Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A NAVEGAÇÃO NO ESTADO DO AMAZONAS FRENTE AS NORMAS REGULADORAS: ASPECTOS JURÍDICOS DE UMA REALIDADE CONTROVERSA Marcio Gualberto Miranda1 Silvina Maria Ramos de Oliveira2 Thiago Dias de Oliveira3 Rubia Silene Alegre Ferreira4 Resumo A malha hidroviária é a principal responsável pela mobilidade da população amazônica e em muitos locais é a única. O transporte misto é de fundamental importância para região, no que tange o direito de ir e vir dos ribeirinhos, garantidos pela carta magna. Neste contexto, o objetivo deste ensaio foi apresentar e discutir algumas das Resoluções da ANTAQ voltadas para a navegação longitudinal de transporte misto (Carga e passageiros), demonstrando as diferenças no transporte ocorrido no Estado do Amazonas e quais as melhorias resultam de suas aplicações. Na Amazônia, a inexistência de um sistema de transporte estruturado contribui para ocupações predatórias em periferias, o que gera a exclusão social, somando às escassas informações sobre o transporte fluvial que poderiam contribuir para planejamentos mais eficientes sobre o setor na região, e para isso alguns aspectos deveriam ser mapeados como a eficiência, a rapidez, a segurança, o conforto, a oferta e a demanda e a adequação dos equipamentos utilizados para o transporte de cargas e passageiros. O ano de 2013 é um marco para o transporte aquaviário com a promulgação da Lei dos Portos n° 12.815/2013, onde as agências reguladoras têm importante papel na gestão e fiscalização dos serviço deste transporte. No Amazonas ANTAQ e a ARSEPAM regulam a concessão dos serviços relativo as embarcações. A região norte, o Amazonas e precisamente o Porto de Manaus necessita desse olhar diferenciado haja visto as particularidades locais são muitas e não há de se comparar com as demais regiões do Brasil. Nesse sentido, a adaptação de regras e regulamentações para a navegação mista hidroviária faria todo o sentido, pois garantiria que todos os armadores pudessem se modernizar e concorrer de forma equânime, possibilitando a abertura de novos postos de trabalho, maior agilidade para o transporte de alimentos e mercadorias oriundas ou destinadas ao interior do estado do Amazonas. Palavras-chaves: Agências reguladoras. Transporte hidroviário. Eficácia e Desburocratização. Abstract The waterway network is the main responsible for the mobility of the Amazonian population and in many places it's the only one. Mixed transport is of fundamental importance for the region with regard to the right to come and go from 1 Acadêmico do curso de Bacharelado em Direito, Centro Universitário do Norte – UNINORTE 2 Acadêmico do curso de Bacharelado em Direito, Centro Universitário do Norte – UNINORTE 3 Acadêmico do curso de Bacharelado em Direito, Centro Universitário do Norte – UNINORTE 4 Professor/Orientador Estágio Supervisionado, Escola de Direito - Centro Universitário do Norte – UNINORTE 2 the riverside, guaranteed by the charter. In this context, the objective of this essay was to present and discuss some ANTAQ Resolutions aimed at longitudinal navigation of mixed transport (Cargo and passengers), demonstrating the differences in transport that occurred in the State of Amazonas and what improvements result from their applications. In the Amazon, the lack of a structured transport system contributes to predatory occupations in peripheries, which generates social exclusion, adding to the scarce information about river transport that could contribute to more efficient planning of the sector in the region, and for that some aspects should be mapped such as efficiency, speed, safety, comfort, supply and demand and the adequacy of the equipment used to transport cargo and passengers. In Amazonas ANTAQ and ARSEPAM regulate the concession of services related to vessels. The northern region, the Amazon and precisely the Port of Manaus need this different look, since the local particularities are many and there is no comparison with the other regions of Brazil. In this sense, the adaptation of rules and regulations for mixed waterway navigation would make perfect sense, as it would guarantee that all shipowners could modernize and compete equally, enabling the opening of new jobs, greater agility for the transport of food, and goods from or destined for the interior of the state of Amazonas. Key-words: Regulatory agencies. Waterway transport. Effectiveness and Bureaucratization. 1. Introdução Apesar de o Estado do Amazonas abrigar a maior parte da bacia hidrográfica do mundo, a estrutura portuária local ainda não alcançou condições mínimas que viabilizem o direito ao transporte e sua locomoção com dignidade. Acesso este assegurado na Constituição Federal de 1988 (dos Direitos Sociais Art. 6º). A malha hidroviária é a principal responsável pela mobilidade da população amazônica e em muitos locais, a única. Ao longo desse percurso hidroviário foram criados portos capazes de gerar maior facilidade na mobilização de bens e pessoas na região dos rios Solimões-Amazonas (COUTO, 2015). Dentro do transporte hidroviário há uma discussão da responsabilidade legal acerca da fiscalização das agências reguladoras do transporte aquaviário no Brasil. No Estado do Amazonas a agência federal ANTAQ (Agencia Nacional de Transportes Aquaviários) e a estadual ARSEPAM (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados e Contratados do Estado do Amazonas) são os órgãos reguladores dos serviços aquaviários, relativo as embarcações que seguem até os limites de fronteira ou se dirigem a outros estados limítrofes, que são, por força de lei, de responsabilidade direta da ANTAQ, todavia, essas mesmas embarcações 3 fazem paradas ao longo dos seus trajetos nos portos das cidades ribeirinhas o que torna a fiscalização também de responsabilidade da ARSEPAM (MEDEIROS, 2012). Com o objetivo de atrair atenção para o tema, e a identificação das responsabilidades entre agências reguladoras, é possível apontar falhas e incoerências do modelo de fiscalização atualmente em uso. Neste sentindo, criar normas que melhorem a navegação intermunicipal e interestadual, garantindo a salvaguarda da vida humana e promovendo qualidade na prestação desses serviços é um grande desafio, principalmente quando o olhar se dar para os portos do estado. As distâncias entre os diversos municípios da região amazônica são vencidos, em sua quase totalidade, através da navegação hidroviária, o que faz com que esse modal seja de alta relevância para os núcleos urbanos que se formam nas margens dos rios. Buscar melhorá-lo e organizá-lo, de modo que atenda às necessidades das comunidades ribeirinhas e também dos armadores (Conceitos e definições de Armador, Artigo 2°, III da Lei n° 9.537/1997), desburocratizando, incentivando e auxiliando na modernização das embarcações, é algo vital para influenciar a qualidade desses serviços. Estabelecer normas que garantam esse desenvolvimento para todos os que dele dependem, também torna-se fundamental, visto que ainda encontramos casos em que as embarcações e seus proprietários possuem dificuldade para atender normas básicas de segurança. É preciso fazer com que as normas já em vigência reflitam o cotidiano do transporte hidroviário regional, o que só pode ser feito em conjunto com os órgãos de regulação tanto federal quanto estadual, além da Autoridade Marítima. Assim como no meio terrestre, em que órgãos de fiscalização e segurança trabalham em conjunto para dispor aos condutores melhores meios de se locomover, garantindo-lhes proteção durante o seu trajeto, sinalizando as vias, exigindo novos itens de segurança, abrindo formas de financiamento para atualização da frota, o mesmo deve ser pensado para o transporte hidroviário. Não há apenas que se exigir o cumprimento das normas, é necessário também garantir- lhe os meios e fins para que isso sejapraticado, feito isso estaremos acautelando os passageiros, cargas e o meio de transporte mais utilizado na região amazônica (PIRES et al., 2003). Nesse contexto o objetivo deste ensaio foi apresentar e discutir algumas das Resoluções da ANTAQ voltadas para a navegação longitudinal de transporte misto 4 (Carga e passageiros), demonstrando as diferenças no transporte ocorrido no Estado do Amazonas e quais as melhorias resultam de suas aplicações. Para dar resposta este objetivo uma pesquisa bibliográfica foi realizada em publicações regionais e nacionais, como trabalhos de dissertação, tese e artigos científicos. 2. Transporte hidroviário no Estado do Amazonas As aventuras marítimas sempre foram, desde os primórdios, alvo de grande interesse da humanidade, notadamente quanto às conquistas de novos e desconhecidos territórios e às suas respectivas riquezas que poderiam oferecer, bem como quanto ao rentável comércio marítimo de mercadorias valiosas entre localidades consideravelmente longínquas. Ao longo dos tempos, surgiram importantes códigos e normas para suprir a necessidade acima mencionada, os quais fincam o início da constituição do Direito Marítimo. A definição apresentada por Mircea Mateesco5 é bem ilustrativa: “é o conjunto de normas jurídicas que regulamentam as relações nascidas da utilização e exploração do mar, tanto na superfície, quanto na profundidade”. Na doutrina de Vianna e Marques (2018) acerca do transporte de pessoas e coisas, discorrem os autores que os artigos 730 a 756 (Código Civil), abordam, dentre outros aspectos, a responsabilidade do transportador e prazo de decadência para reclamação por perda ou avaria, sendo certo que todas as disposições são aplicáveis ao transporte marítimo de carga ou passageiros. Os rios amazônicos são as estradas que ligam cada cidade, cada furo de igarapé, cada braço de rio que leva a comunidades tão isoladas que parecem ainda viver no início do século. As embarcações que navegam por esses rios são os garantidores do transporte dos diversos insumos para manter os comércios e as famílias do interior. Por meio do transporte fluvial famílias se reencontram e se despedem quando algumas resolvem deixar para trás seus locais de nascimento e buscar, nas grandes metrópoles, a tão almejada segurança financeira e consequentemente melhor condições de vida, saúde e educação (FURTADO, 2009). Ao longo dos anos, mudanças foram necessárias para que a navegação fluvial de percurso misto, carga e passageiros, acompanhasse o aumento das populações ribeirinhas. Além da criação de novos povoados ao longo das margens 5 LACERDA, José Candido Sampaio de. Curso de direito privado da navegação. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1984. p.18 5 dos rios, o que fez com que o número de passageiros e cargas aumentasse também de forma exponencial, e estes números permanecem em constante crescimento, razão pela qual investimentos nesses modais são importante (NOGUEIRA, 2003). Na Amazônia, a inexistência de um sistema de transporte estruturado contribui para ocupações predatórias em periferias, o que gera a exclusão social, somando às escassas informações sobre o transporte fluvial que poderiam contribuir para planejamentos mais eficientes sobre o setor na região, e para isso alguns aspectos deveriam ser mapeados como a eficiência, a rapidez, a segurança, o conforto, a oferta e a demanda e a adequação dos equipamentos utilizados para o transporte de cargas e passageiros (PINHEIRO, 2003). Historicamente, o sistema de transporte aquaviário nasceu com a evolução lenta e gradual, ocorrida com o aperfeiçoamento dos barcos primitivos em barcos a vela e com a revolução industrial pela criação de barcos a vapor que possibilitou maiores trocas comerciais entre os países. Ao abordamos a Amazônia no aspecto comercial a data de 05 de setembro de 1900 é marcada pela inauguração oficial do Monumento de Abertura dos Portos do Amazonas ao Comércio Mundial (Figura 1). A abertura do rio Amazonas à navegação foi decisão política direcionada a incrementar a produção extrativista e agrícola da região numa escala de comercialização mundial, agregando a Amazônia às políticas nacionais por meio do transporte hidroviário e na segunda metade desse século ocorreu a modernização do setor pautada na navegação a vapor e modernização dos portos em conjunto com a construção de ferrovias e instalação de empresas e capitais associados a novos empreendimentos de transporte (COUTO, 2015). Figura 1 – Monumento em homenagem a “Abertura dos Portos” no Estado do Amazonas/Manaus (https://www.wikiwand.com/pt/Monumento_%C3%A0_Abertura_ dos_Portos) 6 3. Agências reguladoras do Transporte hidroviário e os problemas da legislação. Toda disposição legal para o transporte aquaviário estar concentrado nas Leis: n° 12.815/2013, que dispõe precipuamente sobre a exploração direta e indireta pela União de portos e instalações portuárias e sobre as atividades desempenhadas pelos operadores portuários, regulamentada pelo Decreto 8.033/2013, que, além desta lei, regulamenta demais disposições legais que regulam a exploração dos portos organizados e de instalações portuárias, e na n° 9.537/1997 dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas nacionais, estando regulamentado pelo decreto n° 2.596/1998. ANTAQ e a ARSEPAM são órgãos reguladores dos serviços concedidos do Estado do Amazonas, relativo as embarcações que seguem até os limites de fronteira ou se dirigem a outros estados limítrofes, que são, por força de lei, de responsabilidade direta da ANTAQ, todavia, essas mesmas embarcações fazem paradas ao longo dos seus trajetos nos portos das cidades ribeirinhas o que torna a fiscalização também de responsabilidade da ARSEPAM. A cobranças de tributos na região portuária do Amazonas tanto ARSEPAM (D.O. AM 30/05/2001 Portaria nº 02/2001) como ANTAQ, (17/02/2002) criaram portarias que regulava tarifas de transporte fluvial de passageiros nas bacias hidrográficas do Estado do Amazonas e que tinha como objetivo principal a criação de um fundo, através da arrecadação da Tarifa de Utilização Portuária – TUP, para incentivar os armadores a atualizar seu plantel de equipamentos, especialmente convertendo as embarcações tradicionais de madeira em embarcações de ferro, mais seguras para os rios amazônicos, que possuem em trechos do rio Solimões obstáculos naturais, como troncos de árvores, que descem os rios e se chocam com as embarcações, naufragando-as, em diversos casos. Por conta da burocracia e pela má gestão dos recursos, nenhum investimento foi feito ao longo de anos, ainda que se tenha contribuído para a TUP durante mais de 10 anos, pois somente em 05 de abril de 2012, por orientação da então Autoridade Portuária do Porto Organizado de Manaus, à época administrada pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), é que referida Tarifa foi extinta, sob o argumento de haver sido instituída por Lei Estadual e revertida a Fundo não gerenciado e não legislado pela União. 7 A ANTAQ, por meio de diversos normativos, enumerou exigências para contribuir com a organização da navegação de cargas e passageiros realizadas pelas embarcações que fazem o transporte interestadual e de fronteira, cuja fiscalização é atributo direto do referido órgão federal de fiscalização. Entretanto, essas mesmas embarcações também realizam o transporte de cargas e passageiros que tem como destino municípios amazonenses, mas não recebem uma fiscalização mais eficiente, haja vista que para os municípios, a fiscalização estaria sob a competência da ARSEPAM, portanto, há aí um conflito de competências entre duas agências reguladoras. Podemos citar como exemplo, os normativos criados pela ANTAQ: Resolução nº912, de 23 de novembro de 2007, alterada pela Resolução 2030, de 25 de abril de 2011, que aprova a norma para outorga de autorização para prestação de serviço de transporte de passageiros e de serviço de transporte misto na navegação; Resolução nº 1.558, de 11 de dezembro de 2009, alterada pelas Resoluções nº 2.025/2011, 2.358/2012, 2.821/2013 e 1.886/2013, que aprova norma para outorga de autorização para prestação de serviço de transporte de cargas na navegação interior de percurso longitudinal interestadual e internacional; Resolução nº 1.864, de 4 de novembro de 2010, alterada pela Resolução nº 2.160, de 22 de julho de 2011, que aprova a norma para disciplinar o afretamento de embarcação para operar na navegação interior; Resolução nº 3.259, de 30 de janeiro de 2014, alterada pela Resolução nº 6, de 17 de maio de 2016, que aprova a norma que dispõe sobre a fiscalização e o procedimento sancionador em matéria de competência da ANTAQ. Pela Capitania Fluvial da Amazônia Ocidental (CFAOC), podemos incluir, como exigências, as Normas da Autoridade Marítima para Embarcações Empregadas na Navegação Interior, NORMAM-02/DPC, que são determinações que, em conjunto com toda a legislação da ANTAQ e ARSEPAM, buscam regulamentar e salvaguardar a vida humana em primeiro lugar. Gradativamente, com o aumento no número de embarcações que fazem o transporte de passageiros e cargas, novos pontos de recepção tem surgido, criando novas empresas armadoras, que no ensejo de auferir vultosos valores com o transporte de mercadorias e passageiros, optam por reduzir a segurança de suas embarcações ou mesmo reduzir a concessão de itens básicos, como água potável, 8 pois, se optarem por armazenar em suas caixas d´água, geralmente de 1.000 litros, perdem o equivale a uma carga de 1.000kg que lhes poderia render mais dinheiro. Portanto, para contornar essa situação, optam por utilizar a água do próprio rio para os sistemas internos das embarcações, sem armazená-la, apenas utilizando-a de modo contínuo. Para que as exigências sejam pontos positivos nas melhorias das embarcações, carga e passageiros faz-se necessário investimentos tanto dos armadores/proprietários como do governo, cada qual assumindo suas responsabilidades. Haja visto a quantidade de embarcações precárias ainda é grande. Da mesma forma a quantidade de armadores clandestinos ainda é muito expressiva, esse fato se deve ao excesso de burocracia, a falta de recursos e a falta de linhas de investimento para melhorar suas condições de trabalho. Notadamente percebe-se que a rapidez em que se instrumentalizam normas para aumentar a competitividade entre as empresas brasileiras de navegação, as então chamadas EBNs, definidas conforme o artigo 2º da Lei nº 9.432/1997, a mesma agilidade não é vista nas demandas que lotam a agência reguladora quanto a alternativas de regularização mais descomplicadas e voltadas à realidade regional. Enquanto o Governo Federal, através do Ministério dos Transportes, acena com a construção de Terminais Hidroviários em substituição aos primitivos embarcadouros construídos nos próprios barrancos nas cidades do interior do Estado, também é preciso acenar com alternativas que aglutinem com eficiência as embarcações de cargas e passageiros. Como a quase totalidade das cidades estão situadas às margens dos rios, a cultura da região é hidroviária, sendo o aquaviário o transporte por excelência, a exigir uma logística compatível com esse grande número de embarcações. Nesse sentido, o Ministério dos Transportes faz voltar uma ideia do passado, mas que nunca se concretizou, que é a de construir, não apenas uma, mas três ou mais estações hidroviárias, por calha de rio ou microrregião, destacando-se, assim, a calha do Madeira, do Solimões, do Negro, do Baixo e Médio Amazonas, do Purus, do Juruá. Nota-se, portanto, que há uma vontade governamental quanto a melhoria da infraestrutura de recebimento de cargas e passageiros, entretanto o transporte propriamente dito fica à mercê de uma regulamentação mais detalhada e mais eficiente. As próprias agências de fiscalização, responsáveis pelas atividades portuárias, sejam elas interestaduais, a cargo da ANTAQ, ou intermunicipais, a 9 cargo da ARSEPAM, não conseguem realizar a contento suas funções considerando o número reduzido de servidores, ocasionando uma facilitação quanto a manutenção das irregularidades encontradas nas embarcações, nos atracadouros oficiais e não oficiais, causando, via de consequência, uma sensação de insegurança para a navegação fluvial como um todo. Mais recentemente, pouco após o início da pandemia de COVID-19 no Amazonas, Decretos Estaduais foram editados, entre eles o Decreto nº 42.087, de 19 de março de 2020, em que se determinou, no inciso III, do artigo 1º, a suspensão dos serviços de transporte fluvial de passageiros, operados por embarcações de pequeno, médio ou grande porte, de qualquer natureza, dentro dos limites territoriais do Estado do Amazonas. Gerou-se uma confusão por parte de alguns armadores, especialmente aqueles que fazem o transporte interestadual, como já dito anteriormente, fiscalizado pela ANTAQ, tendo em conta que a referida Agência editou a Resolução nº 7.653, de 31 de março de 2020, mantendo a operação com as embarcações interestaduais, estabelecendo medidas em resposta à emergência de saúde pública. As embarcações que realizam o transporte longitudinal de percurso misto interestadual atende também a municípios ao longos dos rios do Amazonas (Figura 2) e não se dirigem aos municípios do Pará ou a capital Belém, portanto, cabe a fiscalização a ARSEPAM e não a ANTAQ. Situações como a descrita anteriormente geram multas aos armadores que se veem prejudicados e com isso deixam de cumprir as normas de segurança, atracando muitas das vezes em portos clandestinos sem se importarem com a segurança, envolvendo a embarcação e seus ocupantes. A falta de uma fiscalização eficiente e normativos desburocratizados levam a falta de regularização, causando assim a fuga de receitas municipais, estaduais e federais. Figura 2 – Rota da navegação na Amazônia (ANTAQ/SNI, 2012) 10 Em que pese a questão cultural do nosso modal aquaviário e a necessidade deste se adequar às legislações vigentes, os normativos criados por entidades de fiscalização, cujos “legisladores” no mais das vezes são pessoas de fora do estado do Amazonas, não se identificam com a realidade regional e passam a adotar regras que não conseguem ser implantadas de forma adequada, com modicidade, agilidade e eficiência, resultando em uma prestação de serviços precária e insegura para a população, usuária destes serviços. Nesse sentido temos o exemplo da desorganização do atracadouro denominado “Porto da Manaus Moderna”, nesse atracadouro é comum a confusão que se vê no embarque e desembarque de passageiros e cargas, contudo é necessário, considerando que assim como os demais atracadouros, precisam suportar a grande quantidade de embarcações que entram e saem de Manaus. Os atracadouros oficiais podem ser instados sempre a cumprir as exigências dos órgãos de fiscalização, entretanto, os clandestinos, apesar de receberem fiscalização, estas não tem força suficiente para fazer mudar o quadro de desorganização que se arrasta há muitos anos. Desta feita percebe-se que as regulamentações precisam caminhar lado a lado com as fiscalizações e incentivos financeiros para que esse modal seja de fato atendido a contento. 4. Legislação específica para os portos do Amazonas para um transporte hidroviário regional eficiente. As orientações emanadas da ANTAQ, ainda que criem um ambiente mais seguro e com relativa eficiência, trouxe para a navegação fluvial interior a legislação que é aplicada à navegação marítima, criando conflitos entre as operações em vias fluviais que em muitose diferenciam da navegação marítima, principalmente a que se destina ao transporte de passageiros. Em recente publicação da revista “Navegando a Notícia”, uma matéria foi publicada acerca do prêmio “Valorização das boas práticas ambientais e ações inovadoras” - ANTAQ, onde a proposta foi enaltecer ações que tragam melhoria para o setor aquaviário e que impacte positivamente no atendimento ao usuário. Nessa reportagem o Diretor-Geral da ANTAQ Mário Povia, pontuou6: “a Agência sempre trabalhará para que as instalações portuárias realizem práticas que vão ao encontro da sustentabilidade. Ações 6 Trecho da Revista “Navegando a Notícia”. Anexo X – Nº 46 – Dezembro de 2019. 11 sustentáveis também fazem parte da prestação do serviço adequado, que, sem dúvida alguma, é uma grande preocupação que a ANTAQ tem” (Trecho da Revista “Navegando a Notícia) Diante do exposto não é possível encontrar nada que vai ao encontro no que reza a lei dos portos de n° 12.815/05/06/2013 que tem em suas atribuições o artigo 2°, incisos I, II, III, IV, V, VI e VII, que poderiam ser específicos para cada região. A região norte, o Amazonas e precisamente o Porto de Manaus necessita desse olhar diferenciado haja visto as particularidades locais são muitas e não há de se comparar com as demais regiões do Brasil. Em suma fica evidente a necessidade de politicas publicas buscando ações sustentáveis objetivando as estruturas de atracação, a navegação como um todo (Interestadual – ANTAQ e municipal – ARSEPAM) possibilitando trabalho para este modal das vias fluviais, resultando em melhorias desse segmento, uma vez que existem trechos em que o assoreamento avança a cada ano, fato que contribui para o aumento de encalhe de embarcações, situação está que já se tornou uma constante, evidenciando por vezes a necessidade de um prático, que orienta as manobras e chefia, juntamente com o Comandante do navio, toda a equipe que controla a embarcação. Dessa forma, o custo-benefício do transportes em questão sofre constantes aumentos, seja para carga ou passageiro. Quando houver uma preocupação real por parte das agências reguladoras para essas questões então será possível oferecer um serviço de qualidade eficiente e rápido, favorecendo tripulantes, passageiros e também a carga transportada nesse modal. Releva notar que o transporte de passageiros é realizado em maior número em alguns estados que compõem a Amazônia Legal, muito mais especificamente nos estados do Amazonas e Pará, considerando que para os demais há rodovias em que os limites territoriais são superados via terrestre. É perceptível a enorme vantagem operacional para o Norte do Brasil quando avançamos no assunto de custos do transporte, que é baixo em relação ao transporte de passageiros, mas esses custos podem se elevar a medida que investimentos na infraestrutura aquaviária não são realizados, mas é importante que a legislação aplicada a esse modal seja feita com base na integração e desenvolvimento das cidades que são atendidas pela navegação hidroviária, sem desassociar os costumes locais, culturalmente repassados entre as gerações. 12 A tecnologia para renovação das frotas de embarcações que realizam o movimento de carga e passageiros, convertendo a frota de casco de madeira em casco de aço, reduziria o número de acidentes, com controle eficaz, aumentando a viagem entre os trechos, e para que isso ocorra, não deve-se criar apenas uma legislação baseada em exigências e aplicação de multas, deve ser mantida na prática, criando-se oportunidades até mesmo através de Termos de Ajustamento de Conduta que possibilite aos armadores que almejam essa melhoria operacional, condições reais de fazê-la. Que as infraestruturas de atracação, existentes ao longo da malha hidroviária também sejam eficientes e estejam dentro das normas exigidas pelos órgãos de fiscalização da operação portuária, considerando que ainda há grande descontentamento com o que é ofertado aos passageiros, seja nas embarcações, principalmente as que realizam o transporte hidroviário intermunicipal, seja nos terminais hidroviários da capital amazonense ou das cidades ribeirinhas. A própria Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, principal órgão responsável pela fiscalização das operações envolvendo a navegação hidroviária, ressalta a importância desse modal. Caracterização da Oferta e da Demanda do Transporte Fluvial de Passageiros na Região Amazônica7: “A malha hidroviária de mais de 16 mil quilômetros de rios naturalmente navegáveis da região amazônica revela-se como um verdadeiro convite ao uso das águas para a integração dos grandes centros regionais, as comunidades ribeirinhas e os portos marítimos e fluviais na dinâmica econômica, social e cultural da Amazônia” “Os resultados desse estudo estão publicados nesse portal e servem para aprimoramento das políticas públicas, como também da atuação regulatória da Agência e dos demais órgãos públicos responsáveis pelo transporte aquaviário da região.” É perceptível a importância do transporte fluvial de passageiros na região, e a necessidade de ser adequada a uma legislação que a atenda não apenas no aspecto econômico, mas que a alcance no aspecto cultural, pois os rios são as estradas que nos ligam as inúmeras cidades ao longo das calhas, não apenas aquelas com maior fluxo de viagens, mas também aquelas em que o pequeno produtor pode escoar sua produção, mas que ainda encontra dificuldades, 7 http://portal.antaq.gov.br/index.php/caracterizacao-da-oferta-e-da-demanda-do-transporte-fluvial-de- passageiros-na-regiao-amazonica/ 13 considerando que as embarcações mais antigas, que atendem esses lugares, são lentas e realizam muitas paradas ao longo de suas viagens. Meios de transporte de passageiros têm se modernizado, com a operação de lanchas do tipo “a jato”, que priorizam apenas passageiros e cargas de pequeno volume, transportadas quase sempre por seus usuários, e as grandes cargas passam a ser disputadas por grandes empresas de fora do estado, onde o transporte misto é quantitativamente menor que dentro do estado do Amazonas. Nesse sentido, a adaptação de regras e regulamentações para a navegação mista hidroviária faria todo o sentido, pois garantiria que todos os armadores pudessem se modernizar e concorrer de forma equânime, possibilitando a abertura de novos postos de trabalho, maior agilidade para o transporte de alimentos e mercadorias oriundas ou destinadas ao interior do estado do Amazonas. Convertendo cascos de madeira em cascos de aço, garantindo maior segurança a vida humana. Para que isso ocorra, contribuições parlamentares que objetivam melhorar esse meio de transporte e todos os que dele se utilizam são importantes. A exemplo do Projeto de Lei nº 123, de 2008, de autoria da Senadora Kátia Abreu que “autoriza o Poder Executivo a criar a Escola Técnica Federal de Navegação Interior, no Estado do Tocantins” (Brasil, 2008). Nota-se portanto que a movimentação de parlamentares no estado do Amazonas, deve seguir a mesma linha de raciocínio da senadora pelo estado do Tocantins, buscando sempre a melhoria do transporte hidroviário, não apenas para as infraestruturas de atracação e para as embarcações que realizam essa operação, mas também para os trabalhadores do setor portuário, considerando a inexistência de políticas públicas para esse setor. Considerações Finais Os rios amazônicos são estradas que ligam as inúmeras cidades ao longo das calhas, não apenas aquelas com maior fluxo de viagens, mas também aquelas em que o pequeno produtor pode escoar sua produção, ainda assim encontra dificuldades. O transporte misto é de fundamental importância para região, no que tange o direito de ir e vir dos ribeirinhos, garantidospela carta magna. O ano de 2013 é um marco para o transporte aquaviário com a promulgação da Lei dos Portos n° 12.815/2013, onde as agências reguladoras têm importante papel na gestão e fiscalização dos serviço deste transporte. No Amazonas ANTAQ e 14 a ARSEPAM regulam a concessão dos serviços relativo as embarcações que seguem pelo estado e ainda os limites de fronteira ou se dirigem a outros estados limítrofes. Problemas no transporte de cargas e passageiros, ainda é uma realidade, pois nem todas as embarcações que seguem com destino aos municípios amazonenses, não recebem uma fiscalização eficiente, seja pela carência de servidores, ou ainda pelo conflito de competências entre as agências reguladoras. Desta feita as regulamentações precisam caminhar lado a lado com as fiscalizações e incentivos financeiros para que esse modal seja de fato atendido a contento. As orientações emanadas da ANTAQ, ainda que criem um ambiente mais seguro e com relativa eficiência, trouxe para a navegação fluvial interior a legislação que é aplicada à navegação marítima, criando conflitos entre as operações em vias fluviais que em muito se diferenciam da navegação marítima. A região norte, o Amazonas e precisamente o Porto de Manaus necessita desse olhar diferenciado haja visto as particularidades locais são muitas e não há de se comparar com as demais regiões do Brasil. Nesse sentido, a adaptação de regras e regulamentações para a navegação mista hidroviária faria todo o sentido, pois garantiria que todos os armadores pudessem se modernizar e concorrer de forma equânime, possibilitando a abertura de novos postos de trabalho, maior agilidade para o transporte de alimentos e mercadorias oriundas ou destinadas ao interior do estado do Amazonas. Referências Bibliográficas BRASIL. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. BRASIL. Lei nº 12.815, Decreto 8.033 de 5 de maio de 2013. BRASIL. Lei nº 9.537, de 27 de novembro de 1997. BRASIL. Lei nº Lei nº 9.432, de 05 de junho de 1997. BRASIL. Resolução nº 1.558-ANTAQ, 11 de dezembro de 2009. Aprova a Norma para Outorga de Autorização para Prestação de Serviço de Transporte de Cargas na Navegação Interior de Percurso Longitudinal Interestadual e Internacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 17/12/2009, seção I, p. 2. BRASIL. Resolução nº 912-ANTAQ, 23 de novembro de 2007. Aprova a Norma para Outorga de Autorização para Prestação de Serviço de Transporte de Passageiros e de Serviço de Transporte Misto na Navegação Interior de Percurso Longitudinal Interestadual e Internacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 28/11/2007. 15 COUTO, Mayra H.S.H. Qualidade de vida dos usuários do transporte fluvial na Amazônia: Acessibilidade e políticas públicas. 2015. 219 p. Tese (Doutorado em Ciências – Desenvolvimento Socioambiental) - Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, 2015. FURTADO, Lourdes G. Comunidades tradicionais: sobrevivência e preservação ambiental. In: D’INCAO, M. A.; SILVEIRA, I. M. (Org.). A Amazônia e a crise da modernização. 2. ed. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2009. p. 67-74. JORNAL NAVEGANDO A NOTÍCIA. Prémio ANTAQ 2019. Brasília, Ano X, Nº 46, 2019. MEDEIROS, Juliana T.S. O transporte fluvial e o direito à dignidade da pessoa humana na Amazônia. (2012). 99 p. Dissertação (Mestrado em Direito Ambiental) – Escola Superior de Estudos Sociais, Universidade do Estado do Amazonas, 2012. NOGUEIRA, Ricardo J.B. Transporte Fluvial e território na Amazônia. In: ARAGÓN, L.E.; CLUSENER-GODT, Miguel. Problemática do uso local e global da água da Amazônia. Belém: UFPA, 2003. p. 199-206. PINHEIRO, Ana Maria G.S. Transporte fluvial nas ilhas da área metropolitana de Belém. In: Simpósio Amazônia, cidades e geopolítica das águas [Anais...]. Belém: NAEA; UFPA, 2003. p. 21-24. PIRES JR., Floriano C.M.; ASSIS, Luís F.; SILVA JR., José A.F.DA.; ANTOUN, Augusto R.; PEREIRA, Francisco S.; SOUZA, Cristiano M. Transporte fluvial de passageiros na Amazônia: Regulamentação do setor e segurança da navegação. Segundo Relatório Intermediário de Pesquisa Roadway. Rio de Janeiro: PENO/COPPE/UFRJ, 2003, 125p. VIANNA, Godofredo M.; MARQUES, Lucas L. Direito Marítimo – Atualidades e Tendências. Rio de Janeiro: FGV, 2018, 250p.
Compartilhar