Prévia do material em texto
XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 1 XXIII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HIDRÍCOS DESAFIOS PARA A UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO AOS SERVIÇOS DE ÁGUA E ESGOTO NA REGIÃO NORTE DO BRASIL Matheus Almeida Ferreira 1; Conceição de Maria Albuquerque Alves 2; Jaildo Santos Pereira 3 RESUMO – O acesso aos serviços de abastecimento de água e de coleta de esgoto é um direito assegurado com base no princípio da universalização definido na Lei n° 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico. No Brasil, a região Norte apresenta os piores índices de acesso a estes serviços, apenas 57,5% e 10,2% da população tem acesso aos serviços de abastecimento de água e de coleta de esgotos, respectivamente. São vários os fatores que contribuem para o déficit nos serviços de água e esgoto, dentre eles, destacam-se a ausência de planejamento urbano, a insuficiência e má aplicação de recursos públicos e a falta de capacidade técnica dos municípios para capação de recursos da União e de instituições de financiamentos. Além disso, a fragmentação e descontinuidade das políticas públicas associadas à carência de instrumentos de regulação têm retardado o avanço na prestação dos serviços de água e esgoto. Deste modo, o objetivo do presente trabalho foi de identificar e discutir os principais problemas que têm dificultado e/ou retardado a universalização do acesso aos serviços de água e esgoto, com enfoque na a região Norte do Brasil. ABSTRACT– Access to water and sewage services is a right guaranteed based on the principle of universalization instituted by the Law No. 11.445/2007, in which it is establishes the national guidelines for basic sanitation. The northern region of Brazil has the worst indices of access to water and sewage services, only 57,5% and 10,2% of the population is supplied with water and sewage services, respectively. There are several factors that contribute to the deficit of water and sewage services, some of them are as follows: absence of urban planning, insufficiency and misapplication of public funds and the lack of technical capacity, in a municipality, to raise funds from the Union and financial institutions. In addition, the fragmentation and discontinuity of public policies associated with the lack of regulation instruments have delayed progress in the provision of water and sewage services. Thus, the objective of the present study was to identify and discuss the main problems that have hindered and/or delayed the universalization of access to water and sewage services, focusing on the Northern region of Brazil. Palavras-Chave – Universalização, Saneamento Básico, Serviços de água e esgoto. INTRODUÇÃO As más condições de prestação dos serviços de saneamento básico têm causado sérios problemas ambientais e de saúde pública, que são agravados pela urbanização desordenada associada ao crescimento populacional. Dentre tais problemas destaca-se a contaminação dos corpos hídricos, que pode inviabilizar os usos que demandam maior qualidade da água bruta ou ainda elevar os custos 1) Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília, Brasília 70 910-900, BR. E-mail: almeida-matheus.ma@aluno.unb.br; Telefone: (61) 98195-7671. 2) Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília, Brasília 70 910-900, BR. E-mail: cmaalves@gmail.com; Telefone: (61) 3107-0940. 3) Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, 44 380-000, BR. E-mail: jaildo@yahoo.com; Telefone: (61) 3107-0940. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 2 dos processos de tratamento da água, além de contribuir para a disseminação das doenças de origem e de veiculação hídrica. De acordo com Teixeira et al. (2014), a média da morbidade hospitalar no Sistema Único de Saúde (SUS) por doenças relacionadas ao saneamento básico inadequado no período de 2001 a 2009 foi de 758.750 internações por ano, apresentando maiores proporções de internações anuais na região Norte (7,50 internações por 1.000 habitantes) e menores proporções na região Sudeste (1,71 internações por 1.000 habitantes). Desta forma, é notória a relação entre saúde pública e saneamento básico, uma vez que as maiores proporções anuais de internações foram observadas na Região Norte e as menores proporções na Região Sudeste, regiões nas quais os índices de abastecimento com água e de coleta e tratamento de esgoto são respectivamente os menores e maiores do país. A relação entre saneamento e saúde pública passou a ser melhor compreendida a partir da epidemia de cólera ocorrida em Londres em 1854, que vitimou 578 pessoas em um período de 10 dias, na qual o médico inglês Jonh Snow comprovou a associação entre a incidência de cólera e a contaminação, por esgotos domésticos, da água destinada ao abastecimento humano (Jonhson, 2008). Tal relação entre saneamento e saúde é melhor estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no próprio conceito de saneamento, que consiste no controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem ou podem exercer efeitos nocivos sobre o bem-estar físico, mental e social, ou seja, sobre a saúde. Já a Lei n° 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, o define como o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo de águas pluviais. Tanto na Lei n° 11.445 quanto na Medida Provisória nº 868/2018, que altera a Lei nº 11.445/2007, a universalização do acesso é estabelecida como princípio para a prestação de serviços públicos de saneamento básico no Brasil. Apesar de a universalização do acesso aos serviços de saneamento ser garantira em Lei, não é observada na prática. A região Norte do Brasil apresenta os piores índices de atendimento com abastecimento e coleta de esgotos do país, apenas 57,5% e 10,2% da população tem acesso aos serviços de abastecimento de água e de coleta de esgotos, respectivamente (SNIS, 2019). A não universalização dos serviços de água e esgoto acarreta em problemas de saúde púbica, meio ambiente e cidadania, atingindo principalmente as comunidades periféricas e rurais, contribuindo para aumentar as desigualdades sociais e econômicas. Diversos são os fatores que retardam a universalização do acesso aos serviços de saneamento básico no Brasil. Dada a importância da prestação destes serviços para a manutenção da qualidade de vida da população, o objetivo do presente trabalho consistiu em identificar e discutir as principais XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 3 causas que têm dificultado e/ou retardado a universalização do acesso aos serviços de água e esgoto na região Norte do Brasil, com vista a garantir o princípio de universalização definido na Lei nº 11.445/2007, a partir de uma revisão da legislação vigente, de pesquisa em bancos de dados bibliográficos e do levantamento de indicadores da prestação destes serviços. METODOLOGIA Com o objetivo de identificar as principais causas que dificultam e/ou retardam a universalização do acesso aos serviços de água e esgoto na região Norte do Brasil, a metodologia do presente trabalho encontra-se subdividida em três etapas, são elas: 1) revisão da legislação que regulamenta os serviços de água e esgoto; 2) pesquisa em bancos de dados bibliográficos; 3) levantamento de indicares da prestação dos serviços de água e esgoto. RESULTADOS E DISCUSSÃO Panorama dos Serviços de Água e Esgoto na Região Norte do Brasil A região Norte do Brasil,apresentada na Figura 1, é composta por 7 estados e possui área total de 3.853.676,90 km². No Censo Demográfico de 2010, a região Norte apresentou população total de 15.864.454 habitantes, sendo 73,5% residentes em áreas urbanas e 26,5% residentes em áreas rurais (IBGE, 2011). Figura 1 – Representação da região Norte do Brasil. Fonte: IBGE. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 4 A população residente estimada para o ano de 2017 é de 17.936.201 habitantes (IBGE, 2017), que resulta em uma densidade demográfica de 4,7 habitantes/km². Além disso, cerca de 84% dos municípios da região Norte são de pequeno porte, ou seja, possuem população inferior a 50.000 habitantes, conforme é apresentado na Tabela 1. Tabela 1 – População dos municípios da região Norte. Fonte: IBGE. População (hab) Porte % < 5.000 Pequeno porte I 17,1 5.000 a 10.000 Pequeno porte I 17,8 10.000 a 15.000 Pequeno porte I 11,3 15.000 a 20.000 Pequeno porte I 12,2 20.000 a 50.000 Pequeno porte II 25,6 50.000 a 100.000 Médio porte 9,6 100.000 a 90.0000 Grande porte 6,0 > 90.0000 Metrópole 0,4 As piores condições de acesso aos serviços de abastecimento de água e, principalmente, de coleta de esgoto se encontram na região Norte do país. A Figura 2 mostra a evolução dos índices de atendimento com abastecimento de água, total (IN055) e urbano (IN023), na região Norte entre 2007 e 2017, disponibilizados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) nos relatórios anuais de Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos. 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 50 60 70 80 90 13 14 15 16 17 18 19 Ano A te n d im en to c o m Á g u a (% ) P o p u lação (h ab M i) Total Urbana População Figura 2 – Evolução dos índices de atendimento com abastecimento de água, total e urbano, e da população na região Norte entre 2007 e 2017. Fonte: SNIS e IBGE. A partir da Figura 2, nota-se que em 2017 os índices de acesso ao serviço de atendimento com abastecimento de água considerando-se, respectivamente, as populações total e urbana é de 57,5% e de 70,0%. Desta forma, entre 2007 e 2017 houve um aumento de apenas 4,6% e 5,8% na prestação do serviço de abastecimento de água total e urbano, nesta ordem. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 5 Quando se trata dos serviços de atendimento com coleta de esgoto, referido aos municípios com atendimento de abastecimento de água, a situação é ainda mais desfavorável. A evolução dos índices de atendimento de esgoto, total (IN056) e urbano (IN024), bem como o índice de tratamento de esgoto gerado (IN046), entre 2007 e 2017 na região Norte, é apresentada na Figura 3. 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 0 5 10 15 20 25 0 5 10 15 20 25 Ano A te n d im en to d e es g o to ( % ) T ratam en to d e esg o to (% ) Total Urbana Total Figura 3 – Evolução dos índices de atendimento total e urbano de esgoto e de tratamento na região Norte, entre 2007 e 2017. Fonte: SNIS. Nota-se a partir da Figura 3 que em 2017 o índice de acesso ao serviço de atendimento de esgoto considerando-se, respectivamente, as populações total e urbana é de 10,2% e de 13,0%, representando, nesta ordem, um aumento de 5,1% e 6,8% com relação à 2007. Além disso, houve aumento de 13,0% no tratamento de esgoto gerado, chegando ao índice de 22,6% em 2017. Deste modo, a partir da análise das Figuras 2 e 3, ressalta-se que o déficit tanto na prestação dos serviços de abastecimento de água quanto de coleta e tratamento de esgoto, atinge de forma mais intensa a população rural. Ressalta-se ainda que apesar de pequeno o aumento percentual na prestação dos serviços de abastecimento com água e de coleta de esgoto, deve-se considerar também que houve o aumento de 3,3 milhões de habitantes durante os anos analisados. Fatores que Retardam a Universalização dos serviços de Água e Esgoto na Região Norte A flutuação observada ao longo dos anos analisados nos índices de atendimento com serviços de abastecimento de água e de coleta de esgoto sugerem o descompasso entre o crescimento urbano e populacional e a implantação de infraestruturas de saneamento necessárias para atender os novos usuários e elevar os índices de atendimento desses serviços. Apesar de a maior taxa média de crescimento populacional anual ser observada na região Norte, cerca de 2,09% ao ano (IBGE, 2011), esta região apresenta baixa densidade demográfica, aproximadamente 4,7 habitantes/km², com cerca de 84% dos munícipios de pequeno porte. A densidade demográfica é um importante instrumento do planejamento urbano e é muitas vezes definida em Planos Diretores de Ordenamento Territorial (PDOT), em função do zoneamento XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 6 definido para uma determinada região. Embora o Plano Diretor seja obrigatório pela Lei do Estatuto das Cidades, grande parte dos municípios brasileiros ainda não o possuem, especialmente aqueles municípios de pequeno porte. Em 2017 na região Norte, 42,0% dos municípios afirmaram que possuíam Plano Municipal de Habitação e 26,4% afirmaram que possuíam Plano Municipal de Habitação articulado ao Plano Diretor Municipal (IBGE, 2018). Além disso, segundo o Ministério das Cidades (2017) apenas 8,7% dos municípios da região Norte possuem Plano Municipal de Saneamento Básico, sendo que a Lei nº 11.445/07 previa que, em 2010, todos os municípios brasileiros deveriam ter elaborados os respectivos Planos Municipais de Saneamento. Sabe-se que é de grande importância que os municípios possuam os Planos Municipais Diretores e de Saneamento Básico e que estes planos estejam articulados para que, de forma sinergética, promovam a expansão do acesso aos serviços de saneamento, especialmente os de abastecimento de água e de coleta de esgoto. A falta de planejamento associada à baixa densidade demográfica observadas na região Norte pode indicar um modelo de urbanização dispersa e fragmentada, contrariando a tendência de urbanização compacta, que otimiza o uso de recursos energéticos e de infraestruturas, defendida por diversos autores, como Falcón (2007) e Owen (2009). Deste modo, a falta de planejamento associada à baixa densidade demográfica contribuem para o retardamento do avanço da universalização do acesso aos serviços de saneamento básico, uma vez que nos modelos de urbanização dispersa e fragmentada são necessários mais recursos financeiros para implantação de infraestruturas, quando comparados aos modelos de urbanização compacta. Além disso, de forma geral e devido ao fator de escala, os municípios de pequeno porte não conseguem que os serviços de água e esgoto sejam pagos somente com a cobrança de tarifas, sendo necessárias outras formas de subsídios, como os subsídios cruzados entre companhias estatais. Esta demanda maior por recursos financeiros para implementação de infraestruturas dos serviços de água e esgoto não é suprida, já que geralmente ocorre a insuficiência ou a má aplicação dos recursos públicos, devido a própria baixa capacidade de investimento dos municípios e também devido à falta de atualização tecnológica e carência de recursos humanos (Nascimento e Heller, 2005). Mesmo quando há recursos disponíveis, a captação é inviabilizada, uma vez que os municípios, principalmente os de pequeno porte, não conseguem elaborar o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), que é um requisito necessário, definido pelo Decreto nº 7.217/2010, para o pleito de recursos da União, destinados ao investimento em saneamento básico. Quando se trata de financiamentos, ocorreo mesmo problema de incapacidade técnica e econômica para instruir pleitos de financiamento nas instituições financeiras e na Secretaria do XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 7 Tesouro Nacional, sendo assim, os municípios seguem dependentes dos recursos principalmente da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), ao passo que somente os municípios de maior porte conseguem acesso à financiamentos (Albuquerque, 2011). Todo este contexto relacionado à captação de recursos da União e de financiamentos reflete diretamente na evolução dos investimentos nos serviços de água e esgoto efetivamente observados. A Figura 4 apresenta a evolução destes investimentos nos serviços de água e esgoto e também a evolução da população na região Norte entre 2007 e 2017. 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 0 150 300 450 600 12 14 16 18 20 Ano In v es ti m en to s (R $ M i) P o p u lação (h ab M i) População Investimento em ÁguaInvestimento em Esgoto Investimento Total Figura 4 – Evolução dos investimentos nos serviços de água e esgoto e da população na região Norte, entre 2007 e 2017. Fonte: SNIS e IBGE. Percebe-se na Figura 4 que os investimentos nos serviços de água e esgoto não acompanham o crescimento populacional e que houve um período de queda em ambos os investimentos entre 2013 e 2015, provavelmente em função da recessão econômica ocorrida por volta de 2014, retornando a crescer lentamente a partir de 2016. A origem dos investimentos (recursos próprios, onerosos e não onerosos) é apresentada na Figura 5. Conforme apresentado na Figura 5, observa-se a tendência de maiores investimentos provindos de recursos não onerosos, recursos onerosos e recursos próprios, nesta ordem. Os recursos não onerosos são aqueles não reembolsáveis, ou seja, não precisam ser devolvidos para a instituição de financiamento (órgãos governamentais). Já os recursos onerosos são aqueles provenientes de financiamentos, retornáveis por meio de juros, encargos e amortizações. Ressalta-se que esta tendência de maiores investimentos provindos de recursos não onerosos é um forte indicativo da falta de capacidade técnica e financeira para elaboração de pleitos para financiamentos. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 8 2007 2008 2009 2010 2011 2013 2014 2015 2016 2017 0 100 200 300 Ano In v es ti m en to s (R $ M i) Recursos Próprios Recursos Onerosos Recursos Não Onerosos Figura 5 – Evolução da origem dos investimentos na região Norte, entre 2007 e 2017. Fonte: SNIS. Nota-se ainda na Figura 5 que a partir de 2007 houve o aumento de investimentos provenientes de fontes de recursos onerosos e não onerosos, indicando que a Lei nº 11.445/2007 teve grande importância na definição dos mecanismos de financiamento. É importante ressaltar que os aumentos nos investimentos em saneamento também são provenientes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) criado em 2007. Apesar de as diretrizes nacionais para o saneamento básico serem definidas na Lei nº 11.445/2007, a implementação desta legislação não tem sido feita de forma efetiva devido à carência de instrumentos de regulação (Nascimento e Heller, 2005), afetando principalmente as comunidades periféricas e rurais. Segundo Galvão Junior e Paganini (2009), os instrumentos de regulação podem exercer os seguintes papeis: fazer cumprir, por meio das políticas regulatórias, as macrodefinições estabelecidas nas políticas públicas setoriais e também desenvolver mecanismos que incentivem a eficiência das empresas prestadoras de serviço. Além disso, a carência de regulação prejudica também a concessão dos serviços de saneamento, reduzindo as possibilidades de execução adequada destes serviços. Para a definição de instrumentos de regulação são necessários dados para suporte a tomada de decisão. Esta ausência de dados constitui outro problema que dificulta a universalização do acesso aos serviços de água e esgoto, que é a escassez de pesquisas e de base de informações, que são fundamentais para a solução dos problemas do déficit de atendimento nos serviços de saneamento. No Brasil o SNIS é um dos principais sistemas de informações sobre saneamento, entretanto, como as informações não são validadas não há grande confiabilidade. Como não se tem acesso às informações tanto sobre o desempenho de tecnologias mais adequadas e de otimização do sistema de operação quanto do próprio desempenho de políticas e instrumentos já implementos, não se pode realizar a correção de possíveis problemas normativos e operacionais existentes. Além disso, o setor também tem enfrentado problemas relacionados à forma em que as licitações e contratações são XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 9 realizadas, que consideram apenas o menor preço e não, necessariamente, a tecnologia mais adequada ou eficiente. Tem-se ainda, de modo mais geral, a questão da fragmentação e da ausência de continuidade administrativa das políticas públicas de prestação de serviços de saneamento (Galvão Júnior, 2009). Quanto a fragmentação das políticas públicas, sabe-se que as instituições não tendem a atuar de forma coordenada e integrada, dificultando a execução destas políticas. Já a descontinuidade de políticas é um fator importante, que pode contribuir para a interrupção de experiências bem-sucedidas que podem ser usadas como exemplo para outras localidades, impedindo a disseminação de boas práticas e de tecnologias e, por conseguinte, o avanço na prestação dos serviços de água e esgoto. CONCLUSÃO A região Norte do Brasil apresenta um grave déficit na prestação dos serviços de água e esgoto, em desacordo com o princípio de universalização definido na Lei nº 11.445/2007. Dentre os diversos motivos que ocasionaram este déficit, destacam-se: planejamento urbano inadequado, ineficiência técnica para captação de recursos da União e de financiamentos, ausência de dados para suporte a tomada de decisão e de mecanismos de regulação e também a fragmentação e descontinuidade administrativa das políticas públicas de prestação de serviços de água e esgoto. Deste modo, a Lei nº 11.445/2007 têm contribuído para o avanço na prestação dos serviços de água e esgoto, entretanto este avanço ocorre de forma lenta, afetando principalmente as populações periféricas e rurais, intensificando as desigualdades sociais e econômicas entre a região Norte e as demais regiões do Brasil. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Albuquerque, G.R (2011). Estruturas de financiamento aplicáveis ao setor de saneamento básico. BNDES Setorial nº 34, p. 45-94. Rio de Janeiro. 2. Brasil (2007). Lei nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico (...). 3. Brasil (2010). Decreto nº 7.217, de dezembro de 2010. Regulamenta a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico, e dá outras providências. Brasília, DF. 4. Brasil (2018). MP nº 868, de 27 de dezembro de 2018. Atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei nº 9.984 (...). Diário Oficial da União. Brasília, 8 jan. 2007, e retificado no DOU de 11 jan. 2007. 5. Falcón, A (2007). Espacios verdes para uma ciudad sostenible: planificación, proyecto, mantenimiento y gestión. Barcelona: Gustavo Gili. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos (ISSN 2318-0358) 10 6. Galvão Junior, A.C, Paganini, W.S (2009). Aspectos conceituais da regulação dos serviços de água e esgoto no Brasil. Eng Sanit Ambient v.14 n.1. p 79-88. 7. Galvão Junior, A.C. (2009). Desafiospara a universalização dos serviços de água e esgoto no Brasil.Revista Panamericana de Salud Publica (Print), v. 25, p. 548-556, 2009. 8. Heller, L e Pádua, V.L (2006). Abastecimento de água para consumo humano. Belo Horizonte: Editora UFMG. p. 29-64. 859 p. 9. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2011). Censo Demográfico 2010. Características da população e dos domicílios. Resultados do universo. Rio de Janeiro: IBGE. 10. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2017). Estimativas da população residente no Brasil e Unidades da Federação com data de referência em 1º de julho de 2017. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2017/estimativa_dou_2017.pdf. Acesso em: abril de 2018. 11. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2018). Pesquisa de informações básicas municipais: perfil dos municípios brasileiros 2017. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101595.pdf. Acesso em: junho de 2019. 12. Johnson, S. (2008). O mapa fantasma: como a luta de dois homens contra o cólera mudou o destino de nossas metrópoles. Rio de Janeiro: Zahar. 13. Ministério das Cidades (2017). Panorama dos Planos Municipais de Saneamento Básico no Brasil. Edição: Janeiro de 2017. Disponível em: http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNSA/Arquivos_PDF/panorama_planos_m unicipais_de_saneamento_basico.pdf. Acesso em: junho de 2019. 14. Nascimento, N.O.; Heller, L (2005). Ciência, tecnologia e inovação na interface entre as áreas de recursos hídricos e saneamento. Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 36-48. 15. Owen, D (2009). Green metropolis: why living smaleer, living closer, and driving less are the keys to sustainability. New York: Riverhead Books. 16. Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento – SNIS (2017). Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto 2017. Disponível em: http://app3.cidades.gov.br/serieHistorica/# Acesso em: abril de 2019. 17. Teixeira, J. C., Oliveira, G. S. de, Viali, A. de M., & Muniz, S. S. (2014). Estudo do impacto das deficiências de saneamento básico sobre a saúde pública no Brasil no período de 2001 a 2009. Engenharia Sanitaria e Ambiental, 19(1), 87–96.