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80 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Unidade II A presente unidade tem como objetivo explicitar as formas de organizar o tempo didático através da metodologia de projetos e outras modalidades presentes no cotidiano escolar. A fábula da convivência Durante uma era glacial muito remota, quando parte do globo terrestre esteve coberto por densas camadas de gelo, muitos animais não resistiram ao frio intenso e morreram indefesos, por não se adaptarem às condições do clima hostil. Foi então que uma grande manada de porcos‑espinhos, numa tentativa de se proteger e sobreviver começou a se unir, ajuntar‑se mais e mais. Assim, cada um podia sentir o calor do corpo do outro. E todos juntos, bem unidos, aqueciam‑se mutuamente naquele inverno tenebroso. Porém, a vida ingrata, espinhos de cada um começaram a ferir os companheiros mais próximos, justamente aqueles que forneciam mais calor, aquele calor vital, questão de vida ou morte. E afastaram‑se feridos, magoados e sofridos. Dispersaram‑se por não suportarem mais tempo os espinhos de seus semelhantes. Doíam muito... Mas essa não foi a melhor solução. Afastados, separados, logo começaram a morrer congelados. Os que não morreram voltaram a se aproximar, pouco a pouco, com jeito, com preocupações, de tal forma que, unidos, cada qual conservava uma certa distância do outro, mínima, mas suficiente para conviver sem magoar, sem causar danos recíprocos. Assim, suportaram‑se, resistindo à longa era glacial. Sobreviveram. (Autor desconhecido). 81 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Não poderíamos iniciar esta unidade sem mencionarmos alguns pontos que marcam a sociedade contemporânea. As grandes mudanças ocorridas no campo das ciências, entre elas o colapso das certezas, as transformações sociais e tecnológicas nos sistemas de comunicação e informação, os avanços das redes sociais virtuais, são alguns entre os muitos fatores que têm interferido de forma significativa nas relações sociais. A escola não pode ignorá‑los, pois eles incidem e refletem nas suas responsabilidades, que hoje ultrapassam as suas funções. Espera‑se hoje que a escola resolva problemas de toda ordem, como os da violência, dos preconceitos, das drogas, da indisciplina, da prática do bullying, que ela seja capaz de enfrentar a competitividade dos mercados, preparando com maior competência seus alunos, enfim, a lista não terminaria por aqui. No entanto, nos esquecemos de pensar na escola como espaço de convivência, que favorece a formação do ser capaz de olhar o outro. A escola como um centro de referência pessoal que marca e identifica as pessoas que por ali passam, tornando singular a oportunidade de convívio pelas formas de viverem o cotidiano escolar. Em outras palavras, a fábula da convivência nos traz uma lição, que todos somos diferentes, mas que podemos juntos elaborar formas diferenciadas de comunicação e de aprendizagens, estabelecendo trocas sociais e afetivas que permitam a compreensão e o enfrentamento do mundo que vivemos. Entendendo que a função da escola não é só ”transmitir conteúdos”, mas também facilitar a construção da subjetividade para as crianças e adolescentes, de maneira que tenham estratégias e recursos para interpretar o mundo no qual vivem e sintam‑se parte dele, precisamos com urgência rever a forma como estamos trabalhando (HERNÁNDEZ, 1998). Nessa perspectiva, as situações de aprendizagem criadas pelo professor precisam ser favorecedoras da formação de um aluno humano, crítico, participativo, inserido no contexto. Será essa a realidade das escolas brasileiras? Mais uma vez somos obrigados a reconhecer que ainda temos na escola uma incoerência entre a teoria e a prática. Embora tenhamos uma flexibilização curricular indicada pela LDB (art. 15), que permite um trabalho mais aberto, a escola continua autoritária, difundindo um conhecimento fragmentado, imposto, memorizado, confrontando‑se com a exigência do mundo globalizado, que é a formação de um indivíduo inteiro, capaz de estabelecer relações, criativo, que se torne apto para resolver desafios e viver num mundo conectado (KLEIMAN e MORAES, 2002). Como equacionar essas duas situações: de um lado a escola difunde um conteúdo fragmentado e do outro a sociedade exige um homem por inteiro? Como enfrentar essa realidade? Que saída podemos encontrar para romper com um currículo que fragmenta o conhecimento? 82 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Os autores estudados fazem uma severa critica à forma como os currículos são apresentados aos alunos, ou seja, de forma linear, fragmentada, alienando o conhecimento. Eles propõem práticas que rompam com o esse modelo, que valoriza a informação destituída de uma compreensão do mundo, pela substituição por um trabalho interdisciplinar, neutralizando o individualismo com uma proposta de trabalho coletivo que agregue um tema integrador. A ideia em se trabalhar com projetos não é uma resposta única, absoluta, ao enorme desafio que temos a enfrentar, mas pode‑se dizer que é um possível ponto de partida para melhorar a qualidade de ensino do nosso país. A proposta em questão articula as diferentes áreas do conhecimento através de projetos interdisciplinares com objetivo final em comum, e com um ponto de partida também em comum. Vamos conhecer mais sobre essa possibilidade? 5 ORGANIZAÇÃO DO TEMPO DIDÁTICO, HISTÓRICO E FUNDAMENTAÇÃO Para saber mais sobre como organizar trajetórias para nossos alunos construírem aprendizagens significativas, precisamos lembrar as concepções estudadas na unidade I, que fundamentam a forma que pretendemos organizar o currículo e qual sujeito pretendemos formar, pois ela se revela implícita ou explicitamente. Já ficou evidente que devemos pensar em romper com a justaposição de conteúdos e buscar uma articulação entre eles, fugindo do modelo tradicional linear e hierarquizado. O que se pretende é uma aprendizagem mais integrada, mais significativa, que dialogue entre os conhecimentos, oferecendo um sentido cultural e próximo do universo do aluno. A LDB/96 define que o currículo do Ensino Fundamental deve, obrigatoriamente, abranger o estudo da Língua Portuguesa e da Matemática, assim como o ensino da Arte. A Educação Física deve ser integrada à condições da escola nas diferentes faixas etárias. O ensino da História e Geografia tem sido cada vez mais atualizado, integrando‑se com a formação do povo brasileiro. Assim, a Lei nº 10.639/03 introduz a temática da história e cultura afro‑brasileira no currículo da Educação Básica. Recentemente uma emenda constitucional tornou o ensino de música obrigatório. Esses conhecimentos devem propor um percurso formativo, integrador, contextualizado e que leva em consideração as características do meio, as necessidades e interesses dos alunos. O diálogo entre as áreas do conhecimento pode ser feito organizando‑se o tempo escolar em diferentes modalidades, utilizando‑se de projetos, mas também pela introdução de outras situações que envolvam a resolução de problemas, investigações, atividades permanentes, sequências didáticas, atividades ocasionais, entre outras. Muito se fala sobre a atividade significativa, aquela que faz sentido para o aluno, aquela que permite uma compreensão de significados, que relaciona a experiências anteriores e vivências pessoais dos alunos, permitindo a formulação de problemas que os incentivem a aprender mais. Isso significa dizer que os conhecimentos adquiridos contribuem para a formação do aluno cidadão e se tornam ferramentas úteis para resolver situações das mais variadas da realidade que os cerca. Em outras 83 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTALpalavras, o conhecimento adquirido não pode ser momentâneo, pontual, só para fazer uma avaliação (ORIENTAÇÕES CURRICULARES, Fundamental I, 2007). Saiba mais Para conhecer as Orientações Curriculares e Proposições de Expectativas para o Ensino Fundamental – Ciclo I entre no site <http://www.prefeitura. sp.gov.br>. Como se vê não é o que se aprende, mas como se aprende, que pressupõe um caráter dinâmico da aprendizagem, com um conjunto de atividades sistemáticas, pensadas intencionalmente, no qual conteúdos e métodos se integram, levando em conta a participação do aluno e com escolhas de recursos didáticos variados, que possam se constituir na ampliação do repertório. Aprende‑se por múltiplos caminhos, com diversos meios e modos de expressão. Nesse sentido as aulas devem se tornar espaços de encontro, de convivência, de troca, de comunicação, fóruns de debate e interlocução permeados pela linguagem, instrumento importante para aprendizagem, ampliando assim o significado das interações, num movimento orgânico mediado pelo professor para a construção do conhecimento. A presente unidade tem como foco apresentar e defender os projetos de trabalho como uma modalidade organizativa do tempo didático, como forma de superar a fragmentação dos currículos escolares, pois eles são exemplos de novas configurações curriculares que invertem a lógica presente. Mas para implementá‑los precisamos, além de conhecer seus fundamentos, entender que trabalhar com projetos não significa abandonar os conteúdos específicos estabelecidos no currículo. Significa articular os conhecimentos específicos e integrá‑los aos conteúdos diversos (aqueles que emergem no cotidiano, os interesses do grupo classe, questões sociais urgentes, entre outros) numa unidade mais unificada. Em outras palavras, o professor deve saber com o quê e como trabalhar. Antes de pensarmos nos projetos, sua história, constituição e elaboração, vamos conceituar outras modalidades organizativas do tempo didático como possibilidade de diversificação para a abordagem dos conteúdos, tais como as atividades permanentes, as atividades sequenciadas ou sequências didáticas, atividades ocasionais. Observação Para saber mais sobre as possibilidades de desenvolver formas significativas de aprendizagem, os Parâmetros Curriculares Nacionais em cada uma das suas áreas têm uma seção chamada Orientações Didáticas, que tem a finalidade de subsidiar o professor. 84 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Quando citamos a questão do tempo didático, estamos incluindo também a organização da rotina, que deve ser pensada a fim de oferecer múltiplas possibilidades aproveitando ao máximo o tempo da criança, ou seja, que o período de permanência da criança na escola seja potencializado com vivências e atividades previstas, organizadas com a intenção de garantir uma aprendizagem significativa. Contudo, essa organização também não pode se tornar uma “camisa de força”, deve ter equilíbrio e flexibilidade. Há momentos imprevistos que exigem uma mudança de rota. Sensibilidade e bom senso devem ser incorporados às práticas do professor. Seguem algumas modalidades organizativas do tempo didático. Atividades permanentes São situações que ocorrem de forma sistemática, de modo que as crianças percebam sua regularidade. Podem ocorrer diariamente, uma vez por quinzena, durante vários meses ou ao longo de todo o ano escolar. São particularmente apropriadas para trabalhar com as crianças certos aspectos do comportamento social ou da cultura, constituir atitudes, desenvolver hábitos. As atividades permanentes criam o que chamamos de condições didáticas para realização de outras propostas mais complexas. As atividades permanentes ainda favorecem a aproximação das crianças com conhecimentos que, com grande probabilidade, embora potencialmente interessantes, as crianças não abordariam por si mesmas, seja pela complexidade, seja pela ausência de experiências cotidianas. As atividades permanentes visam familiarizar, aproximar as crianças de conhecimentos da sociedade e da cultura que por elas mesmas talvez não fossem acessados. Deve ser um momento planejado, além disso, favorece o intercâmbio de informações entre as crianças e amplia as relações vividas entre os colegas da classe. A marca principal é a regularidade, o que permite criar uma expectativa por parte dos alunos para essa atividade. Exemplo: roda de conversa, onde um tema é proposto ou deixa‑se em aberto para que as crianças falem, expressem‑se, tragam suas histórias para a escola; momento de leituras (notícias, histórias, versos), ateliê de artes; atividades que envolvam a biblioteca e a sala de informática, entre outras. Atividade sequenciada ou sequência didática Trata‑se de um conjunto de atividades planejadas e orientadas com o objetivo de promover aprendizagens específicas que o professor tenha avaliado como necessárias em dado momento do percurso de um trabalho. O critério é o nível de dificuldade, pois prevê uma progressão de desafios a serem vivenciados pelos alunos. A sequência apresenta problemas que a criança deverá resolver de diferentes modos: fazendo, pensando, experimentado, afirmado, perguntando etc. As atividades são planejadas e orientadas com a intenção de oferecer desafios às crianças, para que possam resolver problemas a partir de diferentes proposições. 85 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Ao contrário das atividades permanentes, essas sequências têm duração limitada a algumas semanas, o que permite ao professor realizar várias delas durante o ano. Elas são parecidas com os projetos, mas não possuem uma atividade de fechamento. As sequências didáticas visam sistematizar, organizar e aprofundar informações de um dado conhecimento. Têm um propósito específico: o professor planeja uma sequência (com objetivos, desenvolvimento, tempo de duração, definição de periodicidade) em função de uma necessidade de aprendizagem verificada em seu grupo de crianças. Exemplo: sequências preestabelecidas para enfrentar um desafio matemático, ou conhecer mais sobre a utilização de sílabas compostas, sequência de atividades de artes envolvendo interferências e situações problemas etc. Atividades ocasionais São situações ocasionais, como o próprio nome diz, são ocasiões esporádicas em que algum tema ou conteúdo tenha a necessidade de ser trabalhado sem que haja uma relação direta com o que está sendo desenvolvido nos projetos. São assuntos importantes que devem ser trabalhados, mas variam e se resumem a uma única atividade. Exemplo de atividades ocasionais: programar visitas a recursos naturais, culturais, visitas diversas, estudos do meio, uma campanha sobre saúde etc. Projeto1 Uma das características que qualificam um bom projeto é a possibilidade que ele oferece de compartilhar objetivos com um grupo – e aqui é que se localiza toda a diferença entre projetos didáticos e sequências didáticas. Podemos dizer que os projetos são sequências de ações organizadas por um determinado propósito e que culminam na elaboração de um produto final compartilhado com o grupo de alunos. Sua duração pode variar conforme o objetivo, o desenrolar das várias etapas, o desejo e o interesse pelo assunto tratado. Diferente das práticas escolarizadas de ensino, os projetos têm o mérito de articular propósitos didáticos e comunicativos, colocando em ação um propósito relevante pela perspectiva do aluno. Eles contextualizam conteúdos de forma interdisciplinar. Isso significa que todos, não só o professor, têm suas ações orientadas por uma finalidade compartilhada. Os alunos se comprometem com a realização de uma tarefa, e por isso estão dispostos a melhorar suas produções até o ponto que esteja satisfatório para eles mesmos. Chamamos sua atenção para pensar que a organização do tempo envolvea utilização de critérios que estão associados à natureza de cada conteúdo, assim como o respeito aos alunos na busca de 1 Será abordado com maior riqueza o trabalho com projetos no próximo subitem, por ora ele cumpre a finalidade de compor as modalidades organizativas do tempo pedagógico. 86 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 um cotidiano mais significativo. A intencionalidade do professor se reflete no planejamento que instrumentaliza e organiza situações de aprendizagem, explicitando suas escolhas e seus critérios. Ainda sobre a organização do cotidiano, gostaríamos de apontar o inciso I do artigo 13 das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, que estabelece: I – concepção e organização do espaço curricular e físico que se imbriquem e alarguem, incluindo espaços, ambientes e equipamentos que não apenas as salas de aula da escola, mas, igualmente, os espaços de outras escolas e os socioculturais e esportivo‑recreativos do entorno, da cidade e mesmo da região. (grifo nosso) É importante salientar que os espaços também ensinam, eles podem ser estimuladores e favorecedores de aprendizagem na medida em que a forma de concebê‑los provoca desafios. Que tal começar pela reorganização da sala de aula do Ensino Fundamental? Preste atenção nos estágios de observação ou mesmo nas escolas de seus filhos, sobrinhos ou de amigos, como a sala de aula do Ensino Fundamental conserva a mesma estrutura física há muitos anos. Diante de tantas mudanças não estaria na hora de criar outras possibilidades? A criança mudou, mas a escola continua a mesma! Para realizar essas mudanças, a equipe da escola, professores, direção juntamente com as famílias e as próprias crianças podem ajudar, pensando sobre a importância dessa ação e nas condições a serem criadas para a sua implantação. Citaremos alguns exemplos. Um canto da classe pode receber uma prateleira com livros e jogos, para atender aqueles alunos que acabam as atividades e às vezes ficam conversando e até atrapalhando seus colegas que ainda não terminaram suas tarefas. Um tapete à disposição pode favorecer uma roda de conversa, um momento mais intimista. Ele pode ficar enrolado num canto da sala, os alunos terão prazer em ajudar para criar esse ambiente. Outra prateleira com materiais diversificados de artes pode ficar à disposição para uma oficina de artes, pelo menos uma vez por semana. As mesas podem ser deslocadas para uma formação em círculo ou agrupamentos de quatro ou seis alunos para compor uma estação de estudos. Tão fácil! É só mudar as mesas de lugar e realizar a atividade, criando um clima diferente! Outros espaços da escola podem receber materiais dos mais diversos, sejam culturais ou esportivos, para criar situações de aprendizagens, aproximações e melhorar as relações. O horário do recreio, que é bastante difícil para algumas escolas, pode ter no seu espaço materiais à disposição das crianças como bolas, cordas, bambolês e jogos de mesa para favorecer a integração. 87 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Será que no entorno da escola não tem uma praça e não seria um local interessante para um lanche coletivo? Não seria uma forma de criar momentos especiais e diferentes? Pense a respeito! Está na hora de pensarmos numa organização espacial mais voltada para os interesses e autonomia das crianças, quebrando o paradigma das carteiras perfiladas, móveis fixos, armários chaveados e um aluno dependente do adulto para qualquer atividade (BARBOSA e HORN, 2008). Podemos buscar inspiração na Educação Infantil, que desenvolve um trabalho muito interessante. A sala de aula é transformada em cantos de atividades diversificadas. O espaço organizado num contexto temático com cantos e recantos permite o livre trânsito das crianças, proporcionando autonomia intelectual e liberdade de escolhas. Um ambiente rico e instigante sugere possibilidades de descobertas e o desenvolvimento de projetos (BARBOSA e HORN, 2008, p. 51). Saiba mais Procure saber mais sobre essa proposta. Lembre‑se de que a integração curricular da Educação Infantil com as séries iniciais é uma necessidade legal e pedagógica. Para saber mais leia: FERNÁNDEZ, Estela; QUER, Lurdes; SECURÚN, M. Rosa. In: Rincón a Rincón: actividades para trabajar com niños de 3 a 8 años. Barcelona: Octaedro‑Rosa Sensat, 2006. Leia agora a música de Paula Toller e Dunga, Oito Anos, que retrata bem a criança das séries iniciais, cheia de curiosidade, que quer desvendar o mundo em que vive e nós professores devemos contribuir para que ela viva sua infância com alegria e brincando, pois é assim que ela aprende. Paula ao compor essa letra a dedicou ao seu filho. Oito Anos (Paula Toller) Por que você é Flamengo E meu pai Botafogo O que significa “Impávido colosso”? Por que os ossos doem Enquanto a gente dorme Por que os dentes caem Por onde os filhos saem 88 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Por que os dedos murcham Quando estou no banho Por que as ruas enchem Quando está chovendo Quanto é mil trilhões Vezes infinito Quem é Jesus Cristo Onde estão meus primos Well, Well, Well Gabriel Por que o fogo queima Por que a lua é branca Por que a terra roda Por que deitar agora Por que as cobras matam Por que o vidro embaça Por que você se pinta Por que o tempo passa Por que a gente espirra Por que as unhas crescem Por que o sangue corre Por que a gente morre Do que é feita a nuvem Do que é feita a neve Como é que se escreve Reveillon Lembrete Paula Toller, em 1998, compõe “Oito Anos” e faz alusão ao seu filho, Gabriel. Paula aponta em sua música ao citar na letra uma série de perguntas fofas, inocentes e, sobretudo, muito perspicazes feitas por seu filho e que foram anotadas ao longo do tempo. Prestando atenção, você irá notar que são questionamentos pertinentes e irresistíveis, que certamente muitos de nós já fizemos quando crianças e talvez sigamos perguntando ou respondendo até hoje. 89 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL 6 CONCEITO, ELABORAÇÃO, INTERDISCIPLINARIDADE Como vimos, não nos faltam motivos para justificarmos a importância do trabalho com projetos. No entanto, precisamos compreender melhor suas bases e para tal escolhemos os estudos de Maria da Graça Souza Horn e Maria Carmen Silveira Barbosa (2008)2, que realizaram um resgate histórico bastante claro e sucinto, o qual adotamos na presente exposição. O uso da palavra projeto é antigo, provavelmente surgiu em Florença, no período do Renascimento, com o nascimento dos esboços de projetos técnicos, como por exemplo, da arquitetura e da engenharia mecânica, usados como antecipações metódicas. Leonardo da Vinci, por exemplo, deixou esboços e projetos em seus cadernos de helicópteros, bicicletas, armas de fogo entre outros. No Iluminismo também surgem discussões sobre projetos sociais com o objetivo de usar o conhecimento para se pensar numa vida melhor para o futuro. O próprio Emílio, de Rousseau, era um projeto educacional inovador para a época, que detinha uma visão revolucionária de criança. No período entre o século XIX e XX o movimento denominado Escola Nova, representado por Decroly, Montessori e Dewey entre outros, fazem uma critica à escola tradicional e procuravam criar formas de organizar o ensino que tivessem como característica a integração dos conhecimentos. No Brasil esse movimento foi coordenado por educadores expressivos como Lourenço Filho e Paschoal Lemme, que criaram um documento cujo nome é Manifesto dos Pioneiros pela Educação, em 1932. Seu objetivo era manifestar‑se a favor da democratização da educação. Os escolanovistas defendiam o atendimento dos interesses dosalunos e sua participação na aprendizagem com uma nova didática na sala de aula. Tivemos outras experiências, com Decroly e os centros de interesse, e com Dewey e seu seguidor Kilpatrick tivemos o nascimento dos projetos. Dewey defendia que os seres humanos têm desejo de aprender e conhecer, e a partir de suas dúvidas, buscam respostas e explicações válidas para os seus questionamentos. A partir dessa premissa a escola deveria auxiliar a criança a compreender o mundo por meio de pesquisa e debates. A participação da comunidade e a família eram consideradas importantes. O trabalho com projetos teve início numa escola experimental da Universidade de Chicago, expandindo‑se depois para a América do Norte. A proposta dava ênfase às experiências de trabalho em comunidade e a sala de aula proporcionava a oportunidade de experimentar a vida em comunidade numa versão menor, uma vez que os alunos aprendiam a partilhar diferentes experiências de trabalho. Dewey (1959, p. 47)3 é considerado o grande responsável por essa pedagogia, pois ele dizia que preparar uma criança para a vida seria colocá‑la em condições de projetar, de buscar meios de realizar seus próprios empreendimentos e de realizá‑los pela própria experiência. Ele afirmava que “projetar e realizar é viver em liberdade”. 2 Projetos Pedagógicos na Educação Infantil. Editora Artmed: Porto Alegre, 2008. 3 DEWEY, J. Vida e Educação. São Paulo: Melhoramentos,1959. 90 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Segundo as autoras, no século XX várias escolas americanas tentaram implantar o trabalho com projetos, mas enfrentaram entraves como o ensino tradicional, que devido a uma densa programação de conteúdos fragmentada e imposta, conflitava com a proposta. Outro fator prejudicial foi o rigor na previsão de tempo para a duração do projeto, antes mesmo de implantá‑lo o seu prazo já estava predeterminado, o que se tornava incoerente com a ideia original, ou seja, a de respeitar o tempo de interesse dos envolvidos. E, por fim, na tentativa de incorporar os conteúdos e o controle do tempo, a proposta foi adaptada para outro modelo de organização de ensino chamada Unidades de Ensino, que abandonou os princípios importantes dos projetos, transformando‑se numa unidade didática, com temas e tempo controlados, e a centralidade das decisões ficavam a cargo dos adultos. Atualmente, podemos citar como proposta de organização próxima aos projetos os temas geradores do referencial teórico, de Paulo Freire (1967). A proposta de trabalho partia dos interesses e necessidades dos alunos, tomando como referência a realidade socioeconômica deles e era associada aos conteúdos e habilidades a serem desenvolvidos. A Prefeitura Municipal de São Paulo teve o privilégio de contar, na gestão da prefeita Sra. Luiza Erundina, com o professor Paulo Freire ocupando o cargo de Secretário de Educação (1989 a 1993). Nesse período, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo propôs o Movimento de Reorientação Curricular, com base nos princípios da autonomia da escola e o resgate das práticas e experiências avançadas. Desta feita, as escolas faziam sua adesão aos projetos denominados Temas Geradores. Para implantá‑los muitas mudanças ocorreram, entre elas a criação de condições objetivas de trabalho para que essa proposta desse certo. Foram realizadas alterações na estrutura da carreira do professor, as jornadas de trabalho foram ampliadas, houve a contratação de eventuais e muita formação continuada. As escolas divulgavam o sucesso e a participação de seus alunos nos projetos com temas geradores. Foi um momento especial para a rede municipal de São Paulo4 e de muito avanço pedagógico. Saiba mais Para saber mais sobre a gestão do professor Paulo Freire como secretário de Educação, acesse: <http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br>. Retomando o percurso histórico, podemos dizer que os projetos foram pensados com objetivo de romper com o modelo tradicional de ensino e seus criadores. Conforme confirmam as autoras, buscavam a inovação e tinham a convicção de romper com o modelo tradicional vigente. O quadro seguinte traz uma comparação dos modos de organizar o ensino ao longo da história, conforme já explanamos. Nesse quadro podem‑se observar as diferenças e as semelhanças mais 4 A conteudista Professora Eliana Chiavone Delchiaro foi diretora de escola da rede municipal de São Paulo durante esse período. 91 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL relevantes entre os modelos: tema gerador, unidade didática, centro de interesse e projetos. A comparação transcrita está baseada em Hernández e Ventura (1998) no livro A organização do currículo por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio e consta também em Barbosa e Horn (2008, p. 20‑21). Quadro 2 – Comparação com base em Hernández e Ventura (1998) Tópicos Tema gerador Unidade didática Centro de interesses Projetos Aprendizagem Através do diálogo e das trocas sociais Por meio da assimilação em uma sequência linear e repetitiva de etapas. Por meio da descoberta. Por meio de relações significativas. Temas Temas coletados na realidade dos educandos. Temas previamente definidos, extraídos da listagem de conteúdos. Temas coletados da média das necessidades e dos interesses observados nas crianças. Temas diversos que envolvam a resolução de problemas, dificuldades, necessidades. Decisão de temas Significação social para o grupo. Definição pelo educador ou pelo sistema. Temas previamente selecionados pelo professor de acordo com o que foi observado como necessidade das crianças. Argumentação, debates, indicação do grupo, temas de interesse coletivo. Função do educador Animador, companheiro. Transmissor de conhecimentos. Propositor das etapas previamente planejadas. Pesquisador, intérprete, organizador. Globalização Inter‑relação entre macro e microestruturas. Somatório de disciplinas. Integração de disciplinas. Relação entre conhecimentos e transdisciplinaridade. Modelo curricular Temas geradores. Disciplinas ou áreas do conhecimento. Conteúdos relacionados principalmente à área das ciências ou de estudos. Temas, problemas, ideias‑chave. Papel dos alunos Sujeito da sua aprendizagem e da sua história. Ouvinte, executor de tarefas. Executor de tarefas. Copartícipe, planejador. Estrutura didática Vivência e pesquisa, seleção de temas, problematização através do diálogo, da conscientização e da ação social. Motivação, desenvolvimento progressivo e sequencial, culminância. Observação, associação e expressão. Atividade de pesquisa, escolha e formulação de problemas, arrolamento dos dados. Construção de hipóteses, experimentação, avaliação e comunicação. Avaliação Mudanças na vida dos sujeitos. Memorização e repetição. Centralização nos conteúdos. Centralização nas relações, nos conceitos e nos procedimentos. HERNÁNDEZ, F. e VENTURA, M. A organização do currículo por projetos de trabalho. Porto Alegre: Artmed, 1998. 92 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Parafraseando Hernández (1998), podemos formular a seguinte questão: Atualmente estamos ajudando nossos alunos a globalizar, a estabelecer relações entre os diferentes conhecimentos a partir do trabalho que estamos fazendo na sala de aula? Para você, acadêmico, fica difícil responder essa questão, pois ainda se prepara para se tornar professor. Todavia, como aluno e como observador das práticas nas escolas já pode arriscar algumas ideias. A noção de educação para a compreensão, que leva em consideração o princípio proposto por Dewey de que, se não se compreende o que se aprende, não há uma boa aprendizagem, indica a necessidade de se reorganizar o currículo a partirde projetos de trabalho, levando‑se em conta: • como os alunos aprendem; • a vinculação que esse processo de aprendizagem e a experiência da escola tem em sua vida; • a aquisição de estratégias de conhecimento que permitam ir além do mundo tal como estamos acostumados a representá‑lo, por meio de matérias escolares e pela bagagem outorgada pelo grupo social ao qual pertence. Assim, é tarefa fundamental do currículo, através da escola, refazer e renomear o mundo e de ensinar os alunos a interpretar os significados mutáveis com que os indivíduos das diferentes culturas e tempos históricos dotam a realidade de sentido, ao mesmo tempo em que lhes abre as portas para compreender suas concepções e as de quem os rodeiam. Portanto, mudar a forma de se trabalhar a organização do currículo é mudar a organização do espaço e do tempo. São questões que envolvem o entendimento da função da escola como geradora de cultura e não só de aprendizagem de conteúdos (HERNÁNDEZ, 1998, p. 32). Considerando que: • não é recente na história da educação a pedagogia de projetos; • voltamos a tratar deles hoje diferente do formato proposto pelos escolanovistas; • há necessidade de se modificar a estrutura e a organização da vida escolar tendo em vista a dinâmica da sociedade contemporânea. Conclui‑se que os projetos podem ser uma forma de se trabalhar os conteúdos escolares, mas ainda outros argumentos são necessários para revigorar a pedagogia dos projetos, após quase cem anos de sua idealização. Essa “nova versão” se fundamenta em algumas ideias da ciência a seguir elencadas, conforme definem as autoras Barbosa e Horn (2008): 1‑ O atual século precisa transpor o paradigma disciplinar para interdisciplinar, para melhor se aproximar do conhecimento. 93 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL 2‑ Para enfrentar os problemas que a humanidade construiu como a pobreza, terrorismo, as drogas, o aquecimento global, as epidemias é preciso abrir as fronteiras e compreender as suas inter‑relações para a tomada de decisões. 3‑ O currículo disciplinar está na contramão da história. 4‑ As verdades não são mais únicas e absolutas é, portanto, preciso conviver com as incertezas. A verdade é histórica e construída. 5‑ O conhecimento cada vez mais está envolto em situações mais complexas e a para compreendê‑lo é preciso tecer uma rede de relações. O mundo hoje está cada vez mais globalizado, as questões se imbricam em nível local e internacional, a cada momento novas descobertas são realizadas e novos conhecimentos se impõem. Segundo Santomé apud Barbosa e Horn (2008, p. 44): O currículo globalizado e interdisciplinar converte‑se assim em uma categoria ‘guarda‑chuva’ capaz de agrupar uma variedade de práticas educacionais desenvolvidas nas salas de aula, e é um exemplo significativo do interesse em analisar a forma mais apropriada de contribuir para melhorar os processos de ensino aprendizagem. Diante do exposto, as escolas precisam pensar que são espaços privilegiados para tratar o conhecimento como forma de aprender. Segundo as ideias de Vygostky e Wallon apud Barbosa e Horn (2008), o conhecimento é socialmente construído nas interações entre os sujeitos e o ambiente físico e social do qual fazem parte. As autoras afirmam: ”Não só a escola, mas todo o ambiente ensinar‑aprender significa criar cultura”. Elas nos informam no mesmo livro que teóricos culturalistas, como Jerome Bruner, Michael Cole e Bárbara Rogoff comungam a ideia de que a aprendizagem se dá num ambiente culturalmente organizado pela comunidade para que as novas gerações possam construir conhecimento, ou seja, é uma visão de aprendizagem sob a perspectiva social e multidimensional. Autores como Dewey, Kilpatrick e Bruner vão nos assinalando uma nova forma de organização do conhecimento e da gestão do tempo e do espaço na escola, ou seja, estruturar aprendizagem do currículo por projetos. O tempo é pensado em períodos de trabalho, onde o que se valoriza é o que cada aluno vai aprendendo, pois ele se torna responsável pela sua aprendizagem, tendo no professor um mediador, juntamente com a participação de outros alunos (HERNÁNDEZ, 1998). Para o autor, mudar a organização do espaço e do tempo escolar onde os alunos se agrupam a partir dos temas ou problemas que vão pesquisar significa pensar sobre o tempo e o espaço sob um novo prisma, uma vez que altera o modelo com a organizacional por nível ou por idade. Isso envolve pensar na totalidade da escola comprometendo toda sua equipe. Para tanto, ele diz que a escola deve ser entendida como geradora de cultura e não só de aprendizagens de conteúdos, onde a importância de ensinar implica em reconhecer as influências mútuas entre as 94 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 diferentes culturas, nos diversos tipos de conhecimento, nas artes, nas ciências e nas crenças, tendo assim o currículo a tarefa de compreender e interpretar a realidade. A organização curricular por projetos de trabalho leva em conta a ideia de integrar os conhecimentos, o mundo externo e a realidade dos alunos, e tem sido o desejo por parte de alguns educadores preocupados em ensinar melhor, superar a fragmentação, conectar os alunos às transformações sociais e contribuir para a formação das suas subjetividades. Foram e são iniciativas que, segundo Hernández (1998), se desenvolveram para responder, de forma mais ou menos exitosa, as necessidades da escola. Não é uma tarefa fácil mudar, a escola tem ainda por construir muitos caminhos e depende dos profissionais docentes, das expectativas das famílias e das políticas públicas e governamentais para concretizar mudanças que envolvem rever estruturas consolidadas há muitas décadas. No entanto, é preciso insistir e buscar alternativas, Barbosa e Horn (2008) esclarecem que em muitos lugares os educadores e pesquisadores têm encontrado formas diferenciadas de se trabalhar com projetos. A literatura nos apresenta vários modelos, que podem ser inspiradores para a criação de outros. Os exemplos citados a seguir foram transcritos da página 29 do livro Projetos Pedagógicos na Educação Infantil, de Maria Carmen Silveira Barbosa e Maria da Graça Souza Horn. Projetos com sistemas complexos: A abordagem de Reggio Emília O trabalho com projetos e vida cooperativa: A perspectiva de Celestin Frenet Projetos de trabalho: A perspectiva de High Scope A perspectiva de Howard Gardner A perspectiva de Fernando Hernández Saiba mais Para saber mais sobre a Pedagogia dos Projetos leia: FORMAN, G.; EDWARDS, G.; GANDINI, L. As cem linguagens da criança, Porto Alegre: Artmed, 1999. HELM, J. Harris; BENEKE, S. 0 poder dos projetos. Porto Alegre: Artmed, 2005. WHITAKER, R. M. Freinet: Evolução histórica e atualidades. São Paulo: Editora Scipione, 2002. HERNÁNDEZ, F; VENTURA, M. A organização do currículo por projetos de trabalho: O conhecimento é um caleidoscópio. Porto Alegre: Artmed, 1998. JOLIBERT, J. Formando crianças produtoras de textos. Volume II. Porto Alegre: Artmed, 1994. 95 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL 6.1 Conceito, elaboração, interdisciplinaridade Vamos conhecer o significado da palavra projeto? A palavra projeto vem do latim projectu, que significa colocar adiante, lançar‑se à frente. É uma ação intencional, um plano de ação que propõe algo, que se antecipa num esboço que se concretiza por várias representações, sejam elas desenhos, textos, cálculos, plantas com vistas a vislumbrar a passagem do intencional para se tornar real. Para alguns autores ele é um sonho a ser planejado. Para Machado5 apud Barbosa e Horn (2008, p. 32), projetar é uma das características do homem: Os sonhos, as ilusões e as utopias são essenciais para alimentar aimaginação quando se pensa na elaboração de projetos, mas é o caráter operatório dos projetos que os distingue das utopias. Muito embora a palavra projeto encerre diferentes significados para a vida pessoal, profissional, acadêmica e empresarial, o seu emprego tornou‑se bastante frequente na escola. É comum escutarmos Projeto Político‑Pedagógico, Projeto de Trabalho Pedagógico, Projeto Pedagógico, Projeto Didático, Projeto de Trabalho, entre outros nomes. E as siglas que esses nomes representam? É um tal de entregar o PPP, construir o PTP. O acadêmico se vê perdido, desorientado diante desse “escolês” e acreditamos que não seja só ele, pois em certo momento os projetos se tornaram moda na escola. As novidades chegam à escola e seus profissionais acabam se apropriando ou sendo obrigados a se apropriar de uma abordagem, sem o devido conhecimento ou mesmo a devida formação. É preciso saber que os projetos têm algumas características importantes, tais como a participação do grupo, a tomada de decisões, o enfrentamento de situações imprevistas, um acompanhamento permanente e paciente. Essa experiência é muito diferente da lógica consolidada no cotidiano escolar, que é individualista e previsível. O modismo dos projetos tem sido representado nas escolas por projetos temáticos que envolvem um trabalho em grupo com um tema, como a Copa ou as Olimpíadas, ou ainda um Projeto do Meio Ambiente. Muitas vezes esses “projetos” se resumem a um cartaz enfeitado para emoldurar as paredes das salas de aula. São na maioria reducionistas e superficiais na aquisição do conhecimento. Outra situação comum é a elaboração de projetos para atender a exigência de uma instância superior como as Diretorias de Ensino, e depois são arquivados e esquecidos. Barbosa e Horn (2008) nos alertam que o projeto tem como marca a inovação, mas isso não significa que devemos imputar a essa marca um poder mágico a metodologia que ele abarca, existem preceitos básicos dos quais não podemos nos esquecer. 5 MACHADO, N. Educação: projetos e valores. São Paulo: Escrituras, 2000. 96 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 O projeto não é a única modalidade de organização da aprendizagem, como já vimos anteriormente, ele, sem dúvida, dá um sentido novo na forma de aprender, mas outras possibilidades devem ser levadas em conta dependendo do momento e da natureza dos conhecimentos. Vamos verificar os pontos em comum num projeto? Vamos nos valer de dois exemplos: Vamos imaginar a organização de uma festa de casamento. Com certeza devem‑se planejar com antecedência os muitos detalhes que a ocasião exige e muitas questões são levantadas, por exemplo, o número de convidados, o local para evento, a música, o horário do casamento, os comes e bebes, as lembranças para os convidados, os recursos financeiros e humanos. Será possível realizar esse evento sozinho ou será necessário contar com mais alguém? O fato é que quanto melhor puder caracterizar o que se deseja ou estabelecer etapas para eleger prioridades, melhor e mais fácil será a realização desse evento. O mesmo exemplo pode ser aplicado para o Trabalho de Conclusão de Curso. Você já deve estar curioso para saber como realizar o projeto de pesquisa, não é mesmo? Pois bem, todo projeto nasce de uma questão bem formulada, que envolve algum tema do qual haja interesse em saber mais. Quanto melhor a questão estiver definida, quanto mais explicitada ela estiver, maiores serão as chances de acerto na investigação, a pesquisa será mais precisa. Lembrete Um projeto de pesquisa prevê etapas a serem percorridas. Ao término do trabalho ele será avaliado, apresentado e divulgado para outros acadêmicos. Como se pode perceber nos dois exemplos, o que desencadeia um projeto é uma questão central, um problema, uma necessidade que impulsiona o seu desenvolvimento. O processo e as dificuldades durante o percurso devem ser vistos como desafios, crescimento e oportunidade para o trabalho gerar pesquisa. Barbosa e Horn (2008, p. 33) apontam que, no âmbito educativo, a exemplo das diferentes situações vividas em outros campos, os projetos escolares convergem em linhas gerais pelo mesmo caminho. Alguns momentos decisivos são universais na sua elaboração, e estão presentes em quase todos os projetos. São eles: • a definição do problema; • o planejamento do trabalho; • a coleta, a organização e o registro; • a avaliação e a comunicação. 97 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Projetar, portanto, vai além do sonho, da utopia. Tem um sentido concreto. Ele é permeado por ações, que envolve a presença do sujeito e do grupo levando à sua efetivação. Nogueira (2002) criou um roteiro de ações para a implantação de um projeto, e ainda esclarece que esse roteiro é o que diferencia um projeto de um projeto temático, a saber: • ter clareza nos objetivos; • elaborar metas; • planejar e definir um percurso; • levantar hipóteses e fazer investigações; • executar e replanejar se necessário; • apresentar e avaliar. Um projeto não é um plano de trabalho ou um conjunto de atividades justapostas, ele é uma intervenção pedagógica que tem um sentido claro, ou seja, é uma necessidade de aprendizagem de situações‑problemas reais e diversificadas. Permite, assim, que os alunos, ao participarem do processo, decidam, opinem, debatam; construam sua autonomia e seu compromisso com o social, formando‑se como sujeitos culturais. Para Hernández (1998), os projetos de trabalho são possibilidades de se ressignificar os espaços de aprendizagem de forma que eles venham a contribuir para a formação de sujeitos ativos, reflexivos e participantes. Os projetos criam necessidades de aprendizagem de novos conteúdos, que poderão ser aprofundados e sistematizados em módulos de aprendizagem, que por sua vez irão repercutir sobre as situações e intervenções dos alunos em outros momentos da vida escolar. Em poucas palavras, para Nogueira (2002) projeto é “uma ação de investigação que possa propiciar a interação do sujeito aprendiz com meio e com o objeto de conhecimento, gerando por consequência a pesquisa, criação, elaboração, depuração, (re) elaboração e múltiplas aquisições”. O projeto traz a ideia de um trabalho no futuro, no entanto, deve se transformar em ato. Até o momento temos explorado os projetos de trabalho ou os projetos didáticos, os que são desenvolvidos na sala de aula, aqueles elaborados pelo professor a partir e com a participação dos alunos. Está sendo privilegiada a aprendizagem do aluno dentro da sala de aula. Os projetos da escola são aqueles que envolvem as famílias, a comunidade escolar, as equipes docentes e técnica, por exemplo o Projeto Político‑Pedagógico, ou os projetos organizados para serem trabalhados com as famílias e os alunos ou ainda só para a formação de pais. Observação O Projeto Político‑Pedagógico é um conjunto de intenções que revelam uma concepção de mundo, sociedade e educação. 98 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 A sua construção envolve participação, compromisso e comprometimento de toda equipe escolar, pais e comunidade escolar. Nesse trabalho muitas reuniões são feitas para discussão e cabem as mais diversas questões no seu debate para a elaboração de um documento da escola, chamado Projeto Político‑Pedagógico. Seguem alguns exemplos: Que tipo de escola se quer construir: com que características, com que valores, com que diretrizes? Que tipo de aluno se quer formar, com que valores, com quais conhecimentos, com quais habilidades, com quais capacidades para participarem da sociedade onde vivem? Como devem ser as relações com a comunidade escolar? O Projeto Político‑Pedagógico pressupõe um movimento de construção coletiva, supondo, portanto, a participação de todos os envolvidosna ação educativa. É o documento que define a carta de intenções das ações pedagógicas da escola. Ele revela as concepções de mundo, de infância, de criança, de currículo de aprendizagem, considerando a diversidade e a especificidade de cada marco de idade. Os projetos são muitos, mas variam dependendo da natureza da ação educativa. Em comum eles têm a intencionalidade, o planejamento, a participação e o compromisso do grupo para o ponto de chegada. Tendo em vista ser o nosso foco os projetos de trabalho realizados, elaborados com e a partir dos alunos e não para os alunos, vamos agora entender melhor suas etapas, a partir dos estudos de Nogueira (2002). Saiba mais Para saber mais, Nogueira (2002) traz em seu livro Pedagogia dos projetos: uma jornada interdisciplinar, alguns projetos para servirem de inspiração. São eles: • Projetos Manguezais – importância da preservação, a partir da página 106; • Projetos Pipas – um exemplo de projeto interdisciplinar, a partir da página 112; • Projeto Centro Médico – um exemplo transdisciplinar, a partir da página 119; • Exemplos de projetos sobre o sistema solar a partir da página 119; • Aniversário da cidade, a partir da página 130. 99 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Segundo o autor, as etapas de um projeto auxiliam alunos e professores na organização e entendimento de suas diversas fases, são elas: • sonhos, utopias, desejos e necessidades; • planejamento; • execução e realização; • depuração; • apresentação e exposição; • avaliação e crítica. Sonhos, utopias, desejos e necessidades Para o autor essa é uma das melhores fases do projeto, quando os alunos explicitam seus interesses, desejos ou necessidades. Estes elementos são o marco inicial, que desencadeiam e estimulam a formação de um aluno investigador, pois o ato de projetar é uma característica do ser humano, que estará realizando um desejo próprio, independente de receber uma nota por isso. O prazer em conhecer, pesquisar e conquistar sua autonomia são valores que devem superar o ganho de uma nota ao final de um trabalho. Nesse sentido, o professor como um orientador e mediador desta ação será o responsável por incentivar seus alunos no desejo de aprender, estudar, conhecer e pesquisar, desvinculando a nota utilizada como moeda de troca pelo conhecimento. Planejamento O planejamento é a fase seguinte do levantamento do tema do projeto. Ele exige uma planificação para facilitar a sua execução, no entanto esse plano não pode ter um rigor acentuado de um planejamento estratégico. O planejamento deve prever o que vai ser feito cada dia, os recursos materiais, com quem e onde serão feitas as pesquisas e será construído a cada passo. Um fator interessante citado pelo autor é que ao ensinar o aluno a pensar em etapas de um projeto, estamos contribuindo para o entendimento do significado do que é planejamento e com certeza isso o ajudará na sua formação enquanto um sujeito integral. Nesta fase deve ficar claro para os alunos, conforme reforça Nogueira (2002, p. 97): O quê pesquisar? O que será tratado no projeto? Por quê? Quais os objetivos desse tema? Como? Como será operacionalizado o projeto, qual a responsabilidade de cada membro do grupo? Quando? Quando serão realizadas as etapas planejadas? 100 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Quem? Quem vai se responsabilizar pelo quê? Quais recursos humanos e materiais vão precisar? Após a estruturação dessa fase, ou seja, depois da definição do quê, como e de quem se responsabilizará pelo percurso do trabalho, pode‑se encaminhar para a próxima etapa, que será executar o planejado. Execução e realização Nesse momento será colocado em prática o plano estruturado, aquilo que era um sonho, um desenho se concretiza. Esta fase é muito significativa, pois ela promove a troca e a interação, os alunos irão pesquisar, criar, construir, entrevistar, representar, escrever, dançar, moldar, desenhar. Desta feita, por meio dessas vivências e de múltiplas linguagens, teremos a aquisição do conhecimento por meio de situações de aprendizagem prazerosas e significativas para os alunos. O papel do professor é fundamental nesse momento, estando atento, ao lado, mediando e articulando o conhecimento e as interações, estimulando a produção, a criação e a utilização de todos os recursos materiais e instrucionais à disposição dos alunos. Diversificar fontes de informação, principalmente os recurso tecnológicos, que não só vêm de encontro com essa geração de alunos bem como são potencializadores da investigação, que é a marca principal dessa fase. Depuração Conforme afirma Nogueira, é preciso não deixar o projeto se encerrar com as duas fases anteriores. Nessa fase o professor pode provocar a melhoria do projeto, estimulando um aprofundamento da qualidade das pesquisas. Nessa hora pode‑se questionar com os alunos, se até então sua produções correspondem ou não às expectativas, e aí será possível replanejar a rota. Assim, criam‑se novas hipóteses, alteram‑se novas condutas com objetivo de ampliar e aprofundar mais o tema. Essa fase deve ser analisada com cuidado, pois ela não deve forçar a nova busca e nem satisfazer‑se com um mínimo de produção, o termômetro é a atitude dos alunos frente ao desafio proposto pelo professor. Apresentação e exposição Esse é o momento da apresentação final, o produto no qual a equipe terá o prazer em expor suas descobertas, hipóteses, criações e conclusões. Os alunos irão comunicar o que aprenderam, o que é muito importante, pois irão expor os conhecimentos adquiridos. Ao falar o aluno reelabora o que aprendeu, intensifica o seu conhecimento, amplia seu vocabulário e todos os membros do grupo terão a oportunidade de expor o que e como aprenderam. 101 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL As apresentações são representadas por um produto final, às vezes uma maquete, uma produção de arte, um painel, um pequeno filme, um portfólio, exposições fotográficas, invenções, um teatro. Diferentes linguagens podem ser representativas das pesquisas feitas, o que é muito enriquecedor para o aluno, não se atendo a exposição oral como única forma de comunicação de um trabalho. O professor terá a oportunidade de fazer a avaliação dos conhecimentos adquiridos, do processo vivido. É bem interessante também fazer uma rodada com todas as equipes ao término dos trabalhos, avaliando‑se o trabalho como um todo. Avaliação e críticas Nesta última etapa o professor pode reunir todas as equipes de trabalho para avaliar o processo das etapas do projeto. Será uma oportunidade para se conversar as competências pessoais, os erros, como os alunos poderiam ter encaminhado algumas situações de uma forma mais colaborativa, enfim é a hora de se criticar, mas de forma positiva. É uma fase reflexiva. Com objetivo de complementar e ampliar o entendimento das etapas de um projeto incluímos as contribuições e os estudos de Barbosa e Horn (2008, p. 35‑37), que nos trazem os seguintes dados: • Os projetos abrem possibilidades de aprendizagens do patrimônio histórico construído pela humanidade por meio de diferentes linguagens, ao mesmo tempo em que proporcionam a reconstrução do que já foi aprendido. • Os professores devem dominar os conteúdos a serem ensinados. Eles devem aprofundar‑se no conhecimento que é seu objeto de trabalho, refletindo, analisando, atualizando‑se, pois quanto mais eles souberem, mais poderão ensinar uma postura de pesquisador. • Os professores devem ter conhecimento da faixa etária com a qual trabalham e ter conhecimento do conteúdo das disciplinas. Assim eles serão capazes de formular questões, aguçar hipóteses, criar desafios. As autoras exemplificam que é necessário saber osconteúdos gerais para melhor oferecer experiências, contribuir com o estabelecimento de relações e não para transmitir conteúdos previamente estabelecidos. • A organização curricular por meio de projetos deve partir de um problema real, de um questionamento que afete o grupo de alunos. Os projetos têm como proposta aproximar de forma global os fenômenos do problema, mas não a interpretação teórica já sistematizada pelas disciplinas. Isto significa dizer que várias indagações são feitas, mas para respondê‑las nos valeremos das diferentes áreas do conhecimento. O conhecimento não deve ser trabalhado de forma linear, ele pertence a uma rede de relações. Resumindo, conforme definem as autoras (p. 31), um projeto é: [...] uma abertura de possibilidades amplas e com vasta gama de variáveis, de percursos imprevisíveis, criativos, ativos, inteligentes acompanhados de uma grande flexibilidade de organização. 102 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Nesse sentido, as autoras afirmam que há dois conhecimentos acontecendo ao longo de um projeto e ambos se referem ao professor: o primeiro, no qual ele demonstra conhecimento acerca da infância, a compreensão com quem trabalha e o repertório de interesse de seus alunos e o segundo se remete ao conhecimento do conteúdo das disciplinas. Assim articulados, esses dois conhecimentos permitem que o professor seja capaz de formular boas questões e criar bons desafios para as crianças. As autoras exemplificam que é necessário saber conteúdos gerais para melhor oferecer experiências que contribuam ao estabelecimento de relações, ou seja, ninguém melhora o conhecimento do outro sem antes melhorar o seu. As autoras Barbosa e Horn (2008) apresentam etapas para se desenvolver um projeto bastante semelhante às de Nogueira, as quais apresentamos a seguir, para efeito de complementação. Elas nos lembram de que a estruturação de um projeto não pode ter uma forma rígida, ela tem marcos referenciais no processo de construção, tais como: • definição do problema; • mapeamento de recursos; • coleta de informações; • sistematização e reflexão das informações; • documentação e comunicação do projeto. Apresentam‑se ainda outras formas de estruturar os projetos, com base nos dados pesquisados pelas autoras em questão. Elas salientam que é muito importante nessa metodologia a construção de um relatório, um registro mesmo, de toda documentação que vai se construindo ao longo do projeto, uma vez que o trabalho é coletivo e vai sendo escrito por muitas mãos. As autoras escolhem oito modelos diferenciados para estruturar os projetos, dos quais destacamos três. Lembre‑se de Madalena Freire, presente na unidade I, ao afirmar que o professor é um intelectual da educação e na medida em que escreve sua história está fazendo ciência da educação. Modelo 1 (Josette Jolibert, 2006) • planejamento do projeto, das tarefas a serem realizadas e das responsabilidades; • realização das atividades; • finalização do projeto; • avaliação coletiva do projeto; • avaliação das aprendizagens durante o projeto. 103 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL Modelo 2 Projetos de Ação em Arte (Miriam Celeste Martins) • título do projeto; • justificativa; • objetivos; • conteúdos; • dinâmica; — avaliação inicial: sondagem para levantamento do repertório; — encaminhamento de ações: avaliação contínua e replanejamento; — sistematizações do conhecimento: finalização e avaliação somatória. • avaliação do projeto pelos educandos e pelo educador; • recursos necessários. Modelo 3 Metodologias de projetos (Adriana Beatriz Gandin) • incentivo (sensibilização); • formulação do propósito (objetivo); • elaboração cooperativa do plano. • desenvolvimento (realização das tarefas e atividades planejadas); • culminância; avaliação e autoavaliação. — Momentos do projeto ‑ seleção e definição de um tópico ou problema; ‑ planejamento das atividades; ‑ desenvolvimento do projeto: levantamento de informações, organização; das informações, experiências realizadas; 104 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ‑ reflexão e sistematização; ‑ conclusões e comunicação. — Etapas do projeto ‑ fundamentos; ‑ localização; ‑ eixo integrador; ‑ justificativa; ‑ objetivos; ‑ temáticas; ‑ estrutura e recursos; ‑ avaliação; ‑ conclusão. Para finalizar a presente unidade, não poderíamos deixar de destacar a interdisciplinaridade na metodologia de projetos. Como já afirmamos, a proposta de se trabalhar com projetos vem superar a ideia linear e fragmentada dos currículos. Os projetos são um dos muitos e variados modos de se organizar a prática educativa. Os projetos representam novas configurações curriculares, que favorecem a interação da escola com a realidade, evitando a transmissão do conhecimento e incentivando a formulação de perguntas e da pesquisa. É vital que o professor compreenda a contribuição de cada área do conhecimento na construção dos saberes dos alunos, permitindo com isso um diálogo entre as disciplinas. No entanto, dizer que a interdisciplinaridade se resume à tarefa de criar uma integração entre as disciplinas é perder‑se no conceito, empobrecê‑lo. A interdisciplinaridade é marca do trabalho coletivo na medida em que aborda a intersubjetividade. Vamos entender melhor o que isso significa? Utilizamos os estudos de Fazenda (2001) para esclarecer esse conceito. De forma bem superficial podemos dizer que a interdisciplinaridade combate a fragmentação do conhecimento entre os diferentes campos do saber, que apenas informa o aluno do conhecimento histórico produzido. Sabemos que os currículos conduzem os alunos a um acúmulo de informações e a cada dia novas disciplinas se agregam a ele, avolumando ainda mais os conhecimentos a serem organizados e sistematizados. Com a adoção de novas metodologias de trabalho, algumas escolas têm abandonado o currículo tradicional e dado ênfase a novos conhecimentos, pautados no senso comum, 105 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL considerados mais atuais. Esquecem‑se com isso, que essa atitude é conservadora, pois pode gerar prepotência ainda maior que o conhecimento científico (FAZENDA, 2001, p. 17). Todavia, “o senso comum, quando interpenetrado do conhecimento cientifico pode gerar racionalidades – o conhecimento não seria privilégio de um, mas de vários”. Para a autora isso significa dizer que o pensar disciplinar tenta um diálogo com outras formas de conhecimento, deixando‑se interpenetrar por elas. Desta feita aceita o senso comum como válido, ampliado através do diálogo com o conhecimento científico. Assim, num projeto, causa e intenção se fundem, conseguindo captar a profundidade das relações entre as pessoas, entre as pessoas e as coisas. O projeto sob essa ótica não se orienta para produzir, mas como um ato de vontade. A autora diz que no projeto interdisciplinar “não se ensina, nem se aprende, vive‑se, exerce‑se”. Isso exige entender a passagem da subjetividade para a intersubjetividade, quando o envolvimento e o desejo de busca de um contaminam o outro e o grupo, reelaborando‑se a busca de um novo conhecimento, que não é interesse e nem privilégio de alguns, mas de todos. Para finalizar a presente unidade, complementaremos os estudos de Fazenda com o conceito de interdisciplinaridade, por meio da metáfora da Professora Sandra Lúcia Ferreira, presente no livro Práticas Interdisciplinares na Escola. Ferreira (2001) compara a compreensão de interdisciplinaridade ao conhecimento de uma sinfonia. Com objetivo de executá‑la é necessária a integração de muitos elementos: os instrumentos, as partituras, os músicos, o maestro, o públicoe os equipamentos eletrônicos, entre outros. Organizada a orquestra, todos os elementos são igualmente importantes, pois eles se ligam num todo, num movimento contínuo, equilibrado. O projeto é o mesmo para todos, ou seja, o foco é a execução da música. Todavia, cada uma das partes desse projeto tem sua marca, sua individualidade. Para a sinfonia se concretizar é preciso contar com a participação de seus envolvidos, da harmonia do maestro e a expectativa dos que a assistem para a composição de um todo integrado. Assim é a interdisciplinaridade: a integração das muitas ciências, como possibilidade de enriquecer e ultrapassar a construção dos muitos elementos que compõem o conhecimento. A interdisciplinaridade tem a característica de integrar todos os elementos do conhecimento, mas pressupõe ainda um movimento ininterrupto, criando outros pontos de discussão, se reinventando, buscando novas combinações e desdobramentos entre as pessoas que participam desta busca. A sinfonia então não termina, ela se recria, se transforma combinando cada um dos seus elementos, respeitando a sua ideia norteadora por eixos comuns: a intenção, a humildade, o respeito pelo outro, a totalidade, a consciência da importância do diálogo. Sem esses elementos não estaríamos aprendendo uma atitude interdisciplinar que é pensar que um fato ou acontecimento nunca é isolado, mas uma consequência da relação entre muitos fatos (FERREIRA, 2001, p. 33‑34). 106 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 Exemplo de uma prática Interdisciplinar A pipa A partir da constatação de que muitas crianças, durante os intervalos, permaneciam um longo período com os olhos atentos aos movimentos das pipas que sobrevoavam a escola e, frequentemente, envolviam‑se em intensas discussões sobre o brinquedo, as educadoras desenvolveram um interessante trabalho pedagógico. Inicialmente, em roda de conversa, foram levantados e registrados em grandes folhas de papel os conhecimentos das crianças sobre o assunto. Surgiram nomes diferentes, técnicas para construção e empinar diversos tipos de pipas. As crianças maiores passaram pelas salas, apoiando e ajudando as menores. Seguiram‑se muitas oportunidades para que as crianças empinassem suas pipas. Nesse momento, como nem todos tinham conseguido construir suas pipas, foram propostas situações didáticas que alternaram o empinar e o contemplar. Na sequência, as professoras reuniram e socializaram com as crianças algumas produções sobre o assunto: livros, narrativas, histórias e obras de arte. Encontraram entre obras de Portinari algumas pinturas que tratavam o tema. Novamente, as crianças foram convidadas a apreciar aqueles artefatos culturais, opinar sobre eles e sobre o seu conteúdo. Surgiu, então, a ideia de se comparar as realidades retratadas pelos pintores (campos abertos, crianças descalças etc.) com a realidade vivida por elas (habitantes de uma comunidade urbana, com uma grande rede elétrica). Nesse contexto, emergiram calorosos debates acerca do risco de se empinar pipas nas condições atuais, comparações com as características da vida cotidiana das crianças do passado e possíveis alternativas para contornar as dificuldades presentes. Como algumas crianças mencionaram que seus familiares viveram em regiões semelhantes às retratadas por Portinari, coletivamente, decidiram convidar alguns adultos da comunidade para relatar suas experiências com as pipas durante a infância. Dois pais e duas mães foram à escola, ajudaram as crianças a confeccionar pipas no formato que conheciam e relataram suas histórias. Na sequência, novamente, foram ao pátio para empinar e observar não só as pipas, como a gestualidade dos colegas e dos adultos. Foi interessante notar que alguns adultos enfatizaram ainda gostar de empinar pipas e brincar com elas. Surgiram questões em torno do perigo atual, do cerol, do risco de se brincar na rua etc. Enquanto alguns meninos diziam que sempre empinavam pipas sem qualquer problema, as meninas demonstravam pouca familiaridade com o assunto. As professoras, provocando debate, solicitaram às crianças que se posicionassem sobre as brincadeiras de meninos e meninas. As crianças recordaram que suas mães, quando meninas, também empinavam pipas, e, na escola, isto também aconteceu. Concluíram, portanto, que pipa não era brincadeira somente de meninos (NEIRA, 2008, p. 88‑89). A partir da observação do interesse de suas crianças durante o intervalo, o professor da prática nos apresenta a disposição em não tratar a elaboração de uma pipa como uma simples atividade de 107 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL reprodução de mais um brinquedo. Sua atitude investigativa estimulou a pesquisa e a interligação de novos conhecimentos envolvendo múltiplas linguagens. Segundo os autores estudados, a interdisciplinaridade precisa ser compreendida para não fugir de seus propósitos. Para Ferreira (2001, p. 35), ”a ideia é norteada por três eixos básicos: a intenção, a humildade, a totalidade, o respeito pelo outro, (...)”. A autora explica que um fato nunca está sozinho, mas ele é consequência da relação entre muitos outros fatores. Desta feita, é importante considerar a necessidade de se assumir uma nova postura diante do conhecimento, ou seja, o ponto de partida e chegada de uma prática interdisciplinar depende da ação do diálogo que acontece entre as disciplinas e os sujeitos da ação (FAZENDA, 1993). Em outras palavras, pode‑se dizer que a interdisciplinaridade integra horizontalmente os conteúdos, superando a fragmentação deles e aponta para a construção de um currículo mais vivo, articulado e participativo. Diante do exposto, retornamos ao início da unidade II com a reflexão da fábula da convivência, ao se abordar a importância de sentir‑se componente de um todo, e que para isso precisamos nos desintegrar no outro e integrar‑nos novamente, num movimento que envolve a unidade e a totalidade, a razão e o humano. Resumo O projeto de trabalho é uma modalidade organizativa do tempo didático que visa: compartilhar objetivos mediante um propósito educacional; elaborar um produto final que possa ser partilhado, divulgado; a organização/planejamento de etapas de trabalho onde todos devem se envolver; comprometer todos os envolvidos, pois suas ideias, intenções e desejos estão circulando pelo projeto, constituindo e estruturando o projeto; promover o trabalho cooperativo já que é preciso tomar decisões, discutir ideias e avaliar em conjunto; ampliar o conhecimento de um determinado saber/informação/situação/acontecimento; ter como referencia inicial o levantamento de dados conhecidos, evidenciados em uma dada situação (conhecimentos prévios do grupo). Por que trabalhar com projetos? Porque eles propiciam aprendizagens significativas; tiram o aluno da passividade; vão além do conteúdo conceitual; permitem uma formação mais ampla; auxiliam no desenvolvimento como um todo; e oferecem a aprendizagem em diferentes áreas: emocional, social, afetivo, motor e cognitivo. 108 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 O trabalho com projeto favorece ao aluno, pois coloca‑o no centro da atenção pedagógica; parte da ideia das crianças; simboliza uma aprendizagem mais significativa; impulsiona o desenvolvimento e a autonomia do aluno; criam‑se aulas dialogadas que partem das necessidades, problemas, perguntas e hipóteses dos alunos; e ele nunca é um planejamento de passos fechados. Exercícios Questão 1 (Enade 2005, Questão 25). A professora Maria Amélia, que atua no Ensino Fundamental, trabalha a literatura infantil como uma das possibilidades de alargamento dos horizontes cognitivos do leitor iniciante. Com essa abordagem, deseja ir além com o seu grupo da “alfabetização”, entendida como o processode codificação/decodificação de sons e letras visando ao letramento. Maria Amélia organizou uma atividade de leitura do seguinte texto: A Festa Renata está noiva do amigo Rodrigo. No dia da festa de noivado, Rodrigo dá um baile para os seus convidados. O baile está muito animado. Mas vejam só que confusão! No meio da festa, Rodrigo tropeça, cai de cara no bolo e se estatela no chão! Renata muda de opinião: — Rodrigo é um bobalhão! Este noivo não quero mais não! A seguir, solicitou às suas crianças da 1ª série a criação de outra história. José Gil escreveu, então, o texto O Noivado. O Noivado Eu gosto dessa história porque o bobo do Rodrigo caiu de cara no chão. Como ele é um bobão. A Renata disse para ele: – Eu vou embora dessa festa e nunca mais quero ver o bobalhão do Rodrigão. Todo mundo confiou na Renata. (José Gil, 1ª Série do Ensino Fundamental) 109 PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 ORIENTAÇÃO E PRÁTICA DE PROJETOS DE ENSINO FUNDAMENTAL A atividade proposta pela professora possibilitou à criança: I – explorar a rima para aumento de vocabulário; II – desenvolver os elementos sensório‑motores; III – emitir opinião sobre a situação narrada; IV – analisar questões de comportamento. São corretas: A) I e II, apenas. B) I e III, apenas. C) I, III e IV, apenas. D) II, III e IV, apenas. E) I, II, III e IV. Resposta correta: alternativa C. Análise das afirmativas I) Afirmativa correta. Justificativa: podemos dizer que, ao explorar as rimas, há uma ampliação do vocabulário. Por esse motivo, parlendas, canções e poesias são utilizadas desde a educação infantil até o ensino fundamental. II) Afirmativa incorreta. Justificativa: essa afirmativa cita o desenvolvimento sensório‑motor, que é uma fase de desenvolvimento das crianças em estágio da educação infantil. III) Afirmativa correta. Justificativa: o aluno, ao elaborar um texto, pode emitir opinião sobre o fato narrado na estória contada pela professora, conforme pode se ver da maneira com que ele inicia o seu texto: “Eu gosto dessa estória porque (...)”. 110 Unidade II PE D - Re vi sã o: M ile na - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 6/ 11 /1 2 IV) Afirmativa correta. Justificativa: o aluno analisou o comportamento de Rodrigo, o protagonista da estória. Questão 2. Na escola Novos Horizontes desejava‑se implantar um currículo que partisse da concepção de conhecimentos em rede e que se aproximasse da vida cotidiana. Em uma reunião com o corpo docente, o diretor trouxe, para reflexão, os argumentos abaixo. I ‑ O conhecimento é, na dimensão das redes, uma propriedade ou uma característica do indivíduo. II – Aprendemos que relevante no nosso fazer é “o quê”, possível de ser medido, quantificado, regulamentado e controlado. III – Todas as atividades que desempenhamos em nossas vidas são aprendidas, mesmo que, em alguns casos, instintiva ou mecanicamente. IV – Os currículos que criamos misturam elementos das propostas formais e organizadas com as possibilidades que temos de implantá‑las. Para a implantação pretendida, os argumentos coerentes são: A) I e II, apenas. B) I e IV, apenas. C) II e III, apenas. D) II e IV, apenas. E) III e IV, apenas. Resolução desta questão na plataforma.
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