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A QUESTÃO DA SELEÇÃO DE FORNECEDORES: UM ESTUDO DE CASOS NA INDÚSTRIA BRASILEIRA DE AUTOPEÇAS Lorenzo Federico Zanotti Lindner Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ Instituto de Pós-Graduação em Administração, COPPEAD Mestrado em Administração Orientadora: Rebecca Arkader Rio de Janeiro 2000 ii A QUESTÃO DA SELEÇÃO DE FORNECEDORES: UM ESTUDO DE CASOS NA INDÚSTRIA BRASILEIRA DE AUTOPEÇAS Lorenzo Federico Zanotti Lindner Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração – COPPEAD, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários para obtenção do Grau de Mestre em Ciências (M.Sc.). Aprovada por: ____________________________________ - Orientadora Rebecca Arkader, D.Sc. COPPEAD / UFRJ _____________________________________ Paulo Fernando Fleury, Ph.D. COPPEAD / UFRJ _____________________________________ Luiz F. M . Vieira, Ph.D. Booz-Allen & Hamilton Rio de Janeiro 2000 iii Lindner, Lorenzo Federico Zanotti A questão da seleção de fornecedores: um estudo de casos na indústria brasileira de autopeças/ Lorenzo Federico Zanotti. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. viii, 96p. ; il. Tese – Universidade Federal do rio de Janeiro, 2000. 1. Fornecedores de Material – Indústria Automobilística – Brasil. 2. Preço. 3. Tese (Mest. - UFRJ/COPPEAD). I. Título. iv AGRADECIMENTOS Agradeço de forma muito especial à Professora Rebecca Arkader, sem a qual não teria sido possível realizar este trabalho. Seu apoio, paciência e incentivo foram fundamentais. Agradeço a todos professores do COPPEAD pelo apoio e pelo conhecimento transmitido ao longo do curso. Agradeço também a todos funcionários pela ajuda e colaboração. Gostaria de agradecer aos meus colegas de turma, Américo, Márcia, Claudinha, Claudia, Tatiana e tantos outros que fizeram com que o período vivido no COPPEAD tenha sido um dos melhores da minha vida. Agradeço à minha mãe e à minha tia pela formação e o apoio dado em todos os momentos. Enfim, agradeço a todos aqueles que tornaram o COPPEAD uma instituição na qual tenho tanto orgulho de ter estudado. v LINDNER, Lorenzo Federico Zanotti. A Questão da Seleção de Fornecedores: um Estudo de Casos na Indústria Brasileira de Autopeças. Orientadora: Rebecca Arkader. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. Dissertação (Mestrado em Administração) O estudo teve por objetivo investigar em que estágio se encontra o tratamento da seleção de fornecedores em empresas nacionais de autopeças de primeiro nível, ou seja, aquelas que fornecem diretamente para as montadoras, face às novas filosofias e práticas de administração de Compras. A metodologia utilizada foi a de estudos de casos. Foram três os casos estudados, com base em entrevistas junto a tradicionais fornecedoras da indústria automobilística nacional, com longos anos de atuação, em que foram exploradas questões relativas a suas políticas e procedimentos para a seleção de fornecedores. O estudo revelou que apesar de ter havido significativa evolução no tratamento das questões de Compras, as empresas ainda adotavam uma abordagem para a seleção de fornecedores que a literatura classifica como tradicional. O principal objetivo perseguido era a redução de preços, não sendo ainda consideradas questões de caráter mais estratégico tais como o estabelecimento de relacionamentos de longo prazo ou a avaliação do custo total relativo a uma compra. vi LINDNER, Lorenzo Federico Zanotti. A Questão da Seleção de Fornecedores: um Estudo de Casos na Indústria Brasileira de Autopeças. Orientadora: Rebecca Arkader. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. Dissertação (Mestrado em Administração) The objective of this study was to determine the stage of evolution of the supplier selection issue in first tier autoparts suppliers (those that supply directly to carmakers) in Brazil, in view of the new principles and practices in the Purchasing area. The case study method was used. Three cases were analyzed, based on interviews with traditional Brazilian first tier autoparts suppliers, in which different aspects of their supplier selection policies and procedures were explored. The study showed that, despite having undergone significant changes in the Purchasing process, these companies continue to have an approach to supplier selection identified in the literature as traditional. The main objective pursued in the selection is price reduction, without much consideration for other more strategic criteria such as the development of long-term relationships or the evaluation of the total cost of ownership. vii SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................1 2 OBJETIVOS E RELEVÂNCIA DO ESTUDO ........................................................3 2.1 Objetivos ...........................................................................................................................3 2.2 Relevância do estudo........................................................................................................3 3 REVISÃO DE LITERATURA ..................................................................................6 3.1 As mudanças na função de compras ..............................................................................6 3.2 Variáveis estratégicas relevantes no processo de seleção de fornecedores..................9 3.3 Os critérios tradicionais ................................................................................................12 3.3.1 Preço.....................................................................................................................................12 3.3.2 Qualidade..............................................................................................................................13 3.3.3 Velocidade de entrega ..........................................................................................................13 3.4 Os novos critérios...........................................................................................................14 3.4.1 Custo total.............................................................................................................................14 3.4.2 Qualidade Total ....................................................................................................................15 3.4.3 Serviço..................................................................................................................................17 3.4.4 Critérios financeiros..............................................................................................................17 3.4.5 Critérios tecnológicos ...........................................................................................................18 3.4.6 Critérios quanto à cultura e estratégia organizacional ..........................................................18 3.4.7 Critérios ecológicos ..............................................................................................................19 3.4.8 Critérios aplicados ao fornecimento internacional................................................................20 3.4.9 Outros critérios .....................................................................................................................21 3.5 O processo de seleção de fornecedores.........................................................................21 3.5.1 Organização para o processo de seleção...............................................................................21 3.5.2 Fontes de informação............................................................................................................22 3.5.3 Ferramentas ..........................................................................................................................24 3.6 Quadro conceitual ..........................................................................................................284 METODOLOGIA .....................................................................................................30 4.1 Introdução.......................................................................................................................30 4.2 Escolha dos casos............................................................................................................30 4.3 Coleta de dados...............................................................................................................31 4.4 Perguntas da pesquisa ...................................................................................................32 5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS.........................................33 5.1 Descrição dos Casos .......................................................................................................33 5.1.1 Empresa F1 ...........................................................................................................................33 5.1.2 Empresa F2 ...........................................................................................................................42 5.1.3 Empresa F3 ...........................................................................................................................51 5.2 Análise dos Casos ...........................................................................................................62 5.2.1 Evolução na função de Compras...........................................................................................62 5.2.2 Evolução dos critérios de seleção de fornecedores...............................................................66 5.2.3 Evolução do processo de seleção de fornecedores ...............................................................69 5.2.4 Percepção geral dos compradores sobre a questão de seleção e avaliação de fornecedores.71 viii 6 C0NCLUSÕES..........................................................................................................72 6.1 Resumo do trabalho.......................................................................................................72 6.2 Conclusões.......................................................................................................................73 6.3 Sugestões .........................................................................................................................85 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................86 8. ANEXOS .......................................................................................................................95 1 INTRODUÇÃO Os últimos 15 anos têm sido marcados, no cenário internacional, por profundas modificações nas estratégias de manufatura das empresas ocidentais, sobretudo em função da adoção de práticas inspiradas nas operações de empresas industriais japonesas. Sob o rótulo geral de “produção enxuta”, estas práticas têm por principal objetivo a redução de desperdícios ao longo da cadeia de valor. Boa parte da superioridade competitiva mostrada pelas empresas japonesas foi creditada aos vínculos especiais estabelecidos entre as empresas compradoras e seus fornecedores. Esta constatação tem levado ao estudo dos diferentes aspectos destes relacionamentos colaborativos, também chamados de “parcerias”, de forma a identificar suas peculiaridades e verificar sua aplicabilidade em um contexto distinto daquele da indústria japonesa. Uma das principais questões estudadas é aquela da seleção de fornecedores. Considerando-se que a nova abordagem da relação entre compradores e fornecedores se baseia em relacionamentos mais duradouros e numa maior estabilidade da base de fornecedores, cresce em importância a questão de sua adequada seleção. A presente dissertação parte desta constatação para estudar de que maneira a seleção de fornecedores está sendo tratada nas empresas industriais brasileiras. Em especial, este estudo se fará no contexto da indústria automobilística brasileira, que a partir desta década, com o choque competitivo da abertura comercial, vem passando por intensa reconfiguração nas práticas de manufatura, inclusive no que diz respeito às políticas de fornecimento. A presente dissertação tem assim por tema a Seleção de Fornecedores, desenvolvendo-se segundo a organização a seguir descrita. A próxima seção apresenta os objetivos da pesquisa e destaca a relevância das questões tratadas, do ponto de vista tanto prático quanto teórico. Segue-se a revisão da literatura sobre o tema, considerando-se a questão da seleção propriamente dita no contexto da evolução da função de Compras, os processos organizacionais para implementá-la e as principais 2 ferramentas utilizadas. O documento prossegue com a apresentação da metodologia utilizada e com considerações sobre a pesquisa de campo. Na seqüência é feita a descrição dos casos e a análise dos resultados. Em conclusão, são discutidas as principais implicações dos resultados obtidos e são feitas recomendações para pesquisas futuras. 3 2 OBJETIVOS E RELEVÂNCIA DO ESTUDO 2.1 Objetivos A presente dissertação tem por objetivo estudar a questão da seleção de fornecedores, no contexto da indústria automobilística brasileira. Para isto, pretende-se observar como tem-se desenvolvido o processo de escolha de fornecedores pelas empresas de autopeças de primeiro nível, ou seja, aquelas que fornecem diretamente para as montadoras. Mais especificamente, o estudo pretende identificar em que estágio se encontra a seleção de fornecedores nestas empresas, face às novas filosofias e práticas de administração de Compras. Atenção especial é dada à própria evolução da área de Compras, dos critérios de seleção e dos processos utilizados. 2.2 Relevância do estudo Uma recente pesquisa realizada em empresas industriais nos Estados Unidos indicou que, na média, o valor gasto em compras de materiais corresponde aproximadamente a 55% dos custos totais de produção (Watts et al, 1995; Monczka et al, 1998). Isso corrobora a afirmação de Dobler e Burt (1996), baseada no Annual Survey of Manufacturers de 1991, de que o valor gasto em compras por uma empresa industrial é superior a todas as suas outras despesas em conjunto (gráfico 1). Gráfico 1: Típica composição dos custos das empresas industriais Salários e benefícios 21% Outras despesas 19% Custo de materiais e equipamentos comprados 56% Lucro antes do imposto de renda 4% Fonte: Dobler e Burt, 1996, p. 26. 4 Este valor, porém, pode variar de acordo com o setor analisado. Em empresas do setor de alta tecnologia, por exemplo, Compras representa em média 34% das despesas totais, enquanto que no setor petrolífero este número sobe para 84% (Dobler e Burt, 1996, p.26). Isto mostra que a área de compras apresenta grandes oportunidades para a redução dos gastos das empresas e, por conseqüência, de incremento do lucro. Aliás, ainda de acordo com Dobler e Burt (1996), cada unidade monetária economizada em compras gera mais uma unidade monetária no lucro. Além disto, os fornecedores estão tendo que assumir mais responsabilidades quanto ao desenvolvimento de um produto ou serviço. Na Ford, por exemplo, fornecedores que não possuem habilidades para desenvolver novos produtos não são selecionados em caso algum (Monczka et al, 1998, p.253). Os compradores estão aumentando suas exigências para poder concentrar seus esforços nas suas competências principais. Como conseqüência, a imagem das empresas frente aos seus clientes começa a depender de e a ser influenciada cada vez mais pelo desempenho dos seus fornecedores (Tracey, Vonderembse, 1999). Por isso, várias organizações estão buscando fornecedores que viabilizem o atingimento de uma posição competitiva mais forte (Benton et al, 1999). O desafio hoje é maximizar o desempenho dos seus fornecedores melhor que os seus concorrentes. Sendo assim, cada vez mais, as dimensões competitivasdas empresas, como qualidade, custo, serviço e outras, estão relacionadas com a operação dos fornecedores. Como conseqüência, o processo de seleção de fornecedores começa a ter uma relevância crescente no contexto empresarial. Na Xerox, por exemplo, existe a crença de que para produzir os melhores produtos é necessário mais que idéias, designs e especificações. É preciso selecionar os melhores fornecedores (Dobler, Burt, 1996, p.211). Apesar disso, ainda não é grande a literatura existente sobre o tema, no contexto da nova visão estratégica de Compras. São poucos os estudos empíricos que investigam especificamente os novos critérios, processos e métodos de seleção e avaliação de 5 fornecedores, como se verá na revisão de literatura. Trata-se de uma área com grande potencial para novos desenvolvimentos conceituais que possam ser testados e aplicados na prática nas empresas. É portanto grande a relevância teórica e a oportunidade do tema proposto, ao que se saiba ainda não estudado no país. Na indústria automobilística brasileira, esta questão é mais relevante do que nunca. Já se mostrou que houve avanço nas relações das montadoras de automóveis presentes no mercado brasileiro com seus principais fornecedores, aqueles de primeiro nível (Arkader, 1997). Estas são as empresas que estão no degrau da pirâmide logo abaixo do topo e tendem a se tornar cada vez mais especializadas, montando sistemas completos para seus clientes. Mas a grande questão é saber se esses esforços não se verão prejudicados pelas deficiências dos fabricantes de autopeças no segundo escalão, cujos produtos irão compor os sistemas. É assim de grande importância conhecer como a questão da seleção de fornecedores está sendo abordada pelos fornecedores diretos das montadoras, já que esta afeta o desempenho da cadeia como um todo. A escolha da indústria automobilística como cenário para a pesquisa decorre da sua importância para a indústria brasileira (representando 25% da produção industrial), das grandes alterações estruturais pelas quais vem passando e da complexidade da sua cadeia de fornecimento. Tem, assim, sido o cenário preferencial para o estudo de questões ligadas a relacionamentos entre fabricantes e fornecedores, como é o caso do presente trabalho. 6 3 REVISÃO DE LITERATURA 3.1 As mudanças na função de compras A visão tradicional do departamento de compras ou suprimentos estabelecia que sua missão era satisfazer as necessidades do cliente interno, sem prejudicar a operação. Poucos nas empresas prestavam atenção à forma de funcionamento da área de suprimentos, contanto que recebessem o que desejavam (Leenders et al, 1994). Farmer (1978) apontava que a maioria dos executivos considerava que o setor de compras deveria atuar de forma passiva na organização, com o limitado objetivo de não atrapalhar os outros departamentos, e que a função de Compras era percebida como administrativa e reativa às necessidades internas da empresa, sem nenhuma importância estratégica. Assim, as Compras sempre foram vistas muito mais como um serviço a ser realizado do que como uma área da qual se poderia obter vantagens competitivas. Os responsáveis pelos departamentos de Compras se concentravam nos benefícios e ações de curto prazo, sem se preocuparem com a estratégia de longo prazo que determina a força competitiva da empresa e a sua estabilidade (Farmer, 1978). No entanto, em meio à escalada da concorrência nos mercados internacionais e do processo de globalização nas últimas décadas, surgiram preceitos gerênciais quase imperativos, como a produção enxuta e a satisfação total dos clientes. Para implementá- los, têm sido adotadas novas práticas, tais como a administração da qualidade total (TQM), as entregas just-in-time e as parcerias entre compradores e fornecedores, criando a necessidade de se rever o funcionamento da estrutura e dos processos de Compras. Assim, a título de exemplo, a opinião generalizada de que se trabalhar com inúmeros fornecedores para cada item comprado (multiple sourcing) aumentaria a segurança do comprador vem sendo contestada e desafiada por uma tendência à adoção da prática de single sourcing (Leenders, Fearon,1997). 7 Nesse novo contexto da gerência estratégica dos suprimentos, a relação entre compradores e fornecedores tende a deixar de ser adversária, passando a envolver uma maior cooperação, onde cada parte deverá auxiliar a outra a melhorar as suas capacidades no que estas afetem objetivos de desempenho competitivo como custo, qualidade, confiabilidade e flexibilidade, tendo em vista diminuir os custos na cadeia de suprimento como um todo (Imrie, Morris, 1992). De fato, a ênfase agora está no processo de administração de toda a cadeia de suprimentos, com base nos objetivos estratégicos da empresa, ao invés de uma concentração de esforços apenas no aspecto transacional do fornecimento (Leenders, Fearon,1997). O relacionamento de curto prazo vem perdendo espaço para contratos de longo prazo e o processo de Compras está deixando de ser uma atividade tática, começando a fazer parte da estratégia competitiva da corporação (Watts et al, 1995). Em empresas como Honda of America e Daimler- Chrysler, Compras já é reconhecida pela alta administração como uma área chave que contribui para a criação de uma vantagem competitiva sustentável (Tracey, Vonderembse, 1999). Na visão de Reck e Long (1988), porém, esta mudança no foco do departamento de compras não se deveria a qualquer fator como globalização, downsizing, outsourcing e outros. Acreditam que nada mais seria do que o resultado de uma evolução da área de Compras. Inspirando-se na taxonomia desenvolvida por Hayes e Wheelright (1984) para os sistemas de manufatura, colocam que o setor de compras evolui através de quatro níveis, variando entre uma condição totalmente passiva e uma situação onde se torna uma peça-chave na estratégia da organização. No início, a área de compras atua passivamente, apenas reagindo aos pedidos das outras áreas. No estágio seguinte, busca adotar novas técnicas e procedimentos para minimizar qualquer vantagem competitiva dos concorrentes. No terceiro estágio, a função de compras passa a sustentar a estratégia competitiva da empresa, através de práticas que reforçam a força da organização no mercado. E, finalmente, no último estágio, a área de compras já está completamente integrada à estratégia da corporação, sendo reconhecida como peça-chave para o seu sucesso. 8 Para identificar onde se situaria o setor de compras de uma empresa, os autores propuseram um quadro com as características principais de cada estágio, mostrado a seguir. QUADRO 1 ESTÁGIOS DE EVOLUÇÃO DA FUNÇÃO DE COMPRAS Estágio Características Passivo Independente Apoio Integrativo Natureza dos planos de longo prazo Não tem Rotineiros Apoia a estratégia Faz parte da estratégia Origem das mudanças Vontade dos gerentes Paridade competitiva Estratégia competitiva Administração integrativa Evolução da carreira Limitada Possível Provável Sem limites Visibilidade organizacional Baixa Limitada Variável Alta Foco do sistema de informática Tarefas repetitivas Eficiência Decisões específicas Necessidades dos tomadores de decisões Fonte de novas idéias Tentativas ou erros Práticas correntes Estratégia competitiva Troca interfuncional de informações Foco dos recursos disponíveis Limitado Arbitrário Objetivo Necessidades estratégicas Avaliação de fornecedores Preço e disponibilidade Custo total Objetivos competitivos Contribuição estratégica 9 Relacionamento com fornecedores Adversário Variável Recurso da empresa Interdependência Foco do desenvolvimento profissional Não existe Práticas correntes Elementos estratégicos Entendimento multi-funcional Característica geral Função administrativa Eficiência funcional Facilitador da estratégia Contribui para a estratégia Fonte: Reck e Long,1988, p.5. Mesmo assim,independente da mudança no setor de Compras ser fruto de uma evolução natural ou não, o fato é que nesse novo contexto, as decisões da área de Compras se tornaram ao mesmo tempo mais importantes e mais complexas. Segundo Leenders e Fearon (1997, p.35-37), são nove os objetivos principais da área de compras, entre os quais se encontra, justamente, a seleção de fornecedores: • fornecer um fluxo ininterrupto dos materiais necessários para a operação • diminuir ao máximo o investimento em estoques e as perdas • manter e melhorar a qualidade • selecionar e desenvolver fornecedores competentes • padronizar, quando possível, os itens comprados • comprar ao menor custo total • melhorar a competitividade da empresa • trabalhar harmoniosamente com as outras áreas da organização • cumprir os objetivos da área de compras com o custo administrativo mínimo 3.2 Variáveis estratégicas relevantes no processo de seleção de fornecedores Segundo Soukup (1987), Sarkis e Talluri (2000) e Monczka e outros (1998), a principal função do responsável por Compras é selecionar fornecedores, tarefa cuja 10 complexidade aumentou muito nos últimos tempos devido a algumas tendências no mundo dos negócios, como o aumento do valor dos produtos comprados em relação ao retorno de uma manufatura, a globalização e a aceleração das mudanças tecnológicas (Soukup, 1987). Torna-se então vital entender os impactos das novas atribuições do departamento de Compras no processo de seleção, bem como as dimensões de que irá se valer para proceder ao mesmo. Na opinião de Monczka e outros (1998), o processo de seleção de fornecedores neste novo contexto de Compras deveria considerar diferentes variáveis estratégicas, tendo em vista que “o objetivo global do processo de seleção de fornecedores é reduzir o risco e maximizar o valor total para o comprador” (p.239). Primeiro, o comprador deve optar pela duração do relacionamento. Existe a possibilidade de se estabelecer tanto um contrato de curto prazo quanto um acordo de longo prazo, sendo que este último seria mais condizente com a nova visão da área de Compras. Isto corrobora a opinião de Ellram (1990), para quem seria fundamental, nesta nova relação com os fornecedores, buscar um compromisso de longo prazo baseado na troca de informações e na divisão de riscos e recompensas. Inclusive, segundo Manoochehri, a chave para maximizar a contribuição de um fornecedor seria selecionar um pequeno número e estabelecer com estes relações de longo prazo (apud Mohammed et al, 2000). Além disto, a globalização está levando cada vez mais empresas que antes apenas compravam no mercado interno a procurarem fornecedores internacionais, o que criou mais uma variável estratégica a ser considerada no processo de seleção: fornecimento interno versus fornecimento internacional (Min, 1994; Monczka et al, 1998). Esta tendência também dificultou ainda mais o processo de seleção de fornecedores, por incluir outros critérios além dos utilizados no mercado local, tais como o risco de ocorrerem instabilidades políticas, mudanças na conversibilidade da moeda, reformas legislativas e outros imprevistos (Min, 1994). A terceira variável que, segundo Monczka e outros (1998), deve ser considerada no processo de seleção de fornecedores, é a quantidade de fornecedores. A empresa 11 pode escolher praticar uma política de multiple sourcing tradicional (diversos fornecedores para cada item), ou adotar uma visão mais moderna de Compras adotando o single sourcing (um único fornecedor para cada item). A influência desta variável no processo de seleção já foi comprovada em pesquisas. Em um estudo do tipo survey com uma amostra de 2000 gerentes da área de Compras de diversas empresas americanas, por exemplo, Swift (1995) concluiu que os compradores que preferem o single sourcing consideram mais importante a confiabilidade, enquanto que os compradores adeptos do multiple sourcing dão maior ênfase ao preço. De fato, o comprador que adota o single sourcing está mais preocupado com o custo total do que com o preço inicial, pois está buscando o fornecedor ótimo. A autora também coloca que a compreensão de que o single sourcing e o multiple sourcing envolvem diferentes critérios de seleção é importante para os departamentos de Marketing e de Vendas do fornecedor, que podem adaptar sua estratégia de acordo com as preferências do cliente. O tipo de produto é uma importante variável estratégica a ser considerada durante o processo de seleção, não havendo uma estratégica única adequada a todos os produtos (Ellram, 1990; Monczka et al, 1998). Os aspectos a serem considerados são, por exemplo, a complexidade técnica do produto e as dificuldades de suprimento (Hirakubo, Kublin, 1998; Monczka et al, 1998). Esta opinião é corroborada por um estudo de Lehmann e O’Shaughnessy (apud Wilson, 1994, p.37) onde diferentes produtos foram classificados segundo quatro categorias: produtos rotineiros que não apresentam problemas de uso e nem de funcionamento; produtos com dificuldades de utilização, que exigem um aprendizado, mas que funcionam como previsto; produtos relacionados a problemas de desempenho, sobre os quais não se tem certeza sobre o funcionamento e produtos com problemas políticos, porque envolvem grandes somas ou porque a decisão de compra depende de várias áreas da empresa. Os autores concluíram que os critérios relevantes variavam de acordo com o tipo do produto. Confiabilidade da entrega e preço eram mais importantes para produtos de rotina, enquanto que produtos com problemas de processo exigiam melhor serviço e confiabilidade, assim como produtos de desempenho. No caso de produtos que envolviam problemas políticos, preço e confiabilidade do produto eram os critérios fundamentais. 12 No entanto, apesar de reconhecer que o tipo de produto deve ser considerado quando de um processo de seleção, Soukup (1987) acredita que o mais importante em um processo de seleção de fornecedores é que o responsável pelo processo julgue a necessidade de uma análise detalhada dos fornecedores. Por exemplo, no caso de vários vendedores estarem no mesmo nível ou de existir um fornecedor muito mais capacitado que os outros, esta decisão deve ser tomada de forma rotineira, sem perda de tempo. Apenas na situação onde vários vendedores possuem diferenças significativas é que deve ser feita uma análise cuidadosa para evitar erros. O Quadro 2 relaciona cada caso com a probabilidade de que ocorra um erro na seleção, com as conseqüências deste erro e com o modo de decisão que deve ser aplicado. QUADRO 2 CLASSIFICAÇÃO DA DECISÃO DE SELEÇÃO DE FORNECEDORES Caso Prob. de erro Conseqüências do erro Modo de decisão Fornecedores semelhantes Alta Mínimas Rotineiro Um fornecedor superior Baixa Elevadas Rotineiro Fornecedores diferentes Alta Desconhecidas e arriscadas Análise detalhada Fonte: Soukup, 1987, p.9. 3.3 Os critérios tradicionais 3.3.1 PREÇO O preço sempre foi considerado um fator crítico no momento da compra (Degraeve, Roodhooft, 1999). Em 1905, por exemplo, Ennis já destacava a importância do conhecimento sobre a formação de preços para o profissional da área de suprimentos (apud Fearon, 1968). Esta preocupação fundamental com o preço caracterizou o que hoje é chamada de abordagem tradicional da cadeia de suprimentos (Goffin et al, 1997). 13 Nela, o comprador adotava uma política de multiple sourcing, mantendo vários fornecedores de um determinado produto, com o objetivo de usar seu poder de barganha para reduzir o preço. De fato, o processo tradicional de compras consistia numa busca incessante pelo menor preço possível entre os fornecedores. Conseqüentemente, as trocas de fornecedor eram freqüentes e os contratos eram de curta duração (Swift, 1995; Goffin et al, 1997). 3.3.2 QUALIDADE A qualidade é também um dos critérios mais tradicionais no processo de seleção de fornecedores. Um artigo de 1890 já mencionava que um dos maiores erros que poderiamser cometidos em uma compra era o de ignorar a qualidade do produto ou serviço (apud Fearon, 1968). No entanto, mesmo sendo considerada no processo, a qualidade era tratada de forma superficial e com menos atenção do que mereceria (Giunipero e Brewer, 1993). Segundo Goffin e outros (1997), o departamento de compras exigia dos seus fornecedores um padrão de qualidade apenas qualificador (Slack et al, 1997). Isto significa que os fornecedores deveriam atingir um nível de qualidade pré-determinado para serem considerados na seleção, e que qualquer melhora nesta dimensão, acima do padrão exigido, acrescentaria poucos benefícios (Slack et al, 1997). 3.3.3 VELOCIDADE DE ENTREGA Segundo Goffin e outros (1997), nos processos tradicionais de compra, além do preço e da qualidade, havia um terceiro critério que também era avaliado: a velocidade de entrega. A importância deste fator é confirmada nos estudos de Lehmann e O’Shaughnessy em 1974 e de Evans em 1982, que concluíram que, na média, a entrega era considerada pelos compradores como sendo mais essencial até mesmo que o preço e a qualidade (Wilson, 1994; Lambert et al, 1997). De fato, um atraso ou um adiantamento na entrega de componentes poderia causar sérios prejuízos para uma empresa. A Hewlett-Packard, por exemplo, conseguiu reduzir seus gastos com estoque em US$ 9 milhões por ano após ter realizado uma campanha junto aos seus 14 fornecedores exigindo um maior comprometimento com as datas previstas de entrega dos produtos (Burt, 1989). 3.4 Os novos critérios 3.4.1 CUSTO TOTAL Este critério consiste em um conceito que visa auxiliar o processo de seleção de fornecedores, identificando o verdadeiro custo de um produto ou serviço e não apenas seu preço. Além do preço, ele inclui os custos relacionados com o pedido, transporte, entrega, inspeção, rejeições, atrasos, etc. (Ellram, 1995). Quando um fornecedor não cumpre o que havia combinado em termos de entrega e qualidade, por exemplo, custos adicionais são incorridos pelo comprador para corrigir estas falhas. Estes custos são levados em consideração neste critério (Monczka, Trecha, 1988). Simplificando, o critério de custo total considera todos os custos associados com a aquisição, uso e manutenção de um produto ou serviço (Ellram, 1993). Além de poder ser aplicado a qualquer tipo de compra, este critério apresenta vários benefícios, conforme resumidos por Ellram (1994, p.173): • Medidas de desempenho Boa base para avaliar fornecedores. Forma concreta de medir resultados de esforços de melhoria da qualidade. Excelente ferramenta para benchmarking. •••• Tomada de decisão Obriga o comprador a quantificar os tradeoffs. Boa base para tomar decisões referentes à seleção de fornecedores. Tomada de decisão baseada em mais informações. Cria um ambiente para a resolução de problemas de forma estruturada. •••• Comunicação 15 Excelente meio de comunicação entre compradores e fornecedores. Modo de envolver outros departamentos nas decisões de compra. •••• Insight/Compreensão Fornece excelentes dados para a análise da tendência dos custos. Fornece excelentes dados para a comparação dos fornecedores. Fornece excelentes dados para negociação. Fornece informações críticas para target pricing. Obriga a função de compras a desenvolver um conhecimento sobre os fatores mais significativos não relacionados ao preço. Orientação para o longo prazo. •••• Incentiva a melhoria contínua Identifica onde os fornecedores devem focar seus esforços de melhoria. Ajuda a identificar oportunidades de redução de custo. Obriga as empresas a analisarem seus custos internos e a entenderem como suas próprias necessidades e especificações podem aumentar os custos. Aumenta o horizonte de análise dos funcionários do departamento de compras, estimulando desta forma o crescimento profissional. 3.4.2 QUALIDADE TOTAL A nova visão de Compras reconheceu que um fornecedor com alto padrão de qualidade não é aquele que simplesmente atende às especificações, mas o que satisfaz às expectativas do cliente, sendo que as especificações são estáticas enquanto que as expectativas são dinâmicas (Pang, 1992). Isto está incentivando o desenvolvimento de novas filosofias, como a administração da qualidade total, que pregam uma melhoria contínua na qualidade. Feigenbaum define a administração da qualidade total como um sistema eficiente de integração das forças das diferentes áreas de uma empresa no sentido de desenvolver qualidade, manter qualidade e melhorar a qualidade (Lee, Wellan, 1993). A qualidade se transformou numa ferramenta fundamental na busca pela satisfação do cliente (Giunipero, Brewer, 1993) e se tornou um fator que Terry Hill 16 chama de order winner (Slack et al, 1997). A qualidade total, e sobretudo o comprometimento com a sua melhoria, passaram a ser considerados peças-chave no processo de seleção, afetando diretamente o potencial competitivo do fornecedor (Giunipero, Brewer, 1993). Com o desenvolvimento da filosofia de administração da qualidade total, as organizações começaram a adotar sistemas de controle gerencial que facilitassem melhorias de qualidade. O conjunto mais universal destes sistemas e procedimentos relacionados à qualidade é aquele influenciado pelos padrões ISO 9000. Esses padrões foram desenvolvidos para assegurar aos compradores de produtos e serviços que eles foram produzidos de maneira a atender às exigências do consumidor (Slack et al, 1997). As certificações se tornaram um componente chave durante o processo de seleção de fornecedores, e cada vez mais, estão influindo na decisão. Mas segundo Groves e Valsamakis, o motivo de exigir a certificação também é função do tipo de relacionamento entre comprador e fornecedor. Em uma relação onde estes são adversários, a certificação é, de fato, reconhecida apenas como um garantia da qualidade do produto e do seu processo de produção. Já em uma parceria, a certificação serve como uma base para avaliar o sistema de qualidade do fornecedor e identificar as áreas que podem contribuir para melhorar o relacionamento. Particularmente na indústria automobilística, a certificação ganhou muita importância. Uma demonstração disto foi a criação de um programa de qualidade comum pelas três maiores montadoras americanas, General Motors, Chrysler Corp. e Ford. Este programa foi denominado QS-9000 e foi resultado da combinação da ISO- 9000 com algumas diretrizes de qualidade específicas do setor. A certificação passou a ser um critério fundamental no processo de seleção de fornecedores destas empresas, o que pode ser percebido na declaração feita pela General Motors em 1998, estabelecendo que nenhum fornecedor de primeira linha sem QS 9000 poderia fechar qualquer contrato com a empresa (Zuckerman, 1998). 17 3.4.3 SERVIÇO No novo contexto, o critério tradicional de entrega foi incorporado por um critério mais amplo denominado serviço, que engloba diferentes fatores. Dentro deste critério, a entrega passou a ser analisada sob outras dimensões além da velocidade (Goffin et al, 1997). Mohanty e Deshmukh (1993), por exemplo, sugerem que o critério de entrega deve considerar também a confiabilidade das entregas, o custo de transporte, a variação da quantidade em cada entrega, a freqüência de entregas e a flexibilidade do fornecedor quanto à programação de entregas. Além disso, devido à crescente adoção de programas de fornecimento just in time, o novo critério de entrega também passou a recomendar a análise da capacidade do fornecedor de realizar entregas JIT, fundamental para o sucesso de uma filosofia que visa minimizar o estoque (Burt, 1989; Goffin et al, 1997). O critério serviço também envolve outros fatores como: flexibilidade do fornecedor, garantia, assistência técnica, serviço pós-venda e disponibilidade de peças sobressalentes (Mohanty, Deshmukh, 1993; Goffin et al, 1997). 3.4.4 CRITÉRIOS FINANCEIROS Os critérios financeiros podem ser subdivididos em duas categorias: desempenhoeconômico e estabilidade financeira (Ellram, 1990). A análise do desempenho econômico reflete o passado financeiro da empresa, o que pode ser feito através dos índices de liquidez, de atividade e de rentabilidade. Os números do fornecedor em questão são comparados com os de seus concorrentes, buscando-se informações sobre variações no capital de giro e no fluxo de caixa, que também auxiliam na avaliação da força competitiva da empresa (Byrne, 1992). A seguir, estuda-se a viabilidade financeira futura da empresa, o que corresponde ao que foi tratado anteriormente como estabilidade financeira. Este equilíbrio seria fundamental, pois dele dependeria o sucesso da parceria no longo prazo (Deming, 1988). Um fornecedor com problemas 18 financeiros teria dificuldades em contribuir para a relação e poderia, até mesmo, não sobreviver (Ellram, 1990). 3.4.5 CRITÉRIOS TECNOLÓGICOS A avaliação do critério tecnológico se faz a partir da análise tanto da atual tecnologia utilizada pelo fornecedor quanto da sua capacidade para desenvolver e incorporar novas tecnologias (Ellram, 1990; Leenders, Fearon, 1997). Para isto é necessário visitar as instalações do fornecedor, conhecer seus equipamentos, sua escala, o ambiente de suas operações e sua forma de operar. Isto fornecerá informações sobre a situação atual. Como o objetivo da seleção é escolher fornecedores que possam contribuir regularmente para a relação, deve-se também avaliar o potencial do fornecedor para participar no desenvolvimento de um produto, sua velocidade de desenvolvimento e incorporação de novas tecnologias e sua capacitação técnica (Ellram, 1990). Segundo Monczka e outros (1998), trabalhar conjuntamente com fornecedores que possuem capacidade de desenvolver componentes reduz drasticamente o ciclo de desenvolvimento de novos produtos. Além disto, uma pesquisa realizada por Tracey e Vonderembse (1999) com 268 gerentes de Compras demonstrou a existência de uma elevada correlação entre o grau de envolvimento do fornecedor no desenvolvimento de componentes e seu desempenho geral: quanto maior o envolvimento, melhor o desempenho. A Ford, por exemplo, exige isto de todos os seus fornecedores e acredita que a sua vantagem competitiva no futuro depende diretamente da capacitação tecnológica de cada um. 3.4.6 CRITÉRIOS QUANTO À CULTURA E ESTRATÉGIA ORGANIZACIONAL Esta categoria de critérios compreende vários fatores intangíveis e seria essencial para o sucesso da relação (Ellram, 1990). Um dos fatores mais difíceis de serem avaliados, por exemplo, é a confiança, considerada fundamental para que ocorra a troca de informações, riscos e recompensas necessárias numa parceria (Ellram, 1991). A expectativa futura e a estratégia de longo prazo também seriam essenciais neste 19 processo, pois duas empresas com estratégias divergentes não conseguiriam cumprir as obrigações de um acordo de longo prazo. Em algum momento haveria um choque e a relação terminaria. Outros fatores como estrutura do fornecedor e compatibilidade entre os empregados de níveis equivalentes nas duas empresas também não deveriam ser ignorados, porque grande parte do sucesso da relação dependeria da forma de trabalho e de comunicação destas pessoas. Considera-se que o relacionamento entre os executivos principais das empresas dá o tom e a direção da parceria. Uma incompatibilidade neste escalão inviabilizaria a relação logo no início (Ellram, 1990, 1991). 3.4.7 CRITÉRIOS ECOLÓGICOS Min e Galle (1997) destacam as crescentes preocupações com o ecossistema nas duas últimas décadas. Segundo eles, os clientes estão cada vez mais atentos aos problemas ambientais e começam a dar preferência aos produtos ecologicamente saudáveis, o que está incentivando as empresas a lançarem produtos “verdes”. Entre 1985 e 1990, por exemplo, a participação de produtos ecológicos no total de novos produtos lançados nos Estados Unidos cresceu de 0,5% para 9,2%. No entanto, investir em novos produtos não basta para estabelecer uma política ambiental, é necessário mudar a visão tradicional do departamento de compras, que sempre ignorou os fatores ambientais no processo de seleção de fornecedores (Min, Galle, 1997). Esta idéia fica clara no comentário feito pelo responsável pela política ambiental da IBM-UK: “a IBM é tão boa ecologicamente quanto o elo mais fraco da sua cadeia de suprimentos” (Kenward, 1992). No entanto, segundo Min e Galle (1997), a concepção de uma estratégia “verde” é complicada pois pode aumentar o custo, requerer profissionais qualificados e ser limitada pela necessidade de materiais não tradicionais. Mesmo assim, existem diferentes formas de se implementar esta estratégia: pode-se reduzir o volume de compras de produtos danosos ao ambiente, incentivar o uso de materiais reciclados ou exigir que os fornecedores eliminem as embalagens supérfluas e usem embalagens biodegradáveis ou retornáveis. 20 A literatura destaca o cuidado com que deveria ser analisada esta questão, pois apesar de existir uma preocupação ecológica, muitos profissionais ainda desconhecem os potenciais econômicos das políticas “verdes” e acreditam, erroneamente, que elas pressupõem altos custos sem retorno compensador (Min, Galle, 1997). 3.4.8 CRITÉRIOS APLICADOS AO FORNECIMENTO INTERNACIONAL Com a globalização, cada vez mais empresas que antes apenas compravam no mercado interno estão contratando junto a fornecedores internacionais. Esta tendência dificultou ainda mais o processo de seleção de fornecedores, por incluir critérios distintos dos aplicados a fornecedores no mesmo país (Min, 1994). Um destes é a taxa de câmbio. Por exemplo, como na maioria das vezes existe um intervalo de tempo entre o momento da compra e o momento do pagamento, no caso de o comprador ter estipulado os pagamentos na moeda do fornecedor, uma variação no valor de conversão desta moeda pode aumentar ou reduzir o montante a ser pago, dependendo do sentido da variação. Daí a importância deste critério, ainda mais se no processo de seleção estiverem competindo fornecedores de diferentes países (Carter, Vickery, 1989). Também deveriam ser consideradas as barreiras culturais. Geralmente, fornecedores estrangeiros utilizam outras práticas de negociação, agem de acordo com outros costumes e falam outras línguas. Estes são alguns dos aspectos culturais principais, e Min (1994) ainda acrescenta que uma atitude etnocêntrica por parte do comprador potencial poderia levar a negociação ao fracasso. A avaliação não pode ignorar, também, os riscos de que ocorram instabilidades políticas, mudanças na legislação ou na política econômica governamental, disputas trabalhistas, controle de preços e outros que possam prejudicar o fornecimento (Ellram, 1991; Min, 1994). 21 3.4.9 OUTROS CRITÉRIOS Outros fatores começam a ser utilizados no processo de seleção de fornecedores. Muitos compradores, por exemplo, sentem-se mais seguros e confortáveis após terem feito uma análise do desempenho passado do fornecedor e de suas referências. Eles consideram isto crítico porque qualquer problema com o fornecedor envolve imediatamente a reputação da empresa cliente (Ellram, 1990). Recomenda-se também uma pesquisa sobre os clientes do fornecedor para que se tenha uma noção da importância relativa da compra na carteira do vendedor. Esta seria uma forma de se garantir maior atenção e uma atitude mais positiva por parte do fornecedor (Ellram, 1990; Smytka, Clemens, 1993). Além disto, caso o fornecedor trabalhe em conjunto com um importante concorrente em um mercado onde o fator tecnológico é primordial, uma parceria com este fornecedor deveria ser considerada desfavoravelmente (Ellram, 1990). 3.5 O processo de seleção de fornecedores 3.5.1 ORGANIZAÇÃO PARA O PROCESSO DE SELEÇÃO Neste novo contexto de compras, a organização das pessoas envolvidas no processo de seleção também mudou. Antigamente, o departamento de compras tinha a política de que todo o contato com os fornecedores sópodia ser feito pelo pessoal da área (Monczka et al, 1998). Além disto, existia um grande antagonismo entre a área de compras e o pessoal das fábricas. Dobler e Burt (1996) relatam um caso real que retrata este comportamento. Há alguns anos, um deles era gerente de compras e propôs ao responsável da fábrica se envolver mais cedo durante o desenvolvimento de um novo produto para perder menos tempo com a revisão das especificações e do projeto. A resposta foi imediata: ele não queria estranhos envolvidos no seu departamento. Da mesma forma, com a expressão “vá brincar com a sua própria caixa de areia”, o responsável por compras respondeu ao pedido de seu colega de participar mais 22 ativamente na seleção de fornecedores. Como conseqüência, Compras tinha um papel reativo, intervindo depois que as outras funções tivessem encerrado suas tarefas (Monczka et al, 1998, p.168). Entretanto, esta miopia estaria sendo substituída pelo que talvez seja a forma mais efetiva de se evitar o lado negativo da especialização e da departamentalização (Dobler, Burt, 1996, p.11). Estão sendo formados grupos multifuncionais com representantes das diversas áreas relacionadas com a compra do produto em questão (Ellram, 1991; Monczka, Trent, 1994). Estes grupos começam a fazer parte da nova estrutura da organização e podem permitir flexibilidade e acesso a uma gama de conhecimentos que não seria possível na antiga visão. Um estudo recente baseado em dados coletados durante o seminário “Purchasing and Materials Management Executive Seminar”, realizado em 1993 na Michigan State University (Monczka, Trent, 1994), revelou que 70 % das empresas analisadas estavam planejando forçar a utilização de equipes multi-funcionais para apoiar as decisões de fornecimento até 1997. No entanto, apesar do conceito ser de fácil compreensão, a sua implementação requer um grande esforço, pois necessita uma cultura corporativa participativa e cooperativa (Monczka, Trent, 1994) que, segundo Pearson, deveria ser baseada em trabalho de equipe, confiança, unidade, coordenação e respeito (apud Larson, 1994). 3.5.2 FONTES DE INFORMAÇÃO Como foi descrito na seção 3.4, o processo de seleção baseia-se nos critérios relevantes para a compra de um determinado produto ou serviço. O foco deste tópico consiste na identificação das possíveis fontes de informação que viabilizariam esta avaliação. As mais citadas na literatura (Leenders, Fearon, 1997; Dobler, Burt, 1996; Zenz, 1994; Monczka et al, 1998) são: • Catálogos: seu valor depende da sua forma de apresentação, da disponibilidade dos seus itens e do uso que é feito destas informações. 23 • Jornais de negócios: existe uma grande variedade em diferentes campos de atuação. Podem ser utilizados como leitura para descoberta de novos produtos ou materiais substitutos, ou como fonte de anúncios de fornecedores. • Representantes de venda: uma das melhores fontes de informação, com quem o comprador deve, na medida do possível, buscar um relacionamento cordial. • Arquivo de fornecedores e de produtos: registros históricos dos diferentes fornecedores que serviram à empresa e dos diferentes produtos comprados pela organização, onde constam dados sobre desempenho, preço, qualidade e outras informações pertinentes. • Visita a fornecedores: mais efetivas quando não constam dificuldades a serem debatidas. O responsável de compras pode ter conversas com executivos graduados que revelem elementos da estratégia futura do fornecedor. • Teste de amostras: amostras de produtos podem ser testadas sendo que a dificuldade é como estabelecer os critérios para o teste. Além destas, as publicações mais atualizadas já recomendam também o uso de Internet (Leenders, Fearon, 1997; Monczka et al, 1998). De fato, várias empresas, como a Mercury Computer Systems, por exemplo, estão aproveitando a imensa quantidade de informações na rede para tornar mais eficiente seu processo de seleção e avaliação de fornecedores (Monczka et al, 1998, p.245). E, a partir das informações obtidas nestas fontes, o comprador poderá fazer uma lista dos possíveis fornecedores e uma ampla análise de cada um para selecionar o melhor. Os autores também destacam que, qualquer que seja a fonte, sua qualidade é essencial para evitar erros no processo. Entretanto, não é raro que as empresas tenham listas de fornecedores preferenciais para a compra de algum produto novo. Pois um fornecedor preferencial já provou sua capacidade numa compra anterior e uma lista deste tipo pode economizar tempo e dinheiro, necessários para um processo de seleção de fornecedores (Monczka et al, 1998). 24 3.5.3 FERRAMENTAS Para simplificar e formalizar o processo de decisão de compras, as empresas geralmente utilizam modelos de seleção. Sobre esta base, Giunipero e Brewer (1993) e Willis, Huston e Pohlkamp (apud Braglia, Petroni, 2000) enquadraram os diferentes tipos de modelos de avaliação de fornecedores em três categorias: modelos categóricos, que classificam os diferentes critérios como abaixo da média, na média ou acima da média; modelos de pontos e pesos, que associam valores aos critérios e notas ao desempenho do candidato, e modelos de custo total, que buscam identificar todos os custos envolvidos numa compra. Eles estão citados em uma ordem crescente de custo, complexidade e modernidade. A primeira categoria de modelos é a mais simples e tradicional, o que não significa que esteja condenada ao esquecimento, pois não existiria modelo adequado a todas as situações (Goffin et al, 1997). Os sistemas de avaliação com maior êxito seriam aqueles que escolhem medidas realistas de desempenho, são fáceis de administrar, dão feedback aos fornecedores e recompensam o bom desempenho (Giunipero, Brewer,1993). Smytka e Clemens (1993) colocaram em um gráfico (Gráfico 2) os três tipos de modelo, de acordo com sua precisão e com o grau de complexidade da sua utilização. 25 Gráfico 2 SIMPLES COMPLEXO IMPRECISO PRECISO CATEGÓRICOS PONTOS E PESOS CUSTO TOTAL Fonte: Smytka e Clemens, 1993, p. 48. 3.5.3.1 Modelos categóricos Os modelos categóricos consistem na avaliação do fornecedor em diferentes critérios, classificando-o como abaixo da média (-), na média (0) ou acima da média (+) em cada um. Podem ser analisados tantos critérios quantos forem desejados sendo que, no final, todas as avaliações são agregadas, a fim de se obter uma compreensão sobre o desempenho do fornecedor. Este é o modelo mais simples, rápido e barato, que no entanto tende a ser influenciado por eventos recentes e geralmente implica um alto grau de subjetividade (Giunipero, Brewer, 1993). 3.5.3.2 Modelos de pontos e pesos Este tipo de modelo é amplamente utilizado devido à sua simplicidade, flexibilidade e eficiência na otimização das decisões de compra. Nele, o comprador 26 atribui pesos para cada critério de acordo com a sua importância, pontua o desempenho do fornecedor, soma o produto dos pesos pelos pontos e obtém a avaliação final do fornecedor (Thompson, 1991). Este método é mais caro e mais demorado que o anterior, mas tende a ser mais objetivo (Giunipero, Brewer, 1993). Mesmo assim, o modelo apresenta um obstáculo fundamental à sua implementação, que é sua dependência exclusiva da capacidade do comprador em estimar a pontuação do fornecedor, o que freqüentemente causa decisões erradas devido às incertezas envolvidas (Thompson, 1991). Apesar destes problemas, Gregory (1986) propõe outra utilidade para o modelo. No caso de uma compra ter que ser dividida entre dois fornecedores, a parte de cada um pode ser definida pela percentagem que representa a nota final de cada concorrente em relação à soma das duas notas. Isto pode ser uma forma de se reduzir o risco de se ter apenas um fornecedor, além de manter a competição entre eles. 3.5.3.3 Modelos de custo total Os modelos de custo total são os mais caros e complicados de se implementar, além de requererem muito mais tempo. Apresentam, no entanto, informaçõescom mais qualidade e precisão (Giunipero, Brewer, 1993). Este tipo de modelo busca incluir na análise de um fornecedor os principais custos relacionados com a decisão. Afinal, o fornecedor que oferece o preço mais atrativo não é necessariamente o mais barato (Degraeve, Roodhooft, 1999). No entanto, a inclusão de um determinado custo em um modelo depende da importância relativa e da magnitude deste custo em relação ao item comprado. “Utilizando a lei de Pareto, a idéia é considerar os 20% dos fatores que representam 80% dos custos” (Ellram, 1994, p.171). 27 Além disto, o modelo pode ser utilizado por diferentes motivos. Em um estudo de casos realizado por Ellram (1994), por exemplo, as empresas analisadas justificaram de diferentes formas o uso do modelo: • recompensar fornecedores por bom desempenho • identificar prioridades e incentivar melhorias no fornecedor • planejar desempenho futuro do fornecedor • medir desempenho atual do fornecedor • fornecer dados que ajudem na negociação • concentrar os recursos nas compras mais importantes • comparar o desempenho dos fornecedores entre si regularmente • reduzir a base de fornecedores • alocar volume entre fornecedores de um mesmo produto Existem, porém, várias barreiras à implementação dos modelos de custo total. Podemos citar algumas como: falta de dados sobre custo nas empresas, variedade de formas de aplicação do modelo, necessidade de uma mudança cultural na forma de comprar (não se basear somente no preço) e o fato de que os custos relevantes diferem de acordo com a natureza, magnitude e importância da compra. Além disto, é importante destacar a grande dificuldade enfrentada pelas empresas quanto à forma de valoração do custo total. Algumas fazem o cálculo alocando para cada atividade uma parcela de custo direto, outras associam pontos às diferentes etapas do processo de compras e encontram um custo em termos de um valor abstrato, existindo ainda uma terceira forma, igual à anterior, mas que converte este valor em moeda corrente (Ellram, 1994). No entanto, segundo Degraeve e Roodhooft (1999), recentes desenvolvimentos sobre o tema de gerenciamento contábil, como o Activity-based costing (custeio baseado na atividade), estão facilitando a quantificação dos custos envolvidos nas diferentes etapas de um processo de compra e conseqüentemente o uso de modelos de custo total. Estes modelos podem ser tanto gerais, servindo para qualquer tipo de compra, quanto específicos para cada produto ou serviço. Neste caso é necessário mais tempo e 28 dinheiro, mas em compensação adiciona-se mais flexibilidade e credibilidade ao processo (Ellram, 1994). 3.5.3.4 Outras ferramentas A maioria dos modelos de seleção de fornecedores recomenda a avaliação do vendedor baseada em um conjunto de critérios que o comprador identificou e ponderou previamente. Ao final deste procedimento é escolhido o fornecedor que recebeu a maior nota ou que tiver o menor custo total. A fraqueza desta técnica seria a de se basear na certeza de que as previsões de vendas, as especificações do produto, o calendário de produção e de entregas e as quantidades requeridas estejam todas perfeitamente corretas. Infelizmente, isto não ocorreria na realidade (Soukup, 1987). Logo, os fornecedores deveriam ser selecionados em função da sua capacidade de se adaptar às incertezas de mercado e não conforme seu desempenho no caso de ocorrer aquela situação prevista. Muitos fornecedores conseguem obter pontuações e custos semelhantes num processo de avaliação estático, porém poucos possuem a habilidade de se adaptar a mudanças imprevistas (Soukup, 1987). Recomenda-se, então, o uso de ferramentas de simulação e de análise de sensibilidade para que as incertezas que existem no mercado sejam incorporadas ao processo de seleção. 3.6 Quadro conceitual O quadro a seguir busca sintetizar as principais diferenças entre a abordagem tradicional e a abordagem estratégica da seleção de fornecedores, com base nas indicações extraídas da literatura, sendo sua estrutura inspirada em Goffin e outros (1997). 29 QUADRO 3 QUADRO CONCEITUAL Fator Abordagem tradicional Abordagem estratégica Relacionamento com o fornecedor • curto prazo • multiple-sourcing • antagônico • longo prazo • single-sourcing • cooperativo Estabelecimento de objetivos • Objetivo tático • Objetivo estratégico Critérios de Seleção • preço • qualidade especificada • velocidade de entrega • custo total • administração da qualidade total • serviço • estabilidade financeira • capacitação tecnológica atual e perspectivas futuras • cultura e estratégia organizacional • meio ambiente • fornecimento internacional • passado do fornecedor • carteira de clientes do fornecedor Locus da decisão de compra • Diferentes departamentos separadamente, Compras servindo como suporte. • Equipes multi-funcionais, envolvendo Compras, engenharia e qualidade. Forma de avaliação dos critérios • Não estruturada • Conforme os critérios mínimos especificados, subjetiva • Estruturada • Conforme avaliação com modelos de pontos e pesos e de custo total, objetiva 30 4 METODOLOGIA 4.1 Introdução Esta pesquisa pode ser classificada, quanto aos fins, como de caráter exploratório, pois há uma grande carência de trabalhos que discorram sobre como as empresas gerenciam suas decisões de Compras no Brasil. Dentre as estratégias disponíveis, considerou-se como a mais adequada para esta pesquisa a do método do caso. Segundo Yin (1989), “os estudos de caso são a estratégia preferível quando as perguntas colocadas são do tipo ‘como’ e ‘porque’, quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos e quando o foco é um fenômeno contemporâneo inserido em algum contexto da vida real” (p.3). Ellram (1996, p.115, apud Arkader, 1997) também aponta que “excelentes oportunidades existem para se usar a metodologia da pesquisa de estudos de casos em muitas áreas da logística e de compras”, indicando ainda que são “excelentes para a construção de teorias, para oferecer explicações detalhadas das melhores práticas e para propiciar maior entendimento dos dados coletados”. Devido às limitações inerentes aos estudos de caso, o estudo se propõe a descrever e analisar, em um dado momento, como estão organizados os processos de seleção de fornecedores nas empresas estudadas, com base nas percepções dos entrevistados, no setor escolhido, não se prestando suas conclusões a generalizações. 4.2 Escolha dos casos A escolha das empresas para desenvolvimento dos casos recaiu sobre empresas de autopeças que atendessem às seguintes características, que seriam indicativas de significativa responsabilidade da área de compras sobre o desempenho da empresa: 31 • Fossem do primeiro escalão de fornecimento, ou seja, fornec essem diretamente às montadoras a maior parte de seus produtos • Fossem de porte suficientemente grande para que a área de Compras pudesse ter relevância • Comprassem insumos e componentes tanto no país como no exterior • Vendessem produtos tanto no mercado interno quanto externo • Fabricassem produtos distintos Além disso, esperava-se que ja estivessem no mercado há bastante tempo, de forma a poder avaliar a evolução das questões aqui tratadas. Todas as três primeiras empresas contactadas aceitaram participar da pesquisa, atendem às características e têm, todas, faturamento anual superior a 100 milhões de reais. Estão ainda situadas em São Paulo, sendo tradicionais fornecedoras da indústria automobilística, com longos anos de existência. F1 fabrica componentes para motores à base de borracha, sendo esta a principal commodity comprada pela empresa. Os componentes comprados de fornecedores de segunda e terceira linha respondem por mais de 30% da sua matriz de compra . F2 produz sistemas de aspiração, sendo aço e papel filtrante as principais commodities utilizadas no seu processo produtivo. O volume de componentes comprados corresponde a 25% do volume gastoem compras. Já F3 fabrica componentes metal- mecânicos para motores e suspensão. Sua matriz de compra tem como principais produtos o aço e componentes produzidos por fornecedores de segunda e terceira linha. 4.3 Coleta de dados Os dados foram coletados através de entrevistas pessoais, utilizando-se roteiro de entrevista com perguntas estruturadas e não estruturadas, que serviu de guia para o aprofundamento das questões de interesse do estudo. Foram entrevistados os Gerentes de Compras das empresas escolhidas, com o objetivo de captar as suas experiências e percepções acerca dos vários temas tratados. 32 O roteiro de entrevista adotado, que se encontra no anexo 1, baseia-se no quadro conceitual comparativo entre a abordagem tradicional da seleção de fornecedores e a nova visão estratégica, apresentado no item 3.6 da revisão de literatura, bem como nas demais indicações da literatura sobre a questão da seleção de fornecedores. As entrevistas tiveram entre duas e três horas de duração. Todas foram gravadas e transcritas para utilização como base da análise dos resultados. 4.4 Perguntas da pesquisa A pergunta geral de pesquisa que este estudo se propõe a responder é: “Em que estágio se encontra a seleção de fornecedores no contexto da primeira linha da indústria brasileira de autopeças, face às novas filosofias e práticas de administração de Compras ? ” Mais especificamente, e para fins de orientação da pesquisa, esta pergunta geral se desdobra nas seguintes perguntas específicas: (1) Como evoluiu a função de compras e sua organização? (2) Como evoluíram os critérios de seleção de fornecedores ? (3) Como evoluíram os processos de seleção e avaliação de fornecedores ? (4) Qual a percepção geral dos compradores sobre a questão de seleção e avaliação de fornecedores? 33 5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS 5.1 Descrição dos Casos 5.1.1 EMPRESA F1 5.1.1.1 Evolução na função de compras e na sua organização Antes de 1996 O departamento de Compras era responsável pela compra de serviços, de insumos produtivos e não produtivos e pelo processo de exportação. No que se refere à compra de serviços, os contratos estavam espalhados pela empresa. A administração central responsabilizava-se por uma parte dos contratos, enquanto alguns departamentos das unidades tomavam conta de outros. Já a parte de insumos produtivos sempre havia sido corporativa. No entanto, de acordo com o entrevistado, "o departamento de Compras não se infiltrava nas unidades, não participava muito da elaboração de um processo, até que se celebrasse um contrato com o fornecedor", e ainda, “Compras não tinha acesso às Engenharias.” Toda a negociação era feita nas unidades. Estas iniciavam o contato com os fornecedores, desenvolviam as amostras e fechavam a negociação sem o envolvimento do departamento de Compras, que tinha uma função meramente administrativa de oficializar e formalizar o processo. O departamento contava com 19 pessoas, que já trabalhavam na empresa há bastante tempo, e não era informatizado. Mudanças na função de compras e na sua organização a partir de 1996 No ano de 1996, a empresa decidiu mudar os responsáveis pela área de Compras devido à constante pressão que passou a ser exercida pelas montadoras. Os preços dos seus produtos sofreram grandes quedas a partir do início da década, e a empresa queria 34 implantar no seu departamento de Compras esta mesma pressão em relação aos seus fornecedores. Foi escolhido, então, um novo responsável, transferido da área de Vendas, que tinha uma postura muito diferente daquela do anterior, que era de perfil antigo, "sempre preso àqueles fornecedores antiqüíssimos de matéria-prima" e que negociava pouco, aspecto fundamental na opinião do entrevistado: "o resultado está na negociação, um preço melhor, uma forma de pagamento melhor." A área de Compras passou a ser uma área estratégica, com a missão de buscar fontes alternativas que gerassem uma economia, "um saving significativo", como definiu o entrevistado. Com esse objetivo, Compras começou a recolher e identificar todos os contratos existentes, a fim de consolidar tudo no seu departamento. Mais nenhum contrato podia ser fechado sem o seu envolvimento. O departamento de Compras passou então a ser responsável por qualquer contato com um novo fornecedor. Compras passou a coordenar todo o relacionamento desde o início do processo, de uma primeira visita até a colocação de um pedido de compra para compras regulares. E com esta “mudança de filosofia”, a empresa conseguiu uma redução considerável dos seus gastos. O pessoal de Compras começou a se impor, a discutir e arrumar alternativas novas para o cliente interno. Existia até um projeto de descentralização de um comprador para cada unidade da empresa, para que este acompanhasse os projetos desde o início, mas que estava até então parado. O departamento comportava 13 pessoas e, na opinião do entrevistado, “já rendia o que rendiam 19 pessoas poucos anos antes”, isso sem estar informatizado. Eram dois compradores de matéria-prima, dois de improdutivos e mais o pessoal de suporte. Além disto, a empresa estava implantando um software de gestão integrada, que deveria permitir uma redução ainda maior de pessoal. Apesar de "não existir uma meta de redução de fornecedores", Compras levava isso em consideração até porque, com a estrutura pequena e cada vez mais enxuta, 35 segundo o entrevistado, “faltava tempo para ficar discutindo com todos para se ter uma redução.” Por conseqüência, a empresa preferia trabalhar com o single-sourcing, "porque é mais fácil lidar com um só", como explicou o entrevistado. Mas, ao mesmo tempo, desenvolvia outros fornecedores para não ficar dependente de um único. Assim, a empresa trabalhava com single-sourcing por um período de 1 ou 2 anos e depois renegociava em função das melhores alternativas. Outra razão para adotar uma política de single-sourcing era a necessidade de se ter escala para obter maior poder de barganha frente a grandes fornecedores. Em dois anos, a quantidade de fornecedores foi reduzida em mais ou menos 10%, atingindo o número de 360. Mas devia ser levado em consideração que a empresa estava ao mesmo tempo terceirizando vários serviços, o que fazia com que a quantidade de fornecedores aumentasse. O entrevistado também ressaltou que, apesar de estar buscando o single sourcing para períodos entre 1 e 2 anos, a empresa praticamente não trabalhava com contratos para não criar obstáculos para a troca de fornecedores. O objetivo era reduzir a base de fornecedores, mas sem assumir compromissos de longo prazo que inviabilizassem a captura imediata de economias com reduções de preço. Houve também um aumento de quase 100% nos processos de importação, decorrente de diversos motivos: o regime automotivo que permitia à empresa importar 50% gozando de benefícios e comprar 50% internamente; preços mais competitivos no exterior, que em alguns casos justificavam importar 100% da sua necessidade, e maior confiança e transparência na forma de o governo tratar o importador. 5.1.1.2 Evolução dos critérios de seleção de fornecedores Antes de 1996 Os principais critérios utilizados na seleção de fornecedores eram o preço e o atendimento às especificações técnicas do produto, que eram determinadas pelas Engenharias. Muitas vezes o preço era fixado pelos próprios fornecedores devido à 36 passividade da área de Compras, o que fazia com que a empresa fosse refém dos mesmos. Tudo era decidido na base da intuição e da experiência, sem o uso de qualquer análise mais aprofundada do mercado. Tampouco havia uma política prospectiva de compras. Mudança dos critérios de seleção de fornecedores a partir de 1996 Com a mudança na área de Compras, os critérios de seleção também acompanharam este processo. Antes de tudo, a empresa avaliava o critério preço, que nas palavras do entrevistado era “um dos fatores preponderantes." A empresa estava cada vez mais pressionadapor preço.” De fato, no caso de dois fornecedores se equipararem tecnicamente, a decisão era tomada em função da parte comercial. Quem oferecesse os maiores benefícios comerciais ganhava o pedido. E, segundo o entrevistado, a empresa tinha mais êxito nas negociações "com os fornecedores estrangeiros do que com os fornecedores locais." Também era feita uma análise do fornecedor para descobrir para quem ele fornecia, pois a empresa não gostava de trabalhar com quem estava começando no mercado, quando freqüentemente era necessário mais tempo para adequar-se aos padrões exigidos, sendo também mais arriscado. Além disto, o fornecedor tinha que ser homologado tecnicamente e pelo sistema da qualidade. A homologação técnica só ocorria no caso da compra de matéria-prima e consistia em uma análise feita pela área de engenharia, que verificava a compatibilidade do produto com as especificações. Já a homologação pelo sistema da qualidade verificava se o fornecedor tinha ISO-GUIDE 25 no caso da compra de serviços de laboratório, ou ISO 9000 e QS 9000 para os demais. Tendo a certificação, o fornecedor era aprovado. Caso contrário, devia responder a um questionário de auto-avaliação com dez questões que abrangiam os pontos principais da certificação e que geravam uma pontuação em relação à norma. Eram necessários no mínimo 50 pontos para haver uma aprovação. 37 A pontualidade também era um critério avaliado quando da seleção de um fornecedor. No entanto, no caso de acordos com novos fornecedores, esta era medida somente após o início do fornecimento. Mesmo assim, o fornecedor tinha que respeitar o que tinha acordado sob o risco de perder o cliente. A empresa também avaliava a capacidade tecnológica do fornecedor e sua assistência técnica. E, no que se refere a estes critérios, acreditava que, de uma forma geral, os fornecedores estrangeiros estavam mais evoluídos que os nacionais. Segundo o entrevistado, "a empresa até deixava de comprar de um fornecedor local por causa da assistência" e, no caso da compra de alguns produtos que requeriam tecnologia muito avançada, "a empresa tinha que ir para o exterior". Além destes critérios, também era considerada a preocupação com o meio ambiente, ainda que sobretudo nos projetos de modelos de veículos que teriam como foco de venda o mercado internacional, onde, segundo F1, esta questão já seria tratada com uma rigidez muito maior. Não foi colocado pelo entrevistado qualquer critério adicional considerado específicamente quando da compra de fornecedores estrangeiros. Segundo o mesmo, estes seriam "fornecedores de grande porte que oferecem muita segurança". 5.1.1.3 Evolução dos processos de seleção e avaliação de fornecedores Antes de 1996 O processo de seleção de fornecedores não era padronizado e variava de acordo com o produto e com o responsável. Não havia uma norma e nem etapas a serem seguidas. Da mesma forma, não existia qualquer forma ou processo objetivo de avaliação dos critérios de seleção. 38 Mudança dos processos de seleção e avaliação de fornecedores a partir de 1996 O processo de seleção de fornecedores sofreu uma grande mudança desde 1996, quando foi feito, com a ajuda de uma grande consultoria, o desenvolvimento de uma cadeia logística interna. Durante este desenvolvimento, a empresa implantou um sistema em Compras que constituía uma espécie de global-sourcing. Foi formado um grupo, liderado por Compras, composto por um técnico de cada unidade, que se reunia semanalmente com dois compradores para discutir as possíveis alternativas de fornecimento. Antes de cada reunião, o departamento de Compras compilava informações sobre vários fornecedores através de catálogos, revistas especializadas, jornais, contatos no mercado, informações das montadoras e, cada vez mais, através da Internet. Quando era encontrado um fornecedor que oferecesse uma oportunidade de economia significativa, este era apresentado na reunião. Se aprovado pelo grupo, a empresa iniciava o processo de desenvolvimento. Após essa etapa, era analisada a qualidade do fornecedor em termos de conformidade do produto com as necessidades da empresa e em termos de certificação pela ISO-9000 e pela QS-9000. A conformidade do produto com a especificação passada pela empresa era verificada pela área de Engenharia em conjunto com o pessoal do fornecedor. Já a validação da certificação era feita pela área de Qualidade. Caso o fornecedor não possuisse qualquer certificação, deveria responder a um questionário de auto-avaliação elaborado pelo pessoal da qualidade. Era feito então um pedido de amostras ao fornecedor e estabelecido um cronograma de desenvolvimento e de testes para cada unidade. Se não houvesse qualquer problema, este era aprovado. Neste caso, a empresa dava uma última chance ao fornecedor antigo de se equiparar ao concorrente e, se isto não ocorresse, aquele perdia o cliente. Este processo começou tanto pelos insumos mais dispendiosos quanto pelos mais estratégicos e evoluiu incorporando os demais. 39 Paralelamente, a empresa começou, em 1993, desde a implantação da ISO-9000, a criar um processo de avaliação dos fornecedores com o objetivo de controlar o serviço prestado pelos fornecedores correntes e montar um banco de dados que pudesse auxiliar em futuras seleções. A mudança iniciou-se por uma das perguntas básicas da norma: como o fornecedor sabe aquilo que tem que entregar? A partir daí, Compras fez junto com as Engenharias e com os usuários das matérias-primas ou serviços um levantamento de todas as especificações. Foi elaborada uma lista dos fornecedores homologados, onde todos os fornecedores entraram através dos históricos de fornecimento, o que foi permitido pela norma. Neste momento, a entrega das especificações foi formalizada. Neste processo, o departamento de Compras começou a criar uma lista de fornecedores homologados com a especificação formalizada, para os quais foi enviada uma carta perguntando se tinham ISO-9000. Aqueles que não tinham receberam os formulários de auto-avaliação. Após essa etapa, foi criado um sistema de acompanhamento de diferentes indicadores, que refletiam alguns dos critérios considerados quando da seleção de um fornecedor, mas que só poderiam ser determinados após o início do fornecimento. Um primeiro índice avaliava a qualidade dos produtos no recebimento. Outro refletia a pontualidade das entregas. A combinação destes dois com a pontuação da ISO-9000 e da QS-9000 resultava na classificação final do fornecedor. Este número não podia estar abaixo de 50% sob o risco de o fornecedor ser declarado inapto e perder o cliente. Todos esses indicadores eram monitorados trimestralmente por um grupo coordenado pela área de Compras e formado por três pessoas da área de qualidade, um representante de cada unidade, além do responsável pela coordenação geral do sistema de qualidade da empresa. Para cada índice a empresa exigia ações corretivas por parte do fornecedor, o que tinha contribuído para uma forte melhora. No caso de persistência dos problemas, o fornecedor podia até ser dispensado. Além disto, estes indicadores também eram usados para auxiliar a tomada de decisão quando da negociação de novas compras com fornecedores correntes. 40 Na opinião do entrevistado, apesar de a empresa ter criado um processo estruturado para selecionar seus fornecedores, este considerava objetivamente apenas uma parte dos critérios que eram utilizados na decisão. O julgamento da equipe de Compras ainda prevalecia, pois não havia uma metodologia objetiva de comparação entre os diferentes critérios. Exigia-se um mínimo para a maioria dos critérios e qualquer contribuição acima deste mínimo não era considerada pois, a partir daí, o que decidia era preço. 5.1.1.4 Aspectos adicionais da percepção da empresa sobre a questão de seleção e avaliação de fornecedores Nas palavras do entrevistado, "desde que foi implantado o sistema de avaliação com os índices, o relacionamento
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