítimas de estupro 
por ano e que dois 
terços das vítimas 
são meninas menores 
de 13 anos, ou seja, 
cerca de 330 mil. 
Homens e meninos 
são atingidos de 
outras formas por 
essa hierarquização
violência, de modo que passa a não ser 
percebida como agressora. Nesse ce-
nário é crucial analisarmos a violência 
sexual sob aspectos como gênero, raça 
e outras condições. Crianças e adoles-
centes são mais suscetíveis à violência 
sexual do que adultos pelo fato de essa 
faixa etária estar afeta a aspectos de 
dependência, devido à fase de desen-
volvimento e outras vulnerabilidades. 
Desse público, meninas pobres e/ou 
negras ou com def iciências estão ain-
da mais suscetíveis; 89% dos casos de 
violência sexual registrados no Brasil 
são contra mulheres. Do total, 70% 
representam casos contra crianças e 
adolescentes, de acordo com o Insti-
tuto de Pesquisa Econômica Aplica-
da (IPEA, 2014). Em campanha rea-
lizada na internet pela organização 
Think Olga com a #PrimeiroAssedio, a 
idade média do primeiro assédio so-
frido por mulheres é de 9,7 anos, ou 
seja, na infância. Ainda abordando as 
questões de gênero, a incidência des-
se tipo de violência contra mulheres e 
meninas é resultado das relações de-
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Perceber que a maneira 
como crianças são 
educadas de acordo 
com as expectativas 
sociais sobre o seu 
gênero é importante 
para entender a 
origem da violência 
sexual. Os estereótipos 
vigentes são alicerces 
que sustentam 
relações abusivas
dos autores da violência sexual contra 
crianças e adolescentes não é doen-
te, ou seja, não tem um transtorno de 
preferência sexual. Noventa por cento 
deles são o que chamamos de abusa-
dores ocasionais – abusam porque fo-
ram autorizados socialmente. A par-
tir de todo esse panorama, é possível 
perceber a violência sexual como um 
fenômeno fruto de um contexto his-
tórico, cultural, socioeconômico mar-
cado pela invisibilidade das crianças e 
adolescentes como sujeitos de direito e 
pelas relações desiguais de poder tanto 
em relação ao gênero quanto à raça, à 
classe social e à faixa etária. 
os estereÓtipos de gênero usados 
eM histÓrias infantis colaboraM 
coM a Manutenção de pensaMentos 
Machistas, que, por sua veZ, aliMen-
taM a prÁtica de violência sexual?
Caroline: Podemos observar que há 
milhares de anos meninas e mulhe-
res têm sido mais vitimadas por essa 
desigualdade de gênero, concretizada 
na violência doméstica, na violência 
sexual, na falta de espaço na esfera 
pública, nos salários mais baixos: pro-
blemas que têm sua raiz na hierarqui-
zação das diferenças entre homens e 
mulheres. Só no Brasil estima-se que 
meio milhão de mulheres são vítimas 
de estupro por ano e que dois terços 
das vítimas são meninas menores de 13 
anos, ou seja, cerca de 330 mil. Homens 
e meninos são atingidos de outras for-
mas por essa hierarquização. Ao terem 
que cumprir ideais sociais que ligam o 
“ser homem” com agressividade, con-
trole e dominação, eles se afastam da 
sensibilidade, da paternidade afetiva, 
dos cuidados com a própria saúde e se 
aproximam da violência urbana. As-
sim, perceber que a maneira como as 
crianças são educadas de acordo com 
as expectativas sociais sobre o seu gê-
nero é muito importante para enten-
dermos a origem da violência sexual. 
Os estereótipos vigentes são os alicer-
ces que sustentam relações abusivas, 
violência doméstica e violência sexual: 
no Brasil temos a quinta maior taxa de 
feminicídio do mundo: são 606 denún-
cias de violência doméstica por dia; 
um estupro a cada 11 minutos. Falar 
sobre gênero nos espaços educativos é 
urgente e signif ica questionar as assi-
metrias de poder presentes em todas 
as relações de nossa sociedade. Assim 
caminharemos em direção à igualdade 
entre os gêneros e à prevenção e en-
frentamento das violências. 
o eMpoderaMento feMinino pode 
aJudar a MiniMiZar o probleMa ou É 
necessÁrio proMover uMa Mudança 
Muito Mais radical, especialMente 
no coMportaMento Masculino?
Caroline: É preciso entender o im-
pacto do empoderamento das meninas 
nos espaços educativos. É através do 
empoderamento pessoal que diversas 
mulheres estão vencendo barreiras im-
postas pelos padrões sociais, por meio 
de um maior conhecimento sobre as 
causas femininas, a autoestima, o sen-
timento de coletividade e das ref lexões 
sobre seus direitos. É fundamental que 
as meninas tenham acesso a espaços 
que as ensinem a desconstruir o es-
tereótipo da feminilidade submissa e 
docilizada, entendendo que elas não 
precisam se adequar a nenhum padrão 
de comportamento, beleza e proje-
to de vida. Muitas pessoas acreditam 
que defender os direitos de meninas 
e mulheres é defender que os homens 
percam os seus direitos, mas isso não 
é verdade. A reivindicação é que elas 
também sejam respeitadas, valorizadas 
e tenham acesso a oportunidades para 
um futuro saudável e sem violências. 
Em contrapartida, a prevenção da vio-
lência sexual pressupõe atenção à edu-
cação dos meninos. É urgente educar 
meninos para que descubram mascu-
linidades positivas, novas formas de se 
relacionar e se posicionar no mundo, 
para que se consiga, de maneira ef icaz, 
diminuir os dados de violência domés-
tica, sexual e de gênero. Educar um 
menino para não ser machista pres-
supõe, antes de tudo, educarmos as 
pessoas adultas que cresceram nesse 
mesmo contexto, que riram de piadas 
machistas, viram os homens relaxa-
rem depois do churrasquinho de do-
mingo enquanto as mulheres lavavam 
a louça da família toda, que cresceram 
achando que as cantadas abusivas são 
elogio, que julgaram as roupas e com-
portamento das mulheres que um dia 
sofreram violência sexual. 
existe alguMa forMa de se prevenir 
o abuso sexual? 
Caroline: Os esforços de prevenção 
podem acontecer em três níveis: pri-
mário, secundário e terciário. A pre-
venção primária se refere a abordagens 
empregadas antes de qualquer violên-
cia sexual ocorrer, evitando assim a 
vitimização. A prevenção primária in-
clui estratégias de construção de am-
bientes seguros, espaços de diálogo e 
ref lexão sobre o tema em si, bem como 
sobre os direitos das crianças e ado-
lescentes. Também se refere à preven-
ção primária a promoção de palestras, 
of icinas, campanhas, eventos e ações IMA
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É preciso entender 
o impacto do 
empoderamento das 
meninas nos espaços 
educativos. É através 
do empoderamento 
pessoal que diversas 
mulheres estão 
vencendo barreiras 
impostas pelos 
padrões sociais
que informem a comunidade sobre 
como detectar, denunciar as suspei-
tas e proteger crianças e adolescentes. 
Assim, essas iniciativas visam elimi-
nar, ou pelo menos reduzir, os fatores 
sociais, culturais e ambientais que fa-
vorecem esse tipo de maus-tratos. Em 
um sentido mais amplo, a garantia da 
implementação de políticas sociais 
básicas, acesso às políticas públicas 
de garantia de saúde e educação, en-
tre as quais se destacam as atividades 
educativas e de caráter informativo 
geral dirigidas a toda a população, es-
pecialmente aos familiares, à comuni-
dade escolar e às igrejas de todos os 
credos, entre outros grupos da socie-
dade civil, são ações fundamentais da 
prevenção primária. É essencial citar 
que a elaboração de campanhas com 
bom conteúdo,a f im de superar mitos 
e desmitif icar os tabus sobre o tema, 
além de alertar sobre causas e conse-
quências desse tipo de violência, pode 
despertar a conscientização sobre o 
tema e incentivar a comunidade a re-
alizar a denúncia de forma precoce. 
Por f im, e de suma importância, a edu-
cação sexual aparece como estratégia 
de prevenção primária. Já a prevenção 
secundária prevê resposta imediata 
após a violência sexual ter acontecido. 
Envolve estratégias de atendimento e 
encaminhamento, atuando nas conse-
quências a curto prazo geradas pela 
violência. Também é considerada ação 
de prevenção secundária a formação 
de prof issionais para detectarem, por 
meio do comportamento atípico infan-
til ou adolescente, sinais que, mesmo 
sem marcas f ísicas aparentes, sugerem 
a suspeita de ocorrência da violência 
sexual. Investimento na capacitaçao 
dos prof issionais envolvidos desde o 
encaminhamento, a escuta das vítimas 
e o acolhimento até os processos le-
gais se conf igurarem, é de extrema re-
levância para que essa fase da preven-
ção aconteça. O sistema de garantia de 
direitos é composto de um conjunto 
de órgãos responsáveis por garantir 
a promoção, a defesa e o controle na 
implementação das leis de proteção 
a crianças e adolescentes. Entre eles, 
encontram-se os Conselhos Tutelares, 
as delegacias especializadas em crimes 
contra crianças e adolescentes, o Mi-
nistério Público, as Varas da Infância e 
da Juventude, a Defensoria Pública e os 
Centros de Defesa. Considerando que 
se trata de uma temática extremamen-
te delicada e penosa para crianças e 
adolescentes, a humanização dos ser-
viços de atendimento deve ser um cui-
dado constante. Também faz parte das 
estratégias de prevenção secundária a 
criação do Disque-Denúncia 100, ser-
viço nacional que integra os vários sis-
temas estaduais e locais de notif icação 
de todas as violações contra crianças 
e adolescentes e que revolucionou o 
processo de denúncias anônimas. Por 
f im, prevenção terciária tem o objetivo 
de acompanhar integralmente a vítima 
e, se possível, o agressor. Conf igura-
-se na resposta a longo prazo após a 
violência sexual ter ocorrido. Seu foco 
são as demandas advindas da vitimi-
zação, que envolvem atendimento psi-
cológico, acompanhamento da família 
e a oferta de tratamento especializado 
aos autores de violência sexual, a f im 
de minimizar a possibilidade de reinci-
dência. Também os aspectos legais de 
responsabilização do autor de violên-
cia são pauta desse tipo de prevenção, 
o que contribui para quebrar o ciclo 
de impunidade e, consequentemente, 
para a redução do abuso e da explora-
ção sexual. A reformulação, atualiza-
ção e proposição de leis mais severas 
podem completar o ciclo do enfrenta-
mento da violência sexual.
Os papéis sociais atribuídos à mulher como figura amorosa, frágil, afetiva e cuidadora camuflam a 
violência, de modo que passa a não ser percebida como agressora
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14 psique ciência&vida www.portalespacodosaber.com.br
coMo a educação sexual se insere 
nesse processo?
Caroline: Embora seja comum achar 
que educação sexual é uma disciplina 
formal reservada apenas aos espaços 
escolares, a verdade é que seu concei-
to é muito mais amplo. A educação 
sexual pode ser entendida como um 
conjunto de valores e informações re-
ferentes à sexualidade, transmitidos 
por diversos elementos sociais: famí-
lia, escola, amigos, religião e percorre 
toda a vida, contando ainda com a in-
f luência cultural do contexto em que o 
indivíduo está inserido. Essas concep-
ções sexuais ainda recebem o reforço 
da mídia e do núcleo social, e nos per-
mitem incorporar valores, símbolos, 
preconceitos e ideologias. Sendo a se-
xualidade um componente individual 
e social que encontra várias formas de 
expressão desde o nascimento do indi-
víduo até sua morte, a educação sexual 
também é um processo contínuo, que 
vai do começo da vida até seu desfe-
cho. Essa educação sexual faz parte do 
processo educativo global. Af inal, não 
é possível colocar a sexualidade em 
um departamento separado de todas 
as outras vivências da pessoa. Assim, 
a educação sexual acontece mesmo 
que nenhum diálogo seja tecido sobre 
a sexualidade. O silêncio e a repressão 
também educam. Todas e todos nós 
estamos construindo noções sobre 
sexualidade a todo momento, formu-
lando valores e conceitos. A família, 
mesmo que não dialogue abertamente 
sobre sexualidade, é quem dá as pri-
meiras noções sobre o que é adequado 
ou não acerca desse assunto por meio 
de gestos, expressões, recomendações 
e proibições. Isso também acontece na 
escola: estando ou não explicitamente 
no currículo escolar, a educação sexual 
acontece, seja nos rabiscos nas portas 
dos banheiros, nas músicas e vídeos 
que rodam nos celulares das alunas e 
alunos, nas relações cotidianas desse 
espaço, nas notícias que chegam até 
a sala de aula, na homofobia que um 
aluno gay sofre por não se encaixar 
nos valores da masculinidade vigente. 
A vida pulsa, a sexualidade também. 
Como essa educação sexual já está, 
mesmo que implicitamente, a ser de-
sempenhada, assume-se a importância 
da sua abordagem explícita tanto no 
ambiente familiar como nos currículos 
escolares e outros espaços educativos. 
Família e educadoras(es) que lidam e 
atuam com crianças têm um desaf io 
ainda maior. Como é recorrente que a 
educação sexual explícita e planejada 
esteja vinculada a conteúdos de bio-
logia para adolescentes, se pressupõe 
que seria apenas nessa fase da vida que 
esse tipo de conhecimento é necessá-
rio. O resultado disso é a ausência de 
conteúdos de sexualidade nos currícu-
los de educação infantil e séries ini-
ciais do ensino fundamental. Tão cedo 
quanto possível, crianças precisam da 
informação e das ferramentas para 
identif icar as situações do cotidiano 
e ter informações para fazer escolhas, 
buscar ajuda e selecionar valores cons-
truídos a partir da ref lexão, na relação 
com o outro e consigo mesmas. Embo-
ra o senso comum sugira que a educa-
ção sexual intencional precoce conduz 
ou estimula a experimentação sexual, 
o Populations Reports, uma publicação 
do Johns Hopkins Hospital, divulgou 
um estudo que aponta uma análise en-
comendada pela OMS de mais de mil 
relatórios de programas de orientação 
É fundamental que 
meninas tenham 
acesso a espaços que as 
ensinem a desconstruir 
o estereótipo da 
feminilidade submissa e 
docilizada, entendendo 
que elas não precisam 
se adequar a 
nenhum padrão de 
comportamento, beleza 
e projeto de vida
A violência sexual, na maioria dos casos, é uma questão de poder, a partir de relações 
assimétricas entre os gêneros
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sexual em todo o mundo. Neste do-
cumento, os autores concluíram que 
a informação e formação em assuntos 
sexuais não conduzem ao sexo precoce 
e, em alguns casos, até o adiam. Vários 
documentos of icias ratif icam a impor-
tância da educação sexual planejada 
e intencional desde a primeira infân-
cia. A promoção de espaços que pri-
vilegiem o desenvolvimento de noções 
acerca da sexualidade desde a educa-
ção infantil é urgente. Primeiro porque 
o direito à informação e a uma edu-
cação que garanta o desenvolvimento 
integral da criança está previsto no 
Estatuto da Criança e do Adolescente. 
Segundo porque essa mesma educa-
ção sexual explícita e planejada causa 
grande impacto na prevenção da vio-
lência sexual. A importância da edu-
cação sexual no enfrentamento da vio-
lência sexual é evidenciada em muitas 
pesquisas estadunidenses e latinas. 
Os estudos apontam que crianças 
expostas a informações de qualidade 
sobre sexualidade, corpo e relações 
humanas além de demonstrarem sen-
timentos positivos sobre seu corpo e 
autoimagem apresentaram seis vezes 
mais probabilidade de terem compor-
tamento de proteção em situações si-
muladas de potencial violência sexual 
Muitos acreditam 
que defender direitos 
femininos é defenderque homens percam 
seus direitos, mas 
isso não é verdade. 
A reivindicação é 
que elas também 
sejam respeitadas 
e tenham acesso a 
oportunidades para 
um futuro saudável 
e sem violências
do que as crianças que não tiveram 
informação sobre o assunto. É eviden-
te que para assumir e concretizar os 
temas de educação sexual no currícu-
lo escolar é de fundamental importân-
cia que as/os prof issionais se capaci-
tem para tal, analisando, debatendo e 
aprofundando as questões relaciona-
das à sexualidade de maneira geral, 
estendendo essas discussões para toda 
a comunidade escolar, de modo que a 
família também tenha a oportunidade 
de reformular conceitos e entender a 
educação sexual sob uma perspectiva 
positiva e necessária.
procede a inforMação de que a Maio-
ria dos casos de violência sexual 
ocorre no aMbiente faMiliar?
Caroline: Em torno de 70% das de-
núncias de violência sexual envolvem 
ambiente intrafamiliar, ou seja, são 
casos cujos autores da violência são 
padrastos, pais, parentes ou pessoas 
em que as crianças conf iam e com as 
quais tem algum vínculo de responsa-
bilidade e afeto. Se a educação sexual 
f icasse reservada à esfera familiar, 
como essas crianças teriam acesso à 
informação que poderá protegê-las 
dos abusos? Prevenção de violência 
sexual não acontece a partir do silen-
ciamento das escolas ou outros espa-
ços educativos. O diálogo de qualida-
de, com prof issionais bem preparados 
e materiais didáticos adequados, é o 
caminho para a proteção da infância 
e da juventude. Importante lembrar 
que, a despeito desse movimento con-
servador, nossa Constituição, Estatuto 
da Criança e do Adolescente e tantos 
outros dispositivos legais e conven-
ções internacionais reaf irmam que a 
inclusão de temas de educação sexual 
no currículo é direito das crianças e 
adolescentes de ampliar os seus refe-
renciais a partir de concepções diver-
sas e científ icas, todas necessárias ao 
pleno exercício da autonomia indivi-
dual e da cidadania. Por f im, é hora de 
arregaçar as mangas e promover, com 
urgência, espaços de diálogo e ref le-
xão por meio de educação sexual in-
tencional, inserida no currículo esco-
lar, numa perspectiva emancipatória e 
entendida como um direito fundamen-
tal para o desenvolvimento pleno de 
uma criança sexuada, completa, com 
necessidades e curiosidades sobre a 
vida, o mundo e sobre si mesma.
Falar sobre gênero nos espaços educativos é urgente e significa questionar as assimetrias de poder 
presentes em todas as relações de nossa sociedade
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in foco por Michele Müller
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DA MESMA 
FORMA COMO 
DEVEMOS 
OBEDECER AS 
NECESSIDADES 
DO CORPO 
ENFERMO, 
TEMOS QUE 
RESPEITAR O 
TEMPO E O 
PROCESSO DA 
MÁGOA EM 
DIREÇÃO DE 
PERDOAR O 
OUTRO E A 
SI MESMO
A capacidade 
do perdão
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riscos de tombos, andando em dire-
ção ao perdão. Ou à compaixão, se a 
palavra parecer mais adequada, uma 
vez que é resultado da capacidade de 
olhar para o outro, de olhar por cima 
da própria dor, sem a necessidade de 
esquecê-la, conforme coloca o f ilóso-
fo David Whyte no livro Consolações: 
“É a parte ferida, marcada e jamais 
ignorada que faz do perdão um ato 
não de esquecimento, mas de com-
paixão. Perdoar é assumir uma iden-
tidade maior que a da pessoa que foi 
ferida, é amadurecer e poder abraçar 
não apenas a parte af ligida do pró-
prio ser, como as memórias cauteri-
zadas pelo golpe original e, de forma 
virtuosa, estender a compreensivida-
de àquele que o entregou.” 
O perdão, complementa, não afas-
ta a ferida, mas leva a uma releitura 
da sua relação com ela, colocando-o 
mais próximo à fonte da dor. Estra-
nhamente, ele nunca surge da parte 
que estava atingida. “Essa parte é 
possível que nunca possa ou real-
mente não deva esquecer, pois, as-
sim como os fundamentos do sistema 
imunológico do organismo, nossas 
defesas psicológicas precisam ter me-
mória e se organizar contra futuros 
ataques.” Essa organização se soma 
à sua identidade, lhe entrega novas 
perspectivas, novas formas de sentir, 
se relacionar, se entender e entender 
os outros. Nessas transformações, 
muito se ganha, muito se perde. Mas 
todos os caminhos que levam a uma 
versão fortalecida de si mesmo pas-
sam pelo perdão.
Michele Müller é jornalista, pesquisadora, especialista em Neurociências, 
Neuropsicologia Educacional e Ciências da Educação. Pesquisa e aplica 
estratégias para o desenvolvimento da linguagem. Seus projetos e textos 
estão reunidos no site www.michelemuller.com.br
Referência: 
Bergen, B.; Liu, N. When do language 
comprehenders mentally simulate locations? 
Cognitive Linguistics, v. 27, n. 2, p. 181-203, 
2016.
ESTAR DISPOSTO 
A PERDOAR NÃO 
SE TRATA MAIS 
DE UMA DECISÃO. 
O PERDÃO NÃO 
AFASTA A FERIDA, 
MAS LEVA A 
UMA RELEITURA 
DA SUA RELAÇÃO 
COM ELA, 
COLOCANDO-O 
MAIS PRÓXIMO À 
FONTE DA DOR
E
m Portugal, a parte do cor-
po machucada está “magoa-
da”. Aprendi isso na prática, 
quando, enganada pelo pe-
núltimo degrau de uma escada, que 
aparentava ser o último, caí, torci 
o pé e fui acudida por uma senhora 
que perguntou se ele estava magoa-
do. Meus próprios sentidos haviam 
me iludido – nesse caso, minha visão 
pouco conf iável –, mas a escadaria do 
metrô passou a representar perigo e 
levei muito tempo para voltar a des-
cê-la correndo. 
No Brasil usamos mágoa somente 
para af lições psicológicas, mas em-
prestamos outras palavras do universo 
f isiológico, como feridas, machucados 
ou cicatrizes, para descrever a dor no 
coração. Af inal, o processo é o mes-
mo: existe a dor, a busca por alívio, a 
proteção, o medo e a cura. É dessa úl-
tima etapa que nasce o perdão. Com 
o pé doendo, ainda muito magoado, 
forçar-se a retirar a mão do corrimão 
e encarar os degraus com conf iança 
seria um desrespeito ao próprio corpo.
Estar disposto a perdoar, nem que 
seja pelo próprio bem-estar, parece 
simples quando você acredita que é 
uma boa pessoa, compreensiva e em-
pática. Até quem é ferido de uma for-
ma estranhamente profunda precisa 
ressignif icar a palavra perdão. Não se 
trata mais de uma decisão. Esquecer 
ou passar por cima também não são 
possibilidades e, se fossem, não seriam 
escolhas sensatas: a mágoa e sua rela-
ção com a verdade são estradas sem 
retorno e você sabe que precisa atra-
vessá-las e deixar se transformar por 
elas. Deve tratá-la da mesma forma 
como obedece às necessidades do cor-
po enfermo: segurando no corrimão, 
andando devagar e cuidando da parte 
machucada por respeito a si próprio.
Nesse processo, não há muito 
espaço para empatia. Em um nível 
biológico básico, um organismo in-
timidado se contrai, se fecha, em 
uma reação de fuga ou luta que é 
automática e egocêntrica: diante da 
ameaça, o sistema nervoso faz uma 
série de movimentos inconscientes 
que protegem – e isso não inclui en-
tender como o outro está se sentindo. 
Nessa fase, lembra a psicóloga budista 
Tara Brach, em uma meditação sobre 
o tema, simplesmente não é possível 
enxergar o cenário amplo. “A capaci-
dade de empatia é ‘desligada’ por um 
tempo. E é muito importante reco-
nhecer que existe um período em que 
não se deve mesmo ser compassível: 
deve-se cuidar de si, pois ainda não 
há recursos para perdoar.” A reação 
límbica, ela lembra, tem sua própria 
inteligência, mas, depois de cum-
prir sua função, precisa dar espaço 
para que se possa continuar evoluin-
do. Cuidar de si, portanto, não sig-
nif ica se entregar à desesperança e à 
inatividade: o corpo magoado precisa 
ser reeducado a partir do movimento, 
por mais incômodo que seja; o cora-
ção segue a mesma indicação e, à me-
dida que se fortalece, volta a assumir 
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18 psique ciência&vida www.portalespacodosaber.com.brpsicopositiva Por Flora Victoria
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AÇÕES virtuosas e filantropia
COMO DIVERSAS FORMAS DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SÃO 
CAPAZES DE PAVIMENTAR UM CAMINHO PODEROSO DE 
FLORESCIMENTO DO INDIVÍDUO E DA SUA COMUNIDADE
P
ara alcançarmos uma vida 
mais feliz em sociedade, di-
versos estudos psicológicos 
examinaram como ajudar o 
próximo é capaz de afetar o nosso 
bem-estar. Existe uma correlação 
entre os benef ícios aproveitados por 
quem recebe ações f ilantrópicas e, 
de modo correspondente, aqueles 
recebidos por quem age de modo 
generoso e altruísta. 
A origem etimológica da palavra 
“f ilantropia” é o termo grego philan-
tropia , que signif ica “amor à huma-
nidade”. Esse comportamento faz 
parte da história humana, uma vez 
que a cooperação social em larga 
escala foi o que permitiu que os gru-
pos humanos prosperassem e che-
gássemos ao estágio evolutivo atual. 
Nesse contexto, a motivação 
para o altruísmo e a f ilantropia são 
as chamadas “ações virtuosas”, que, 
à luz da f ilosof ia aristotélica, podem 
ser sucintamente explicadas como 
atividades conscientes e voluntárias 
que visam um bem maior e que ex-
pressam a excelência humana. Ações 
virtuosas são comumente def inidas 
pela literatura da Psicologia Positiva 
como gratif icações, excelências ou 
atividades de f low (f luxo), aquelas 
que envolvem você completamente, 
aproveitam suas forças e permitem 
que você perca a autoconsciência e 
mergulhe no que está fazendo.
Nos tempos presentes, os motivos 
principais para o envolvimento em 
ações f ilantrópicas são a proteção e a 
crença na necessidade de tomar res-
ponsabilidade social pelo bem-estar 
comunitário da sociedade. Esse tipo 
de ação social, portanto, representa 
uma ponte entre preocupações indi-
viduais e coletivas. É um caminho 
para que as pessoas conectem seus 
interesses aos dos outros, liguem-se 
a suas comunidades e envolvam-se 
com a sociedade em maior escala, 
sempre por meio de iniciativas de in-
divíduos e grupos para os quais esse 
envolvimento não é obrigatório. 
Alinhado a isso, o modelo de 
ação e bem-estar da Psicologia Po-
sitiva apresenta implicações ricas 
para a teoria f ilantrópica. O dr. 
Martin Seligman, “pai” da Psicolo-
gia Positiva, invoca essas conexões 
com frequência, a ponto de def inir a 
sua área de estudos como uma ten-
tativa de mover a Psicologia do ego-
cêntrico para o f ilantrópico.
Essa é a essência da contribuição 
que def ine os objetivos altruístas – 
cujos benef ícios se estendem, tam-
bém, a toda uma cadeia de pessoas, 
e que, por isso mesmo, são capazes 
de elevar os nossos níveis habituais 
de felicidade, saúde e bem-estar. 
Para tanto, diversos tipos de doa-
ção são possíveis – tempo, trabalho, 
atenção, conhecimento e, claro, re-
cursos materiais. 
Em um trabalho intitulado “Gas-
tos pró-sociais e felicidade”, as psicó-
logas Elizabeth Dunn e Lara Aknin, 
juntamente com Michael Norton, da 
Harvard Business School, encontra-
ram uma relação positiva consisten-
te entre os chamados gastos “pró-
-sociais” e o bem-estar. Realizada 
em 136 países, com níveis de rique-
za e contextos culturais diversos, a 
pesquisa revelou que indivíduos que 
recentemente haviam feito doações 
a instituições de caridade relataram 
maior bem-estar subjetivo, mesmo 
considerando diferenças individuais 
de renda. 
No nível psicológico, os pesqui-
sadores pontuam que a doação vo-
luntária de recursos f inanceiros tem 
ligação com a teoria da autodeter-
minação, desenvolvida por Edward 
L. Deci e Richard M. Ryan. Segun-
do essa teoria, o bem-estar humano 
depende da satisfação de três ne-
cessidades básicas: relacionamento, 
competência e autonomia, as quais 
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psique ciência&vida 19www.portalespacodosaber.com.br
Flora Victoria, presidente da SBCoaching Training, mestre em Psicologia Positiva 
Aplicada pela Universidade da Pensilvânia, especialista em Psicologia Positiva aplicada ao 
coaching. Autora de obras acadêmicas de referência, Ganhou o título de embaixadora 
oficial da Felicidade no Brasil por Martin Seligman. É fundadora da SBCoaching Social.
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emergem quando as pessoas se co-
nectam com os outros por meio dos 
gastos pró-sociais, veem como suas 
ações generosas são capazes de fa-
zer a diferença e sentem que suas 
ações de caridade são escolhidas li-
vremente.
Por trás disso está também a 
ideia de que o bem-estar de um in-
divíduo depende intrinsecamente do 
bem-estar dos seus relacionamentos 
e da comunidade em que ele resi-
de. Para o dr. Isaac Prilleltensky, da 
Universidade de Miami, a própria 
def inição de bem-estar engloba um 
estado positivo de relações, nutrido 
pela satisfação simultânea e equili-
brada de diversas necessidades nas 
esferas pessoal, relacional e cole-
tiva da vida de uma pessoa. Dessa 
forma, ele propõe em seu trabalho 
uma mudança de paradigma que dê 
às abordagens baseadas em forças, 
prevenção, empoderamento e co-
munidade mais destaque, visando 
impactar positivamente áreas como 
saúde e justiça social. O enfoque é 
fazer avançar e progredir os indiví-
duos e suas comunidades.
De muitas maneiras, trabalhando 
isolada ou coletivamente, as pessoas 
são capazes de atuar em prol da hu-
manidade. Mas como você pode co-
locar isso em prática? Os caminhos 
são vários. O envolvimento f ilantró-
pico pode assumir a forma de parti-
cipação em trabalho voluntário, gru-
pos comunitários e organizações de 
bairro, ativismo social e movimentos 
políticos, tendo como objetivo maior 
o bem-estar conjunto e cidadão. 
Atividades como essas são oportu-
nidades de abordar e agir sobre pro-
blemas locais e globais, considerando 
que o poder da mudança e do f lores-
cimento está em cada um de nós.
O BEM-ESTAR 
COMUNITÁRIO 
PODE SER 
ALCANÇADO POR 
MEIO DAS CHAMADAS 
AÇÕES VIRTUOSAS 
ABORDADAS PELA 
PSICOLOGIA POSITIVA 
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20 psique ciência&vida www.portalespacodosaber.com.br
psicopedagogia por Maria Irene Maluf
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DA PRÉ-ESCOLA À UNIVERSIDADE, PARA ALCANÇAR O 
SUCESSO PROFISSIONAL NÃO BASTA UM DIPLOMA NA PAREDE 
COMO NOS TEMPOS DE NOSSOS AVÓS. HOJE É PRECISO 
RENOVAR CONSTANTEMENTE CONHECIMENTOS E PRÁTICAS
Escola: ESCOLHA
fundamental
tecnologia, a formação acadêmica de 
qualidade é um fator decisivo para o 
acesso bem-sucedido às oportunida-
des prof issionais, pessoais e sociais 
das crianças e jovens adultos. Como 
a constante atualização também é in-
dispensável para atender as exigências 
na pré-escola, muitos pais buscam, 
nesta época do ano, orientações para 
fazer a opção de escola que melhor se 
adapte à educação acadêmica que de-
sejam para seus f ilhos. 
 Nos dias de hoje, frente a um 
mundo globalizado e dependente da 
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m meio ao segundo semestre 
do ano, são abertas as matrí-
culas para o próximo ano le-
tivo em praticamente todas as 
escolas. Seja porque procuram uma 
nova opção educacional, ou porque 
está na hora da sua criança ingressar 
psicopedagogia.indd 20 22/08/2019 16:54
psique ciência&vida 21www.portalespacodosaber.com.br
o tipo de avaliação que será usada ao 
longo do ano letivo pode evitar grandes 
e desagradáveis surpresas, pois escola 
e casa devem ter muitos pontos em co-
mum no quesito disciplina.
Uma escola situada em um local 
iluminado, arejado, arborizado e si-
lencioso pode ser um aspecto mui-
to favorável na hora da seleção, mas 
não é o mais importante, pois, com o 
passar dos anos, essas características 
frequentemente se modif icam e tam-
bém há inf luência relativa no aprovei-
tamento pedagógico. 
Essas visitas à nova escola devem 
preferencialmente ser feitas em horá-
rios diferentes para se poder observar 
os alunos na entrada e na saída: essa é 
uma forma de saber como se sentem 
naquele ambiente.
 Conversar com outros pais, com 
alguns funcionários e procurar conhe-cer pessoalmente as professoras tran-
quiliza a maioria dos familiares ansio-
sos, especialmente no caso de crianças 
pequenas, pois nesse contato poderão 
estabelecer um vínculo com os adultos 
que olharão pelas crianças enquanto 
estiverem longe delas.
Uma vez feita a primeira seleção, é 
importante que as crianças visitem o 
local, também, não para decidir onde 
vão estudar, pois essa é uma respon-
sabilidade que está longe de ser de-
las, mas para que seus pais observem 
como se sentem no novo ambiente e 
depois possam trocar ideias com os 
f ilhos sobre isso.
Outra ordem prática deve ser levada 
em conta: o valor das mensalidades e a 
distância de casa. Pode parecer pouco 
para quem nunca manteve um filho na 
escola, mas o custo mensal total ultra-
passa o da mensalidade, pois há o uni-
forme, os livros, as despesas com pas-
seios, entre outras coisas. Nem sempre 
as famílias conseguem dar conta de tan-
tas despesas, e mudar a criança de escola 
em meio ao ano letivo pode ser um des-
gaste muito grande, em vários aspectos. 
Para f inalizar, é fundamental que 
os pais procurem conversar entre si 
sobre essa importante opção, de modo 
que seja do agrado de ambos, ou ao 
menos muito próximo daquilo que de-
sejam para seu f ilho. 
Uma postura de segurança e f ir-
meza em relação a essa escolha fará 
com que a criança se sinta muito mais 
conf iante e se adapte melhor à escola.
Vale ainda lembrar que é o aluno que 
deve se adaptar à escola, pois, como na 
sociedade e no trabalho, há normas que 
todos precisam aprender a respeitar e 
que, diferentemente do que ocorre na 
família, não se permitem exceções.
Assim, educar ganha a perspecti-
va de formação de cidadãos que, usu-
fruindo de boa educação acadêmica, 
se preparam permanentemente para 
ser prof issionais de sucesso em qual-
quer área que venham a escolher.
Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e 
Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de 
Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em 
publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de 
especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br
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do mercado de trabalho, uma boa for-
mação acadêmica desde o início da 
escolarização torna-se indispensável 
para iniciar e fundamentar todo esse 
importante percurso. 
Inegavelmente há um valor enorme 
colocado na educação e que não é ape-
nas f inanceiro. Envolvendo essa ques-
tão, pesam as aspirações paternas, a 
pressão social, a responsabilidade na 
formação das crianças, que inf luen-
ciam na hora de tomar uma decisão 
de tal porte. Uma seleção como essa 
exige muita ref lexão da família antes 
da tomada de uma decisão que certa-
mente terá sérios ref lexos no futuro da 
criança e na dinâmica familiar.
A escolha em geral se inicia pelas 
indicações de parentes, de outros pais 
e de amigos que já passaram por essa 
fase tão importante para as famílias, 
mas nada substitui uma visita – e até 
mais de uma – a algumas boas opções, 
seja se tratando de ensino infantil ou 
de escolas de ensino médio. Af inal, a 
escola é onde as crianças e os jovens 
vão viver boa parte de seu dia e, além 
da formação pedagógica de qualidade, 
é lá que a educação de valores será 
continuada em consonância com a que 
a família iniciou. E nesse ambiente a 
criança conquistará seu primeiro gru-
po de amigos, e as experiências do dia 
a dia terão grande inf luência na sua 
personalidade em formação. 
Ao visitarem as escolas, muitas 
informações serão passadas aos pais, 
mas é importante que estes já tenham 
em mente alguns pontos a investigar, 
que consideramos importantes, até 
para poderem posteriormente compa-
rar e escolher mais adequadamente.
As informações devem ser inicial-
mente voltadas para a formação exi-
gida dos prof issionais, como professo-
res, coordenadores, entre outros.
É importante saber que tipo de apoio 
e incentivo cada escola oferece para in-
crementar a modernização do corpo 
docente e dos demais funcionários. Per-
guntar sobre as normas disciplinares e 
HÁ UM VALOR 
ENORME COLOCADO 
NA EDUCAÇÃO 
QUE NÃO É APENAS 
FINANCEIRO. PESAM 
AS ASPIRAÇÕES 
PATERNAS, A 
PRESSÃO SOCIAL E A 
RESPONSABILIDADE 
NA FORMAÇÃO DAS 
CRIANÇAS
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recursos humanos por João Oliveira
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A EXPERIÊNCIA 
DE VIDA E A 
INTERPRETAÇÃO 
DELA SÃO 
ESTRUTURAS 
FRASAIS QUE FICAM 
RICOCHETEANDO 
NA MENTE DE 
TODOS NÓS. 
PODEMOS DESTACAR 
DOIS PERFIS DE 
PENSAMENTO 
RECORRENTES: 
ABUNDÂNCIA E 
ESCASSEZ
MUITO SE QUESTIONA SOBRE QUAL O MELHOR PERFIL 
COMPORTAMENTAL PARA GERAR RESULTADOS POSITIVOS. O 
CUIDADO COM O GERENCIAMENTO DO QUE SE PENSA IRÁ 
REFLETIR EM EMOÇÕES MAIS ADEQUADAS À PRODUTIVIDADE
gera uma maior tranquilidade para o 
planejamento a longo prazo e etapas 
para a realização dos projetos.
Quem está ou esteve submer-
so em uma economia instável com 
histórico de bruscas mudanças no 
cenário pode desenvolver um per-
f il voltado para a escassez, tornan-
do dif ícil um planejamento sólido e 
tranquilo para longo prazo, criando 
o imediatismo nas ações em busca 
de retorno rápido. 
O detalhe importante é que isso 
pode ser alterado de acordo com a 
vontade e esforço de cada um. No 
entanto, quem está dentro de um es-
tado de ânimo por muito tempo – 
em qualquer perf il possível – muitas 
vezes pensa que “é assim” ao invés 
de ter a consciência de que “está 
assim”. Somos capazes de mudar e 
nos adaptar diante das demandas 
cotidianas e com o gerenciamento 
interno podemos ir além. Basta, ini-
cialmente, reconhecer se existe essa 
necessidade.
Qualquer um que esteja no mo-
delo da escassez pode pensar que 
isso é uma perda de tempo, af inal 
ele exige resultados rápidos. Já os 
que estão modelados na abundância 
podem aceitar com facilidade a in-
clusão de algumas práticas em sua 
vida, como investimento na lapida-
ção e sua excelência. 
mos e como respondemos. Com isso 
já podemos destacar dois perf is de 
pensamento recorrente e como isso 
pode ref letir negativamente ou não 
no dia a dia: abundância e escassez.
Quem teve experiência de vida 
dentro de uma base econômica está-
vel pode estabelecer com facilidade 
um pensamento voltado para a abun-
dância. Os recursos e custos podem 
ser calculados com meses de antece-
dência sem muitas surpresas, o que 
S
eja no ambiente prof issional 
ou pessoal, todos desejam ter 
sucesso no que fazem, mas 
nem sempre é isso que ocor-
re. Falhas, erros e fracassos podem 
ser associados a uma imensa gama de 
variáveis, que vão desde o ambiente 
externo (mercado, condições econô-
micas, necessidades dos clientes) até 
a atmosfera psicológica que envolve 
os agentes que praticam as ações.
Sabemos que as palavras que 
ecoam em nossas cabeças, o famoso 
self talk, são responsáveis pelo estado 
de ânimo. O monólogo interno é resul-
tado de muitos fatores, como: memó-
rias marcantes, conteúdo absorvido, 
interpretação dos estímulos externos 
e reações a sintomas endógenos. Ou 
seja: também estamos à mercê de mui-
tas possibilidades sobre as quais não 
temos, de fato, muito controle.
Podemos destacar alguns aspec-
tos e como trabalhar – de dentro 
para fora – a busca pela excelência 
no nivelamento emocional. Não é fá-
cil, mas pode se tornar natural com 
o passar do tempo. A experiência 
de vida, seja ela qual for, e como foi 
interpretada, é o maior provedor de 
estruturas frasais que f icam ricoche-
teando na mente de todos nós. As 
trocas que fazemos com o grupo com 
que nos comunicamos é a segunda 
variável mais importante: o que ouvi-
MODELO MENTAL
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O prof. dr. João Oliveira é doutor em Saúde Pública, psicólogo e diretor de Cursos 
do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br).Entre seus livros estão: 
Relacionamento em Crise: Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; 
Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente 
Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise 
Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora).
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Podemos apresentar algumas di-
cas de como direcionar o pensamen-
to para o gerenciamento emocional. 
Qualquer modelo existente pode ser 
melhorado e, uma vez que se descubra 
como isso possibilita melhores resul-
tados, provavelmente as práticas serão 
incorporadas no dia a dia como parte 
das atividades essenciais: Meditação: 
os melhores operadores do mercado 
f inanceiro possuem uma rotina quase 
religiosa de acordar muito cedo para 
meia hora de meditação. Trata-se de 
um alinhamento emocional antes de 
começar a atuar no ambiente de rápi-
das mudanças, onde a percepção deve 
ser muito apurada. Mantra pessoal: 
método criado pelo psicólogo francês 
Émile Coué e aprimorado nos últimos 
anos. Absolutamente simples! Monte, 
de forma assertiva, um pequeno tex-
to de incentivo. Grave no seu próprio 
celular e escute várias vezes ao dia. 
O mantra criado pelo Coué, para ter 
pequena busca na internet que, com 
certeza, irá encontrar uma centena de 
textos e livros com exemplos de ativi-
dades para o cérebro.
São apenas dicas para começar 
um trabalho que, com certeza, não 
terá f im. Não existe um modelo ou 
nível melhor que o outro, pois de-
pende de cada momento na vida e do 
ambiente onde estamos inseridos. No 
entanto, todos os modelos podem ser 
aprimorados. Se está pensando em 
começar a se trabalhar, o momento 
é agora: não espere pelo próximo mi-
nuto. Descubra como a abundância e 
a escassez podem fazer toda a dife-
rença nos resultados de vida prof is-
sional e também pessoal. 
como exemplo, é esse: “Todos os dias, 
sob todos os aspectos, eu vou cada vez 
melhor!”. Palavras de controle: bus-
que, todos os dias, novas palavras que 
possam estar ligadas ao seu propósito 
prof issional ou pessoal. No mínimo 
dez novas palavras por dia, anote e 
incorpore em suas frases essas novas 
palavras. Vá juntando as palavras ao 
longo dos dias e no f inal de semana 
revise tudo, palavra a palavra, e o sig-
nif icado de cada uma para você. Caso 
tenha dif iculdade, faça uma busca na 
internet pelo processo Vitatransfor-
matio, pode ajudar. Neuróbica: exer-
cícios de neuróbica já são mais do 
que conhecidos. Caso isso seja uma 
novidade para você basta fazer uma 
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CAPA 
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Deixar marcas, ser notado, não passar em 
branco, ser alguém especial... por que isso 
é tão essencial e essa necessidade tem 
crescido tanto numa sociedade que valoriza 
até a ostentação da felicidade?
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Por Carla Daniela P. Rodrigues
A importância 
em ser 
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CAPA 
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O amor é o 
alimento da 
alma. Amor é 
preenchimento, 
transbordamento, 
alegria. Quando 
estamos cheios 
de amor genuíno 
e realmente 
conseguimos 
nos amar, esse 
amor transborda 
e atinge o outro, 
assim como 
preenche a vida
Amar e ser amado são necessidades inerentes à humanidade, somos seres sociáveis e, como tais, temos o desejo de 
pertencimento a um grupo e de compar-
tilhar amor. Necessidade essa que nasce, 
fundamentalmente, na infância e nos 
acompanha no decorrer da vida.
O amor é o alimento da alma. Amor 
é preenchimento, transbordamento, 
alegria. Quando estamos cheios de 
amor genuíno e realmente consegui-
mos nos amar, esse amor transborda 
e atinge o outro, assim como preen-
che a vida e tudo que se faz! É o que 
dizem as escrituras sagradas em “amar 
o próximo como a ti mesmo”. Quan-
do se pratica o amor, a vida se torna 
leve, colorida. Ele é o combustível da 
vida, o sentimento que dá sentido ao 
que somos e ao que fazemos. Quem é 
cheio de amor genuíno, amor-próprio, 
consegue amar o outro de forma in-
condicional. Ter amor ao que faz traz 
felicidade e uma sensação de paz e de 
completude na vida.
De acordo, porém, em como se 
dão as primeiras experiências em com-
partilhar amor, ainda na tenra infância, 
outros sentimentos podem nascer e 
comprometer fundamentalmente a for-
ma como iremos ressignifi car esse senti-
mento futuramente. Se essas experiên-
cias forem negativas, sentimentos como 
frustração e baixa autoestima surgirão, 
determinando os relacionamentos futu-
ros e a visão sobre o amor.
Talvez esse seja um caminho para 
começarmos a entender, olhando para a 
atual sociedade, os motivos pelos quais 
as pessoas buscam incessantemente se-
rem notadas e admiradas, para se senti-
rem valorizadas e amadas. É preciso vol-
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A criança quer chorar, gritar, expres-
sar livremente seus sentimentos e até sua 
agressividade, mas precocemente é re-
primida em seus atos, para ser apreciada 
e amada. Ela deve se comportar para ser 
aceita e querida e assim pode ir apren-
dendo a ter a necessidade de aprovação 
externa sobre os seus comportamentos. 
Ela percebe, ou sente, que existe um pa-
drão para “acessar o amor do outro” e, 
cada vez que ela não consegue alcançar 
esse padrão em suas experiências, se sen-
te insegura e frustrada, dando início ao 
processo das neuroses.
O amor deixa de ser algo entendido 
como natural, inerente, incondicional, 
para ser visto como algo a ser conquis-
tado, ou seja, surge a necessidade de “se 
fazer amado”.
Dessa forma, de acordo com essas 
primeiras experiências infantis e con-
forme as frustrações com estas vão cres-
cendo, a autoestima vai diminuindo, 
criando-se uma lacuna entre o querer e 
o conseguir ser amado.
O amor-próprio diminui gradativa-
mente frente às inseguranças surgidas. 
Sem amor-próprio o amor ao outro se 
torna um processo difi cultoso, árduo.
Sem o amor-próprio não há como se 
valorizar e o conhecimento de si mesmo 
tar à infância para começar a entender 
esses processos.
Segundo Freud, a criança ao nas-
cer se depara com uma sociedade neu-
rótica e vai se moldando aos poucos, 
tornando-se mais e mais sensível a 
essa neurose.
Carla Daniela P. Rodrigues é especialista 
em Psicopedagogia e em Neuropsicologia. 
Terapeuta em distúrbios do desenvolvimento, 
palestrante e professora no ensino superior, 
pesquisadora em Neurociências 
carladaniela_psico@hotmail.com A sensação de amar e ser amado é uma necessidade do ser humano, pois todos têm o desejo do 
pertencimento a um grupo e de compartilhar amor
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Quem é cheio de amor genuíno, amor-próprio, 
consegue amar o outro de forma incondicional. 
Ter amor ao que faz traz felicidade e uma 
sensação de paz e de completude na vida
passa a ser um referencial no “reconheci-
mento externo”. Se alguém diz que você 
é bom, você se sente bom, e se diz que 
não é bom, sente-se deprimido. A neces-
sidade de ser aprovado foi ensinada: se 
não há reconhecimento, não há valor. In-
felizmente, esse sentimento pode acom-
panhar a pessoa no decorrer da sua vida.
Nesse processo, passa a “valer tudo” 
para ganhar o olhar do outro, e a estraté-
gia mais utilizada é a busca pela atenção. 
Chamar a atenção do outro passa a ser 
a tentativa de preencher a lacuna que 
surgiu lá trás. Quando amamos alguém 
prestamos atenção nesse alguém, na-
turalmente. Então, o raciocínio inverso 
passa a ser verdadeiro: quando alguém 
está atento a nós, nos sentimos amados. 
A lacuna está preenchida!
Daí para frente, há alguns desdobra-
mentos que irão resultar em outros: o 
amor verdadeiro e transcendentalpassa 
a ser substituído por um “amor banali-
zado”. Todos se amam, mesmo que te-
nham um relacionamento superfi cial, na 
vida, nas redes sociais, porque a palavra 
“amor” perdeu o signifi cado primário.
A lacuna do verdadeiro sentimento é 
substituída pela busca infi nita pela aten-
ção do outro. E na ânsia por essa atenção 
usam-se as formas mais visíveis para a 
obtenção de olhares, holofotes e admira-
ção: comportamento, fama, ostentação. 
Tudo para ser admirado e desejado.
Entende-se então, assim, que a ne-
cessidade de ser importante é o resul-
tado da falta de autoestima, tornando-
-se uma busca de compensação para o 
vazio, a lacuna sentida na alma quando 
perdemos o amor-próprio e natural.
Mundo das redes
Nesse contexto em que chamar a atenção irá preencher um vazio 
e trazer o sentimento de “plenitude” e 
valorização, surge um cenário maravi-
lhoso que serve para mostrar ao mundo 
“que eu existo” da forma como eu quiser 
ser visto: a internet.
As redes sociais proporcionam a 
vitrine para o mundo. Nela, qualquer IMA
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pessoa pode se mostrar da forma como 
gostaria de ser e arrematar para si os tão 
importantes olhares de aprovação que 
darão a falsa impressão de ser impor-
tante, de ser amado.
Ao postar uma foto ostentando ale-
gria, felicidade, sucesso, realização profi s-
sional e social e começar a receber likes e 
comentários, o ego vai sendo massagea-
do e inicia-se um vicioso ciclo de prazer, 
que vai sendo realimentado, fazendo 
com que haja uma dependência e neces-
sidade cada vez maior desse ciclo.
Dessa forma, as pessoas vão crian-
do “máscaras de felicidade”, procurando 
transparecer, cada vez mais, algo que 
muitas vezes não condiz com a sua rea-
lidade, mas que serve para alcançar os 
olhares, as curtidas e a aprovação.
Dentro de um contexto social em que 
valores materiais são supervalorizados em 
detrimento aos valores morais e éticos, 
é cada vez maior a ostentação no plano 
material, principalmente por jovens e 
Ser notado
Segundo autores como Allan e Barbara
Pease, a necessidade de se sentir no-
tado é muito mais forte do que as 
necessidades fisiológicas humanas. E 
esse sentimento de importância esta-
rá sempre relacionado a uma escala de 
valores. São esses valores que ditam 
como a pessoa se sentirá valorizada. 
Se o dinheiro e o sucesso ocupam 
os primeiros lugares da sua escala de 
valores ela só vai sentir-se realizada 
quando sucesso ou dinheiro lhe forem 
abundantes.
O desejo de pertencimento a um grupo que nos traz felicidade nasce, fundamentalmente, na infância e nos 
acompanha ao longo da vida
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CAPA 
28 psique ciência&vida www.portalespacodosaber.com.br
A criança quer chorar, gritar, expressar 
livremente seus sentimentos e até sua 
agressividade, mas precocemente é reprimida 
em seus atos para ser apreciada e amada. Ela 
deve se comportar para ser aceita e querida
adolescentes, em busca de autoafi rmação. 
Surgem os braggers, termo que em inglês 
signifi ca “fanfarrão”, mas que se refere 
àquele que se autopromove, o exibicio-
nista nas redes sociais. O verbo brag em 
inglês está ligado ao ato de se vangloriar.
Ser uma pessoa de sucesso fi nancei-
ro, profi ssional e pessoal é o modelo de 
alguém bem-sucedido, perseguido por 
milhares de pessoas que almejam a valo-
rização e “ser notadas”.
Assim nasce a “cultura do exibicio-
nismo”, com uma superexposição virtual, 
fi ngindo-se, na maioria das vezes, ter um 
estilo de vida que não é o real. Cria-se o 
“mito” da felicidade em cem por cento do 
tempo, a necessidade de se mostrar exube-
rante em tempo integral, ostentando um 
relacionamento perfeito, uma vida social 
intensa, uma vida profi ssional de extremo 
sucesso, uma vida fi nanceira abundante.
A cultura do exibicionismo
Estudos atuais relacionam essa su-perexposição às redes sociais a 
distúrbios psicológicos.
A Universidade da Pensilvânia 
(EUA) analisou 143 estudantes de 18 
a 22 anos em três plataformas mais 
populares (Facebook, Snapchat e Ins-
tagram) e chegou à conclusão de que 
quanto mais tempo esses jovens passa-
vam junto às redes, mais probabilidade 
apresentavam em relação a manifesta-
rem sentimentos e comportamentos 
de tristeza, depressão e solidão.
Parece um paradoxo, uma vez que, ao 
inventar o Facebook, Mark Zuckerberg 
propunha um espaço de liberdade e de 
conexão, um ponto de encontro para 
amigos. Hoje, com mais de dois bilhões 
de usuários ativos por mês, a plataforma, 
tal qual algumas outras, pode instigar 
sentimentos negativos e prejudiciais à 
saúde psíquica.
Chega a ser irônico, diz Melissa 
Hunt, líder da pesquisa. Porém, ao anali-
sar de perto o comportamento dos usuá-
rios, percebe-se que tudo faz sentido: há 
muita comparação entre aquele usuário 
que está vendo a publicação e exposi-
ção do outro com a sua própria vida. A 
impressão que se tem é que a do outro é 
sempre muito melhor do que a sua, esti-
mulando o aparecimento de sentimentos 
de menos valia, incompetência e baixa 
autoestima. 
O psicólogo Ethan Kross, da Uni-
versidade de Michigan, aponta em seus 
estudos que, quanto mais tempo conec-
tadas, mais insatisfeitas as pessoas fi cam 
com suas próprias vidas.
Uma outra pesquisa, realizada pela 
Universidade Humboldt, em Berlim, en-
trevistou 357 universitários e descobriu 
que o principal sentimento manifestado 
em relação à vida virtual é a inveja. Uma 
a cada cinco pessoas pesquisadas aponta 
o Facebook como origem do sentimento 
de inveja em sua vida.
Quase 30% dos jovens entrevistados 
relataram sentir inveja ao ver posts sobre 
viagens, atividades de lazer de amigos e 
postagens vinculadas ao sucesso.
Alguns usuários, mesmo se exibin-
do, se mostram chateados quando suas 
postagens de ostentação não são notadas IMA
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Se as experiências forem 
negativas, sentimentos 
como baixa autoestima 
surgirão, determinando 
relacionamentos futuros e a 
visão sobre o amor
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psique ciência&vida 29www.portalespacodosaber.com.br
DOPAMINA, REDES SOCIAIS, VÍCIO E PRAZER
 para saber mais 
Estudos atuais, como os da Global Web Index (2015), apontam que os brasileiros passam cerca de 26 horas semanais em redes sociais. O nú-
mero vem aumentando, o que prova que existe um ciclo vicioso na utiliza-
ção das redes. Esse fenômeno é explicado neurologicamente. Quando nos 
deparamos com um estímulo prazeroso, o sistema de recompensa cerebral, 
chamado núcleo accumbens, é ativado pela dopamina, um importante neu-
rotransmissor do sistema nervoso central (SNC), que é liberado nas situa-
ções de prazer. Nas redes, assim como no ato de fazer esportes, ou no ato 
de jogar, comer chocolate, ouvir música, entre outras situações de prazer 
que podem ser até mesmo ideias, o sistema de recompensa é ativado 
através dos elogios, comentários, curtidas, fortalecendo um ciclo vicioso 
de “prazer” liberado pela dopamina nessas áreas de recompensa do cérebro. 
As redes sociais podem se tornar prejudiciais, como o uso das drogas, que 
também liberam uma quantidade exorbitante de dopamina, fazendo com 
que o cérebro entenda a ação como algo que superestimula a área de re-
compensa. Além de 
massagear o ego, 
trazendo a sensação 
de plenitude e va-
lorização, o acesso 
intenso às redes so-
ciais ativa o sistema 
de prazer das redes 
neurais, promoven-
do um bem-estar fí-
sico e mental nessa 
prática.
Fonte: http://i.imgur.
com/fu8gx78.jpg
De acordo com 
as primeiras 
experiências 
infantis e 
conforme as 
frustrações 
com estas vão 
crescendo, a 
autoestima vai 
diminuindo, 
criando-se uma 
lacuna entre 
o querer e o 
conseguir ser 
amado
como gostariam, aumentando ainda 
mais um ciclo de disputa por curtidas e 
por serem notados.
Recentemente, o caso de uma jovem 
consumida pela mídia social e necessida-
de de aprovação foi exposta, por ela mes-
ma, na rede social.
Essena O’Neil, uma jovem aus-
traliana de 18 anos, consagrada 
como

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