Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
2018 Cozinha Fria Bruno Andreassi de Faro Copyright © UNIASSELVI 2018 Elaboração: Bruno Andreassi de Faro Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. F237c Faro, Bruno Andreassi de Cozinha fria. / Bruno Andreassi de Faro – Indaial: UNIASSELVI, 2018. 194 p.; il. ISBN 978-85-515-0176-4 1. Culinária (Pratos frios) – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 641.79 Impresso por: III apresentação Ao ouvir o termo “Cozinha fria”, o que a maioria de nós imagina? Talvez uma cozinha em que tudo seja produzido sem cozimento algum, ou uma cozinha em que tudo é servido frio. A cozinha fria é também chamada de Garde Manger, termo que vem do francês e significa “guardar comida”. Na verdade, também é o nome de um armário usado há muito tempo, no qual se estocava alimentos como embutidos, queijos, conservas, defumados e aqueles imersos em gordura animal, chamados de “confit”. Em muitos restaurantes, podemos encontrar na cozinha um setor e um funcionário denominado Garde Manger. Geralmente, ele é responsável pelas entradas frias, saladas, sopas frias e até sucos. Não é raro também que este profissional também faça as sobremesas. Tudo para otimizar equipe. Contudo, a função do setor Garde Manger é muito mais ampla e não produzimos somente receitas sem cozimento. Esta tendência gastronômica é o crudivorismo. No Garde Manger, muitas preparações são feitas com cocção, mas em grande parte, são servidas frias. Como a cozinha fria é responsável pelas técnicas de preservar os alimentos por mais tempo, cabe a ela as preparações curadas, defumadas, confitadas, marinadas, maturadas, desidratadas, escabechadas, recheios, mousses salgadas, uso de hidrocoloides, elaboração de queijos e decorações diversas. O Garde Manger também trabalha os canapés e aperitivos usando diversas técnicas e focando sempre na união entre estética e sabor. Este livro apresentará este conteúdo através de seus três capítulos, cada um com três tópicos. Na unidade 1, conheceremos a história do Garde Manger e os movimentos que o influenciaram, a importância e o uso do sal na cozinha e os principais tipos de molho, emulsões e sopas frias. Já na unidade 2, veremos as formas de uso da gelatina e outros hidrocoloides, a cura seca, salmoura, salmoura injetada, defumação, confit e os estilos de recheio para diversas produções como embutidos, terrines, pâté em croûtes, galantines e roulades. Por fim, a Unidade 3 traz os tipos de queijo, produções da mesa de antepastos típica na Itália, aperitivos, canapés e planejamento de menu, custos e apresentação de espelhos de Garde Manger. Desta maneira, você poderá aprender as principais técnicas e produções que formam os pilares desta importante cozinha, a Cozinha Fria, ou Garde Manger. Aproveite o livro e bons estudos. O autor. IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI VII UNIDADE 1 – A ARTE DA COZINHA FRIA .................................................................................... 1 TÓPICO 1 – A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER ........................................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA .................................................................................................. 3 2.1 UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE A NOUVELLE CUISINE...................................................... 8 3 PRINCIPAIS RESPONSABILIDADES E ATIVIDADES .............................................................. 9 4 FUNÇÕES DO SETOR ....................................................................................................................... 14 4.1 REQUISIÇÃO DAS MERCADORIAS PARA A PRODUÇÃO .................................................. 16 4.2 MISE-EN-PLACE DA PRODUÇÃO ............................................................................................. 18 4.3 PRODUZIR ENTRADAS FRIAS.................................................................................................... 18 4.4 PRODUZIR SOPAS FRIAS ............................................................................................................. 19 4.5 CONFECÇÃO DE SALADAS ........................................................................................................ 20 4.6 MOLHOS FRIOS .............................................................................................................................. 20 4.7 CANAPÉS, PETISCOS, TÁBUAS DE FRIOS E FINGER SANDWICHES ............................... 20 4.8 PORCIONAR, EMBALAR E ETIQUETAR PRODUTOS A SEREM USADOS ....................... 21 4.9 PREPARAR FRUTAS E SUCOS ..................................................................................................... 21 4.10 DECORAÇÕES ............................................................................................................................... 21 4.11 PREPARAÇÃO DE BANDEJAS, ESPELHO E BUFÊS ............................................................. 21 4.12 LIMPEZA ........................................................................................................................................ 22 4.13 ORGANIZAÇÃO DO ESTOQUE ................................................................................................ 22 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 23 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 24 TÓPICO 2 – A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS ....................................................................... 25 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 25 2 O SAL ...................................................................................................................................................... 25 2.1 TIPOS DE SAL ..................................................................................................................................28 2.2 OSMOSE ............................................................................................................................................ 29 2.3 DESIDRATAÇÃO ............................................................................................................................ 30 2.4 DESNATURAÇÃO DE PROTEÍNAS ............................................................................................ 33 2.5 ALTAS TEMPERATURAS .............................................................................................................. 33 2.6 PHS EXTREMOS .............................................................................................................................. 33 3 SALADAS ............................................................................................................................................... 34 3.1 SALADAS VERDES ......................................................................................................................... 35 3.2 SALADA DE VEGETAIS ................................................................................................................ 37 3.3 SALADA DE MACARRÃO ........................................................................................................... 39 3.4 SALADA DE GRÃOS (CEREAIS) ................................................................................................. 41 3.5 SALADAS DE LEGUMINOSAS .................................................................................................... 42 3.6 SALADAS DE FRUTAS .................................................................................................................. 43 3.7 SALADAS MORNAS ...................................................................................................................... 44 4 TERRINES VEGETAIS ........................................................................................................................ 45 sumário VIII RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 49 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 50 TÓPICO 3 – EMULSÕES, CHAUD FROID, MOLHOS, REDUÇÕES E SOPAS FRIAS ........... 51 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 51 2 EMULSÃO .............................................................................................................................................. 52 2.1 UMA MAIONESE SEM PROBLEMAS ......................................................................................... 53 3 CHAUD FROID .................................................................................................................................... 54 4 REDUÇÕES ............................................................................................................................................ 55 5 SOPAS FRIAS ........................................................................................................................................ 59 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 62 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 66 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 67 UNIDADE 2 – A ARTE DA COZINHA FRIA .................................................................................... 69 TÓPICO 1 – A GELATINA E SUA APLICABILIDADE NA COZINHA FRIA, MOUSSES SALGADAS E PATÊS ...................................................................................................... 71 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 71 2 HIDROCOLOIDES .............................................................................................................................. 72 3 GELATINA ............................................................................................................................................. 73 3.1 USANDO GELATINA ..................................................................................................................... 75 3.2 TIPOS DE GELATINA E FORMAS DE USO E ESTOCAGEM ................................................. 77 4 AGAR AGAR ......................................................................................................................................... 82 5 MOUSSE ................................................................................................................................................. 84 5.1 PRINCIPAIS INGREDIENTES ...................................................................................................... 84 5.2 PROPORÇÃO BÁSICA PARA UMA MOUSSE .......................................................................... 85 5.3 MODO DE FAZER .......................................................................................................................... 85 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 88 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 89 TÓPICO 2 – ALIMENTOS CURADOS, DEFUMADOS E CONFITADOS ................................. 91 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 91 2 CURA ....................................................................................................................................................... 91 2.1 CURA SECA ..................................................................................................................................... 92 2.2 SALMOURA ..................................................................................................................................... 97 2.3 CURA SECA ..................................................................................................................................... 99 2.4 SALMOURA ..................................................................................................................................... 99 2.5 PELÍCULA ........................................................................................................................................ 99 3 DEFUMAÇÃO ....................................................................................................................................... 100 3.1 DEFUMAÇÃO A FRIO ................................................................................................................... 101 3.2 DEFUMAÇÃO QUENTE ................................................................................................................ 103 3.3 LÍQUIDA ........................................................................................................................................... 104 4 CONFIT................................................................................................................................................... 105 4.1 GORDURA VEGETAL .................................................................................................................... 106 4.2 RILLETES .......................................................................................................................................... 107 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 109 AUTOATIVIDADE................................................................................................................................. 110 TÓPICO 3 – RECHEIOS PARA PRODUÇÃO DE SALSICHAS, TERRINES, PÂTÉ EN CROÛTE, GALANTINES E ROULADES.................................................................... 111 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 111 IX 2 ESTILOS DE RECHEIOS .................................................................................................................... 111 2.1 FARCE DIRETA................................................................................................................................ 111 2.2 FARCE CAMPONESA (CHAMADA TAMBÉM DE COUNTRY) ............................................ 112 2.3 FARCE GRATIN ............................................................................................................................... 112 2.4 FARCE MOUSSELINE ................................................................................................................... 113 2.5 FARCE 5/4/3 ...................................................................................................................................... 113 2.6 INGREDIENTES DE GUARNIÇÃO ............................................................................................. 113 2.7 PÂTÉ EN CROUTE .......................................................................................................................... 121 2.8 GALANTINES E ROULADES ....................................................................................................... 126 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 129 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 132 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 133 UNIDADE 3 – A ARTE DA COZINHA FRIA .................................................................................... 135 TÓPICO 1 – QUEIJOS E ANTEPASTO ............................................................................................... 137 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 137 2 HISTÓRIA .............................................................................................................................................. 137 3 PRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 139 3.1 O LEITE ............................................................................................................................................. 140 3.2 TRANSFORMANDO LEITE EM QUEIJO ................................................................................... 141 3.3 INOCULAÇÃO ................................................................................................................................ 143 3.4 ARRUMANDO UMA TÁBUA DE DEGUSTAÇÃO DE QUEIJOS .......................................... 148 4 ANTEPASTOS ....................................................................................................................................... 148 5 ESCABECHE .......................................................................................................................................... 155 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 157 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 158 TÓPICO 2 – APERITIVOS, HORS D’OEUVRE E CONSERVAS .................................................. 159 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 159 2 APERITIVOS ......................................................................................................................................... 159 2.1 CAVIAR ............................................................................................................................................. 162 2.2 FOIE GRAS ....................................................................................................................................... 166 3 CONSERVAS ......................................................................................................................................... 169 3.1 INFUSÃO EM ÓLEO OU VINAGRE ............................................................................................ 170 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 174 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 177 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 178 TÓPICO 3 – APRESENTAÇÃO DE BUFÊS E CRIAÇÃO DE MENUS ......................................... 179 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 179 2 MENU ...................................................................................................................................................... 180 3 APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 183 3.1 OPÇÕES DE APERITIVOS PARA EVENTOS ............................................................................. 188 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 190 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 191 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 193 X 1 UNIDADE 1 A ARTE DA COZINHA FRIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você será capaz de: • Conhecer a história da cozinha fria, também conhecida como Garde Man- ger, as principais responsabilidades dos cozinheiros que atuam nesta área e as funções do setor. • Compreender a importância do sal na história e na cozinha fria, suas dis- tintas aplicações e como ele atua nos alimentos. • Será possível conhecer e identificar os diferentes tipos de salada, molhos e sopas frias e ainda a produção de terrines sem uso de carnes como base. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER TÓPICO 2 – A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS TÓPICO 3 – EMULSÕES, CHAUD FROID, MOLHOS, REDUÇÕES E SOPAS FRIAS 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 1 INTRODUÇÃO Você pode até estar pensando que cozinha fria deve ser sem graça. Isso pode ser que seja derivado de nossa cultura gastronômica no Brasil. Tente pensar em um prato salgado brasileiro de carne ou peixe que seja servido gelado. Lembrou de algum? Realmente é difícil. Mesmo com o nosso clima tão quente, podemos degustar uma moqueca borbulhante com os pés na areia quente de cidadespraianas da Bahia e Espírito Santo, podemos comer caldeirada fervente em Maceió, tainha na brasa em Santa Catarina e uma feijoada no centro do Rio 40oC. A cultura de qualquer local é passada através do tempo e nem sempre é questionada. Por isso existem estas discrepâncias. Não seria mais lógico comermos mais pratos refrescantes em nosso clima tão quente? Se olharmos para outros países, muitos possuem pratos mundialmente conhecidos e aceitos e que são servidos gelados ou em temperatura ambiente. O que dizer do tão adorado sushi? Ou mesmo do ceviche peruano, que é feito com peixe fresco cru temperado com limão, gengibre, coentro, cebola, pimenta e servido bem gelado? Por que não um antepasto italiano, ou uma terrine de carne de porco francesa? A cozinha fria se configura em algo de muita importância na história humana, pois permitiu ao homem estocar e aumentar a vida útil dos alimentos, facilitando a transição de caçador/coletor para produtor. A cozinha fria é responsável em grande parte pela mudança de cultura no consumo mundial e é isso que este livro demonstrará. 2 A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA A qualidade da gastronomia francesa é amplamente reconhecida. O país, além de tudo, contribuiu com o termo mais usado no mundo para denominar a cozinha fria: Garde Manger. Esta denominação era dada a um local designado a guardar alimentos curados (desidratados com sal), fermentados, defumados, desidratados, embutidos, conservas, compotas etc. (INSTITUTO AMERICANO UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 4 DE CULINÁRIA, 2014). Geralmente, este local era um armário ou aparador com grades. Não costumava ser fechado demais para evitar mofos e bolores indesejados. Os antigos já sabiam que a circulação de ar ressecava ainda mais os produtos e fazia com que durassem mais. Abaixo vemos uma foto de um armário típico que antigamente era chamado de Garde Manger. FIGURA 1 – ARMÁRIO ANTIGO PARA ESTOCAR COMIDA FONTE: Disponível em: <Https://Pin.It/Kqsze6eqrzunf3>. Acesso em: 15 dez. 2017. Com o tempo, deixou de ser uma despensa para se tornar uma das praças em restaurantes e hotéis pelo mundo. Se você já trabalhou em um restaurante bem estruturado, provavelmente já tinha ouvido o termo. Esta denominação francesa quer dizer “guardar comida”. Traduzindo de forma prática para o “gastronomês”, Garde Manger é a área da cozinha que trabalha todas as técnicas que prolongam a vida dos alimentos. Sabe aquele salaminho feito de forma artesanal pelos nossos avós; ou a carne de porco cozida e armazenada em banha consumida pelo interior de Minas Gerais; os queijos dos colonos; a barriga suína defumada e tão adorada chamada de bacon; a maionese e a vinagrete; qualquer salada; as salsichas dos hot dogs; ou mesmo os canapés servidos em casamentos antes dos pratos principais? Tudo isso é produção do Garde Manger. Depois de deixar um pouco mais claro o quão versátil pode ser a cozinha fria, podemos continuar com um pouco mais da história do Garde Manger. Qual a grande diferença de nós, Homo sapiens, para os outros animais? Se você pensou “inteligência”, não chega a estar errado, mas muitos outros animais possuem inteligência para resolver problemas complexos, se comunicar ou até mesmo utilizar ferramentas. TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 5 O nosso grande diferencial é que cozinhamos nossos alimentos. Nenhum outro animal faz isso. O cozimento do alimento foi o grande passo que nos permitiu saltar da alimentação crua, demorada e que exigia muita mastigação, para uma mais prática, saborosa, macia e calórica. Nós começamos a ter mais tempo para desenvolver nossos laços sociais, nos dedicar à arte e outras atividades. Tudo possível graças ao cozimento. O primeiro método de cocção do alimento descoberto pelo homem foi de radiação, por meio da cocção por calor seco, sem a utilização de gordura, com o alimento sendo assado diretamente na brasa. É provável que essa descoberta humana tenha sido por acaso, como muitas outras. Imagine que nossos antepassados estavam reunidos e, de repente, um raio cai nas proximidades e causa um incêndio. Depois de apagado, poderiam caminhar pela área queimada e descobrir animais mortos e “assados”, cuja carne estava mais macia, mastigável e saborosa. Ali naquele momento, percebeu-se a vantagem do uso do fogo. No início, mantinham sempre a chama coletada desses incêndios acesa, mas depois descobrimos como produzi-la a qualquer momento. O fogo dava poder, protegia de predadores, aquecia, e, mais importante de tudo, nos permitiu cozinhar. Este método de cocção é utilizado até hoje, de modo que não há grande sofisticação tecnológica sobre a técnica, que pode ser utilizada com braseiro feito sobre o chão ou com recipientes adequados, que otimizem a reflexão e distribuição do calor, como as churrasqueiras (COLETTI, 2016). Com o calor, o homem passou a transformar a textura do alimento, tornando-o mais tenro para o consumo, fazendo com que fossem exigidos menos esforços de sua musculatura facial e do sistema digestivo, conferindo-lhe alterações de características. Agora com energia sobrando graças à diminuição do esforço, podíamos desenvolver outras partes do corpo, como o cérebro. Entretanto, o principal benefício da descoberta do fogo foi a alteração do sabor do alimento (BRILLAT-SAVARIN, 2012). Diria que não só o sabor, mas logo percebemos que o alimento que era colocado próximo ao fogo, não diretamente sobre ele, desidratava e defumava. Não sabíamos ainda, mas havíamos inventado a defumação. Este processo não mudou muito e hoje é ainda feito de forma similar à da pré-história. Ele resseca o alimento, o que diminui a umidade e o desenvolvimento microbiano e também a própria fumaça é tóxica a microrganismos que deterioram alimentos. Com esta descoberta, surgia também o Garde Manger. Como assim? Simples. Você já sabe que Garde Manger vem de guardar comida, certo? Se você desidrata um alimento e com o uso da fumaça o transforma a ponto de que ele dure mais tempo do que se estivesse cru, você está aplicando o princípio básico da cozinha fria: prolongar a vida dos alimentos. O uso do fogo é um fator fundamental para o desenvolvimento do nosso paladar e para a diferenciação dos futuros conceitos de alimentação, abrindo uma grande lacuna entre a nossa espécie e os outros animais, com a possibilidade da UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 6 diferenciação do ato de se alimentar por necessidade fisiológica e do ato de se alimentar por prazer (BRILLAT-SAVARIN, 2012). Os antigos não possuíam tecnologias como temos hoje para congelar alimentos e preservá-los por muito tempo. Com isso, no século XII, quando ainda de 80% a 90% das pessoas viviam no campo trabalhando para os mais nobres, havia uma época do ano fundamental. A época do processamento dos alimentos cultivados para durarem em épocas das entressafras. Vegetais, frutas e grãos eram colhidos e por secagem eram armazenados em locais frios, ao lado de picles, conservas, glacês, compotas e queijos. Bovinos, ovinos, aves e outros animais domésticos eram abatidos e suas carnes preservadas de diferentes formas: conserva, salgamento, salmoura, cura seca, secagem, cozimento e acondicionamento em gordura ou defumação (INSTITUTO AMERICANO DE CULINÁRIA, 2014). Cada vez fica mais claro a importância do Garde Manger, não acha? Creio que também já esteja visualizando essas técnicas em muitos produtos que você consome no dia a dia. A necessidade de guardar, aliada à criatividade humana, permitiu o surgimento de inúmeros produtos, derivados das culturas em que se inseriam. O processo do queijo exemplifica muito isso. Certo dia, uma pessoa levou leite em uma bolsa feita de estômago da vaca. Restos de ácidos estomacais talharam o leite. Ao invés de dispensar o produto, esta pessoa provou. Provavelmente, coou e degustou o que era basicamente uma coalhada. Em um outro momento, esse leite pode ter sido guardado e sem quererfoi atacado por um fungo, suponhamos que seja pelo Penicillium roqueforti. Esta pessoa esquece o leite por tanto tempo, que quando lembra dele e vai checar, ele está todo esverdeado, alterado e estranho. Ela prova e gosta. Ela não faz ideia do que ocorreu, mas aprende a dominar o processo de guarda e evolução do queijo. Nasce o Roquefort. Por processo similar, nasceu o Gorgonzola na Itália, o Stilton na Inglaterra ou o Cabrales na Espanha. Muito antes de vermos um microrganismo em um microscópio, já dominávamos o processo de fermentação de muitos produtos. Incrível, não? Com o tempo, o ser humano foi percebendo que muitas outras técnicas poderiam ser usadas a fim de dar vida mais longa aos alimentos e ainda aprendeu a evoluí-las de forma a criar a infinidade de produtos que encontramos hoje, todos derivados da simples necessidade de guardar comida. Até o fim deste livro passaremos por todas elas. Um dos grandes cozinheiros da história, o francês Antonin Carême (1783- 1833) introduziu muitas técnicas de elaboração nas produções da cozinha fria (KELLY, 2005). Essas técnicas são aproveitadas até hoje. Na antiguidade, era usado o serviço de grande elaboração, com mesas faraônicas (com aves e animais inteiros), bandejas enormes, muita ornamentação e extraordinnaires. Estas eram peças centrais extremamente trabalhadas que serviam tanto para decorar como para se servir. TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 7 FIGURA 2 – EXTRAORDINNAIRE DE ANTONIN CARÊME FONTE: Kelly (2005) Eram usados mosaicos em legumes, esculturas e arranjos elaborados; até a decoração do lugar era de impressionar. Tapetes caríssimos, arranjos de flores exóticas, abundância de obras de arte, nas mesas peças em ouro, prata e pedras preciosas. Tudo para mostrar o poderio econômico e muitas vezes político dessas pessoas. Esses banquetes eram a forma de se ter prestígio perante a sociedade. As produções eram pesadas, com muita gordura, muita carne e tudo muito rústico. Os cozinheiros eram disputadíssimos, pois estavam sempre procurando novas invenções, novas técnicas, efeitos ou esculturas que fizessem a diferença de seu trabalho. A mão de obra e a comida eram abundantes e de baixo custo, as preparações muito trabalhosas e em grande estilo. Um importante movimento também na cozinha francesa revolucionou a cozinha fria. A chamada Nouvelle Cuisine nos deu pratos mais leves, mais lights, com reduções de gorduras saturadas, açúcares, molhos pesados etc., procurando usar mais proteínas alternativas, como algas, reutilização de aparas e porções mais controladas. Pratos à base de peixes, aves, vitela, queijos lights, grãos, legumes e verduras fazem a tendência das cozinhas modernas. O Garde Manger atual deve produzir pratos criteriosamente elaborados e montados, criativos e práticos, dando atenção especial ao custo dos ingredientes e à mão de obra mais especializada. Hoje o Garde Manger abrange serviços à la carte, buffets, recepções e banquetes. Esta área necessita que seus profissionais manejem com precisão produtos como terrines, pâtés, embutidos e queijos. Devem possuir inúmeras habilidades, assim como deve-se desenvolver em cozinha quente. O Garde Manger é tão desafiador que muitos profissionais o escolhem como carreira para toda a vida. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 8 Outra profissão surgida foi o pasteleiro, que era todo aquele que fazia tortas com os recheios da charcutaria. Era usada uma casca de massa com recheio. Esses recheios eram feitos da emulsão de fibras da carne com a própria água da carne e gordura. Nas produções de Garde Manger, existem muitos aspectos que precisam ser observados para o sucesso no resultado final. Não importa se os pratos são frios ou quentes: eles precisam ter um ótimo sabor. Além disso, o visual do prato a ser oferecido é de fundamental importância, pois o comensal é conquistado primeiramente pelo visual e depois pelo sabor. 2.1 UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE A NOUVELLE CUISINE A Nouvelle Cuisine, movimento gastronômico nascido na década de 1970, revolucionou a alta cozinha e contribuiu definitivamente para que a estética e os valores nutricionais se firmassem na gastronomia moderna. Estas mesmas práticas nos acompanham até os dias de hoje. Embora tenhamos o ano de 1972 como data de partida, sabemos que antes disso alguns chefs já praticavam as novas técnicas e apresentações, tais como Ferdinand Point, Alain Chapel, Alain Senderens, Michel Guérard, entre outros. Saímos de um mundo gastronômico clássico no qual imperavam as práticas orquestradas por Auguste Escoffier. Naquela época, as preparações substanciosas davam as ordens. O negócio era “se banquetear”. Eram comuns os molhos muito ligados à base de farinha, patês gordurosos, massas pesadas e guarnições com o objetivo de saciar a fome. A união da criatividade e do design passou a ser enfatizada. A estética passou a ter um novo valor, as pessoas passaram a “comer com os olhos”. Finalmente, a cozinha é desejada pelos cinco sentidos. A essência da Nouvelle Cuisine se perpetuou no cenário gastronômico. Notamos isso pelos benefícios deste movimento. A herança não foi somente na estética: houve uma profunda transformação nas técnicas da cozinha ao tornar as preparações menos gordurosas, menos ligadas, passamos a ter molhos mais leves (jus e fumets). Ganhamos em frescor, leveza, harmonia natural, simplicidade nos métodos de cocção, cozimentos mais rápidos que preservam os elementos nutricionais. Além disso, a valorização do serviço empratado (service sur assiette) no lugar das travessas de prataria. Emulsão é a mistura de dois produtos que sozinhos não se misturam, com a ajuda de uma substância que permite a união de ambos, dando um resultado mais homogêneo. IMPORTANT E TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 9 Terroir é o termo francês que denomina a união de todos os fatores de uma pequena região específica. Clima, microclima, solo, incidência de ventos e chuva são fatores que compõem um terroir. IMPORTANT E Apesar dos benefícios, a Nouvelle Cuisine teve seu período de difamação. O próprio chef Alain Ducasse aponta que o movimento causou danos à alta gastronomia. Está evidente pelo mal aproveitamento das técnicas e criações bizarras dos péssimos alunos desta tendência. Isso é visível pelas porções minúsculas em pratos enormes. Cozinheiros usavam nomes poéticos e dissertativos, porém com pouco conteúdo. Esta imagem errada da alta gastronomia que se limita às porções minúsculas continua na cabeça de muitas pessoas. Lá se vão quase 40 anos e a essência está totalmente atualizada. Este movimento abriu as portas para a cozinha moderna. Embora tenhamos vivido outros movimentos gastronômicos (como o fusion e a cozinha molecular), as boas práticas da Nouvelle Cuisine ainda são contemporâneas: valorizam fatores como o terroir e o saudável, tendências da cena atual. 3 PRINCIPAIS RESPONSABILIDADES E ATIVIDADES Não é difícil notar a profunda divisão de tarefas em uma cozinha e sua hierarquia militar tão marcante. Não é à toa e vem de muito tempo atrás. Auguste Escoffier (1846-1935) detalhou a cadeia de comando lógica, que eliminou a bagunça do fim do século XIX (INSTITUTO AMERICANO DE CULINÁRIA, 2014). Ainda hoje, em uma cozinha profissional, nos referimos às praças de trabalho com os nomes apontados por Escoffier. As principais praças são: Saucier: cozinheiro responsável pela produção dos caldos e molhos. Rôtissier: cozinheiro responsável pelas proteínas animais. Pâtissier: responsável pela confeitaria e produção de massas diversas. Garde Manger: responsável pelas produções frias, embutidos, terrines, molhos frios, saladas etc. A seguir podemos ver uma cozinha de Garde Manger atual. Apesar do tempo ter passado e ela, hoje, muitas vezes ser mais despojada, as funções e a qualidade se mantêm. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 10 FIGURA 3 – COZINHA ATUAL DEGARDE MANGER FONTE: Disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/-qW5v0_eRWlI/Vl0PD_Qx8qI/ AAAAAAAAntg/YTacsJ88cLI/s1600/DSC_0019.JPG>. Acesso em: 15 dez. 2017. Em relação às principais responsabilidades de um cozinheiro de cozinha fria, podemos citar: • Organização, padronização e eficiência O Garde Manger precisa ser bem organizado do início ao fim. Desde o processo de compras de insumos, sua higienização, processamento, porcionamento e execução precisam ser bem planejados. Muitas produções da cozinha fria exigem alto nível de padronização. Quando montamos um espelho com canapés, por exemplo, precisamos fazer cada um igual ao outro. Como um sushiman que faz cada peça de sushi igual às outras. Quando se trabalha de forma organizada, padronizada e bem planejada, eficiência é consequência. • Brigada com conhecimento técnico e eficácia A equipe de Garde Manger deve ser bem treinada a fim de conquistar eficácia máxima nas produções, garantindo maior aproveitamento de insumos e do tempo disponível de produção. TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 11 • Distribuição de tarefas ordenadas e justas entre os membros da equipe Antes de qualquer dia de produção, cabe ao chef ou subchefe determinar o que será produzido e por quem. Também é importante determinar quando será preparado, para que dois cozinheiros não precisem do mesmo equipamento na mesma hora. Na cozinha, chamamos este planejamento de plano de ataque. A seguir, veremos um exemplo de plano funcional, no qual se aponta inclusive em que louça o item será servido. Nele estão dois canapés: Sardinha frita com pão crocante, molho de abacate e picles de beterraba; pernil suíno assado servido em chips de batata com creme de mostarda e salsa crespa. Note que o canapés deverão ser montados na terça-feira, mas produções que mantêm qualidade podem ser feitas anteriormente, como o picles e o crocante de pão, por exemplo. Desta forma, no dia do serviço, sobram somente a fazer o que de fato tem que ser a la minute. Muito esperto, não? Canapé Dia produção Quantia Responsável Louça para servir 1 - Sardinha frita 3ª feira 150 unidades Paulo Prato de vidro Molho de abacate 3ª feira 500 g Pedro Crocante de pão 2ª feira 150 unidades Fernanda Picles de beterraba 2ª feira 150 unidades Cláudia 2 – Pernil assado 2ª feira 1 kg Paulo Prato de ardósia Creme de mostarda 3ª feira 500 g Pedro Batata chips 2ª feira 150 unidades Fernanda Salsa crespa 3ª feira 150 unidades Cláudia TABELA 1 – PLANO DE ATAQUE FONTE: O autor Um plano como esse deve ser feito previamente, o que também auxilia ao chef detalhar a lista de pedidos a fim de garantir que todos os insumos cheguem no dia correto de produção. • Coordenação harmoniosa da equipe A cozinha pode ser vista como uma orquestra e o chef como maestro. A equipe é seu reflexo. Equipe ansiosa deriva de chef agitado, já equipe que flui tranquilamente deriva de um chef calmo. Infelizmente, a gastronomia é mundialmente conhecida por alguns chefs exaltados e nervosos. Já é mais do que percebido que eles até conseguem atingir excelentes resultados, mas a um alto custo. O nível de estresse em muitas cozinhas pelo mundo aumenta a saída de muitos colaboradores. Você preferiria trabalhar em um local cujo chef é áspero, nervoso, mal-educado ou em um local onde o chef trata todos com paciência, compaixão e é um verdadeiro mentor? UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 12 Ainda bem que existem muitos chefs que são realmente excelentes líderes. Levam a equipe aos mais altos níveis sem ter necessidade de exaltação, desrespeito e austeridade. • Conhecimento do funcionamento dos equipamentos e utensílios do setor Se você trabalha em uma cozinha de Garde Manger, deve conhecer os principais equipamentos e utensílios. Assim como na confeitaria, a cozinha fria possui particularidades. Fornos combinados, formas específicas para terrines e Pâtés en Croûte, faca de fatiar produtos curados, batedeiras, abridores de massas, entre muitos outros. • Vistoriar constantemente equipamentos, utensílios e validade dos produtos Uma cozinha eficaz depende de seus equipamentos e utensílios. Imagine você estar trabalhando para um evento de cozinha fria e seu forno quebra no dia em que você ia assar todas as produções? O que você faz? A manutenção de qualquer equipamento deve ser planejada de forma preventiva. Quando ocorre uma emergência como esta, o telefone do técnico já deve estar salvo para ser usado prontamente. Imagine agora que o único técnico da cidade não atende. A melhor opção seria locar outro forno por um dia. Pode demorar um pouco para ele chegar, mas pelo menos não se perde a produção. Outro ponto que o cozinheiro de Garde Manger está sempre prestando atenção são as validades. Como muitas produções desta área duram muito tempo, cabe aos cozinheiros, através da análise organoléptica ou mesmo biológica, verificarem a qualidade das produções. Como os eventos geralmente são longos, é comum optar por produções que aguentem com qualidade mais tempo de exposição. Lembre-se: se há dúvida na qualidade do alimento ou em sua validade, não o utilize. • Qualidade dos serviços prestados tanto na higiene quanto na aparência O que você acharia de chegar em um evento montado de forma impecável e se deparar com os cozinheiros bem sujos ou mesmo tocando nas comidas com as mãos nuas? De nada adianta ter higiene em alguns aspectos. Higiene tem que ser geral. IMPORTANT E TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 13 Desde a chegada dos produtos, a higiene é fundamental. O local de armazenamento deve ser limpo, as bancadas, equipamentos e utensílios devem ser sanitizados corretamente e as temperaturas mínimas de segurança na cocção devem ser atingidas. Da mesma forma que higiene é fundamental, apresentação pessoal também é. Padronização dos uniformes, barba feita, unhas limpas e sem esmalte ou base, sem relógios, colares e anéis e todas as outras exigências da ANVISA devem ser levadas em conta. • Organização e atualização dos estoques e geladeiras Quando possível, é sempre válido que o restaurante possua um estoquista que faz todo o controle de entrada e saída de insumos, controle de validade e higienização correta dos estoques secos e frios. Quando esta figura importante não está, cabe ao chef, ou mesmo aos cozinheiros, monitorarem estes detalhes a fim de garantir a qualidade e a rotatividade dos produtos. Importante que se aplique o PEPS (primeiro que entra, primeiro que sai). Assim como nas gôndolas de mercados, os produtos com validade maior devem ser usados depois. • Recepções - coquetéis - brunches - bufês frios - coffee-breaks Como se faz dinheiro com Garde Manger? Através de coquetéis, brunches, bufês, coffee-breaks, em hotéis e restaurantes. Um coquetel pode ser desde um serviço em um lançamento de uma nova coleção de roupas para poucas pessoas dentro de uma loja ou antes dos pratos quentes em um grande casamento. Nele podem ser servidas opções frias, quentes, geralmente de forma volante, ou seja, o garçom circulando e oferecendo as diversas opções aos presentes. Já os brunches surgiram da união do café da manhã (breakfast) com o almoço (lunch) e, geralmente, são servidos do meio da manhã até o fim da tarde. Suas preparações típicas incluem canapés frios e quentes, pães, embutidos, produtos curados, queijos, defumados, preparações com ovos, folhados, sopas frias, geleias e coquetéis com e sem álcool. Bufês se configuram no serviço cujas preparações são expostas, sem a circulação volante. Preparações frias ficam em espelhos, pratos, bandejas e as quentes em réchauds. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 14 Por fim, coffee-break se constitui no serviço no meio da manhã ou meio de tarde, geralmente durante um evento com aulas, palestras ou outras atividades. Na tradução, seria uma pausa para o café. Geralmente são servidas mais preparações frias, sucose café. • Decorações pertinentes ao setor: esculturas em legumes, frutas, gelo, sal ou manteiga As esculturas são um ponto à parte na área. Exigem muita habilidade e anos de prática. Em países muito frios é comum haver profissionais do Garde Manger que esculpem no gelo. No Brasil, é mais comum encontrarmos esculturas em frutas e legumes. Contudo, hoje, muitos enxergam essas decorações em alimentos como desperdício de matéria-prima, já que pouca coisa é aproveitada depois de esculpida. Através da mescla de amido de milho ou farinha de trigo com sal, água e corantes, pode-se obter uma massa fácil de modelar como aquelas com que brincamos quando crianças. As esculturas em manteiga ou gordura mescladas com farinha também são viáveis e versáteis. Mesmo com tantas opções de técnicas de produção de peças decorativas, quando os canapés e outras produções são versáteis e bem apresentáveis, a necessidade de peças diminui. Atualmente, é mais comum encontrar eventos mais minimalistas neste quesito. 4 FUNÇÕES DO SETOR As funções de um cozinheiro de cozinha fria podem variar muito, dependendo do seu nível de experiência ou, mesmo, tempo de serviço no local (INSTITUTO AMERICANO DE CULINÁRIA, 2014). a) Nível inicial: Neste nível, o trabalho inclui limpar e cortar ingredientes, fazer molho básico como vinagretes, maioneses e à base de molho holandês, manteigas aromatizadas com ervas e outros temperos. Tudo produzido sob supervisão. Você sabia que réchaud é o termo francês para o que nós chamamos de banho- maria, onde servimos comidas quentes em self-services? NOTA TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 15 Muitas tarefas de cozinha fria podem levar dias, semanas ou até meses, por isso, é imprescindível que o cozinheiro seja organizado e consiga planejar suas atividades e requisições de matéria-prima com habilidade. Neste nível, o cozinheiro deve também aprender a usar todos os equipamentos disponíveis com segurança. Grande parte dos acidentes com equipamentos em cozinhas profissionais ocorre pelos seguintes motivos: 1) funcionário mal treinado para operar o equipamento; 2) falta de itens de segurança, como luvas de proteção (para fatiadoras ou serras de bancada, por exemplo); 3) jornada excessiva que gera cansaço e com isso falta de atenção; 4) funcionário distraído operando o equipamento. b) Nível avançado: Com o desenvolvimento de suas habilidades, o caminho para chefiar uma cozinha se torna mais viável (INSTITUTO AMERICANO DE CULINÁRIA, 2014). É muito comum conhecer pessoas que acreditam que o chef passa o tempo todo cozinhando. Quem dera. O chef é um coordenador, um gerente. Ele dita o caminho e mantém a cozinha motivada e produtiva e precisa liderar de forma que todos evoluam com o tempo. Grande parte das funções de um chef de cozinha são burocráticas, como: produzir fichas técnicas de receitas e custos, planejar eventos, alugar material quando necessário, conhecer novos produtos e fornecedores, contratar e demitir, treinar etc. Em um nível avançado, o profissional de Garde Manger precisa desenvolver novos itens no menu; criar receitas padronizadas para que todos executem da mesma forma e o cliente receba sempre o mesmo produto de qualidade; estimar custos de pratos e eventos; e desenvolver orçamentos. Ele é responsável também por treinar os cozinheiros e garçons para apresentarem corretamente cada novo item do cardápio (INSTITUTO AMERICANO DE CULINÁRIA, 2014). Neste nível, o controle só aumenta. Saber exatamente os valores e custos tanto dos ingredientes quanto dos pratos torna-se tarefa básica do dia a dia. Cada item proposto a um cliente deve ter seu custo conhecido e valor de venda adequado. Quando apresentamos opções de canapés para um casamento, por exemplo, devemos agrupá-los por subgrupos. Veja um exemplo: Sempre que começar em uma cozinha nova, independentemente de sua experiência, escute todos os membros da equipe, seja proativo, faça tudo conforme mandarem, trabalhe de forma limpa e organizada, seja pontual e, se fizer algo errado, assuma a culpa e conserte sem inventar desculpas. Na dúvida, peça ajuda. DICAS UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 16 Subgrupos: • Canapés vegetarianos frios. • Vegetarianos quentes. • Canapés frios de frutos do mar. • Canapés quentes de frutos do mar. • Canapés frios de aves. • Canapés quentes de aves. • Canapés frios de carnes. • Canapés quentes de carne. Este é só um exemplo, cada chef detalha de maneira alinhada com a sua proposta e seu trabalho. Nestes subgrupos, poderíamos adicionar ainda sopas, opções de saladas, pratos a serem servidos volantes, itens em uma mesa de frios e até mesmo as sobremesas (incluindo o confeiteiro na equipe). A separação em subgrupos facilita a visualização do cliente e a escolha dos itens que comporão o menu. O chef de cozinha fria trabalha muito em conjunto com o gerente de salão, ficando até encarregado de solicitar serviços de terceiros, como cerimonialistas, floristas, fotógrafos etc. Quais são as funções básicas de uma equipe de cozinha fria que produz eventos, banquetes, cerimônias, ou mesmo que componha uma equipe de um restaurante estrelado? 4.1 REQUISIÇÃO DAS MERCADORIAS PARA A PRODUÇÃO Um pedido de compras mal feito atrapalha a estocagem quando feito em excesso. Se algo falta, é comum buscar a compra em locais mais caros, como supermercados, o que pode até inviabilizar o custo de uma produção. Costumamos dizer na cozinha que o urgente sai caro. Sempre se indica fazer os pedidos com os fornecedores primários e não os finais. Quando uma cozinha é muito grande, é comum que cada cozinheiro faça sua própria requisição a partir do conhecimento sobre o movimento ou serviço do dia seguinte. No início, fazer uma requisição é desafiador, contudo, com o tempo, torna-se simples e rápido. Quando a cozinha não possui uma equipe tão grande, é mais prático que o chef ou subchefe façam o pedido. É importante também que se crie um estoque mínimo de itens secos e até carnes e laticínios, deixando para o dia a dia basicamente o hortifrúti. A seguir vemos um exemplo de planilha de estoque mínimo: TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 17 Produtos Estoque Produtos Estoque Secos: unidade atual mínimo pedido Laticínios: unidade atual mínimo pedido Arroz kg 15 Nata kg 10 Arroz arbóreo kg 25 Leite litro 50 Azeite extra litro 15 Manteiga kg 20 Farinha de rosca kg 10 Iogurte kg 10 Farinha de trigo kg 20 Parmesão kg 20 Molho de tomate kg 20 Gouda kg 5 Molho shoyu litro 10 Emmenthal kg 5 Mostarda amarela kg 5 Brie kg 5 Mostarda escura kg 5 Cheddar kg 5 Mostarda Dijon kg 5 Carnes: Óleo de soja litro 50 Acém kg 20 Óleo de gergelim litro 5 Patinho kg 20 Vinagre branco litro 10 Alcatra kg 25 Vinagre de álcool litro 5 Picanha kg 15 Vinagre balsâmico litro 20 Pernil uni 3 Vinho do Porto litro 30 Cordeiro kg 5 Vinho tinto litro 30 Filé frango kg 15 Vinho branco litro 20 Coxa frango kg 15 TABELA 2 – ESTOQUE MÍNIMO FONTE: O autor Esta tabela contém somente alguns subgrupos de alimentos, mas serve como exemplo. Geralmente, o estoque mínimo é feito uma vez por semana, no domingo ou na segunda-feira. O responsável deve anotar em “atual” o que a cozinha ainda possui em estoque. Quando o comprador recebe esta folha, ele subtrai do “mín” a quantia em “atual” e assim saberá o “pedido” a ser feito. O estoque mínimo é importante, pois gera certa previsibilidade de compras e permite que haja uma sobra no caso de haver um evento surpresa ou uma perda de matéria-prima não prevista. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 18 Muitas empresas trabalham com a folha de estoque mínimo sendo preenchida uma ou duas vezes por semana (alguns hotéis têm estoque mensal) aliada à folha de pedidos de hortifrúti, pois estes chegam no dia do pedido sem problemas. O hortifrúti diário também garante que recebamos o melhor produto possível. 4.2MISE-EN-PLACE DA PRODUÇÃO O mise-en-place é a alma da cozinha. Se ele não é bem feito, podemos atrasar pratos durante o serviço e, ainda pior, servir sem qualidade alguma. Ele consiste em todo pré-preparo feito na cozinha antes do serviço. Ele deve ser planejado de acordo com o tempo de cada receita. Por exemplo: se eu sei que amanhã vou servir filé de salmão defumado artesanalmente em um evento, sei que hoje é preciso aplicar nele uma cura de sal, açúcar e temperos (como será melhor explicado na Unidade 2), pois ele precisa desidratar antes de ser defumado. Deste modo, o salmão precisa estar na cozinha um dia antes do evento. O pré-preparo inclui: • Higienizar verduras, legumes e frutas. • Porcionar alimentos. • Executar cortes como brunoise, julienne, chiffonnade, battonet, haché dos produtos que serão usados no dia. • Deixar pré-finalizados itens que possuem tempo longo de cocção. • Montar a praça de serviço, deixando tudo necessário à mão. • Produzir molhos e caldos básicos que serão usados durante o serviço. • Limpar peixes, carnes, aves, porcionar, embalar e refrigerar. 4.3 PRODUZIR ENTRADAS FRIAS O Garde Manger em um restaurante ou hotel é no mínimo responsável pelas entradas frias. O leque de possibilidades aqui é enorme. O cozinheiro pode produzir e finalizar entradas empratadas de forma individual ou para compartilhar. Estas entradas são diversas, podendo inclusive sair um pouco da regra e servi-las também quentes. Tudo depende de como a cozinha e o serviço foram planejados. Algo comum de ocorrer, por exemplo, é o cozinheiro de Garde Manger servir uma salada com alguma carne. Ele produz a salada, mas a carne é o Rôtisser que manipula, porciona e finaliza. Quando a entrada é solicitada por um cliente, ambos trabalham em conjunto para mandarem a entrada à mesa. TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 19 Por que não deixar as carnes das entradas também com o cozinheiro do Garde Manger? Muitas vezes, os equipamentos de finalização das carnes estão em outra área, já que o ideal é manter a cozinha fria, fria. Além disso, o cozinheiro das carnes costuma mexer somente com isso para evitar contaminações cruzadas pela cozinha. Não é indicado que, em uma mesma geladeira, folhas e vegetais crus fiquem próximos a carnes ou pescados crus, pois aumenta-se o risco de contaminação. Desta forma, cada um deve estar colocado na sua área. Contudo, quando as entradas possuem opções de terrines e Pâté en Croûtes com carnes, não há problema, pois já foram feitos no pré-preparo, para serem somente fatiados na hora do serviço. 4.4 PRODUZIR SOPAS FRIAS Como assim, sopas frias? Não se assuste, é comum que nós, brasileiros, achemos um tanto quanto estranho o fato de preparar e servir uma sopa fria, pois as sopas típicas nacionais são bem quentes. Contudo, em climas mais quentes, sopas frias deveriam ser mais corriqueiras. Dentre algumas das clássicas sopas frias que temos pelo mundo, podemos citar: • Gazpacho: sopa da Andaluzia, na Espanha. Feita crua e batida no liquidificador. Leva tomate, pimentão, pepino, azeite, vinagre, pão para espessar, sal, cominho e alho. Pode ser feita também amarela com tomates e pimentão amarelo, ou verde com tomates verdes e pimentão verde. Costuma ser consumida no verão, bem gelada. • Ajoblanco: outra sopa da Andaluzia, na Espanha. Feita no liquidificador com água, alho, amêndoas sem pele, azeite, sal e vinagre. Assim como o Gazpacho, é popular principalmente no verão, bem gelada. Muitas vezes, quando empratada, leva uvas brancas e amêndoas tostadas em sua apresentação. • Ervilha com menta: bem popular na cozinha fria, consiste em uma sopa de ervilha pré-cozida e liquidificada com creme, menta, salsa e servida com creme azedo. • Pepino com ervas: liquidificar pepino com iogurte, azeite, hortelã, dill, sal e pimenta. Servir bem gelada. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 20 • Beterraba com creme: cebola, alho, beterraba e creme de leite. Cozinhar até amaciar e depois liquidificar e coar. Servir bem gelada com pedacinhos de beterraba e folhas de salsa. Sua cor rosada chama atenção e agrada bastante os clientes. • Vichyssoise: clássica francesa é produzida com batatas, alho poró, creme, caldo e manteiga. Depois de batida, temperada e gelada, costuma ser servida com ciboulette picada salpicada. 4.5 CONFECÇÃO DE SALADAS As saladas podem se configurar no principal de uma entrada ou também servir de guarnição em um prato. Também é comum que o cozinheiro do Garde Manger seja responsável por pequenas finalizações frias em pratos principais, por exemplo, minissaladinha temperada com um vinagrete, ou mescla de brotos e flores comestíveis para finalizar. 4.6 MOLHOS FRIOS Quando falamos de molhos frios, podemos incluir aqueles que são produzidos a frio ou mesmo aqueles produzidos com cocção, mas servidos frios. O mais simples do Garde Manger é o vinagrete. Caso tenha pensado naquele vinagrete servido em churrascos Brasil afora, com cebola, tomate, pimentão, salsa, cebolinha etc., saiba que este é um derivado do vinagrete. O nome mais indicado para este clássico do churrasco é Molho à campanha. O vinagrete básico leva um óleo vegetal, um ácido que pode ser suco de fruta cítrica ou algum vinagre e sal. Nada mais. Desta base surgem infinitas possibilidades somente limitadas pela criatividade do cozinheiro. Contudo, este não é o único clássico molho servido frio. Podemos incluir aí reduções, relishes, chutneys, maioneses, holandês, bearnaise, e muitos outros que serão melhor detalhados no próximo tópico desta unidade. 4.7 CANAPÉS, PETISCOS, TÁBUAS DE FRIOS E FINGER SANDWICHES Os canapés servidos são responsabilidade do Garde Manger, da mesma forma que a produção, o fatiar e o servir dos frios, queijos e pães da mesa de frios e também os sanduíches tamanho “finger” são. TÓPICO 1 | A HISTÓRIA DA COZINHA FRIA E AS FUNÇÕES DO COZINHEIRO DO GARDE MANGER 21 Não é viável resumir a cozinha fria somente aos canapés frios, pois é muito comum que os quentes também sejam responsabilidade deste setor, pelo menos na parte da produção. Um exemplo é um bolinho a ser frito que pode ser produzido pela cozinha fria, mas finalizado por um cozinheiro da cozinha quente durante o evento. 4.8 PORCIONAR, EMBALAR E ETIQUETAR PRODUTOS A SEREM USADOS Geralmente, após um evento, tudo que foi exposto e sobrou não é reaproveitado por questão de segurança alimentar. Durante a produção, o cozinheiro deve embalar toda produção corretamente, quando possível à vácuo, por ser mais seguro, etiquetar item a item descrevendo o nome do preparo, dia da produção e sua validade e estocar no local correto. 4.9 PREPARAR FRUTAS E SUCOS Apesar de eventos possuírem bares de apoio, não é estranho o pessoal da cozinha fria se responsabilizar por esta tarefa. Cabe à equipe planejar as compras, produção e serviços destes itens. 4.10 DECORAÇÕES Qualquer decoração feita com alimentos ou gelo, gordura, massa de farinha e sal deve ser produzida na cozinha fria. 4.11 PREPARAÇÃO DE BANDEJAS, ESPELHO E BUFÊS Os alimentos produzidos na cozinha fria costumam passar em bandejas pelo salão ou ficarem expostos em espelhos de serviço ou bufês. Toda a montagem deve ser feita pela equipe da cozinha fria, pois são mais aptos a entregarem uma montagem mais lógica, bonita e eficaz. As reposições também devem ficar sob responsabilidade dos cozinheiros do Garde Manger. Finger food é o termo em inglês que aponta produções para se comer com os dedos. Logo, são pequenos petiscos que comemos sem louça ou talher. IMPORTANT E UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 22 Para saber mais sobre o assunto, recomendamos a leitura dos seguintes textos: • KELLY, Ian. Carême - Cozinheiro dos Reis. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. • STEINGARTEN, Jeffrey. O homem que comeu de tudo. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. DICAS 4.12 LIMPEZA Trabalhar na cozinha e não gostar de fazer limpeza setorna um martírio diário. Todo chef de respeito já esfregou muito chão e se engordurou lavando coifas. Deixar a cozinha e o ambiente do evento limpos é responsabilidade indispensável na gastronomia. Quando treinamos e criamos uma equipe que trabalha o tempo todo de forma limpa e organizada, naturalmente, a limpeza no final do serviço será mais leve. As boas práticas de manipulação também garantem maior segurança ao cliente. Existem muitas empresas que simplesmente faliram por processos ou simplesmente por ficarem malvistas depois de terem altos níveis de contaminação em seus eventos. 4.13 ORGANIZAÇÃO DO ESTOQUE Quando falamos em estoque, incluímos toda e qualquer área na qual guardamos alimento, desde estoque seco, frio, congelado ou mesmo estufas de maturação. Os cozinheiros devem ser responsáveis por manter tudo etiquetado corretamente, garantir que os itens fora de validade sejam descartados, verificar se as embalagens estão íntegras e garantir a limpeza destes ambientes. Desta forma, encerramos o primeiro tópico da Unidade 1. A seguir, confira duas sugestões de leitura que todo cozinheiro deveria conhecer, já que se configuram em conhecimento básico para a área. 23 Neste tópico, você aprendeu que: • O termo Garde Manger vem do francês e quer dizer guardar comida. Sendo assim, a cozinha fria é a área da gastronomia para a qual o principal foco configura-se nas técnicas de prolongar a vida das preparações. • Antonin Carême foi um chef francês que influenciou muito a cozinha fria, pois além de ter padronizado muitas receitas básicas, executava obras primas em seus eventos para milhares de pessoas a mando dos nobres da época. • A Nouvelle Cuisine, movimento da década de 1970, trouxe uma evolução à cozinha fria, pois diminuiu as receitas muito calóricas através da troca de ingredientes, maior uso de carnes mais leves e maior preocupação com estética e empratados. • O cozinheiro da cozinha fria deve sempre atentar aos pedidos, ao planejamento da produção, ao tempo de preparo, à qualidade dos produtos, à etiquetagem e armazenamento correto, trabalhar bem em equipe, atentar à higiene pessoal e para a do ambiente e conhecer o uso correto dos equipamentos. • A organização de um evento depende do conhecimento das necessidades do cliente, conhecimento técnico das receitas, insumos e equipamentos a serem utilizados, construir um bom plano de ataque, trabalhar de forma limpa e segura, manter estoques mínimos e bem estruturados. • O profissional da cozinha fria pode atuar em recepções, coquetéis, coffee-breaks, bufês frios, na praça do Garde Manger em um restaurante ou hotel. • Suas funções em nível inicial são: fazer mise-en-place e armazenar as produções de forma correta. Já no nível avançado, fechar menus com clientes, planejar as compras, custos, faturamento, treinar equipe e criar novos itens para o menu. • A cozinha fria se encarrega de produções como saladas, molhos frios, canapés, petiscos, sanduíches, sucos, peças decorativas, terrines, Pâté en croûtes etc. RESUMO DO TÓPICO 1 24 1 Aponte quais fatores históricos mais influenciaram a cozinha fria de hoje. 2 Descreva a funcionalidade de um plano de ataque bem feito na preparação de um evento, por mais complexo que este seja. AUTOATIVIDADE 25 TÓPICO 2 A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Neste tópico vamos aprender sobre o ingrediente mais importante da cozinha fria, o sal. Sua importância remonta desde a primeira vez que ele foi usado, na qual se percebeu que realçava os sabores dos alimentos e que quando aplicado a uma carne ou peixe, por exemplo, os desidratava e garantia maior tempo de guarda. Passaremos por sua história, aplicações práticas, o processo osmótico que ele propicia, a desidratação e a desnaturação de proteínas que ocorrem pelo contato com este produto. Além de tratar do sal, neste tópico também vamos conhecer os diferentes tipos de salada e sua história e receitas, terrines sem carne. 2 O SAL Os primeiros seres vivos da Terra surgiram nos oceanos e a vida evoluiu a partir disso. Sendo assim, é natural que o sal seja um mineral também importante para nós. Nosso corpo utiliza o cloreto de sódio em muitas reações, no entanto, dietas com sal e o excesso dele podem causar inúmeros problemas. Temos que tomar cuidado para não exagerarmos, principalmente se este consumo desencadear modificações em nossa pressão sanguínea. A pressão, definida como força/unidade de área, é uma grandeza física. A pressão arterial, portanto, depende de fatores físicos, como volume sanguíneo, por exemplo (CHEMELLO, 2005). O equilíbrio é a chave aqui. Os romanos já tratavam o sal como produto divino, sendo o próprio termo derivado da Deusa da Saúde, Salus. Até mesmo o termo salário vem do sal, que era usado como moeda no exército romano pagando os soldados por seus serviços (KURLANSKY, 2004). O sal é necessário para outros animais. É incrível ver, por exemplo, elefantes cavando para acessar o solo com sal. No link a seguir, podemos vê-los em sua busca por minerais: <https://www.youtube.com/watch?v=C6rAQekwvL0>. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 26 Antes da agricultura era comum que o homem se alimentasse de produtos naturalmente ricos em sal, sem a necessidade de adicioná-lo à comida. Contudo, com o plantio desenvolvido em terras pobres em minerais, o uso do sal separadamente aumentou vertiginosamente. As células de nosso organismo necessitam de sal o tempo todo, já que o sódio é um importante controlador. No transporte ativo, ocorre a passagem de substâncias através das membranas celulares. Este transporte se dá por um mecanismo denominado bomba de sódio, o qual ocorre quando íons como o sódio (Na+) e o potássio (K+) têm que atravessar a membrana contra um gradiente de concentração (CHEMELLO, 2005). É possível encontrar diferentes concentrações, dentro e fora da célula, para o sódio e o potássio. Na maioria das células dos organismos superiores, a concentração do íon sódio é bem mais baixa dentro da célula do que fora desta. O íon de potássio apresenta situação inversa, ou seja, a sua concentração é mais alta dentro da célula do que fora. Ingerindo de seis a oito gramas de cloreto de sódio por dia, conseguimos manter o equilíbrio do corpo, isto é, um balanço ideal dos nutrientes e de água dentro das células. Com relação ao íon cloro, este é fundamental para o funcionamento e manutenção do organismo. A quantia sugerida de ingestão de cloreto varia de 750 a 900 miligramas (mg) por dia, faixa baseada no fato de que a perda total de cloreto está na média de 530 mg por dia. Uma importante ação desempenhada pelo cloro é a sua participação na formação do ácido clorídrico do estômago, cuja função é auxiliar na digestão dos alimentos. Sobre o sabor do sal, este produto não somente confere o sabor salgado na comida, mas também atua nas papilas gustativas de nossa língua, aumentando nossa percepção de sabores doces e diminuindo a percepção de amargor e acidez (THIS, 1996). Além de melhorar o sabor da comida, o sal passou a ser fundamental na preservação de alimentos através do processo de cura, salmoura ou, simplesmente, como elemento que interrompe a fermentação em picles e conservas, como o chucrute. Faça o teste. Produza um molho de tomates somente com tomates partidos, um fio de azeite em uma panela e fogo baixo até que se desmanchem totalmente e virarem um molho. Passe por uma peneira e prove. Deverá sentir certa acidez. Muita gente vai tentar corrigir essa acidez com açúcar, mas não é necessário. Basta acertar o ponto de sal que o molho parecerá adocicado. O sal tem esse poder de alterar nossa percepção de doçura e outras qualidades dos alimentos. Incrível, não? DICAS TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS 27 FIGURA 4 – PILHAS DE SAL NO SALAR DE UYUNI, BOLÍVIA FONTE: Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/File:Piles_of_Salt_Salar_de_Uyuni_Bolivia_Luca_Galuzzi_2006_a.jpg>. Acesso em: 16 dez. 2017. Uyuni, o maior lago salgado do mundo, com 10.600 quilômetros quadrados, uma área grande como a Jamaica ou metade do Estado de Sergipe. Há 15 mil anos, Uyuni era bem diferente. O lago era de água doce e era cercado por vulcões ativos. Foram eles que salgaram a área. As erupções despejaram na terra toneladas de lava enriquecida com sais minerais, que foram arrastados pelas chuvas e rios para o lago. Com o tempo, o clima seco evaporou tudo por ali e transformou Uyuni no que os geólogos chamam de salar. Uma placa salgada de mais de 200 metros de espessura. Com isso, Uyuni acumulou 64 bilhões de toneladas de cloreto de sódio, mais 150 milhões de toneladas de cloreto de potássio e outras 100 milhões de cloreto de magnésio (CHEMELLO, 2005). O local também possui de 60% a 70% do lítio do mundo. Não conhece o lítio? Ele é componente fundamental em baterias, como as de celulares. Depois de perceber seu valor, o sal passou a se tornar produto importante nos comércios mundiais. No início, era retirado de terrenos salinos e locais próximos ao litoral. Hoje, contudo, há uma grande variedade de locais de extração. A seguir podemos ver alguns exemplos. UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 28 FIGURA 5 – SALINERAS DE MARAS, PERU FONTE: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Salinas_de_Maras_-_ panoramio_(3).jpg>. Acesso em: 16 dez. 2017. Nas proximidades de Cuzco, em plena Cordilheira dos Andes, um local que já fez parte do oceano, mas que se elevou pelos choques de placas tectônicas, deixando todo o sal acumulado nas montanhas, estão localizadas as salineras (salinas) de Maras. A população local se divide em administrar mais de cinco mil poços de extração de um sal muito puro e limpo. De dentro da montanha nasce uma corrente de água aquecida que passa por toda a área da produção carregando sal consigo. Para a população que lá vive, o local é sagrado. Agora, passaremos a conhecer os tipos de sal existentes. 2.1 TIPOS DE SAL Sal refinado: os sais refinados após a extração passam por lavagem para depois serem moídos, centrifugados e, por fim, secos em altas temperaturas. Em seguida, as impurezas são extraídas por peneiração e são adicionados compostos antiumectantes a fim de torná-lo bem solto, além de uma dose de iodato de potássio, exigido pela legislação brasileira, para prevenir o bócio, uma doença que ocorre na tireoide em função da diminuição ou ausência de iodo no organismo (CHEMELLO, 2005). Sal grosso: este sal sofre um processo de recristalização mais lento, o que garante a formação de cristais maiores. TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS 29 Flor de sal: quando o sal ainda está misturado com água e é colocado ao Sol, como na figura Salineras de Maras, Peru, os primeiros cristais que sobem e se acumulam na superfície são os mais leves. Estes são separados e depois de secos ganham o nome de flor de sal. As melhores do mundo não recebem iodato para não sofrerem alteração de sabor. Dentre as mais conhecidas estão: Guérand na França, Maldon na Espanha e, no Brasil, temos a flor de sal do Rio Grande do Norte. Sal vulcânico: retirado de depósitos próximos a vulcões e costuma ter cor negra. O mais conhecido é o sal negro do Havaí. Sal rosa do Himalaia: presente em acúmulos nas montanhas do Himalaia, principalmente no Paquistão. Este sal possui tons rosados devido à combinação de alguns minerais que possui. Popularizou-se muito nos últimos anos, e quanto menos intensa for a sua cor, mais puro é o sal. Sal de cura: sal utilizado no processo de cura de carnes, garantindo maior segurança alimentar e tons rosados. Este sal é composto de 94% sal comum e 6% de nitritos e nitratos. Estes têm a função de matar mais microrganismos, como o temido Clostridium botulinum, causador do botulismo. O sal de cura é tingido de rosa para que não seja trocado pelo comum e usado em excesso. Os nitratos e nitritos, apesar de serem úteis na preservação desta infecção, são altamente cancerígenos se consumidos em excesso ou por muito tempo. 2.2 OSMOSE A osmose acontece o tempo todo sem intervenção humana, mas para preservar melhor os alimentos, é fundamental entender mais sobre esse processo. Uma definição simples consiste no movimento de um solvente (geralmente água), através de uma membrana semipermeável (geralmente parede celular) com o objetivo de equalizar a concentração de um soluto (por exemplo, sal) dos dois lados da membrana. A denominação "sal marinho" nem sempre significa que ele saiu do mar, mas aponta também que não passou por nenhum procedimento de refinação, somente sofreu a adição de iodo (CHEMELLO, 2005). NOTA UNIDADE 1 | A ARTE DA COZINHA FRIA 30 FONTE: Disponível em: <http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/quimica/osmose- uma-propriedade-coligativa.htm>. Acesso em: 16 dez. 2017. FIGURA 6 – OSMOSE H2O Moléculas de soluto Membrana semipermeável As moléculas de água passam através da membrana Assim sendo, quando aplicamos sal a uma carne, os fluidos internos dela atravessam as membranas celulares no esforço de diluir o sal do outro lado da membrana. Quando há mais fluido fora das células, este retorna ao interior da célula levando consigo sal dissolvido. Assim, entrando nas células, o sal age contra agentes patogênicos. Ao perder água, as carnes ficam mais densas e firmes, perdendo peso. Seu sabor se concentra e por isso a cura se transformou em uma técnica tanto pelo sabor como pela preservação. Contudo, é bom reforçar que somente aplicar sal nas carnes, não se chega à desidratação total dos alimentos. Por isso, une-se o processo de secagem, que pode levar semanas, meses ou até anos. Esta secagem ainda auxilia a estocagem, que nem mais precisa ser refrigerada. Este processo pode ser percebido também quando aplicamos sal em vegetais. Se, por exemplo, salgarmos um pepino fatiado e deixarmos sobre uma peneira, a água sairá do vegetal. Esta perda de líquido diminui sua atividade de água, retardando ou até cessando o desenvolvimento de certos microrganismos. Nas saladas a osmose é muito evidente. Já reparou que quando temperamos as folhas elas murcham depois de um tempo? Isso ocorre porque a água difunde das células vegetais de uma alface (meio menos concentrado) para o meio mais concentrado, que é a solução de vinagre e sal. O contrário também ocorre. Se colocarmos as folhas em água, elas ficam mais vistosas. 2.3 DESIDRATAÇÃO Quando você pratica esporte por muito tempo, não fica com muita sede? E quando fica muito tempo no mar? Também dá sede. Isso ocorre porque você perdeu líquido para o ambiente e, desta forma, precisa se reidratar. Na cozinha, a desidratação pode tanto ser interessante, como ser um problema. Uma cenoura que fica tempo demais na geladeira, resseca e amolece. Não queremos isso, uma boa cenoura é firme e crocante. Contudo, no caso do bacalhau, a desidratação é totalmente proposital e desejada. TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DO SAL E COMO ELE ATUA NOS ALIMENTOS, TIPOS DE SALADA E TERRINES VEGETAIS 31 Você acha que bacalhau é uma espécie de peixe? Ele não é. Bacalhau é a técnica de cura e secagem aplicada a cinco espécies de peixe (permitidas para o produto final poder ser chamado de bacalhau). A história deste produto é antiga. Há registros de fábricas na Islândia no século IX. Os vikings são reconhecidos como os pais do produto. Eles pescavam a espécie Gadus morhua, espécie mais valorizada devido aos altos filés que proporciona. Como não tinham sal, os vikings simplesmente secavam os peixes ao ar livre até desidratarem totalmente e aguentarem muito tempo de viagem. Da Escandinávia, o produto foi para outros países europeus, principalmente, Portugal, França, Itália e Espanha. Consequentemente, os países colonizados por eles também cultivam o hábito do consumo de bacalhau. Os peixes utilizados para a formação do bacalhau estão relacionados
Compartilhar