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Teoria do Conhecimento Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr. Valter Luiz Lara Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval 5 • Introdução • 1ª parte: Teoria do Conhecimento na História da Filosofia Antiga • 2ª parte: Teoria do conhecimento na história da filosofia medieval · Conhecer os principais problemas, teorias e autores que marcaram as noções de conhecimento do mundo antigo e medieval, de modo que o aluno aprenda a reconhecer os termos das grandes controvérsias em torno do ceticismo, da lógica e do acesso à realidade através dos conceitos. Seja bem-vindo ao estudo de autores que marcaram profundamente a história não só do pensamento humano, mas de toda a consciência que temos de nós mesmos e de nosso relacionamento com o mundo. O objetivo dessa unidade é apresentar alguns dos autores da história antiga e medieval que são considerados os mais importantes para a filosofia; aqui, porém, eles serão destacados naquilo que contribuíram mais especificamente no campo da investigação do conhecimento. Chamamos sua atenção para perceber em cada autor o possível legado que ainda hoje podemos reconhecer no modo como conhecemos o mundo. Embora a linguagem deles possa parecer estranha, muito do que disseram e escreveram de alguma forma influenciou a história que produziu o que somos e pensamos hoje. Procure ler, ver e ouvir o que foi proposto ao longo dessa unidade de modo que o aprendizado seja tão prazeroso que a exigência da disciplina seja assumida com o gosto de quem, ao final, ainda quer mais... Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval 6 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval Contextualização Em seguida, veja como ela faz menção aos princípios da filosofia dialética de Heráclito, filósofo pré-socrático que propôs uma leitura da realidade segundo o movimento constante. Parmênides, outro filósofo, seu contemporâneo, defendeu princípio oposto. O debate não parece ter sido resolvido. A vida, como na letra dessa música de Lulu Santos e Nélson Motta, continua desafiando nossa interpretação: se ela é movimento, mudança e transformação constante o que nela permanece? O que nesse movimento pode ser identificado como o mesmo? Qualquer que seja a teoria do conhecimento precisa retomar o problema de Heráclito e Parmênides.Cada filósofo e, na verdade, cada pessoa, acaba, ao final das contas, tendo que resolver, ao menos para dar sentido a sua vida e a seu modo de ser no mundo, o problema da mudança e da multiplicidade dos seres em continua transformação. Pense nisso quando começar a ler o texto teórico. Ouça a música de Lulu Santos e Nélson Motta, Como uma onda, e preste atenção na letra: http://www.vagalume.com.br/lulu-santos/como-uma-onda-no-mar.html 7 Introdução A filosofia antiga e medieval abrange um largo período da história, muitos autores e uma diversidade enorme de temas. A teoria do conhecimento nem sempre foi o foco principal da atenção dos filósofos nesses dois períodos. A consciência mais explícita de uma filosofia que se ocupa do conhecimento como seu objeto privilegiado de reflexão é produto da filosofia moderna. Entretanto, os elementos próprios da teoria do conhecimento podem ser inferidos de qualquer sistema filosófico, mesmo que ele não expresse nada sobre gnosiologia1 propriamente dita. Afinal de contas, não há como fazer conhecimento se não há pressupostos teóricos sobre o que é ou o que significa conhecer. Desse modo, o trabalho nessa unidade exige a seleção do que julgamos ser fundamental para se ter uma visão de conjunto das principais contribuições da filosofia para aquela disciplina que mais tarde os modernos chamaram de Teoria do Conhecimento. Segue, assim, um breve sumário dos tópicos que irão retratar aspectos importantes da teoria do conhecimento em construção nesses dois momentos da história. 1ª parte: Teoria do Conhecimento na história da filosofia ANTIGA Os pré-socráticos: a racionalidade como critério de investigação da realidade Os sofistas e a centralidade do discurso na busca do conhecimento Sócrates e a busca do conhecimento através do método maiêutico Platão: o conhecimento das ideias Aristóteles e os fundamentos do conhecimento a partir do regramento lógico O período helenístico: ética, ceticismo, ecletismo e o renascimento do platonismo e aristotelismo 2ª parte: Teoria do Conhecimento na história da filosofia MEDIEVAL Dos sistemas filosóficos gregos para as filosofias cristãs da época patrística Agostinho como ponto alto do contato entre filosofia e teologia A filosofia escolástica e o clássico tema dos “universais” Tomás de Aquino, a reconciliação da teologia cristã com Aristóteles e o equilíbrio entre fé e razão Os principais problemas e teorias que envolvem os esforços de reflexão sistemática em teoria do conhecimento já estão presentes no desabrochar da filosofia antiga e medieval. A busca da verdade através de um método que seja seguro para atingir o que se espera ser conhecimento verdadeiro sobre as coisas é o elemento permanente da investigação filosófica de todos os tempos. O fato é que nem sempre essa preocupação ocupa o lugar central do debate filosófico, pois tanto a filosofia antiga como a medieval são muito mais filosofia do ser 1 Gnosiologia é sinônimo de teoria do conhecimento. Do grego gnose, que significa conhecimento, e logia, que do grego mais livremente traduzimos como discurso, estudo ou racionalidade. 8 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval do que do conhecer, elas estão devotadas às questões que buscam compreender a realidade em geral. O mundo, a sua ordem universal, o movimento e os princípios que regem o cenário que se vislumbra ao sujeito são os objetos principais da reflexão filosófica desses dois períodos. O método, as fontes, as formas e o processo do conhecimento acabam aparecendo, mas apenas como consequência da necessidade de estabelecer regras e critérios claros e mais seguros sobre o conhecimento da realidade. O conhecimento do conhecimento já está subentendido nesse processo, mas ainda não é a questão central. Com essa consciência e distinção entre a filosofia do ser e a do conhecer vamos iniciar a primeira parte apresentando o que da filosofia antiga mais pode ser identificado com os temas da teoria do conhecimento. Para favorecer uma visão dos autores mais importantes da filosofia nesse período, abaixo transcrevemos dois breves quadros: o primeiro mostra uma linha que resume o modo como o Ocidente divide os diferentes períodos de nossa história, incluindo, além da história antiga e medieval, a moderna e contemporânea; o segundo mostra, na mesma linha, os principais filósofos que serão apresentados nesta unidade. Grécia Arcaica Período das narrativas míticas Filosofia Antiga Filosofia Medieval Mitologia Séc. VI a.C - VI d.C VII ao XIV • Cosmos (mundo) • Viagens Marítimas • Moeda • Cidades • Escrita • Política • Valorização do diálogo entre fé e razão • Teocentrismo • Padres Igreja • Pensadores - Pré-socráticos - Sofistas Platão Sócrates Aristóteles • Pensadores - Patrística Agostinho - Escolástica Anselmo Tomás de Aquino 9 1ª parte: Teoria do Conhecimento na História da Filosofia Antiga Os pré-socráticos: a racionalidade como critério de Investigação da realidade Nas origens da filosofia estão aqueles pensadores que foram chamados de pré-socráticos ou físicos2. Antecessores de Sócrates, inauguram uma forma de pensar o mundo que acaba estabelecendo o que vai caracterizar a identidade de toda a filosofia no mundo ocidental, a saber, o seu caráter exclusivamente racional na busca pelo conhecimento das coisas. Com Tales de Mileto (624-547 a.C.)3, inicia-se a busca pelo princípio que possa explicar a ordem de todos os seres. A palavra grega “arché”, que traduzimos por “princípio”, expressao alvo dessa inquietação que funda a filosofia ao propor uma nova forma de conhecer a realidade centrada não mais no uso das narrativas míticas, mas no uso do método da observação racional, sistemática e criteriosa da realidade física em si mesma. Mais do que o resultado da busca pela “arché” de todas as coisas, importa o legado da forma de conhecimento deixada pelos pré-socráticos. Tales achava que a água era o elemento físico originário de tudo o que existe, a resposta foi muito rapidamente questionada e outros elementos foram sugeridos: o ar (Anaxímenes [585-525 a.C.]); algo indeterminado (Anaximandro [610-547 a.C.]); os números (Pitágoras [viveu em torno do ano 530 a.C]); água, ar, terra e fogo (Empédocles [viveu em torno do ano 450 a.C]); o átomo (Lêucipo [nascimento após 460 a.C.] e Demócrito [460-370 a.C.]). Para os propósitos de uma teoria do conhecimento que funda a filosofia, importa destacar três coisas: a ruptura com o mito; a busca pela totalidade; observação objetiva da realidade. 1. Há uma ruptura com o mito. O modo de pensar e de buscar as causas dos fenômenos em eventos cuja causalidade se encontra fora deles, isto é, nos deuses, cede lugar para a observação da natureza. Por isso, esses filósofos são chamados de físicos, da palavra grega “phisis”, que pode ser traduzida como natureza. 2. A busca pela totalidade. A necessidade de explicação racional diante da multiplicidade das coisas e da complexidade do real começa a exigir sistematização, ou seja, organização do pensamento. A unidade do real deve ser verificada segundo uma visão de conjunto que inclua e recupere não o que está fora dela, mas o que a constitui como seu centro de referência e, ao mesmo tempo, fundamento originário. 3. A observação da ordem cósmica segundo a própria dinâmica das coisas observadas. Os pré-socráticos são, na verdade, os primeiros filósofos a estabelecerem uma forma de conhecimento voltada para garantir objetividade na abordagem da realidade. O critério do 2 Destes filósofos originários temos pouca coisa escrita. O que temos são fragmentos dos ensinos e ditos que eles legaram para seus discípulos e outros escritores que, mais tarde, os citaram – como Platão, Aristóteles e outros historiadores e filósofos da antiguidade como Teofrasto, Sexto Empírico, Diógenes Laércio, Plutarco, Estrabão, Simplício, Próculo, Porfírio, Hipólito, Clemente de Alexandria e Orígenes, entre outros. De Sócrates, que não deixou nada escrito, por exemplo, o que nos restou está indicado principalmente nas obras de Platão. Por isso, fundamentamos nossa reflexão sobre a teoria do conhecimento dos pré-socráticos com base nos fragmentos compilados dos textos desses autores antigos. Sugerimos a consulta da obra organizada por Gerd Bornheim (1977) para a leitura dos fragmentos mais citados dos pré-socráticos – eles já estão traduzidos para a língua portuguesa. 3 As datas de nascimento e morte para os filósofos pré-socráticos são, para maioria deles, aproximadas. Seguimos aquelas que foram indicadas por Bornheim (1977). 10 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval conhecimento é dado pelo objeto que se observa em sua unidade e harmonia com os demais objetos. Trata-se de uma razão voltada para fora do sujeito e totalmente devotado a esclarecer o nexo causal constitutivo que unifica a realidade. Filósofos como Parmênides (viveu em torno de 500 ou 475 a.C.) e Heráclito (viveu por volta de 504 e 500 a.C.) darão as bases para toda a discussão posterior sobre o que de fato constitui a essência da realidade. O problema do ser, abordado por esses dois autores, aparece como expressão da mais alta capacidade do ser humano pensar abstratamente a realidade. O ser é, em linguagem filosófica, o ponto de chegada da busca pré-socrática pela totalidade e, de certa forma, de toda a filosofia para abarcar tudo o que existe. Embora a leitura clássica do debate entre Parmênides e Heráclito seja feita a partir da metafísica ou ontologia4, podemos interpretá-la à luz da teoria do conhecimento. Parmênides prefere submeter a observação da realidade, isto é, do ser, à lógica da não contradição do discurso. Segundo ele, o ser é e não pode não ser, por isso, só existe o ser. O não-ser é uma ilusão e um engano. Do mesmo modo, conclui Parmênides, o movimento não existe a não ser como ilusão dos sentidos. Ao contrário, Heráclito defende o movimento como única realidade possível. Tudo é movimento e devir constante. Ilusão é a permanência ou a imutabilidade das coisas. Do ponto de vista da teoria do conhecimento, estão dados os pontos de partida opostos para compreensão do que de fato deve ser concebido como fonte e, por conseguinte, o melhor método para se atingir a verdade do conhecimento. Para Heráclito, a fonte é o devir constante; para Parmênides, o imutável. Quanto ao método, para Parmênides, o discurso não pode deixar-se contradizer pela realidade; para Heráclito, o discurso precisa admitir o movimento dos contrários como a base mais objetiva para compreensão das coisas. 4 Metafísica é, em filosofia, a palavra que designa a área da reflexão filosófica voltada para os objetos que estão “para além” ou “depois” (do grego: meta) da física. Outra leitura entende a metafísica de modo diferente, como a área da reflexão filosófica que visa responder as questões que fundamentam os princípios causais e originários que explicam a realidade que estão não “para além” ou “depois” da física, mas no interior mesmo da realidade física. Esta segunda maneira de entender a metafísica a coloca como sinônimo de ontologia, isto é, como estudo do ser enquanto ser. 11 Os sofistas e a centralidade do discurso na busca do conhecimento Nas contradições entre pensamento e ser, discurso e realidade, duas consequências imediatas podem ser extraídas: subjetividade e relativismo. O conhecimento torna-se refém da arbitrariedade e subjetividade humana. Filósofos como Protágoras (nasceu por volta de 491/481 a.C.) chegam a sentenciar: “o homem é a medida de todas as coisas”5; outros proclamam simplesmente o relativismo do conhecimento humano através do testemunho do ceticismo6. Os sofistas7, sábios pedagogos, foram profissionais da retórica apurada, fizeram do discurso profissão e instrumento para convencer suas platéias da verdade de suas teses e proposições8. Graças ao trabalho deles, a busca pela verdade do conhecimento prosseguiu o seu caminho, atingindo com Sócrates, Platão e Aristóteles um de seus momentos mais nobres. Sócrates e a busca do conhecimento através do método maiêutico Sócrates, como homem de seu tempo, procura responder às grandes questões que desafiaram o conhecimento do mundo através das polêmicas geradas pelos filósofos da natureza que o antecederam e os sofistas que se tornaram presas fáceis do discurso relativista. Nesse sentido, ele é o pensador que põe o ser humano no centro do debate filosófico. A inscrição famosa do templo de Delfos9, “conhece-te a ti mesmo”, torna-se o rótulo mais importante de sua filosofia. Os temas da cosmologia e da natureza ficam em segundo plano, enquanto o que se refere diretamente aos interesses da vontade e do agir humanos ganham cada vez mais espaço na discussão filosófica: ética, política, saber, justiça, direito, bem e mal, verdade e conhecimento tornam-se temas centrais de seu pensamento. Em termos de teoria do conhecimento, o maior legado de Sócrates é a superação do relativismo e a arbitrariedade da manipulação do discurso. A distinção entre doxa10 e episteme tornou-se propulsora de um novo método na busca da verdade. Para Sócrates, só a razão interrogante é capaz de superar as contradições do discurso produzido pela opinião e atingir uma forma de conhecimento mais seguro. O método é simples, supõe que o conhecimento já esteja na capacidade que o ser humano racional tem de chegar ao conceito mais preciso sobre as coisas. Maiêutica é o nome desse diálogo que interroga e questiona– Maiêutica nada mais é do que a arte da parteira que traz a criança para fora do ventre da mãe. O método maiêutico 5 Protágoras (Frag. 1), Apud GILES1979, p. 42. 6 O ceticismo é a corrente de pensamento filosófico que considera ser impossível atingir a verdade do conhecimento. Se a verdade existir, ela é inacessível ao conhecimento. Pirro (360-270 a.C) é um dos maiores expoentes do ceticismo, considerado seu fundador. 7 Sofistas famosos como Górgias (em torno de 485/480 a.C.), Pródico (em torno de 470/460 a.C.) e Hípias (final do séc. V a.C.) desenvolveram a retórica como técnica de aprimoramento do discurso e propuseram a impossibilidade da existência de verdades absolutas – ver comentário sobre esses e outros autores em Reale e Antiseri (1990, p. 78-84). 8 A ponderação de Reale e Antiseri relativiza o modo negativo como os filósofos sofistas são tratados: “‘Sofista’ é termo que significa ‘sábio’, ‘especialista’ do ‘saber’. A acepção do termo, que em si mesma é positiva, tornou-se, porém negativa sobretudo pela tomada de posição fortemente polêmica de Platão e Aristóteles. [...] o movimento sofista foi desvalorizado, sendo considerado predominantemente como momento de grave decadência do pensamento grego. Somente em nosso século é que foi possível revisão sistemática desses juízos e, consequentemente, radical reavaliação histórica desses juízos” (1990, p. 73). 9 O templo de Delfos em Atenas era conhecido por expor em seu portal de entrada a frase que Sócrates assumiu como sendo a mais importante da reflexão filosófica. 10 Doxa é palavra grega para a simples opinião dos sujeitos acerca das coisas. Episteme é palavra grega para expressar o que traduzimos por ciência, na acepção grega, conhecimento certo e seguro sobre a realidade e que ultrapassa a subjetividade da opinião (doxa) do sujeito. 12 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval de Sócrates tem função semelhante, isto é, trazer as ideias sobre as coisas para fora do sujeito. Desse modo é que Sócrates não só humaniza o conhecimento, mas atribui à relação “sujeito- objeto” uma nova consciência, a consciência ética da responsabilidade de que conhecer exige compromisso com suas implicações. Desse modo, ainda que se possa discordar da proposta socrática, o fato é que, para Sócrates, do ponto de vista da ética, do bem e da justiça, conhecer significa capacidade para realizar, pois segundo sua visão, não há como conhecer o bem e não praticá-lo. Platão: o conhecimento das ideias Platão deu continuidade às propostas de Sócrates, sistematizou não apenas as intuições fundamentais do mestre sobre o conhecimento e o método maiêutico, mas procurou dar conta de responder aos problemas levantados pelos pré-socráticos e sofistas. O problema da multiplicidade do real, o movimento perceptível aos nossos sentidos e a necessidade de unidade racional capaz de explicar de uma só vez a perenidade do ser e a variedade dos seres ainda desafiavam a mente do discípulo de Sócrates. A chave Platônica para resolver os problemas legados pela filosofia anterior está na distinção entre ser e parecer. Há uma realidade essencial que está para além das aparências, essas são acessíveis aos nossos sentidos, enquanto a outra, essencial, só acessível à razão do pensador. O processo que torna acessível a realidade perene que Platão chama de ideia é a dialética. Só pelo diálogo dialético, da contraposição e confronto entre as opiniões baseadas nos sentidos, é que se pode superar o conhecimento sensível (doxa) e caminhar para um conhecimento que vá para além das aparências e das opiniões apressadas sobre as coisas. Conhecer, para Platão, é superar a percepção dos sentidos e ser capaz de atingir pelo processo dialético o conceito racional que permite contemplar as ideias que dão a forma essencial às coisas. O mundo da matéria é aquele que é percebido pelos sentidos, enquanto o mundo das ideias é aquele que só pode ser acessado através da contemplação racional11. Fonte: eironeia.eu 11 A famosa alegoria da caverna presente no Diálogo A República ilustra bem o dualismo platônico que faz do filósofo aquele que conduz as pessoas a superarem a escuridão das sombras 13 A esta, por sua vez, só se chega depois de um longo processo de despojamento dos sentidos que se faz através do método dialético de contraposição entre a realidade sensível – mais aparente e ilusória – e a realidade ideal – essencial, inteligível e verdadeira. Aristóteles e os fundamentos do conhecimento a partir do regramento lógico O realismo de Aristóteles se contrapõe ao idealismo de Platão. A teoria do conhecimento aristotélica é o ponto de chegada da sistematização do modo grego de fazer ciência a partir da observação racional e criteriosa da realidade e, ao mesmo tempo, o ponto de partida para tudo aquilo que mais tarde se transformaria na ciência moderna. Aristóteles conseguiu, a partir da análise das respostas que os pré-socráticos deram ao problema da multiplicidade dos seres e ao modo platônico, equivocado em sua visão, de distinguir mundo sensível do inteligível, chegar a uma proposta de compreensão da realidade que equacionou movimento e permanência, entes particulares e ser universal que lhe dá unidade. As noções de ato e potência, matéria e forma, bem como as de causalidade como fatores geradores e determinantes dos seres permitiram a Aristóteles explicar não só o movimento, mas também a harmonia entre o ser e o aparecer, o sensível e o inteligível, o provisório e o permanente. Potência é a dimensão latente das coisas, pois elas guardam o poder escondido e ainda não manifesto de se transformarem em outras a partir do que elas são. Ato é a dimensão das coisas enquanto existem e estão sendo no momento presente. O exemplo típico de potência e ato está na semente: a semente é potência para ser árvore, e essa, por sua vez, é o ato presente de sua potência. As quatro causas do ser – a saber, causa material, formal, eficiente e final – explicam o ser em sua manifestação múltipla e móvel. A causa material refere-se à dimensão do que as coisas são feitas; a causa formal, por sua vez, diz respeito ao modo como uma coisa toma sua configuração específica, isso é, sua forma essencial; a causa eficiente é o agente desse processo em que forma e matéria se constituem para realizar a causa final, ou seja, ao objetivo pretendido pelo agente ao dar forma à matéria que usou para imprimir sua intenção. Em qualquer artefato ou coisa pode-se verificar a vigência das quatro causas – na obra de um artista plástico, como uma escultura, elas são facilmente identificadas: causa material (barro, madeira, cimento, metal, etc.); causa formal (o trabalho de configuração e moldura da matéria); causa eficiente (o artista); causa final (as intenções e finalidades que o artista vislumbrou e pretendeu imprimir em sua obra ao criá-la). Do ponto de vista da teoria do conhecimento, Aristóteles superou a discriminação da realidade sensível como etapa a ser negada pela dialética platônica para se atingir a verdadeira realidade. A proposta do conhecimento a partir do método indutivo resgata o valor dos sentidos na percepção dos seres particulares. Conhecer, para Aristóteles, é partir dos objetos particulares, observá-los, extrair semelhanças, qualificá-los e, pelo processo de abstração dessas semelhanças comuns existentes entre esse objetos, atingir o conceito universal. Por isso, diferente de Platão, Aristóteles considera que o conhecimento verdadeiro passa necessariamente pelos sentidos. 14 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval Outra grande contribuição de Aristóteles à teoria do conhecimento foi a construção de uma disciplina do saber filosófico que regrou o discurso e apontou os erros dos raciocínios equivocados, muitos deles, produzidos pelos sofistas. Aliás, Aristóteles denominou de silogismo12 a forma elementar do argumento discursivo. Procurou, assim,apontar as regras do silogismo correto para assim distingui-lo do falso silogismo. O falso silogismo ele chamou de sofisma, pois é aquela forma de argumentação que não cumpre as leis do silogismo correto. Desse modo, Aristóteles conseguiu oferecer, não só à filosofia, mas a qualquer forma de conhecimento que pretenda racionalidade, como é o caso da ciência, um instrumento seguro para tirar do caminho da verdade os obstáculos do relativismo e do subjetivismo. O período helenístico: Ética, ceticismo, ecletismo e o renascimento do platonismo e aristotelismo Helenismo é o movimento desencadeado pela dominação militar (334-323) de Alexandre Magno (334-323), que se impôs ao mundo mediterrâneo daquela época e levou as formas e cultura gregas de organizar a vida em sociedade para os povos dominados. O período helênico divulgou não só a língua, mas os costumes, a arte, literatura, política e filosofia gregas para territórios do Oriente Médio, Ásia e África, em nações como Egito, Síria e Israel. Foi um momento da história marcado por profundas transformações, inclusive de mudança de comando da dominação imperial. Roma irrompeu como a mais poderosa das forças vigentes até aquele momento e trouxe consigo novos desafios para a humanidade. Guerra e paz, liberdade e escravidão, encontros e desencontros entre povos, culturas e seus costumes, religiões e saberes deram um caráter cada vez mais cosmopolita à filosofia. Naturalmente, o intercâmbio e a difusão do conhecimento possibilitaram diferentes formas de ecletismo13 e, ao mesmo tempo, o ressurgimento de escolas que seguiam os grandes mestres do passado: Pitágoras, Platão e Aristóteles. A atenção nesse momento da história da filosofia voltou-se mais para as questões práticas da vida e menos para as especulações em torno do conhecimento. A ética ocupou o centro da reflexão. Filosofias como estoicismo, epicurismo, pitagorismo, platonismo e outras vertentes de tendências mais religiosas provenientes do oriente deram origem a formas de conhecimento mais contemplativas e mais preocupadas com caminhos que pudessem de verdade conduzir as pessoas para a felicidade. O encontro da fé religiosa com a filosofia vai mudar o caráter de ambas, inclusive os rumos da história do ocidente que hoje conhecemos. 12 Jacques Maritain descreve de modo bastante claro os principais conceitos, leis e exemplos da lógica aristotélica e assim define silogismo: “é uma argumentação na qual, de um antecedente que une dois termos a um terceiro, infere-se um consequente que une esses dois termos entre si” (MARITAIN, 1980, p. 195). Exemplo de silogismo: Todo homem é mortal. Ora, Valter é homem. Logo, Valter é mortal. Os dois termos (mortal e Valter) estão unidos a um terceiro (homem). 13 Ecletismo é a postura filosófica que reúne indiscriminadamente um conjunto variado de teorias e conceitos provenientes de distintos filósofos ou correntes filosóficas, sem a preocupação com coesão ou unidade sistêmica do pensamento. 15 2ª parte: Teoria do conhecimento na história da filosofia medieval Dos sistemas filosóficos pagãos para as filosofias cristãs da época patrística Com a conversão do imperador romano Constantino (272-337) à fé cristã no início do século IV e a transformação do cristianismo em religião oficial do império por Teodósio no final do mesmo século (391)14, a reflexão filosófica dominante será absorvida pela teologia, o que mais tarde, principalmente no período medieval, tornará os pensadores cristãos protagonistas da reflexão filosófica. Se por um lado, a religião se converte e submete suas verdades aos conceitos da filosofia grega, por outro, a filosofia grega acaba se transformando em serva da teologia, isto é, em instrumento e caminho para a expressão e compreensão mais claras da fé. O período da história patrística é aquele em que predominam os pensadores e teólogos cristãos. Geralmente, os pensadores, considerados pais ou padres da igreja15, são aqueles líderes do povo cristão que procuram, no interesse da fé (apologia), apresentar e desenvolver em linguagem e conceitos filosóficos os grandes temas da religião. Nesse período, acontece o processo de reinterpretação de sistemas filosóficos gregos pagãos como o de Platão à luz das novas exigências da fé cristã. O mundo e o ser humano divididos em matéria e espírito, realidade sensível e mundo supra-sensível serão facilmente integrados no horizonte de interpretação da linguagem religiosa que separa vida terrena e vida depois da morte, corpo e espírito, luz e trevas, terra e céu. Movimentos gnósticos16 e outras correntes de pensamento cristão irão desenvolver práticas contemplativas e extáticas de conhecimento como meio de acesso, de comunicação e comunhão com a divindade. Agostinho como ponto alto do contato entre filosofia e teologia A trajetória de Agostinho (354-430) é dolorosa e maravilhosamente exemplar para um filósofo que busca incansavelmente o sentido da vida e a verdade da existência. Viveu de modo intenso o caminho de quem se torna de fato amigo do sábio (Filos + Sophos). Depois de trilhar o caminho do maniqueísmo17 e do ceticismo, aderiu finalmente às verdades da revelação cristã, as quais proclamou até o final da vida sob o pano de fundo da filosofia neoplatônica. Sua obra é marcada pela profundidade do pensamento reflexivo e pela certeza de que a verdade está em Deus. Por isso, o caminho da fé, embora reconheça ser dominado pelo mistério do incompreensível, não elimina o esforço da razão em identificar os sinais inteligíveis que o criador deixou em sua obra. 14 É o famoso Edito de Milão de 13 de junho de 313 que oficializou, após a conversão de Constantino (governou o império de 306 a 337), a tolerância e liberdade de culto para a religião cristã e o fim de sua perseguição, mas o cristianismo só se tornou a religião oficial do império sob Teodósio (governou o império de 379 a 395) em 391. 15 Patrística é termo que deriva do latim “Pater”. Padres ou pais da Igreja são aqueles homens que representaram em sentido mais abrangente a ortodoxia (normas e dogmas oficiais) defendida pela igreja em seu credo e doutrina. Trata-se de escritores, teólogos e filósofos que marcam o período histórico que abrange o século II ao VI da Era cristã. Nomes bastante conhecidos desse período são: Inácio, Irineu, Justino (séc. II), Orígenes, Tertuliano (séc. III), Basílio, Crisóstomo, Ambrósio (séc. IV), Jerônimo, Agostinho (séc. V), Gregório Magno (séc. VI e VII), Isidoro (séc. VII), entre outros. 16 Gnóstico é o movimento religioso de origem diversa presente tanto no judaísmo helenístico quanto no cristianismo primitivo que considera a gnose (conhecimento) como meio de acesso à divindade. 17 Maniqueísmo é a doutrina filosófica atribuída a Mani (séc III) da Pérsia que defendia o universo como sendo criado por dois princípios opostos e irreconciliáveis: Deus como bem absoluto e o Diabo como expressão absoluta do mal. 16 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval A teoria do conhecimento de Agostinho retoma a dicotomia de Platão que separa conhecimento sensível do conhecimento intelectual, corpo e alma, céu e terra. Nesse sentido, sua maior contribuição talvez tenha sido a consolidação de um caminho já iniciado pelos autores cristãos que o antecederam: aproximação e diálogo entre fé e razão. A fé busca compreensão e, embora nem sempre se saiba com a clareza do conhecimento intelectual o que se crê, pode-se crer na certeza de que a verdade é uma busca que termina apenas no conhecimento de Deus e não se esgota com o esforço humano. Só Deus tudo sabe e, por sua graça, garante a verdade ao final do processo18. Creio tudo o que entendo, mas nem tudo que creio também entendo. Tudo o que compreendo conheço, mas nem tudo o que creio conheço (AGOSTINHO, De Magistro, p. 319, Apud COTRIN, 2002, p. 121). Com Agostinho, está aberto o caminho para a filosofia medieval, serva fiel da Sagrada Teologia,considerada assim pela Igreja dominante em território europeu ao longo desse período (séculos V ao XV). A filosofia escolástica e o clássico tema dos “universais” No mundo medieval, a filosofia é produto de uma sociedade dominada pela cultura e poder vinculados à Igreja cristã. A Escolástica é, nesse contexto, o nome dado ao conjunto das doutrinas, filosofias e teologias que foram geradas por escolas e universidades estreitamente ligadas e submetidas, inclusive fisicamente, às igrejas, catedrais e espaços eclesiásticos. Até o século XIII quando começa a formação das universidades, as escolas eram monacais (anexas a uma abadia), episcopais (anexas a uma catedral) e palatinas (anexas à corte: palatium). [...] A partir do século XIII, a escola se configura como universidade, que é produto típico da Idade Média. [...] A cultura medieval floresceu juntamente com essas instituições, primeiro as scholae e depois a universitas. Pois por escolástica entendemos precisamente aquele corpo doutrinário que, inicialmente de forma bastante inorgânica e depois de modo sempre mais sistemático, foi elaborado nesses centros de estudo, nos quais encontramos dedicados a escrever e ensinar, homens criativos, frequentemente dotados de grande capacidade de crítica e agudeza lógica (REALE; ANTISERI, 1990, p. 478, 480-481). 18 Sobre o tema da verdade em Agostinho, ver o comentário de Reale e Antiseri (1990, p. 440) e a citação que fazem de uma passagem de A verdadeira religião do próprio Agostinho: “A verdade está no interior da alma humana [...] Convence-te de que não és tu o que é a verdade: a verdade não busca a si própria, mas és tu, distinto dela, que a buscas – naturalmente, não no espaço sensível, mas com a sensação da alma [...]”. 17 A sintonia entre fé e razão, filosofia e teologia marcou os princípios do que ficou conhecido como período dos autores escolásticos. É preciso reconhecer que tal sintonia estava a serviço de uma razão pragmática de defesa da fé diante dos adversários da religião cristã, mais frequentemente os mulçumanos. As cruzadas não se deram apenas com armas de guerra, mas com o apoio da filosofia e sua lógica racional. Era preciso conciliar e demonstrar a fé também no nível dos argumentos meramente racionais, e não apenas com os princípios da revelação. Nesse momento, procurava-se desenvolver argumentos que demonstrassem, por meio do uso da razão, provas da existência de Deus. Anselmo de Aosta, Arcebispo de Cantuária (1033-1109), por exemplo, foi um dos expoentes desse modo de fazer a filosofia servindo os interesses da teologia19. No centro de seu pensamento, está a característica mais importante da escolástica: a fé como pressuposto fundamental para o trabalho da razão. Crer para compreender resume o princípio desse período de interlocução e diálogo entre fé e razão. Como contribuição mais direta à teoria do conhecimento, a polêmica mais significativa desse período se deu em torno do que ficou conhecido como o tema dos “universais”. A divisão ternária (trivium: gramática, retórica e dialética) e quaternária (quadrivium: geometria, aritmética, astronomia e música) dos estudos feita pela escolástica privilegiava de certa forma o discurso, seu método e o aprimoramento lógico da linguagem em detrimento do conteúdo ou dos objetos visados pelo discurso. A palavra como representação e veículo das ideias ganhou importância capital na construção do saber, a ponto de se levantar a questão da existência independente das ideias gerais sobre as coisas – daí o sentido do termo “universais”, concebido como propriedades ou características que identificam e qualificam os objetos: bondade, beleza, leveza, largura, dureza, brancura, etc. A questão é simples, mas de solução controversa: as ideias e os conceitos universais que qualificam ou dão a essência das coisas particulares existem em si mesmas fora dos objetos singulares ou são apenas abstrações e nomes que só representam as coisas, mas coisas mesmo não são? Realistas e nominalistas divergiam a esse respeito. Os realistas20 defendiam que os “universais” existem por si mesmos independentes das coisas. Bondade e beleza, por exemplo, são realidade e entidades, isto é, seres que moldam e possibilitam que as coisas particularmente boas e belas sejam criadas. Os nominalistas21, ao contrário, afirmavam os “universais” como meros nomes representativos e produtos da convenção humana sobre os seres particulares, e como tais não existem fora desses. 19 Anselmo escreveu em sua obra Proslogion o famoso argumento ontológico em favor da existência de Deus. Esse argumento basicamente consiste na ideia de que se o Deus que se pensa pressupõe a perfeição e é a maior coisa que existe, não é possível que ele não exista na realidade fora da mente. Por isso o argumento é ontológico: pois da ideia de Deus se infere obrigatoriamente a sua existência. 20 Anselmo de Aosta, Arcebispo de Cantuária, era realista quanto aos “universais”. 21 Roscelin de Compiègne (1050 – 1120 aproximadamente) é um expoente dos nominalistas. 18 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval Tomás de aquino, a reconciliação da teologia cristã com Aristóteles e o equilíbrio entre fé e razão A presença do platonismo no pensamento cristão estava garantida e consolidada com os filósofos e teólogos da Patrística. Aristóteles permanecia como suspeito por rejeitar a imortalidade da alma e conceber Deus de um modo impessoal e nada parecido com o criador da revelação cristã. Tomas de Aquino (1280-1349) representa a interpretação cristã do mundo em chave aristotélica. A metafísica, antropologia e lógica de Aristóteles serão incorporadas pela filosofia de Tomás de Aquino sem o temor do realismo do primeiro. Com Tomás, o cristianismo faz as pazes não só com Aristóteles, mas com o mundo sensível e com as sensações do corpo, que são etapa preliminar do ato de conhecimento. Na concepção do ser humano como síntese entre corpo e alma encontra-se o fundamento da intelecção que a alma efetua no processo de conhecimento. Tudo começa com a percepção da realidade através dos sentidos. A metafísica das quatro causas em harmonia com elementos da antropologia de Aristóteles oferecem o essencial para a compreensão da teoria do conhecimento em Tomás de Aquino. Matéria e forma, ato e potência entram em cena para explicar no ser humano como se dá o conhecimento: O homem é uma síntese do material e do imaterial, um composto do corpo e alma racional. A alma racional é a forma, o ato do corpo numa união íntima. Ela depende do corpo para a experiência e para o conhecimento. Tendo por ponto de partida as coisas sensíveis, tais como existem, é preciso que o intelecto se encontre com o elemento inteligível, a forma, ou seja, a ideia realizada e concretizada na matéria. O inteligível se encontra em potência nas coisas. Para que se torne inteligível em ato, é preciso que intervenha uma faculdade ativa, o intelecto ativo que trabalha sobre os dados previamente adquiridos do conhecimento sensível. Essa atividade realiza-se em dois momentos: no momento da ativação do sentido externo pela sensação e no momento da ativação do sentido interno pela imagem, elaborada a partir da sensação. É dessa imagem que o intelecto ativo extrai a ideia, o núcleo inteligível (GILES, 1979, p. 59). Esse realismo aristotélico presente no pensamento de Tomás ajudou a teologia e filosofia cristãs a superar preconceitos imensos que a mentalidade medieval havia produzido ao assumir o platonismo como seu principal interlocutor no campo da filosofia. Dessa forma, o mundo das experiências sensíveis e do corpo como centro das sensações deixaram de ser irrelevantes no processo de conhecimento da realidade. A experiência como fonte do conhecimento e, em alguns casos, centro da atenção dos analistas do processo do conhecimento já apontava o horizonte que a ciência moderna transformaria em sua principal referência. 19 MaterialComplementar Vídeos: Para completar seus estudos, que tal acompanhar no Youtube a aula do prof. Ítalo Silva? Ele começa apresentando uma linha bastante ilustrativa da história da filosofia. Segue o link para acessá-la: https://www.youtube.com/watch?v=cQYnLk_RPJE Filmes: O nome da Rosa (1986, Itália/França/Alemanhã, Direção: Jean-Jacques Annaud) Adaptação para o cinema da obra homônima de Umberto Eco. O ambiente é um mosteiro dominicano no séc. XIII, no qual ocorre uma série de mortes misteriosas. Temas interessantes estão presentes: relação entre fé, teologia, ciência e filosofia, intolerância religiosa, heresia, inquisição, etc. Em nome de Deus (1988, Inglaterra/ Iugoslávia, Direção: Clive Donner). Retrata a história de Abelardo e Heloísa e o ambiente medieval do século XII, marcado pelo nascimento das escolas e universidades ligadas à igreja. No filme, aparece a famosa Universidade de Paris entre os anos de 1114 e 1118. São mostrados os impasses e conflitos de uma mentalidade cristã desafiada por novos métodos de ensino filosófico mais abertos ao debate de temas polêmicos para a época. 20 Unidade: Teorias do conhecimento na história da filosofia antiga e medieval Referências AZEVEDO, André Nunes de. A reforma Pereira Passos: Uma tentativa de integração urbana, In: Revista Rio de Janeiro /Dossies nº. 10. Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro, 2003. AGASSIZ, L.; AGASSIZ, E. C. Viagem ao Brasil: 1865-1866. Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: EDUSP, 1975. 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