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Hugo Lovisolo A educação Física vive momentos de discussão e crítica de questões vinculadas à sua identidade e lugar entre as disciplinas científicas, e com sua legitimidade e papéis na própria sociedade. Nos cursos de graduação e pós-graduação essas questões suscitam tanto preocupações de ordem intelectual quanto de ordem pessoal. O autor analisa e propõe alternativas, a partir das ciências sociais, para as relações entre educação física e seus fundamentos científicos e para os problemas vinculados àlegitimidade e possibilidade de sua intervenção. Propõe que compreendamos a Educação Física como definida a partir do horizonte de valores (estéticos e éticos), transformados em objetivos sociais, que comandam a intervenção. Considera que os educadores físicos devem desenvolver uma arte da mediação entre conhecimentos, valores e objetivos no programa de intervenção e que essa arte é produto da mediação criativa entre ciências, técnicas e saberes. A intervenção, para o autor, apenas faz sentido, e será eficiente, no seio de acordos sociais livres e participativamente decididos. Tomando como referência a educação física escolar desenvolve e exemplifica esta hipótese. Dada a contraposição de valores que caracterizam a nossa sociedade, e tomando como eixo analítico o valor da competição em jogos e esportes, o autor demonstra as ambigüidades desse valor no plano dos efeitos na formação individual e na dinâmica sócio-cultural. A articulação de valores, éticos e estéticos, e sua quase indistinção ou superposição, é trabalhada no seio do movimento social pela saúde (qualidade de vida, mantendo a forma, prolongando a vida), um vetor de estruturação de nosso presente e um campo significativo, em suas múltiplas dimensões, de atuação profissional. A obra abre para novas questões e formas de olhar a Educação Física no momento atual ao invés de se fechar em posições já estabelecidas. O autor matem um diálogo permanente com o leitor, a partir das ciências sociais, utilizando formas discursivas que facilitam a compreensão do leitor. cação Física ARTE DA I MEDIAÇÃO p O) SPRINT Educação Física .* ' "' oE lífe SE A ARTE DA MEDIAÇÃO Hugo Lovisolo Direitos exclusivos para a língua portuguesa Copyright© 1995 by EDITORA SPRINT LTDA. Rua Adolfo Mota, 61 CEP 20540-100 - Rio de Janeiro - RJ TeL: (021) 264-8080 — Fax: (021) 284-9340 ISBN 85-85031-81.6 Reservados todos os direitos. Proibida a reprodução desta obra, ou de suas partes, sem o consentimento expresso da Editora. Capa e Editoração: VIZUALL Editoração Criativa CIP-Brasil. Catalogação na fonte LOVISOLO, Hugo Educação Física: Arte da Mediação; Hugo Lovisolo Sprint Editora - Rio de Janeiro - RJ - 1995 ISBN 85-85031-81.6 I. Educação Física 2. Esporte 3. Corporeidade 4. Antropologia 5. Sociologia I. Título Depósito legal na Biblioteca Nacional, conforme Decreto n° 1825 de 20 de dezembro de 1967 Impresso no Brasil Printed in Brazil Hugo Lovisolo Doutor em Antropologia Social, professor do mestrado e doutorado em Educação Física da Universidade Gama Filho. Sumário Introdução 01 Capítulo l : A educação física como arte da mediação 07 Capítulo 2: Educação e educação física em escolas de Rio de Janeiro 39 Capítulo 3: Regras, esportes e capitalismo 81 Capítulo 4: Esporte e movimento pela saúde 109 Capítulo 5: Ciências do esporte: interdisciplinaridade ou mediação 133 Bibliografia 149 Introdução Os cinco capítulos que compõem este livro, apesar de escritos em distintas oportunidades entre 1991 e 1994, possuemuma considerável unidade. Trata-se, nos três, de pensar aspectos do lugar da educação físicana sociedade atual e particularmente na brasileira. Devo reconhecer que, antropólogo por formação, meu interesse nos temas que aqui desenvolvo foi durante muito tempo de caráter geral, situavam-se no campo das leituras que as etnografias provocavam em relação as representações e práticas sobre o corpo e as atividades corporais em distintas culturas. A oportunidade de lecionar antropologia e sociologia do corpo e das atividades corporais na Universidade Garoa Filho, no Mestrado de Educação Física, possibilitou o contato com os colegas e alunos. Os alunos mudaram a imagem que eu tinha dos professores de educação física, os educadores físicos como os chamo, com muito carinho, no primeiro capítulo. Eles me transmitiram um horizonte de questões, de problemas e ansiedades profissionais que eu nem imaginava existirem. Meu interesse no campo se potencializou e iniciei pesquisas ria área. Alguns princípios orientadores de leitura dos fenômenos que~\ nos ocupam me parecem evidentes. O primeiro é que o corpo fornece um grande modelo de referência, um manancial de metáforas para pensarmos tanto questões não corporais nem materiais quanto a própria sociedade. O segundo, é que a linguagem sobre o corpo torna- j se figuras de expressão de instâncias ou processos não corporais. O i terceiro, é que o esporte e as atividades corporais tornaram-se, além dê" um componente do processo civilizador, no sentido elaborado por Elias, um modelo de entendimento, por vezes crítico, da sociedade. O quarto, é que a procura do equilíbrio entre o físico e psíquico, o corporal e o mental, a carne e o espírito (talvez entre natureza e j cultura?) é um vetor significativo para entendermos o auge das práticas corporais. Há, acredito, uma espécie de recusa à preeminência 'j qualquer um dos aspectos e sua substituição por um modelo de circularidadê ou de condicionamento reciproco entre os leigos e os M especialistas. O quinto, é que a procura da longevidade e de manter J a forma ou estar em forma são chaves orientadoras, talvez também-i _i -L : práticas de resistência à entropia natural e social, para entendermos o fenômeno das práticas corporais. Recuso, portanto, entender os esportes e as atividades culturais como meros mecanismos de fuga e (descompromisso. r No Ocidente a formação dos homens implicou gradativamente a constituição de quatro questões principais: ada formação intelectual, a da moral, a da manual e a da física ou corporal. Apaideia no Ocidente respondeu com variações ao longo de sua história aos problemas que cada dimensão apresenta. De fato, as propostas pedagógicas tratam destas questões combinando-as, fundindo-as e hierarquizando-as .segundo perfis particulares. Assim, por vezes, trata-se de formar o intelecto, o físico e a habilidade manual. Em outras, apenas o espírito e o corpo ou a consciência e o corpo. As vezes a moral é absorvida na tematização da formação política ou do cidadão. As quatro questões, e seus desdobramentos em questões específicas, continuam sendo relevantes por estabelecerem ao longo da história uma rede de relações de signos variados. Tomemos as questões mais próximas para observar, por exemplo, que a formação intelectual (a habilidade no raciocínio, na utilização criativa de informações, como exemplos) não se confunde com a moral embora estejam inter-relacionados. E fácil mencionar muitos exemplos de pessoas dotadas intelectualmente porém altamente questionáveis sob o ponto de vista moral ou do senso que possuem da justiça. Entretanto, hoje, um corpo, formado a partir de hábitos de controle alimentar e da prática esportiva, pode nos estar sinalizando uma atitude moral, a do autocontrole, e também produzir um efeito que entendemos como estético. A educação física surge na modernidade vinculada à questão da formação dos corpos e superpõe no horizonte de seu agir objetivos diversos: militares, disciplinares, de saúde, estéticos, esportivos recreativos, esportivos de alto rendimento e expressivos e formativos do eu mediante o corpo, entre outros. Em tempos de critica e rebeldia, a educação física, ou melhor seriadizer os educadores físicos, expandem seus campos de intervenção. Emergem assim propostas de educação física preocupadas com a formação intelectual, a consciência política e moral, a formação holística dos "eus" entre outros novos objetivos. O espírito crítico revisa a história da educação física, retomando questões sobre suafuncionalidade ou capacidade de transformação manifesta ou latente. Também olha para as práticas esportivas e corporais encontrando nos modos de sua realização e em suas regras interesses de acomodação, domínio e manutenção de ordenamentos nem sempre justos. Por vezes, os educadores físicos se sentem em meio de uma crise: de valores orientadores, de identidade, de consenso em relação aos processos de intervenção e a seus objetivos. Acredito que a crise resulta das forças do relativismo que domina nosso presente. Se nos entregamos ao relativismo temos que reconhecer que há lugar para qualquer tipo de representação sobre o corpo e para qualquer tipo de prática corporal. Temos que aceitar que cada grupo e cada indivíduo tem direito a pensar e tratar de seu corpo como sua vontade lhe indique. O educador físico seria assim um mero mediador, alguém que estabelece um programa de atividades, que distribui um conjunto de meios, para atingir ou satisfazer as demandas do grupo com o qual trabalha. Contudo, uma boa parcela dos estudantes e profissionais da educação física recusa esse papel por dois motivos principais, analiticamente distinguíveis, porém, na prática, altamente coexistentes. Por um lado, porque acreditam que seu próprio conjunto de valores é superior aos do grupo com o qual trabalha. Assume-se, então, como formador de valores, como orientador de condutas de pensar e fazer. Pensam que os outros estão alienados, não são conscientes ou ainda não ascenderam ao entendimento do justo, do verdadeiro e do belo. Por outro, existem os que pretendem reencontrar aunidade maisque imporum conjunto de valores, Sentem-se desgarrados pela fragmentação do presente, procuram e querem reencontrar a unidade, a comunidade de valores e de formas de expressão. Os artigos situam-se nesse contexto de reflexões, sentimentos e atitudes. O primeiro, A editcaçãofísica como arte da mediação, título do livro, procura clarificar a distinção entre intervenção em educação ._física e pesquisa disciplinar e entre intenções é efeitos nos processos de intervenção no campo. O segundo, apresenta os resultados de uma pesquisa em escolas do Rio de Janeiro, realizada com alunos e responsáveis, com o intuito de relativizar, partindo da "demanda", muitos dos discursos elaborados sobre o dever ser da educação física em contextos escolares. Trata de dizer que devemos escutar o que os alunos e seus responsáveis estão demandando da escola e da própria disciplina educação física. Trata de insinuar que a escola não será boa se não estabelece acordos entre seus agentes. O terceiro, discute uma questão central: o problema das regras nas práticas corporais e esportivas, tentando relativizar as críticas e abrindo algumas sendas que acreditamos deveriam ser transitadas. O quarto, procura dar algumas pistas para pensarmos esse poderoso movimento de consenso que é o da saúde, talvez a única expressão "anti-relativista" do atual momento. O quinto artigo, volta a retomar, no contexto da interdisciplinaridade nas ciências ao esporte, algumas questões anunciadas, porém não trabalhadas, no primeiro capítulo. Minhas posições, ainda em processo de elaboração e reformulação, foram construídas a partir das questões e reflexões de meus alunos da disciplina Sociologia das Atividades Corporais do curso de Mestrado em Educação Física da Universidade Gama Filho e também dos diálogos no processo de orientação dos mestrandos. Algumas das preocupações dos alunos tornaram-se eixos em minhas próprias reflexões, em vários sentidos são co-autores, embora não responsáveis por muitas das afirmações realizadas. Contudo, não é intenção do trabalho fechar questões, propõe- se mais a indicar algumas pistas para os estudos e pesquisas dos alunos. E de se destacar também as influências das conversas, mais assistemáticas que sistemáticas, com meus colegas do mestrado e, especialmente, com seu coordenador, Helder Guerra Rezende. A alunos e colegas agradeço e dedico estas páginas. Capítulo l A educação física como arte da mediação Introdução A experiência docente na pós-graduação indica que muitas das discussões do campo da educação física, por vezes de grande virulência, são em pane produto de mal-entendidos e, sobretudo, da necessidade de solidificar valores sentidos como verdades pelos seus defensores. Daí a insistência em apresentar a própria posição como se fosse cientifica ou como resultado de um processo de "conscientização11 que, quase sempre, é entendido em oposição à alienação, isto é, como falta de compreensão científica do mundo ou como adoção de ideologias que não se correspondem com a posição social de seus portadores. Os "conscientizados", desde sua posição de superioridade ou .iluminada, consideram-se responsáveis de ajudar aos não conscientizados a realizar sua própria passagem para o estado superior, seja científico, seja de ideologia autônoma. Muitos '"conscientizados" sofrem profundamente quando os t lnão conscientizados" não estão nem um pouco inclinados a reconhecer a bondade do "conscientizador''. Na verdade a posição que ocupam sob o ponto de vista sociológico é semelhante a do catequizador e a do colonizador. A afirmação precedente não implica um juízo moral negativo sobreo conscientizador ou educador. Historicamente, nos movimentos de aproximação entre "intelectuais" e povo, os sentimentos de compaixão, solidariedade, culpa, vergonha e de responsabilidade pela situação do outro desempenharam um papel motor. As ideologias elaboram, refinam esses sentimentos impulsores, lhes dão expressão em categorias como compromisso ou comunhão com o povo ou estar a serviço dos fracos, entre outras. Estes sentimentos possuem dignidade e nobreza e nos é difícil pensar numa sociedade que de alguma forma não os desenvolva nos espíritos e nas práticas. Mais ainda, parece difícil transformar a realidade sem alguma forma de presença desses sentimentos. O motor da ação dos homens carece de seu combustível. Entretanto, em nossas sociedades, a argumentação pseudo- científica torna-se um escudo para a defesa e difusão de sentimentos^ e valores partilhados pelos educadores que se identificam como "comprometidos", e também pelos educadores físicos, os alunos da pós-graduação. Embora eu compartilhe muito desses valores (emancipação, igualdade; liberdade, solidariedade, entre outros) não posso deixar de assinalar que dessa forma se elaboram "ideologias cientificas", isto é, discursos cuja pretensão de justiça e de verdade é legitimada se apresentando como "Ciência". Tal modo de justificar os valores conforma a "tradição cientificista". Sabemos que freqüentemente as ideologias conservadoras —de corte racista ou sexista e outras— apoiam-se também no seu caráter pretensamente científico. A observação das diferenças empíricas entre os homens levou os conservadores a justificar a hierarquia, ainda bastante recentemente sob o escudo de testes de inteligência já suficientemente criticados. A mesma observação das diferenças levou e leva outros a lutar pela igualdade diante de deus, a lei, o estado ou as oportunidades. Em outras palavras, embora se constatasse cientificamente que o egoísmo é parte integrante da natureza humana as sociedades poderiam querer favorecê-lo ou querer criar formas de socialização e educação que fossem contra o egoísmo, mítigando-o, reduzindo seus efeitos. Há, assim, uma alta quota de independência entre a constatação de propriedades dos homens e das sociedades e a ação de indivíduos historicamente situados para formar os homens e remodelar suas sociedades. Julgamos a ciência pela sua coerência interna e sua relação com os fatos nos quais se apoia, porém não podemos julgar os valores da mesma forma. De fato, se acompanharmos Rousseau, pensaremos que os homens estão algemados por toda parte. Mas esta observação, falsa ou verdadeira, não obstaculiza nem um pouco que lutemos pela igualdade. Se a biologia provasse que o instinto de agressão é natural 10 ao homem igualmente poderíamos lutar para desenvolver a paz. Temos suficiente experiênciahistóricaparasaber que apoiar valores unicamente baseados na ciência é perigoso. O que hoje é ciência pode se tornar amanhã mero erro da caminhada. A ciência e a lógica podem ajudar a determinar aquilo que não devemos acreditar, contudo são péssimas companheiras para nos dizer em quais valores devemos apostar para construir o mundo que sonhamos. J Acredito que as ideologias dominantes na educação física em' nosso meio são cientificistas, isto é, pretendem assumirpára o discurso sobre o social o mesmo estatuto dos discursos sobre a natureza elaborado pelas ciências que dela se ocupam. A história e posição da educação física, • enquanto campo de aplicação de conhecimentos científicos, como veremos adiante, gravita nessa direção. Corremos assim o risco, por exemplo, de que um modelo estético do corpo se torne um modelo científico. Mesmo as receitas ou recomendações científicas sobre o tratamento dos corpos modificam-se com grande velocidade. Qualquer um de nós pode lembrar exemplos de hábitos que tidos como científicos deixaram de sê-lo. Para minha geração era cientificamente obrigatório extirpar as amigdalas, hoje esta intervenção, sé realiza pouco freqüentemente. , . • A ciência muda rápido demais para que nela encontremos fundamento de nossos valores e critérios duradouros de orientação no cotidiano. Não estou com isto atacando a ciência, apenas sugerindo que saibamos qual é seu lugar e que não conviríamos a enunciação de seu nome num aríete para impor convicções sobre o social. Talvez seja ainda o marxismo a corrente dominante dentro do cientificismo da educação física. Na verdade um marxismo muito fraco, por vezes nem mesmo um marxismo. Falta-lhes a seus defensores muita leitura, reflexão e observação humilde dos dados que correspondem à realidade formulada pelo próprio marxismo. Um marxismo ao qual falta a observação dos dados, como os que Marx apurava nos informes dos inspetores de fábricas ingleses ou Lenin nos censos dos Estados Unidos, corre o risco de ser apenas preconceito. Solicito que leiam, por exemplo., o livro do professor Medina sobre q corpo do brasileiro como exemplo das afirmações precedentes. Ao 11 invés de pesquisa somente acho nele declarações de grande apelo emotivo. Quando a principal confiança marxista, no plano da intervenção, a de que um mundo centralizado e planejado é superior a um mundo regido pelo mercado parece haver-se derrubado, ou pelo menos eclipsado, e quando ao invés da paz e unidade os países socialistas enfrentam o fantasma bastante real da guerra interna e da fragmentação, a humildade do cientista deveria substituirá crença dogmática. É hora de pensar, de colocar as velhas 'Verdades" em suspense e não de repetir antigos "slogans" que parecem dar a força que a razão falha em proporcionar. Os alunos sensíveis se sentem confusos e este sentimento é certamente melhor do que a afirmação de um dogmatismo sem apoio na realidade. Os professores, pelo menos alguns, sabemos que também estamos confusos pois as razões desse sentimento são bem reais. (/\/\ jj> Q ̂ f\ tV t\- ^ 9. c'ent'fic'smo, entre outros desfavores, faz freqüentemente esquecer que um dos pilares da eficácia da educação é o consenso ou acordo numa sociedade democrática: o compartilhar valores sobre os fins e os meios do processo educativo. Nenhuma educação pode dar certo se não se apoia num horizonte comum de valores perseguidos em conjunto pelos atores do processo educativo. O acordo, entretantõT não significa monolttismo. Significa que apenas é possivel mudar no seio de uma tradição. Os desacordos fazem sentido no horizonte da concordância. A crítica que perde de vista as considerações em pauta acaba jogando tudo fora, água e a criança. A eficácia tampouco existe quando a valorização é meramente discursiva e não se concretiza na prática: pouco se valoriza a educação quando se desvalorizam os educadores. Um educador desvalorizado social; cultural e economicamente é a pior propaganda educacional. Estudar para ser como o professor não parece ser um bom negócio para os alunos brasileiros. Valores e práticas devem assim seguir a mesma música. Esta coerência é um dos vetores do consenso. Minha posição pessoal, que não pode ser confundida com uma solução, e a de que os valores não são nem verdades cientificas nem questão de mero gosto individual. Formam uma estrutura triangular 12 com as questões de gosto, liberdade da esfera pessoal ou subjetiva, e as verdades da ciência, iníersubjetivas em alto grau. Nem pessoais, nem altamente intersubjetivos, os valores merecem ser defendidos com argumentos e ações que os realizem. Embora sejam coletivos eles não se confundem com as verdades cientificas que hoje representamos como transitórias e aproximadas. Portanto, pouco fundamento poderíamos encontrar nelas para construir nosso mundo. Há cientificistas, positivistas e marxistas, que acreditam na eternidade da verdade científica. Claro que se fossem eternas seriam um ótimo fundamento para a construção do mundo. Outros, acreditam que a eternidade é o método científico. Todavia, hoje se fala dos métodos e sabemos que a vigência do método é imersubjetiva, relativa e histórica. A velha solução de dialogar sobre os valores continua sendo um caminho transitável se acreditamos na razoabilidade dos homens. O diálogo apenas é possivel se a democracia é uma realidade do cotidiano. ^ Parece-me que, o diálogo sobre os valores deve reconhecer três^ ^ princípios em nome da experiência: a) O da pluralidade: existe diferenciação significativa devalores nas sociedades complexas. Nossa cultura ou tradição valoriza valores por vezes contraditórios, b) O da HÕO contradição: valores contrários podem ser igualmente valiosos e necessários para a vida humana, neste sentido Kolakowsjd escreveu' seu ti/ogio à incoriseqüência. c) O da sititacionaUdade: situações históricas específicas nos demandam a defesa de valores que podem perigar, estar prestes a morrer. Isto não significa, entretanto, matar os -valores opostos. A luta pela igualdade não deve acabar com a liberdade nem a manutenção da liberdade de poucos significar a desigualdade de 'muitos. Caminhar pelo fio da-navalha é difícil, porém é o caminho necessário e desejável. Por vezes parece que a única forma possível de caminhar é,no vai e vem, no ziguezague. . Uma cultura é forte na medida em que possui um estoque de valores diferenciados mesmo que em contradição. E forte, assim, de modo semelhante ao de uma espécie por possuir recursos genéticos variados. Uma sociedade de valores únicos e não contraditórios é fraca pois dá pouca liberdade de combinação e criatividade aos seus atores. 13 \ / \A Estas sociedades são desejadas por aqueles que sentem a diversidade eo conflito entre valores como negatividade, como falta de organicidade e mesmo como desmapeamento. Assim, segundo meu ponto de vista ^nada original, a palavra de ordem que nos manda escolher entre democracia representativa eydireta é redutora, limita nosso estoque cultural. O bom é se perguntar onde e quando democracia representativa, onde e quando a direta e como combiná-las, conciliá-las. O mesmo em relação a igualdade e liberdade ou aventura e segurança ou competição e solidariedade. Fico com as alternativas, embora hajam situações que demandem a defesa de uma delas e não existam respostas já prontas que definam as escolhas em cada situação. A força do argumento é :entral em cada situação. São citados poucos autores nas notas deste texto. Esta estratégia é proposital pois se quer fugir ao argumento de autoridade. O texto é mais um convite para refletirmos juntos do que uma demonstração, sistemática de afirmações. E um momento de eliminação de obstáculos para pensarmos com maior leveza, com menor carga de sentimentos e preconceitos, ou seja, com argumentos que lembrem sua razão de ser. Não espero, sobre este texto, que os leitores pensem se é ou não cientifico. Interessa-rne, sobretudo, que motive nosso diálogo sem * 'perder a forma1' pois quando ela se perde é difícil dê ser reencontrada. /p i /\Apo P^TA /^T£ ̂ (j^u^íõ^"«lA Sobre a legitimação aas disciplinas e outros tópicos talvez desnecessários Estamos acostumados, em nossa tradição de pensamento, a abordar os fenômenos a partir de perspectivas analíticas. Em outros termos, aceitamos que o ponto de vista constrói o objeto de conhecimento separando o essencial, o determinante, o estrutural ou significativo dos aspectos não relevantes. Um fenômeno como a 1 'vida' * pode legitimamente ser estudado sob o ponto de vista da física (biofísica), da química (bioquímica), da biologia ou da filosofia entre outros. Cada ponto de vista opera uma redução do fenômeno a objeto, de pesquisa. Podemos também discutir sobre qual é o ponto de vista mais 14 O - valioso, verdadeiro, operacional, econômico, redutor, não-redutor, complexo, etc. Supomos então que podemos estabelecer um campo, um terreno neutro ou comum do qual avaliar e selecionar o melhor ponto de vista. Este terreno comum permitiria, epistemologicamente, estabelecer a legitimidade de um ponto de vista e escolher entre teorias concorrentes. Esta confiança hoje está suficientemente alquebrada para que pensadores importantes a questionem e afirmem a impossibilidade de se estabelecer um terreno comum.1 Sem entrar no âmago desta discussão filosófica, podemos constatar que um ponto de vista é socialmente aceito quando é produzido por uma disciplina de reconhecida cientificidade, legitimada como papel na sociedade.2 Neste sentido, cada legitimidade possui uma história. Assim, encontramos físicos, químicos, biólogos e suas respectivas disciplinas. O reconhecimento social, a legitimidade, não eliminam as críticas nem os debates, da mesma forma que reconhecimento dos partidos políticos ou da legitimidade do governo não faz desaparecer a crítica a suas propostas e ações. Os biólogos concordam no papel da seleção, no entanto podem discutir sobre se ela acontece no gene, no indivíduo ou no grupo. Para avançar na discussão é importante saber em que concordamos, e não somente dominar o índice das discordâncias. Assim poderemos sentir a proximidade, e não apenas a distância, que temos com nossos adversários, Habitualmente legitimamos um papel social quando reconhecemos que realiza valores especiais de uma forma adequada. No caso do papel social da ciência,dois valores lhe são atribuídos: o fundamental, o próprio valor do conhecimento como desejável em si mesmo e enquanto meio para se . aumentar o conhecimento (as matemáticas que conhecemos servem para desenvolver "mais" matemáticas); secundariamente, a utilidade do conhecimento para a vida humana, para a solução dos problemas práticos que os homens formulam e enfrentam. A utilidade é secundária, pois se fosse um valor dominante a astrologia seria reconhecida como ciência ao invés da astronomia. Semdúvidaaastrologiaémuitomaisútilquea astronomia no cotidiano das pessoas. -L Ser secundário, todavia, não implica que o valor da utilidadej' 15 não ocupe freqüentemente o primeiro plano da cena, nem que os cientistas não usem a utilidade para obterem legitimidade e apoio de todo tipo. Os cientistas não são tão diferentes das outras pessoas quando argumentam em benefício próprio. Ambos valores são construções sociais que foram realizadas num longo percurso histórico pormeio de argumentos. Éa história quepode explicar o reconhecimento da astronomia como ciência e a não legitimidade científica da astrologiajamaisautilidade. Há pessoas que apenas podem reconhecer a ciência pela sua utilidade. Eles são de fato utilitaristas, embora possam criticar o utilitarismo. Para a maioria das pessoas saber que o homo sapiens tem cerca de 50.000 anos é de completa inutilidade. Apenas é "útil" para compreender nossa precariedade na terra, para saber que estamos aqui apenas nos últimos segundos de um dia de bilhões de anos. Talvez pudéssemos ser mais cuidadosos se sabemos que os dinossauros, grandes e fortes, desapareceram após cem mühões deanos.^p J/A? O R f A /VT& Os dois valores em questão foram e ainda são questionados, 'criticados. Contudo, julgar os conhecimentos prioritariamente a partir de sua utilidade, qualquer que seja ela, é sofrer de miopia utilitarista, isto é, enxergar, e mal, apenas aquilo que está perto. Eu não sei se a ciência chegará um dia a "solucionar" nossos principais problemas. Acredito, no entanto, que pode aumentar a compreensão de nós mesmos e esta é uma das poucas cartas que temos no baralho para definir e enfrentar nossos problemas, A utilidade domina por vezes nas críticas a educação. Assim, por exemplo, se contrapõe ao ensino das matemáticas sua utilidade social. Os homens no mercado realizam cálculos que não sabem fazer no papel, nos dizem, como se estas ações fossem o dever ser das matemáticas. Reduzem o ensino a sua utilidade. Além de sua utilidade, nem sempre explicitada, a geometria euclidiana é um modo de pensar, de definir as coisas e operar com elas. Há verdades e utilidades nela, por certo, porém também há beleza que o docente deve ensinar a apreciar. Quando apreciamos Bach, Guimarães Rosa, Olinda, a vida sertaneja ou a arte de domar os potros, alguma coisa do humano está entrando em nós. Talvez essas artes não sejam úteis no cotidiano da 16 luta econômica. Entretanto, elas participam, com tantas outras, de nossa relação com o mundo. Observo que muitos revolucionários da educação raciocinam como os empresários que apenas querem para os trabalhadores uma educação útil para o processo produtivo, Os revolucionários quase sempre a pretendem útil para o processo organizativo-político. Ambos são funcionalistas e utilitaristas da educação. -1 Há, lembremos, também os que pensam que o progresso do conhecimento científico se traduz em regressão espiritual, moral e mesmo em destruição da natureza.3 Há, então, os que pensam que passaríamos melhor sem ciência. Outros pensam que passaríamos melhor sem esporte ou sem política. Estas soluções se assemelham a acabar com a pobreza matando os pobres. Podemos, no entanto, aceitar que domina na sociedade, embora com reações, o reconhecimento desses especiais valores da atividade científica. Mais ainda, que as áreas de atividades mencionadas ciência, esporte e política podem ser aperfeiçoadas ao invés de decapitadas. Reconheço, entretanto, que o valor de aperfeiçoar nossas atividades, o próprio aperfeiçoar, conta com muitos detratores. Aperfeiçoar passou a ser uma atitude de segunda ou terceira categoria, pois para muitos trata-se de revolucionar. A mudança social pode ser pensada como um processo gradual de transformações ou como um processo que avança a saltos, com grandes rupturas. Os biólogos, nossos parentes mais próximos das ciências exatas e naturais, enfrentam a mesma oposição quando pensam a mudança. Eu defenderia, juntamente' com alguns dos biólogos, um enfoque pluralista: a mudança é por vezes gradual e por vezes revolucionária. Há lugar para todos no pluralismo da sociedade e da natureza. (Recomendo a leitura das obras de S. Gould aos que gostam de biologia e muito mais àqueles que a detestam). £ o baita problema da legitimidade da educação física Cí £l-- L , L Este breve apanhado nos coloca dois problemas sérios.) < .Primeiro: qual é o ponto de vista da educação física, seu objeto. no\V" conhecimento1 de seus fenômenos? Segundo: quais os valores especiais]^ 17 que lhe são socialmente reconhecidos, quer de utilidade, quer de conhecimento? ij r Sejamos generosos, partamos do princípio de que o campo dos -(fenômenos que se ocupam com a educação física é o das atividades \! corporaisnum sentido amplo. Este campo fenomênico é tremendamente " disperso pois pode abranger tudo aquilo que os homens fazem e significam com seu corpo —nível intencional— ou tudo aquilo que os corpos dos homens fazem e significam sem que as intenções dos í homens estejam presentes —nível biológico-, inconsciente individual, "(determinação cultural, etc. • É óbvio que tamanho campo fenomênico pode ser estudado por quase qualquer disciplina socialmente reconhecida. Teríamos assim uma física, uma química, uma biologia, umapsicologia, uma economia, uma sociologia, entre outras, das atividades corporais. Cada uma destas disciplinas estudaria as atividades corporais com um conjunto identificável e distinguível de teorias, métodos e estilos de fazer ciência. Cada disciplina produziria um recorte, uma redução particular . do campo fenomênico na construção de seu objeto. A mesma cidade pode ser habitada e visitada de formas diferentes. Coloca-se então a questão de qual é o conjunto próprio, b identificável e distinguivel, de teorias e objetos, métodos e estilos de fazer ciência da educação física? Qual é o seu recorte? Em outros termos, por certo mais emotivos, qual e a sua identidade? Temos um monte de joãozinhos que fazem musculação cinco r dias por semana e nos perguntamos sobre o porquê deste esforço. Um biólogo poderia responder que eles estão desenvolvendo características corporais que os colocam melhor dianteda seleção natural, isto é, estão potencializando suas possibilidades de reprodução. Um psicólogo, de alguma ortodoxia, poderia responder que estão sublimando determinados instintos e construindo uma imagem do eu. Um sociólogo procuraria no poder da distinção ou na correspondência com padrões culturais as explicações da conduta dos joãozinhos, e também de algumas mariazinhas. O historiador narraria o desenvolvimento histórico dessas condutas, talvez nos levaria em direção das tradições (tantas 18 academias de fisioculturismo levam o nome de Apoio!). Cada um desses cientistas operaria a partir de alguns dos pontos de vistas dominantes em suas disciplinas. Um leitor avisado poderia reconhecer qual a tradição disciplinar que gera a explicação ou interpretação. Qual, me pergunto, é o ponto de vista explicativo da educação física?, Qual a tradição que nos permite afirmar diante de uma interpretação ou explicação que ela pertence ao campo disciplinar da educação física? Ela existe? Mantenhamos um bocadinho mais o mistério. O primeiro mal-entendido: cientista ou bricoleur Uma forma de abordar o problema consiste em se situar no plano da reprodução do papel social da atividade científica. Na reprodução de um físico domina o conteúdo da própria física, isto é, as teorias, os métodos e os estilos de se fazer física. O físico é socializado na tradição da física. Estórias, anedotas, figuras heróicas participam na construção e transmissão da tradição além de teorias, métodos e dados. Com os matemáticos e os biólogos acontecem coisa semelhante na formação • de suas respectivas tradições. Um educador físico suporta um currículo de formação que vai da mecânica à filosofia, passando pela fisiologia,, a neurologia, a biologia, a sociologia, as ditas ciências da educação e a história entre outras áreas disciplinares. A reprodução, ou formação, é claramente mosaico, fragmentária, multidisciplinar, e não dominantemente disciplinar. Os conteúdos do currículo podem enfatizar uma ou outra área disciplinar, mas a ênfase não tira o caráter eminentemente multidisciplinar. Este caráter da formação não implica que se baseie em formas consensuais e satisfatórias de integração ou relacionamento das diversas disciplinas que entram no currículo. De fato, e este é um problema sério na formação, as disciplinas podem ser entendidas como compartimentos sem graus apreciáveis de comunicação. O currículo pode então, com bastante razão, ser entendido como justaposição de fragmentos ou como um mosaico de disciplinas. Na própria pós- graduação, por exemplo, as disciplinas bioméclicas são obrigatórias até para os interessados em fazer história da educação física ou pedagogia 19 O do movimento humano. Observe-se que não estou questionando a importância de cada disiciplina, apenas estou afirmando que não sabemos como costurar os retalhos. O problema se coloca na prática quando o educador físico deve produzir um arranjo das disciplinas num programa de atividade corporal. Neste caso, o educador físico se nos aparece muito próximo da figura do bricoleur^ de Lévi-Strauss, que a partir de fragmentos de antigos objetos, guardados no porão, constrói um objeto novo no qual suas marcas não desaparecem.4 Ele é formado, fundamentalmente, para combinar conhecimentos, técnicas e tecnologias para alcançar objetivos sociais. A combinação, o produto intelectual de sua atividade, se expressa geralmente num programa: de treinamento, de educação corporal ou de lazer entre outros. Esta concepção já estava presente no parecer sobre educação de Rui Barbosa. Mais ainda, se lermos o parecer observaremos que nele a educação física possui o valor instrumental de formar um bom suporte material, corporal, para o intelecto. Seu caráter instrumental e utilitário é evidente. A educação física dominantemente foi considerada como meio pararealizar valores sociais (higiênicos, estéticos e de controle social para citarmos alguns dos mais importantes). Por certo, um profissional de educação física_pode produzir papers que, quando de qualidade, podem ser considerados como trabalhos de fisiologia, de psicologia, de história ou4e sociologia e, neste caso, opera como os profissionais dessas áreas disciplinares. 5 Entretanto, quandoeleplanejaourecomendaatividadescorporaisage, prima fade, como um bricoleur. Por exemplo, quando formula o plano de "educação física" para uma escola pode levar em consideração afirmações, ou conhecimentos, que vão da fisiologia até aquelas que a antropologia elabora e, sobretudo, procura realizar objetivos políticos ou sociais com seu programa. Em outros termos, o programa realiza objetivos que se supõem úteispara a sociedade no seu conjunto, para algum de seus segmentos ou simplesmente para os participantes do programa. A utilidade pode assim ocupar o lugar central na obra /ou programa de intervenção do bricoleur. A tradição da educação l física parece ser portanto a formulação de propostas ou programas de 20 intervenção no plano de atividades corporais que realizem valores sociais. De fato, os cursos de "educação física" foram inicialmente criados para formar especialistas em um tipo de intervenção. Neste sentido, considerou-se a educação física como um campo de "aplicação" das disciplinas científicas, O educador físico deveria ser alguma coisa assim como um engenheiro das atividades corporais na realização de valores postulados como sociais pelos idealizadores. j A intervenção, então, devia e deve, tudo indica, basear-se nos l ' conhecimentos cientificos das disciplinas que podem auxiliá-la. Entretanto, nem a definição dos valores orientadores da intervenção nem a seleção das disciplinas ou conhecimentos auxiliadores são j i < _ • - = - .:„.«„,„ f rdecisões científicas. Confundir os dois papéis, o do cientista e o do bricoleur, ou interventor", é o primeiro e freqüente mal-entendido que encontramos entre os educadores físicos. Este mal-entendido se relacionarão da confusão entre disciplina e programa de atividade? O segundo mal-entendido: disciplina ou programa de atividades "• Há ainda um segundo mal-entendido que persegue a educação física. Na verdade na escola, no clube, na fábrica, nas academias, nos centros de recuperação se realizam atividades corporais programadas (jogos, esportes, ginástica, etc.) emfunçao de objetivos sociais. Nesses lugares não se ensina a disciplina "educação física" ainda que esse possa ser, no caso das escolas, o nome das atividades no horário escolar. O professor dematemáticasoudefísicae/í5/>?c/^tó/wí7//£:a/ne//íe o conteúdo de sua disciplina no seu horário escolar. Ensina parcial e gradativamente aquilo que aprendeu na sua própria formação, isto é, matemática ou física. Em outras palavras, o objetivo de sua ação educativa reproduz —parcialmente e segundo critérios de adequação ao tipo de ensino— o currículo de formação de sua área disciplinar. Esta, de praxe, não é a situação do professor de educação física: ele não é contratado para ensinar aquilo que aprendeu na sua formação. 21 r / £j ÍEspera-seque oaprendido sejautilizado na formulação de um programa, s /baseado no conhecimento científico, de atividadecorporal que deve ^J realizar objetivos sociais, isto é, valores em condições determinadas. ^ Os objetivos sociais dos programas de intervenção são a especificação de valores adeterminadas condições queconformam, na representação, uma situação singular.6 Encontra-se, portanto, próximo das fimções-do médico, do engenheiro, do assistente social e do pedagogo quando agem no plano da intervenção. Esta situação especial e paradoxal não deve ser dimihuida em mportância e significado,pois a sociedade moderna pareceria que não pode funcionar sem os especialistas da intervenção. Uma sociedade sem especialistas seria muito diferente daquilo que entendemos por sociedade complexa, moderna e plural. Entretanto, a situação especial leva a muitos professores de educação física a procurar ensinar fragmentariamente (nem gradativa nem sistematicamente) conteúdos do currículo de sua própria formação. Leva-os a projetar, no sentido psicanalítico vulgar, sua formação na formação dos participantes da atividade corporal programada. Buscam imitar a conduta daqueles^jue \ ensinam as disciplinas reconhecidas como científicas. Assim, o educador ^físico pode tentar ensinar a mecânica ou a fisiologia de um determinado movimento; a antropologia, sociologia ou história de um esporte em particular como se este fosse um objetivo em si mesmo. De praxe, os ^educadoresfísicos acreditam que essa projeção (formação) é necessária, útil, boa, conscientizadora para os praticantes ou participantes dos programas de atividades corporais. Entre os alunos de pós-graduação em educação física a procura de formas de realizar a projeção se torna angustiante, obsessiva.7 Aquilo que outras áreas discipünares fazem de modo natural é um espelhismo que corre sempre na frente dos educadores físicos. ^ Talvez devêssemos mudar a lente da comparação e tomar como referência a formação do médico. Neste caso também nos confrontamos com um currículo de estrutura multidisciplinar. Também o médico pode fazer pesquisa em bioquímica, genética, físiologia, neurologia ou qualquer outra especialidade operando, em cada caso, com as teorias, métodos e estilos da área disciplinar na qual realiza a pesquisa. 22 D Entretanto, quando é médico, quando deve prevenir, proteger ou restaurar a saúde dos indivíduos ou da população também ele opera como um bricoleur: usa recursos diversos em função de objetivos sociais. Cria um programa no qual articula conhecimentos de áreas diversas, técnicas, tecnologias e até efeitos simbólicos quando os considera como elementos ativos ou coadjuvantes do processo de cura ou restauração. Mesmo quando populariza os conhecimentos médicos o objetivo é a saúde e não a formação médica. Os conhecimentos são considerados como um meio e não como um objetivo em si mesmo. Uma pesquisa em química não se confunde com uma pesquisa em medicina, apesar que os resultados dessa pesquisa sejam úteis para a saúde. Uma pesquisa médica, insistamos, se distingue por se colocar no ponto de vista de articular recursos diversos —de conhecimentos e técnicos com a finalidade de realizar o objetivo social da saúde--. Esta pesquisa não deve necessariamente aumentar os conhecimentos que articula, seu valor deriva fundamentalmente de sua utilidade para realizar objetivos sociais. Uma correlação empírica positiva entre uma substância e uma doença é um bom fundamento para uma terapêutica, embora não saibamos como a substância possa atuar no organismo. As linhas de demarcação são por certo frágeis, contudo o papel do médico e da medicina não se confunde com o papel da pesquisa nas disciplinas que subsidiam a medicina. Assim como não confundimos o dia e a noite embora seja impossível determinar quando um termina e o outro começa. Foi na história que a medicina ganhou grande reconhecimento e os médicos passaram a ter um poder político e uma incidência cultural considerável. Hoje apreciamos o papel social da medicina e de seus mediadores, os médicos. Podemos discutir se ela deve ser privada ou pública, se desenvolver a medicina preventiva, de base ou as especialidades, se concentrar esforços na alopatia ou desenvolver a homeopatia ou as ditas medicinas ou curas alternativas. Não está em questão a necessidade da cura nem a atividade médica que a toma por objetivo. Tanto os médicos estão seguros do reconhecimento do seu papel social que podemos encontrar médicos que aceitam tudo aquilo 23 que é bom para a cura do paciente. Assim, não descartam as práticas terapêuticas populares de cura nem os efeitos simbólicos dos rituais religiosos ou de corte psicanalíticos. O programa terapêutico pode incluir tudo aquilo que comprovadamente não seja contrário ao objetivo social da cura. O programa articula, concilia, diversos recursos em prol da cura. No passado, quando a medicina ainda não havia sido reconhecida, sobretudo na cultura popular, os médicos lutavam pela penalização de práticas terapêuticas que hoje aceitam com bastante entusiasmo como coadjuvantes. A diferença especifica da medicina se reflete em representá-la como competência para combinar ciências, técnicas e experiência. Por vezes a competência para combinar recursos diversos recebe o nome de arte, O mesmo qualificativo tem recebido a agricultura e a educação, entre outras tantas atividades.8 O qualificativo indica que os •{recursos não podem ser combinados cientificamente ou por um algoritmo. Indica então que a atividade do bricolenr, seu gênio, instinto, percepção, entre outras alusões ao mesmo problema, é~ fundamental. Digamos que dizem que a criatividade para realizar o rograma não pode ser programada, que é uma artev Educação física e objetivos sociais contrapostos O que hoje conhecemos por educação física emerge como reflexão que articula conhecimentos ou saberes para realizar objetivos sociais. As propostas de atividades corporais programadas, não espontâneas, procuram realizar valores sociais: tradicionalmente corpos fortes e sadios, corpos disciplinados, caráteres, personalidades, hábitos entre outros. A atividade corporal é entendida como meio, como recurso, para se realizar valores sociais. Observemos que é somente no discurso e conduta das crianças onde o jogo, o esporte e a brincadeira se colocam em si mesmos como finalidade. Os adultos, habitualmente, atribuem a essas atividades também, ou dominantemente, outras finalidades, situam-nas como meio que contribui para o trabalho, asaúde, o relaxamento ou outros objetivos. Os adultos tendem a racionalizar e justificar, em linguagem utilitária, as atividades corporais. 24 Esta posição de mediação não se modifica quando no presente , colocamos valores tais como-a liberdade, a felicidade, o prazer, a n conscientização do corpo, a transformação social, a realização do eu ou qualquer outro enquanto objetivos das atividades corporais. Todavia, esta situação não se modifica quando se trata de integrar a dualidadecorpo-mente. Asatividadescorporaisprogramadascontinuam "J sendo um meio para se realizar valores de utilidade social, embora sejam diferentes dos tradicionais e diferentes grupos de profissionais e . intelectuaisque defendem valores contrapostos, e cadagrupo considere as elaborações adversárias, pensadas por vezes como inimigas, como fonte do erro ou ideologias a serviço dos opressores ou qualquer outro qualificativo. Uma sociedade plural se caracteriza pela existência, xA confronto e conciliação de valores e objetivos diferentes e por vezes em • 5 franca oposição. No presente lidamos tanto com valores gerados no ̂ passado quanto com aqueles que supomos apenas terão vigência plena ^~ no futuro. O presente aparece como lugar de tensão, de irresolução, T de confronto e conciliação. Lt É por razão da obrigação de realizar objetivos sociais, e nãoA )- meramente produzir conhecimento, que a principal discussão no :ampo da educação física é sobre os objetivos sociais que ela devetllllLÍVy «w WUUW*Y»U _ _ _ _ Tomover, perseguir, realizar. De fato, não podemos cientificamente \r decidir se a educação física deve perseguir o objetivo da emancipaçãopolitica ou o da saúde ou o da estética do corpo. Em segundo lugar, as discussões centram-se sobre as características dos programas para a jgalização dos objetivos uma vez definidos. Os profissionais da educação física referem-se permanentemente ao seu compromisso com a prática, em definitivo, ao conjunto dos valores transformados em objetivos que devem promover no programa L de atividade corporal. No campo da medicina e da engenharia a legitimidade social é grande, e é significativamente alto o consenso sobre os objetivos sociais a serem promovidos. O grau de consenso, por demais o grau de\\ qualquer coisa, é importante na sociedade. Não podemos refletir e agir sobre o social se o grau daquilo que consideramos não é levado em consideração. Temos que deixar de considerar o grau como C9 í/significativo, acessório ou negligenciável. Na verdade "o grau" é freqüentemente o verdadeiro problema.9 É o alto grau de consenso da medicina, por exemplo, que faz com que os valores sociais da saúde sejam lidos como demanda do povo, da classe trabalhadora ou da sociedade e não como trabalho de imposição dos especialistas. Como conseqüência, o próprio especialista se sente respondendo a uma c( demanda. Pode se apresentar e se sentir como solucionador de demandas, esquecendo que seus predecessores agiram ativamente para definir o perfil das demandas atuais e deixam de notar que eles contribuem para sua redefinição constante. A situação atual, na medicina e outros campos de atividades, oculta o longo trabalho dos especialistas (da saúde, da religião, dos humanistas) para inculcar valores, estruturas de personalidade e padrões de comportamento na sociedade. Formação que abrange os modos de reprodução e sexualidade, de atendimento do corpo, de definição da normalidade ou saúde, de espectativas em relação à duração da vida, de ideais de corpo entre outros.10 Este longo trabalho de inculcação faz, por exemplo, que objetivos como a longevidade, a altura e peso dos indivíduos se tenham tornado valores' 'naturais". Os jornais registram a preocupação com abaixa estaturadosbrasileiros, quando comparada com as médias americanas por exemplo, e tomam uma maior altura média como símbolo de progresso alimentar, da saúde, enfim, das condições de vida. Esta absolutização para qualquer realidade indica a pouca base científica do valor da altura, pois, sob o ponto de vista darwiníano, a altura apenas poderia ser considerada como positiva ou negativa pela sua adequação ao contexto. Devemos reconhecer que o apelo á argumentos científicos e ao prestígio da ciência foi fundamental na construção social dos especialistas do corpo. ^ A educação dos corpos, a educação física, emerge no bojo das atividades de intervenção dos especialistas. Sua institucionalização resulta da demanda de programas de atividades cprporajsque realizem objetivos sociais. Assim, é impossível pensar a educação física sob o modelo da institucionalização das disciplinas cientificas. De fato, a educação física não possui um objeto próprio, delimitado, específico. Ao longo de sua história as atividades corporais situaram-se em (J 2Q relação a valores e objetivos sociais. Os historiadores da educação\ física afirmam, e por vezes se queixam, de serem suas atividades consideradas como disciplina corporal que contribui na formação moral ou do caracter. Assim, o corpo deve ser trabalhado para ser um bom receptáculo para uma mente que, ao mesmo tempo, o considera' um instrumento, um meio de sua realização. Quase todos os manuais de história da educação enfatizam que o enfoque biomédico e as necessidades militares institucionalizaram a educação física no sistema educacional na primeira metade de nosso século. n A formação de especialistas resultou assim de uma demanda associada de corpos sadios e funcionais para a ordem social, a economia e a defesa nacional Quando as demandas originais perdem seus fundamentos, e se tornam preconceito, são retrabalhadas e criticadas sob a base de demandas emergentes inseridas em redefinições, necessidades e objetivos sociais w c ( J* Demandas sociais e propostas A educação física hoje aparece como um campo no qual projetos e demandas variadas se confrontam. Um amplo leque de demandas -isoladas ou associadas e mais ou menos consensuais— definem o horizonte de atuação dos profissionais da educação física na sociedade. Ao mesmo tempo, o campo da educação física está eivado de- propostas de novo tipo, muitas delas ditas contrárias às demandas tradicionais ou socialmente dominantes. Apontemos, sem pretender ser sistemáticos e exaustivos, algumas delas. Em primeiro lugar, o discurso biomédico continua apresentando demandas vinculadas à saúde. A atividade corporal situa-se aqui em três dimensões principais: a) como preventiva de doenças e dos desgastes da velhice —recusa social a se envelhecer--, b) como formadora, mantenedora e recuperadora da disposição física ou do corpo, a atividade corporal na empresa poderia aqui ser incluída, c) como compensadora dos desgastes neurológicos e/ou psicológicos da vida moderna e d) como recuperadora de funções corporais perdidas ou não desenvolvidas em indivíduos. Neste campo, as propostas 27 alternativas à físiologia ou medicina normal se multiplicam. Propostas que objetivam à unidade da mente e do corpo, ao tratamento das dimensões emocionais entre outras. As ciências biomédicas ocupam um lugar de destaque no fundamento das propostas de intervenção relacionadas com estes objetivos. Em segundo lugar, há um conjunto de demandas estéticas, por vezes travestidas de cientificas, que se expressam nas atividades de construção de modelos ou tiposideais de corpos. Realizam-se esforços • significativos para se construir uma identidade, uma distinção, a partir da imagem do corpo. No plano mais geral, por exemplo, torna-se uma preocupação a altura e peso da população. As academias de formação de corpos estéticos se multiplicam. Em terceiro lugar, destaca-se a demanda das atividades corporais -recreação, divertimento, lazer, etc- ocuparem o tempo livre que resulta da tendência à redução dajornada de trabalho, de mudanças em suas modalidades e de redefinições amplas da sociedade. Emergem as propostas sobre o prazer de "trabalhar" o e com o corpo. O enfoque "liberador" , por sua vez, enfatiza que o corpo deve ser liberado dos domínios aos quais foi submetido para recuperar o prazer do corpo. O pensamento crítico humanista participa ativamente na discussão e implementação de propostas deste tipo. Situam-se em quarto lugar as demandas do nacionalismo esportivo. Ao invés de ganharmos e festejarmosaguerrao nacionalismo nos manda ganhar competições esportivas, científicas e artísticas. O espírito competitivo e a procura do louvor deve se realizar na paz dos esportes, na doçura das atividades científicas e artísticas e não no campo de batalha. O desenvolvimento de capacidades Esportivas e o treinamento é hoje um campo significativo para os profissionais da educação física em nosso meio. O Brasil não somente exporta jogadores de futebol, como também treinadores nessa e noutras modalidades esportivas. Em relação a estas demandas as propostas alternativas se situam dominantemente no questionamento dos meios recomendados para a realização dos objetivos. Em quinto lugar, c onfront amo-nos com as demandas de atividades corporais na educação formal. Os objetivos são aqui 28 diversificados: saúde, desenvolvimento psicomotor, cognitivo, conscientizadores ou políticos entre outros. Neste tipo de demanda os profissionais da educação física interagem fortemente com os pedagogos, os educadores. A filosofia, a psicologia, a sociologia e antropologia educacional subsidiam ativamente as discussões neste campo. pb l f^ÇO PI AA>Tb Em todas estas e outras demandas os educadores físicos participam discutindo e apresentando propostas que fazem'a sua definição de objetivos, perfil da demanda e características de cada atividade. O campo da educação física aparece diante de nós como conflitivo, onde se disputa a hegemonia de definições,objetivos e> práticas em qualquer segmento de demanda. Observamos que "projetos" e '.'compromissos" antagônicos se confrontam em qualquer segmento de demanda. A intervenção no campo das atividades corporais continua sendo o núcleo da tradição da educação física, l /W u Da arte da mediação: objetivos e meios TO bj A situação apresentada nos leva a redefinir o papel de bricoleur como arte da mediação: mediação entre histórias, entre presente e futuro; mediação entre disciplinas; mediação entre ideologias ou demandas sociais na elaboração do programa de atividade corporal. Q educador físico, o mediador, não se relaciona apenas com a articulação de áreas disciplinares. A representação e avaliação da história, do presente e futuro' de sua atividade, desempenha um papel central em suas propostas. Também os valores que escolhe promover e realizar agem sobre as propostas. Estes planos de construção das/1 propostas agem sobre a escolha das disciplinas que o mediador prioriza na elaboração de seus programas. Assim, as incidências sobre a arte da mediação são múltiplas. Recortaremos apenas alguns de seus aspectos A arte da mediação se nos aparece como estando principalmente condicionada pela opção entre a "aceitação" e a "determinação" da demanda. Isto cria como duas tribos de profissionais da educaçãc física. O profissional que aceita a demanda guia-se na elaboração do 29 programa por objetivos externos, isto é, por objetivos que aceita^ como socialmente dados em algum segmento de atividade. Digamos / que ele é a-crítico em relação aos objetivos. Assim, pode elaborar' um programa de treinamento competitivo para o brilho nacional ou de atividades corporais na empresa para que os operários estejam psicológica e fisicamente melhor e sejam mais produtivos. Sua pretensão é ade realizar da melhor forma possível os objetivos sociais que lhe são demandados. Neste caso, a questão central l r diz respeito sobre a melhor forma de realizar os objetivos/jj requeridos. Isto não implica, entretanto, falta de criatividade ou de) competência na mediação. Este tipo de profissional pode ser muito criativo na articulação do programa e mesmo altamente renovador em relação aquilo que vinha sendo feito. Assim, aceitando-se a demanda o profissional pode ser tradicional ou 'renovador na elaboração do programa que a satisfaz. Pode, portanto, ser crítico e criativo em relação aos meios para realizar os objetivos. A outra tribo é formada pelos profissionais que desejamJ necessitam ou acham fundamental determinar a demanda. Aqui o programa inicia-se pela discussão dos objetivos com o auxilio dá interpretação socio-política. Qual a função profissional é a grande questão? Qual o papel dos educadores físico^ Qual a função do programa de atividade corporal? Estes profissionais são os críticos, os que se sentem renovadores ou revolucionários, os que acreditam que podem transformar a realidade social em função de seus desejos ou1 sonhos, embora por vezes atribuam esses desejos ou sonhos ao povo/ aos oprimidos, aos trabalhadores. Esta opção não implica que estes; profissionais sejam necessariamente criativos ou renovadores em relação aos meios. De fato, na mediação que elabora o programa eles podem ser tradicionalistas ou pouco inovadores. A-críticos, então, enj relação aos meios que realizem seus objetivos criticamente elaborados ^Nossos comentários nos levam as seguintes possibilidades: 30 ••n* /• O B J E T I V O S Críticos A-críticos B A-críticos D A: critico ou inovador em relação aos objetivos e meios; ~nr= B: a-crítico em relação aos objetivos e crítico em relação aos meios; ^ C: crítico em relação aos objetivos e a-crítico em relação aos meios; ̂ , . . D: a-cntico em relação a objetivos e meios. Estas considerações nos colocam diante de um velho e crucial problema: devemos avaliar os homens pelas suas intenções (a-criticasu ou críticas) ou pelos efeitos de sua ação (tradicional ou inovador)? AJj questão não existiria se as intenções e os efeitos fossem convergentes] *. Entretanto, há uma longa lista de pensadores de envergadura que - chegaram à conclusão de que intenções e efeitos podem ser paradoxais, ou contraditórios, isto é, divergentes. Mandeville popularizou a divergência positiva quando afirmou que dos vícios privados (da intenção egoísta) se deriva a virtude pública (o efeito de riqueza das nações). Marx, em oposição, enfatizou a segunda divergência quando reafirmou que o inferno está empedrado de boas intenções, isto é, que as boas intenções dos capitalistas podem nos levar, e também a eles, a uma situação pior. Mais ainda, quando sua tese central diz que se os capitalistas agem capitalisticamente contribuem para a morte do capital. Observemos que a grande críticaacaridade,umaboaintenção, é a de que seu efeito resulta em aumentar a dependência, a apatia, e por 31 esse meio apenas reforça a caridade dos doadores enquanto situação de superioridade. Tomemos um exemplo desportivo: o boxe. Meu conhecimento dos educadores físicos aponta que muitos deles compartilham sentimentos e argumentos humanistas contra este esporte. Alguns gostariam que fosse uma prática esportiva proibida e nenhum dos que compartilham esses sentimentos e argumentos se dedica voluntariamente a atuar no treinamento esportivo do boxe. A intenção crítica apenas pode ter algum efeito no campo geral da discussão ideológica e pouco ou nada se incorpora ao programade treinamento. Em oposição, os que aceitam os objetivos desse esporte estão introduzindo novidades no programa de treinamento cujos efeitos, a médio e longo prazo, podem significar uma mudança no boxe. A introdução da dança, e portanto da música, no treinamento pode gradativamente ir diminuindo a importância do nocaute, esse "gol" do boxe. Esta mudança não necessita estar determinada por uma intenção ou vontade de modificar a demanda. O treinamento pode gradativamente ir enfatizando a importância do estilo, um valor de tradição e cultura do boxe, sobre o nocaute, seu outro valor. Esta mudança gradativa da relação entre aquilo que se admira num esporte pode levar a uma docificação do boxe e a conseqüente introdução de estilos e equipamentos que minimizando a importância do nocaute sejam menos agressivos para seus praticantes. O boxe poderá ser valorizado ainda como esporte enquanto o nocaute perderia sua importância e, com ele, o privilégio concedido à violência do soco. Os exemplos poderiam ser multiplicados.12 Não estou por certo propondo que deixemos de julgar as intenções. A necessidade de julgar as intenções dos outros impõe-se no cotidiano, permanentemente avaliamos as intenções dos outros para definir nossa conduta. O campo da relação entre governantes e governados é fundamentalmente, de pane dos segundos, um processo de avaliação de intenções. O cidadão comum não pode esperar que os especialistas avaliem, após vários anos de estudo, o efeito educativo dos Cieps parajulgar Brizola enquanto governador. De fato, o primeiro julgamento é sobre as intenções. Se daqui a alguns anos o próprio Brizola reconhecer que sua estratégia educativa foi errada, porém bem 32 intencionada, os cidadãos poderão votar ainda nele. Habitualmente perdoamos a incompetência ou desconhecimento, e mesmo o efeito negativo de uma ação nào-intencional, somos mais duros com as intenções negativas ou moralmente ruins. Isto pode acontecer porque em nossa própria experiência constatamos a divergência entre intenções e efeitos. Podemos, todavia, no processo avaliativo, ^privilegiar as intenções ou os efeitos. Salientemos que, enquanto a avaliação das intenções não exige créditos especiais, por ser basicamente moral, a avaliação dos efeitos em nossa sociedade " * ̂ ' - — — —. ̂ ,-. f,^^ ftff^. f^ UtlJlVuln i—i.'.--. . —-, _ _ . demanda especialistas. Os efeitos são diferentes no tempo e no espaço, '"V * - -- ^ - —.**.}!+. * r* f^. e nos diversos contextos especialistas avaliações das políticas públicas b l lVUI l bsjum ~«- _ _ í implementadas, embora muitas vezes engavetem-nas quando seus ^ --* -»~ -^ ** *-*'"^li^ír*O/~l/1rtC mi|_ntlin_iilcnjnj, <*.i*.w* resultados não lhes sào favoráveis. Na arte da mediação a avaliação dos 1U^ Anr efeitos é um processo central, vertebral, para a • Z i~ programas, de sua mudança, e para a obtenção do reconhecimento social sobre os mesmos. Curiosamente domina entre os educadores físicos a avaliaçãc da arte da mediação pela intenção. Basicamente, avalia-se se o: • " ' " ' !-„,., objetivos dos "outros*' são os mesmos que "nós" defendemos. Este \J ^JJ •Wiru^».^^, _. tipo de avaliação é um claro sinal da ideologização do campo -i - _..:..: j„segmentos de atividade ^ Vi u v. u y uu f-j* •- ..4 _ ̂ _ . . vinculados á educação formal e não-formal. Neste terreno, a disput * ' J _ • n i— " ~ ^. ^ -v* l l*, si f* r V UI^LHUVJUJ — T entre os que aceitam a demanda social e os que desejam lhe da - - - - - - - r ^ : r ; ^ .. ^ -_ __T*^ ^,1111%, WJ --[k.-^ v. -------- -. forma, ganha sua maior força e virulência e, muito freqüentemente discussão torna-se não civilizada. Os médicos podem discordar sobre o tratamento Me ur paciente. Cada um pode defender uma arte da mediação diferente e. termos dos meios a serem articulados. Entretanto, por mais furioso " ~ * • • - • - j --------- «^Á^t termos dos meios a serem articmaaos. nnu eiamu, ym mau tu» *>~~ que se encontrem na disputa, partilham o objetivo de curar o pacienjj A discussão se torna técnica, menos ideológica. Q próprio pacientf\ U.1OVL4JJUU jy ..,."..,_ ., poderá consultar outros médicos para arbitrar a disputa. Oobjeti '' - - -..-*: l U n m Incice posto em questão, pacientes e médicos o comjjartilhãmTirisisU e^ta é uma discussão em relação aos meios e não sobre_osJjtTsJ reconhecimento do papel social deação. Ilustra o alto grau de médicos e o consenso em relação aos objetivos de sua ação. Esta discussão não é ideologicamente do mesmo tipo que quando se discutem os objetivos ou finalidades. Confundir estas duas discussões é uma forma de aumentar os mal-entendidos. Destes apenas tiram partido os que apostam no discurso único, na atitude de unificação que é contraria ao processo intelectual que gera distinções cada vez mais finas. O discurso que não distingue possui um alto apelo emotivo, porém pouco consegue fazer, pois o fazer implica distinguir e temperar na medida certa como sabe qualquer boa cozinheira. A dupla confusão entre as intenções e os efeitos e entre a discordância ou a concordância em relação aos objetivos ou aos meios permeia as discussões no campo da educação física. N*T verdade, educadores físicos podem entre si: a) discordar em relação aos objetivos e aos meios; b) concordar em relação aos objetivos e discordar em relação aos meios; c) discordarem relação aos objetivos e concordar em relação aos meios e d) concordar em ambos planos. As situações "a" e "d" se nos aparecem como coerentes e de fácil aceitação. As situações sociológica e historicamente relevantes são as "b" e "c". Os marxistas, compartilhando o objetivo do socialismo, discordaram em quanto aos meios para sua construção, por exemplo, uso ou não da violência. Liberais e marxistas podem discordar em relação ao tipo de sociedade que desejam, contudo, podem concordar em considerar como os meios principais a persuasão e a educação. Os exemplos históricos podem ser, em relação a estas situações, multiplicados ao infinito. Estas duas situações nos surpreendem, e por vezes nos incomodam, à medida que consciente ou inconscientemente acreditamos que existe ou deveria existir a ação racional em determinadas áreas do social e especialmente no campo da educação física. Entender o agir como ação é a lógica natural do ator. Basicamente, entendemos as condutas quando pensamos que elas resultam da vontade dos indivíduos de alcançar objetivos (intenções) cuja realização depende de condições e meios. As condições são variáveis que o ator deve considerar embora não possa modificar, os meios são os recursos que o ator pode mobilizar para alcançar os objetivos. (V, (O \ <c ÜJ Qü O Q. Entendemos que uma ação é racional quando levando em conta as condições mobiliza os meios de forma a atingir o objetivo, ou pelo menos maximiza os meios disponíveis para atingir o objetivo. Entendemos que a ciência, a estratégia econômica ou militar, a engenharia, a medicina, entre outras, são campos nos quais domina a ação racional. Associamos, assim, a ação racional a possibilidades de conhecimento e de cálculo. Se a ação é racional, como é possível concordando no objetivo utilizar meios discordantes e como discordando no objetivo utilizar meios concordantes? Esta é a surpresa. Vejamos o problema com breves toques em perspectiva histórica. Valores nos objetivos e nos meios O mundo moderno pensou a modernidade como um processo secular de aumento do domínio da ação racional em todos os campos de atividades. Os objetivos da ação podiam ser pensados como não racionais, como valores, no entanto o processo de sua realização devia e podia ser crescentemente racional, Isto significou uma profunda valorização do conhecimento dás condições e dos meios, e de sua inter-relação, no mundo moderno. Medicina e engenharia passaram a ser áreas de atividade racional, embora desenvolver o conhecimento científico . não fosse o objetivo dominante. A racionalidade tornou-se o denominador comum entre as áreas de atividades modernas. As condutas tradicionais, as que não podiam fundar-se num cálculo racional, foram entendidas como preconceito, como atividades que tinham perdido suas razões empíricas. Aeducaçãoeaeducação física são áreas que se desenvolveram a partir de pretensões de cientificidade e racionalidade. As atividades de educação foram reivindicadas como objeto pelas "ciências da educação", a cientificidade e a racionalidade foram passaportes para se obter reconhecimento e legitimidade na modernidade. Os limites a • suas pretensões, contudo, não se situaram nem se situam principalmente na a-cientificidade ou a-racionalidade dos objetivos, senão que na relação não racional nem calculável entre meios e objetivos. A escola 35 é criticada por não alfabetizar, pela alta evasão, pela repetência e pela baixa qualidade da formação e não por serem esses objetivos pouco compartilhados ou não expressarem valores sociais compartilhados. A falta de realização dos objetivos questiona a cientificidade das ciências da educação. Por certo os especialistas da educação colocam a responsabilidade sobre os repetidos fracassos nos políticos, pois os especialistas teriam a especialidade mas não o poder de implementar suas receitas. Os objetivos podem, e devem, ser valores socialmente compartilhados. Entretanto, os valores também permeiam os meios na ação educacional e, de modo geral, toda a arte da mediação. Disto decorre a vigência das situações "a", "b" , "c" e "d'*. Situações nas quais a relação meios-objetivos se apresenta como racional quando na realidade é uma relação segundo valores, ou seja, os' valores presentes nos objetivos estào também presentes nos meios ("a" e "d") ou valores diferentes permeiam objetivosemeios^b" ê "c"). ^> Exemplifiquemos para a educação física o que viemos dizendo sobre os casos intermediários, que são os mais significativos sob o ponto de vista sociológico. Tomemos dois exemplos do treinamento, programas que se supõem mais carregados de racionalidade na relação meios-objetivos. s- Caso (b). No treinamento objetiva-se o desempenho do (atleta, a eficiência, importa a performance na competição. Entretanto, o treinamento pode ser pensado num t lclima" de disciplina autoritária ou num outro de disciplina auto-imposta, elaborada pelos participantes do treinamento. Em ambos os casos, os argumentos salientam as vantagens para o desempenho de um ou outro meio. Cada estratégia apresentar-se-á como mais eficiente no atingimento dos objetivos. Isto é, como mais racional na articulação de meios e fins. Esta seria uma situação freqüente onde a demanda social estabelece com força os valores e objetivos e ainda não existe consenso entre os mediadoresem relação aos meios para se atingir os objetivos ou onde as diferentes propostas sobre os meios refletem disputas entre os mediadores por ocupar posições no campo, como 36 ( C C ^ ÍJ diria Pierre Bourdieu. Í/Y- ^ Caso (c). Na escola um educador pode defender como objetivo o desenvolvimento psicomotor da criança e um outro conscientização de sua situação de vida. Ambos podem operar nu "clima" participativo e apoiando a capacidade crítica da criança. Ambos podem pretender realizar seus objetivos por meio de processos inovadores em relação aos tradicionais. Num plano geral suas atitudes em relação à escolha dos meios, nos limites que os objetivos possibilitam, são semelhantes. J Poder-se-ia objetar o fato de tomarmos o 4 ' clima" como meio para se atingir objetivos. A maioria dos programas se preocupam explicitamente por sua definição e estabelecimento e lhes atribuem importância estratégica. A critica da pedagogia moderna à tradicional é mais uma critica aos valores presentes no processo pedagógico, aos modos de interação, enfim ao "clima", do que aos objetivos. De fato, pedagogos modernos recuperam a transmissão sistemática de conhecimentos como objetivo da educação formal. A criticatoma cada vez mais o sentido de estabelecer uma coerência ou correlação entre os valores presentes nos objetivos e os valores presentes nos meios. Digamos que desejam que às intenções estejam'presentes nos meios pelos quais se procura realizá-las. E, depois .de tudo, no cotidiano, antes de sair de casa procuramos saber qual é o clima. Diria, para finalizar, que a principal finalidade didática é a de estabelecer um clima de entendimento. Este, lembro, é o primeiro objetivo destas notas. • ' • ' 1 Em relação a esta discussão ver o trabalho de Ròrty (1988.) 2 Estou partindo aqui dos fundamentos da sociologia da ciência, a literatura a respeito c ampla c conhecid. . - . • * A idéia de progresso é fundamental no Brasil e no mundo. Ver as obras de Nisbct e o claro texto de Lc Goff sobre a inscparabilidadedas idéias de progresso c reação. 37 4 Refiro-me aqui à imagem criada por Lévi-Strauss no Pensamento selvagem. 5 Conferir como exemplo a excelente História do corpo de Crespo. 6 Observe-se que esta é uma mediação sistematicamente realizada pelo especialista entre o universal, aprendido na formação, e o particular da situação na qual o programa se desenvolve. 7 De fato os especialistas da Física podem discordar sobre as partes da Física que devem ser priorizadas, os meios de ensino-aprendizagem e as metodologias entre outros aspectos.Contudo, eles não se colocam objetivos culturalmente tão distantes como a "conscientização políüca"e a "saúde do corpo". Observemos que estes objetivos se colocam como contrapostos no programa de atividades e não na sociedade. Esses valores situam-se em planosdiferentes e ambos podem ser valiosos. É no programa de atividade onde o especialista situa a contradição e a escolha que, no fundo, remete à diferenciação entre os especialistas. • * Conferir meus comentários sobre este assunto em Educação popular: maioridade e conciliação. 9 Observo que há, entre os especialistas da Educação Física, um marxismo banalizado que esquece o grau. De fato, o grau é uma questão empírica complexa e o marxismo banalizado, distanciado da pesquisa empírica, o exclui, pois está impossibilitado de lidar com ele dada sua preferência em explicar quase tudo pela luta de classes. Esquece que a definição e entendimento concreto das classes e dos seus agires é tarefa teórica e empírica complexa e que demanda pesquisa constante. O marxismo banalizado é muito cômodo e mágico, pois tira de frases feitas a "realidade social". 10 Ver os TrabaJhos de Elas, Brown, Vigarelío e Crespo citados na bibliografia, corno exemplos de análise das construções às quais me refiro. 11 Conferir Eby, por exemplo. 12 Uma contribuição central, da releitua da história da ciência, feita por Kuhn é considerar que a atividade científica sendo convergente -agindo dentro de um paradigma- termina provocando a divergência, a mudança do paradigma. Entre as intenções que guiam a ação e seus efeitos há também no caso da ciência distâncias consideráveis. 38 Capítulo 2 Educação e educação física em escolas do Rio de Janeiro 39 1.Educação e educação física em escolas do Rio de Janeiro.1 O campo da educação física no Brasil caracteriza-se pela dispersão das propostas ou programas de atividades corporais. O debate existente é considerável e, dificilmente, poder-se-ia afirmar que, a intervenção dos profissionais da área, se orienta por um consenso significativo, em termos de valores ou objetivos a serem perseguidos e dos meios adequados aos mesmos. A dispersão, com seus debates e discussões, aparentemente inesgotáveis, é particularmente forte no que diz respeito à educação física no contexto institucional da educação formal e, sobretudo, no seu Primeiro Grau.2 . . . . . . O ponto de partida dos estudos Sobre a educação formal, diríamos que de consenso, reside naafirmaçãp de que a escola brasileira está mal e que devem ser realizadas ações para tirá-la desta situação. A partir deste consenso, muito frágil ou muito forte, segundo o ponto de vista avaliador, as .propostas de transformação ou mudança se multiplicam. Se'u lequeé-arhploe, sob o ponto de vista pedagógico, abrange desde a politização da educação até sua psicologização mais individualista ou a revalorização da escola tradicional. No plano organizativo, defende-se desde um controle e centralização maior da educação pública, até ousadas propostas de descentralização, com a introdução de mecanismos de ''mercado" , ou de estímulo a produtividade. Adispersâodas propostas indica, entre outros elementos, a dificuldade da educação brasileira em constituir uma tradição, um conjunto de valores e normas suficientemente articulados, em cujo âmago da mudança educacional aconteça. De fato, o acúmulo de Propostas hão está acompanhado por mudanças efetivas no cotidiano 41 escolar. Evidentemente, estepanorama da educação incide, fortemente, na educação física escolar. Também aqui as propostas de intervenção se diversificam, em termos de valores e meios, para sua realização. A emancipação política, o desenvolvimento psicomotor, o desenvolvimento cognitivo, o apoio a integração e funcionamento escolar, o respeito a cultura dos alunos ou a competência corporal, entre outros, podem ser escolhidos enquanto valores orientadores do processo de intervenção. Por certo, a diversidade dos meios propostos é correlata a dos valores ou objetivos. Os discursos de intervenção dos especialistas geralmente pretendem o status de científicos. Entretanto, é habitualmente baixo e mesmo nulo, o fundamento em termos de pesquisa empírica. Os especialistas participantes dos debates pretendem impor seus pontos de vista sem apresentarem, habitualmente, "dados" ou "provas", que possibilitem ãleançaçmos alguns' 'acordos", que permitam aperfeiçoar a educação no Brasil. ': • >• "*••• *: Os alunos e seus responsáveis também possuem seus pontos de vista e opiniões-formuladas, a partir da experiência escolar, e de representações elaboradas, à partir de incidências diversas (cultura popular, especialistas, meios de comunicação, entre outras). Estes pontos de vista devem ser levados em alta consideração se pretendem alcançar algum grau de consenso, em termos de "projetos" ou de "propostas", para a ação educacional e, em especial, para a educação básica. Parece por demais evidente que os negócios humanos funcionam quando se estabelece algum grau de consenso ou acordo entre os atores sociais que deles participam. Os atores privilegiados do processo educativo são sem dúvidas as famílias, os educandos e os 1 educadores. Se entre eles não existe um acordo suficiente a escola não funciona. Acordo sobre valores, os meios, as espectativas parece ser a estratégia fundamental para que se implementem projetos no plano da educação. Enfim, se os atores não partilham de um horizonte comum de crenças ou representações é impossível a eficácia
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