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1 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Sinapses e Condução Nervosa INTRODUÇÃO Sinapse é a região especializada onde se tem a transmissão da informação de uma célula para outra. Essa sinapse pode ser elétrica, quando há um acoplamento elétrico entre as duas células, o que ocorre através das junções comunicantes. Ou pode ser uma sinapse química, quando a transmissão é feita através a mediação de um neurotransmissor. Lembrando que neurônio pré-sináptico é aquele que traz (conduz) a informação do potencial de ação para o neurônio pós-sináptico. TIPOS DE ARRANJOS SINÁPTICOS Essas sinapses podem ocorrer na configuração de 1 para 1 (Ex.: Junção Neuromuscular, onde 1 neurônio inerva 1 fibra muscular). Podemos, também, ter uma configuração e uma célula para muitas, que seria a divergência do sinal (Ex.: Células de Renshaw da medula espinhal ou no Sistema Sensorial, quando se sente um cheiro e, além de sentir, tem uma resposta emocional a ele por exemplo). Ou ainda, uma configuração de muitas células para uma só, que seria a convergência do sinal, esse último tipo é o mais comum no sistema nervoso (Ex.: Núcleo Olivar Inferior, que recebe informações proprioceptivas e de SNC mais ascendente antes dessa informação adentrar a região do cerebelo). CLASSIFICAÇÃO DAS SINAPSES As sinapses podem ser classificadas quanto à localização, quanto à função e quanto às estruturas envolvidas. Quanto à localização, existem sinapses centrais (localizadas no cérebro e na medula espinhal) e sinapses periféricas (localizadas nos gânglios e placas motoras). Quanto à função, existem sinapses excitatórias e inibitórias, em relação às sinapses químicas mais especificamente, visto que depende do neurotransmissor. Quanto às estruturas envolvidas, existem as sinapses axo-somática, axo-dendrítica, axo-axônica, dendro- dendríticas e axo-somática-dendrítica. Sendo que as mais comuns são as axo-somática e axo-dendrítica. CAP. 6 - BERNE / PROFA. ALESSANDRA 2 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 TIPOS DE SINAPSE Como já dito, as sinapses podem ser, principalmente, de dois tipos quanto à forma de condução de estímulo de uma célula para outra: Sinapses elétricas ou sinapses químicas. SINAPSE ELÉTRICA As sinapses elétricas são pouco comuns no SNC. Ocorre através de um acoplamento elétrico da membrana da célula pré-sináptica com a membrana da célula pós-sináptica. Têm-se proteínas chamadas de conexinas se juntam e formam um conéxon, portanto existe um conéxon na célula pré-sináptica e um conéxon na célula pós-sináptica. Esses dois conéxons, então, se juntam e formam uma junção do tipo GAP (GAP junction). Esse sinal passa mais rapidamente (do que o da sinapse química) porque não precisa de nenhum neurotransmissor para mediar a condução (é mais direta) e o estímulo é conduzido, então, rapidamente para a célula pós-sináptica. Esse tipo de sinapse ocorre em muitos tecidos, até em outros tecidos excitáveis sem ser o nervoso (ex.: miócitos cardíacos e algumas células musculares lisas). Em relação a esse tipo de sinapse, existem as sinapses recíprocas, quando ela passa nas duas direções (bidirecional), isto é, as correntes elétricas passam com igual eficiência em ambas direções. Existem, também, as sinapses retificadoras, que tende a passar o sinal em um único sentido (é transmitida mais facilmente para um único lado), isso pela presença de algumas isoformas de conexinas voltagem- dependentes. Essas conexinas, formando os conéxons e as GAPS, vão sincronizar a atividade de grupos neuronais e estão presentes em tecidos, como no tecido cardíaco (impedindo que ocorra contração de átrio e ventrículo ao mesmo tempo por exemplo). SINAPSE QUÍMICA As sinapses químicas são um pouco mais moduladas, visto que dependem da liberação de neurotransmissores. Esses neurotransmissores saem da membrana pré-sináptica e são lançados na fenda sináptica, visto que precisam chegar em receptores na membrana pós-sináptica. Essa sinapse é um pouco mais equilibrada, bem regulada e demorada, visto que depende da interação de um neurotransmissor específico com o seu receptor. É chamada de unidirecional por muitos livros, mas pode haver uma modulação retrógada, que seria a célula pós-sináptica modulando a célula pré- sináptica. De forma geral, o potencial de ação gerado no cone axônico vai chegar na terminação sináptica. Com a chegada desse potencial de ação, há uma despolarização dessa terminação sináptica, OBS.: Existem conexinas voltagem-dependentes / Junções comunicantes = via de baixa resistência para passagem de corrente eletroeletrônica. Ex.: Existem neurônios pós-sinápticos que liberam NO (Óxido Nítrico) que se difunde para o elemento pré-sináptico e controla a liberação de neurotransmissores. 3 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 causando uma abertura dos canais de cálcio voltagem-dependentes, o cálcio entra e estimula as vesículas contendo o neurotransmissor a sofrerem exocitose. Com a exocitose, o conteúdo da vesícula é liberado para poder interagir com o receptor na membrana pós-sináptica, onde existem enzimas que posteriormente vão degradar esse neurotransmissor ou eles podem ser captados de volta e metabolizados na terminação sináptica (depende do tipo de neurotransmissor). NEUROTRANSMISSORES E VESÍCULAS Nós possuímos neurotransmissores de peso molecular mais alto, que são sintetizados na região do corpo celular junto com as vesículas, que têm a geração dependendo do retículo endoplasmático rugoso e do complexo de Golgi. Pelos microtúbulos elas são transportados até a terminação sináptica, alguns tipos de neurotransmissores também. Essa região de microtúbulos se estende desde a região do cone axônico até a terminação sináptica e existem 4 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 2 proteínas que fazem esse tráfego de vesículas tanto do corpo para a terminação, quanto da terminação para o corpo, que são a dineína e a cinesina. Alguns tipos de neurotransmissores, principalmente os de origem peptídica (ADH, por exemplo), vão ser sintetizados e já empacotados dentro das vesículas para serem levados até a terminação. Como os neurotransmissores não-peptídicos são bem pequenos (baixo peso molecular), eles já são sintetizados na terminação, ao exemplo da Acetilcolina. Nesse caso da acetilcolina, exemplificando os neurotransmissores não peptídicos, a vesícula vem vazia do corpo celular até a terminação, possuindo uma bomba de hidrogênio e um receptor que capta a acetilcolina (produzida na terminação) para dentro da vesícula, esse receptor é ativado pela alteração do pH criada pela bomba (a medida que a bomba funciona, o pH da vesícula se altera e receptores são ativados para o empacotamento da acetilcolina). Depois da formação da vesícula, ela é ancorada na membrana junto com a actina e uma proteína chamada sinapsina. Quando há o aumento do cálcio intracelular (influxo), essa sinapsina se desfaz liberando essas vesículas, que se dirigem a zona ativa, que é a zona que vai ancorar a vesícula. Após a exocitose, há uma proteína nessa zona ativa chamada de clatrina, que vai envolver a vesícula exocitada e puxa ela para dentro de volta, para reaproveitamento. 5 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 PROTEÍNAS DAS VESÍCULAS Mostrou uma imagem mais específica da vesícula e as proteínas na sua membrana. Recapitulando... Na vesícula, há a bomba de hidrogênio, que quando está ativa, joga o hidrogênio para dentro, criando um pH favorável para ativar o transportador que transporta o neurotransmissor para dentro da vesícula. Além desse complexo, existem algumas outras proteínas importantes (sinaptobrevina, sinaptogamina, sinaptofisina e sinapsina). Essa sinapsina é aquela que ancora. Ela temum ponto de fosforilação pela proteína quinase dependente de calmodulina 2 (CAMKII). Então, quando o cálcio aumenta (influxo), ele se liga à calmodulina e o complexo cálcio- calmodulina ativa essa quinase dependente de calmodulina, que fosforila a sinapsina, fazendo com que ela libere as vesículas que estão ancoradas. Resumindo, a sinapsina interage com proteínas do citoesqueleto, é fosforilada por PKA e CAMKII. Com o aumento do cálcio, a sinapsina é fosforilada, se destaca e permite que a vesícula se mova para as zonas ativas. A sinaptobrevina é uma proteína que é essencial para a liberação do neurotransmissor. É alvo de toxina botulínica, que acaba impedindo a exocitose do neurotransmissor. No caso da acetilcolina, que é imprescindível para a contração muscular, se não há liberação, a contração muscular diminui ou cessa. A sinaptogamina é o receptor de cálcio da vesícula. Desencadeia a exocitose das vesículas ancoradas. A sinaptofisina está envolvida na formação do poro durante a exocitose. OBS.: Existem alguns inibidores de todos esses processos comentados. Como por exemplo, a tetrodotoxina que inibe o canal de sódio voltagem-dependente, que impede que haja o potencial de ação. Ou também a toxina tetânica e botulínica que impedem a liberação do conteúdo da vesícula (inativa ela). Entre outros. 6 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 TIPOS DE RECEPTORES DE NEUROTRANSMISSORES Podem ser receptores do tipo ionotrópicos (vide imagem esquerda), onde o próprio receptor é um canal iônico, então basta que o neurotransmissor se ligue que ele o canal se abre permitindo o fluxo de íons, é de efeito rápido (Ex.: Junção neuromuscular). Ou podem ser receptores metabotrópicos acoplados à proteína G (vide imagem direita), onde o neurotransmissor abre o canal iônico indiretamente. Há a presença de 2º mensageiro para modificar a excitabilidade do neurônio pós-sináptico. Possui um efeito mais demorado. OBS.: Resumo de todas as etapas da neurotransmissão química: OBS.: 3 vias principais da proteína G. A maioria dos neurotransmissores utilizam receptores acoplados à proteína G. Logo, todas as respostas vão depender do segundo mensageiro gerado a partir da ativação desses receptores. - Proteína G Alfa-Q: Está relacionada a ativação da fosfolipase C, que vai degradar fosfolipídio de membrana, gerando fosfatidilinositol difosfato, que por sua vez, forma o IP3 (fosfatidilinositol trifosfato) e o Diacilglicerol. Essa via também ativa a proteína quinase C. - Proteína G Alfa-S: Estimulatória. Adenilato ciclase é ativada, vai gerar AMPc, que vai ativar a proteína quinase A - Proteína G Alfa-I: Inibitória. Adenilato ciclase é inibida, diminuindo o AMPc. 7 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 PRINCIPAIS NEUROTRANSMISSORES Para a acetilcolina existem neurônios colinérgicos que quando liberam acetilcolina ela se liga a receptores ionotrópicos e neurônios colinérgicos que quando liberam acetilcolina ela se liga a receptores metabotrópicos. Na junção neuromuscular, por exemplo, é do tipo ionotrópico (receptor nicotínico). Já em alguns tipos de neurônios colinérgicos do SNC, o tipo de receptor que predomina é muscarínico (metabotrópico). O receptor nicotínico é inibido por curare (extraída de plantas, utilizada por tribos indígenas na ponta de flechas para neutralizar presas). Já o receptor muscarínico é inibido pela atropina (substância encontrada em alguns medicamentos, extraída da planta Atropa Belladonna – Dama da Noite). Em relação à noradrenalina, o que vai definir se um neurônio é dopaminérgico ou noradrenérgico são as enzimas que ele contêm, porque as vias de sínteses são bem parecidas. Então, se o neurônio contém a enzima que transforma dopa em dopamina e não contém a que transforma dopamina em noradrenalina, ele termina a etapa de síntese em dopamina e vai liberar dopamina. Os neurônios noradrenérgico possuem uma etapa a mais na síntese, que seria a formação de noradrenalina a partir da dopamina. Nesse caso não há degradação da noradrenalina/dopamina na fenda sináptica, elas são recaptadas de volta para a terminação sináptica e nela metabolizadas pela MAO. Em relação à dopamina, então, temos duas situações extremas, a possibilidade de surto psicótico pelo excesso da dopamina (falta de recaptação congênita ou por uso de cocaína por exemplo) e a Doença de Parkinson, pela degradação de neurônios dopaminérgicos de algumas áreas do SNC (mais especificamente na substância negra). Já a serotonina está relacionada ao humor, porém participa de outras funções importantes, como a regulação da temperatura e a indução do sono. Existem vários medicamentos que inibem a recaptação de serotonina, como o OBS.: A cocaína atua aqui. Lembrando que a pessoa que utiliza a droga fica mais elétrica, faz isso inibindo a recaptação de dopamina na fenda sináptica, então fica mais dopamina atuando nos receptores dopaminérgicos, que dá a sensação de aceleração na pessoa. Ao inibir essa bomba de recaptação e aumentar a concentração de dopamina, gerando essa euforia, o indivíduo pode entrar em surto psicótico. OBS.: Tabela com os principais neurotransmissores 8 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 prozac, que são utilizados em alguns casos de depressão. Embora esteja relacionada ao humor, o excesso de serotonina pode causar a perda do apetite, por isso há pessoas que, equivocadamente, utilizam remédios antidepressivos para reduzir o apetite. Todos esses neurotransmissores vão finalizar sua ação de alguma forma, ou por ação enzimática (enzimas presentes no neurônio pós-sináptico) ou sendo recaptados de volta e metabolizados na terminação pré-sináptica. POTENCIAIS PÓS-SINÁPTICOS EXCITATÓRIOS E INIBITÓRIOS Alguns livros classificam, erroneamente, os neurotransmissores como excitatórios ou inibitórios. Porém, não são os neurotransmissores que possuem essa característica, é o receptor com o qual ele vai agir que vai produzir ou uma resposta excitatória ou uma resposta inibitória. Sendo assim, o mesmo neurotransmissor pode ser excitatório e inibitório, a depender do tipo de receptor no qual ele vai se ligar. Ex.: Acetilcolina é excitatória no músculo liso vascular, ela contrai esse músculo. Já no coração, esse neurotransmissor é inibitório, porque os tipos de receptores são diferentes, gerando uma sinalização diferente. O neurotransmissor atua no receptor desenvolvendo potencial pós-sináptico excitatório quando ele causa uma despolarização, que normalmente ocorre pela entrada de cátions (principalmente sódio e cálcio). Ou o neurotransmissor atua no receptor desenvolvendo potencial pós-sináptico inibitório quando ele causa uma hiperpolarização, que normalmente ocorre pela entrada de ânions (cloreto, por exemplo) ou saída de cátions (principalmente potássio). Lembrando que a função do potencial pós-sináptico excitatório é produzir um potencial de ação na próxima célula, isso só é possível com a abertura de canais de sódio voltagem-dependentes, portanto quanto mais despolarizante um estímulo, maior a probabilidade disso ocorrer. SOMAÇÃO DAS ENTRADAS Lembrando que se a soma das entradas excitatórias e inibitórias não chegar no limiar de ativação de canais de sódio, não haverá o potencial de ação, ou seja, se a excitação total não for supralimiar, não há condução do estímulo. A somação pode ocorrer de forma temporal ou especial. A somação espacial é quando se tem várias entradas chegando em um neurônio pós-sináptico. Se todas entradas forem excitatórias, todas se somam. Se existirem entradas excitatórias e inibitórias, é o balanço final que vai determinar se ocorrerá excitação ou inibição. A somação temporal é quando se tem um único neurônio disparando repetidas vezes e essa repetição de disparos no neurônio seguintese soma temporalmente e amplificam a despolarização do neurônio pós-sináptico. Tanto a somação temporal, quanto a somação espacial vão determinar a intensidade do estímulo. Isso significa que quando você está sentindo alguma coisa com mais intensidade é porque está ocorrendo algum tipo de somação, visto que o cérebro interpreta a intensidade do estímulo dessa forma. Em algumas raras situações, quando o disparo é muito grande, pode ocorrer fadiga sináptica, ou seja, esgotamento do neurotransmissor, daí não há mais produção de resposta no neurônio seguinte, até que os neurotransmissores sejam novamente sintetizados. Exs.: Acetilcolinesterase degrada a acetilcolina em acetato e colina / Noradrenalina é recaptada para a terminação sináptica e é metabolizada pela MAO (Monoaminaoxidase). 9 FISIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Resumindo, a amplitude do potencial pós-sináptico estimulatório é diretamente proporcional à intensidade do estímulo e à frequência dos potenciais de ação. A quantidade de neurotransmissores liberada depende da frequência do potencial de ação. OBS.: O potencial de ação continua sendo “tudo-ou-nada”. A intensidade do estímulo vai de acordo com a interpretação do cérebro dessas somações espaciais e temporais dos potenciais.
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