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UERJ ESTUDO DIRIGIDO

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UERJ
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO DE JANEIRO
ESTUDO DIRIGIDO
CÂNDIDA DO NASCIMENTO SILVA
INCONTINÊNCIA ANAL
RIO DE JANEIRO
2020
DEFINIÇÃO
A incontinência anal é definida como perda do controle voluntário das fezes. Dentre os mais variados graus de incontinência anal, podemos citar a leve como a perda involuntária de gases, perda ocasional de líquidos ou até eventualmente soiling (escape de material fecal pelo ânus após defecação normal, que pode levar à eczema perianal), incontinência grave se apresenta como a perda significante de líquidos ou sólidos e a necessidade do uso de forros(BALSAMO et AL ,2011).
EPIDEMIOLOGIA
A incontinência fecal é um grande problema social e de higiene. Afeta entre 1 e 15% dos adultos e 1,1 a 1,3% das pessoas com mais de 65 anos, impondo limitações e queda na qualidade de vida. Sua real prevalência é provavelmente subestimada, já que a abordagem do sintoma é dificultada pelo constrangimento que tal afecção acarreta, quando incluso em questionário sobre incontinência, 5% dos indivíduos sadios confirmam ter apresentado o soiling em algum momento de suas vidas.(BALSAMO et AL, 2011).
FISIOPATOLOGIA
A continência fecal é mantida pela integridade estrutural e funcional da unidade neuromuscular anorretal e do pavimento pélvico mas, qualquer alteração na sua anatomia ou fisiologia leva a incontinência. O reto é um tubo muscular de 12 a 15 cm, composto por um músculo longitudinal contínuo que se interlaça com o músculo circular subjacente. Este arranjo muscular permite que funcione como reservatório, conseguindo acomodar-se passivamente à distensão, e como propulsor de fezes (RIBEIRO, 2013). 
Durante a sua distensão há uma diminuição da pressão de repouso anal num processo designado de reflexo reto-anal inibitório e mediado pelo plexo mioentérico, cuja amplitude e duração aumenta com o volume da distensão retal. Apesar deste reflexo facilitar a descarga de gases, a distensão do reto está também associada a uma resposta contrátil anal, ou seja, a um esforço subconsciente refléxico- reflexo reto-anal excitatório- que vai prevenir a libertação de conteúdo retal, bem como dos gases. Esta resposta contrátil envolve a contração do esfíncter anal externo (EAE) e é mediada pelos nervos pudendo e esplâncnicos pélvicos (RIBEIRO, 2013).
Quando a compliance retal está comprometida, um pequeno volume de fezes consegue gerar uma pressão intra-retal elevada, que ao ultrapassar a resistência anal gera incontinência. Além disso, a diminuição da sua capacidade e do volume máximo tolerável está diretamente relacionada com o aumento da frequência das defecações e diminuição da continência, pelo aumento de pressão retal a volumes cada vez menores (RIBEIRO, 2013)
FATORES DE RISCO
A incontinência surge geralmente após uma lesão traumática esfincteriana, sendo raros os casos de etiologia congénita, quer por agenesia ano-rectal ou por meningomielocelo. Na mulher predomina o trauma obstétrico, podendo existir lesão esfincteriana em 35% das parturientes após o parto normal, embora só em menor percentagem surjam sintomas de incontinência(LEITE E POÇAS, 2010).
 Várias intervenções ano-rectais complicam-se de incontinência, tais como a esfincterotomia, a fistulotomia, a hemorroidectomia ou a dilatação anal. O trauma perineal com fractura da bacia pode também condicionar graves lesões esfincterianas ou nervosas. Nos doentes com diabetes, esclerose múltipla ou com demência há repercussão nas funções neuromusculares e várias doenças musculares associam lesão esfincteriana, tais como as distrofias neuromusculares, a amiloidose ou a miastenia gravi(LEITE E POÇAS, 2010). 
A ausência de distensibilidade retal é outro fator que pode condicionar o aparecimento de incontinência fecal sem lesão esfincteriana. Tal pode acontecer nas situações de proctite ulcerativa, proctite rádica ou de prolapso retal (LEITE E POÇAS, 2010).
TIPOS DE INCONTINÊNCIAS
Em termos etiológicos, a incontinência fecal pode dividir-se em quatro categorias: danos do esfíncter, alterações das características das fezes, distúrbios neuromusculares e alterações da compliance e sensibilidade retal (RIBEIRO, 2013).
Esfíncter: Parto vaginal, cirurgia anorretal, cancro anal ou retal, malformações anorretais 
Fezes: Diarreia: DII, diarreia infeciosa, abuso de laxantes, enterite rádica, síndrome do intestino curto constipação: alimentação, medicamentos constipantes, demência 
Neurológico: Neuropatia do pudendo, DM, lesões da medula espinhal, neuropatia do pudendo, esclerose múltipla, doenças congénitas (meningocelo, mielomenigocelo), distúrbios SNC (AVC, trauma, infeção, tumores) 
Reto: Prolapso retal, neoplasias retais, fístulas anais, proctite rádica, agenesia retal, malformações anorretais
DIAGNÓSTICO 
Através de uma história clínica detalhada é possível diagnosticar a severidade da incontinência e compreender que, frequentemente, o início de dejecções diarreicas explica a sua ocorrência fisiológica. A história obstétrica e de prévia cirurgia ou de eventual trauma anorretal deverá orientar o exame mais detalhado do caso. A presença de cicatriz residual ou de orifício fistuloso poderá confirmar a história. A presença associada de prolapso retal mucoso ou completo deverá ser observada logo após o esforço em posição defecatória(BALSAMO et AL,2011)
 O toque retal efetuado por um clínico experiente permite uma avaliação do grau de tônus basal anal e da pressão de contração anal voluntária muito aproximada da realidade. A identificação de fecalomas ou de massa retal sugere a etiologia da incontinência. O exame clínico só fica completo após a realização de anuscopia e de uma retossigmoidoscopia, podendo diagnosticar-se hemorróidas, uma neoplasia ou proctite (BALSAMO et AL,2011).
A ecografia endoanal permite identificar com grande precisão os diferentes músculos esfincterianos e estruturas do pavimento pélvico, como o corpo perineal, e constitui um exame complementar indispensável. Sabese contudo que uma lesão esfincteriana não se correlaciona necessariamente com a presença ou o grau de incontinência fecal (BALSAMO et AL, 2011).
A manometria anorretal é o exame de avaliação fisiológica mais largamente utilizado no estudo da incontinência fecal e permite a mensuração das pressões de repouso e contração, assim como o tamanho do canal anal funcional, capacidade, complacência e pesquisa do reflexo inibitório retoanal, bem como entender a sincronização dos componentes sensórios e motores do canal anal (BALSAMO et AL, 2011).
 A manometria anorrectal complementa a informação clínica, embora também não se verifique ter boa correlação com o grau de incontinência devido à variabilidade dos resultados encontrados no conjunto de doentes assintomáticos e dependendo também da idade ou do sexo do paciente. A manometria contribui para a decisão terapêutica no contexto global das restantes informações clínicas. Pode servir de guia de avaliação da resposta a terapias efetuadas (Biofeedback, cirurgia). A prova da continência a um enema de soro fisiológico poderá ajudar na objetivação da resistência esfincteriana e da acomodação rectal. O estudo da sensação retal à distensão de um balão permite reconhecer as situações de hipersensibilidade retal, assim como de hiposensibilidade (encontrada nas incontinências de overflow, como na encoprese ou na diabetes). 
TRATAMENTO MÉDICO
 Na maioria dos doentes com sintomas ligeiros, as recomendações dietéticas com proposta de aumento da dose de fibras, bem como a abstenção de alimentos associados a diarreia e a medicação antidiarreica, particularmente com a loperamida, são suficientes para melhorar os sintomas e a qualidade de vida desses pacientes (LEITE E POÇAS, 2010). O ensino do doente através das técnicas de biofeedback tem permitido taxas de sucesso terapêutico muito variável, mas os estudos randomizados têm revelado não ser superior aos dos grupos de doentes que apenas receberam recomendações convencionais médicas e de enfermagem com incentivo nos exercícios da musculatura do pavimento pélvico (LEITE EPOÇAS, 2010). Geralmente os pacientes que apresentam queixas severas de incontinência fecal não obtêm melhoria clínica significativa com as medidas antes referidas. Impõe-se a necessidade de equacionar as opções cirúrgicas.
CUIDADOS DE ENFERMAGEM
Os cuidados de enfermagem a essa clientela iniciam-se com a questão da educação em saúde e a orientação nos diversos aspectos que envolvem a incontinência fecal e o alcance do bem-estar, os pacientes devem ser orientados quanto ao uso e a escolha dos equipamentos coletores e adjuvantes, aos hábitos alimentares e às mudanças dietéticas para melhoria da incontinência fecal, aos medicamentos que podem influenciar o surgimento e agravamento da mesma, aos cuidados habituais com a pele e, ainda, quanto aos métodos de prevenção da DAI (LEME, SOUZA, CHAGAS, 2019).
A avaliação das modalidades terapêuticas também faz parte dos cuidados de enfermagem, de forma a selecionar junto ao paciente o melhor recurso terapêutico para cada caso. O enfermeiro deve avaliar e orientar os exercícios do assoalho pélvico, biofeedback, irrigação, estimulação percutânea do nervo tibial e técnicas cognitivas para diminuir a ansiedade. A identificação das opções de gerenciamento para IF, que são preferidas pelos pacientes, permitem um melhor planejamento de acordo com prioridades e preferências dos mesmos, estabelecendo assim, maior probabilidade de adesão aos tratamentos propostos(LEME, SOUZA, CHAGAS, 2019).
Em relação às tecnologias para o manejo da IF, diversos são os cuidados que o enfermeiro deve desenvolver. As fraldas e demais equipamentos absorventes precisam ser trocados a cada episódio de IF, promovendo a limpeza da pele e o uso de cremes barreira, a fim de prevenir a ocorrência da DAI. O enfermeiro deve ainda investigar a DAI em pacientes não hospitalizados, questionando-os sobre a IF, quanto à presença de sintomas e à gravidade, já que o estigma e o constrangimento decorrentes da mesma, muitas vezes, impedem que os pacientes busquem ajuda espontaneamente (LEME, SOUZA, CHAGAS, 2019).
 O enfermeiro deve proceder ao ensino da auto-avaliação, com o uso de espelhos, por exemplo, para verificar a região perineal e adjacências. Pacientes hospitalizados e em uso de tecnologias para o manejo da IF também precisam ser avaliados rotineiramente quanto à prevenção e cuidados da DAI. O apoio emocional, igualmente, faz parte dos cuidados de enfermagem a essa clientela. O profissional deve aconselhar e apoiar a pessoa a superar os contratempos e a refletir sobre seus próprios objetivos, além de conhecer as possíveis respostas emocionais à IA a fim de promover apoio terapêutico, facilitando a aceitação da IA e melhor adesão ao tratamento(LEME, SOUZA, CHAGAS, 2019).
REFERÊNCIA
BALSAMO, F; FILHO, P,R,R; POZZOHON, B, H, Z; CASTRO, C, A, T; FORMIGA, G, J, S; Correlação entre achados monométricos e sintomatologia na incontinência fecal. Revista bras. Colo-proctol. Vol. 31 n° 1 Rio de Janeiro. Jan/Mar. 2011.
FANI SUSANA LEITE RIBEIRO; Incontinência fecal: abordagem passo a passo; Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina submetido no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar; Ano letivo 2012/2013.
LEITE, J; POÇAS, F; Tratamento da Incontinência. Ver. Port. Colopract. 2010; 7(2): 68-72
LEME, L,N,R; SOUZA, N,V,D,O; CHAGAS, P,F; Cuidados de enfermagem e suas repercussões na vida da pessoa com incontinência anal: revisão integrativa. Ver. Enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2019; 27: e 40285.

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