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1 MANUSCRITO I GÊNESE HISTÓRICA E CONCEITUAL DO TRABALHO COMO EXPLORAÇÃO DA NATUREZA PARA A PRODUÇÃO DA EXISTÊNCIA HUMANA. Prof. Dr. Dalton Alves Pedagogia/UNIRIO/LIPEAD Departamento de Fundamentos da Educação Disciplina: Educação e Trabalho Primeiramente faça o seguinte exercício, de preferência antes de ler este texto, se conseguir: Pare, pense e responda para si mesmo, sinceramente (se puder, vá anotando num papel ou num lugar qualquer): O que é trabalho ou processo de trabalho para você? Ao pensar nisto, quais são as primeiras ideias, imagens, experiências de trabalho que veem à sua mente? Quando você vê uma pessoa trabalhando, o que você pensa? Tem algum trabalho que você acha ser do tipo ideal, o melhor de todos? Por quê? Quais os sentimentos que você associa ao trabalho, ao se ver trabalhando e ao ver alguém trabalhando? São sentimentos positivos ou mais negativos? Pense nesta frase: “O trabalho dignifica o homem (o ser humano) ”. Você concorda com esta frase? Por quê? O que mais lhe ocorre quando você pensa em TRABALHO? Bem, agora, depois de fazer este exercício, vamos tentar explicar o que a literatura, ou seja, o que algumas teorias nos dizem sobre o que podemos entender por trabalho ou processo de trabalho. A ideia é que durante este estudo você possa comparar a sua noção inicial de trabalho, manifesta em suas respostas às perguntas do parágrafo anterior, problematizando-as com base em outros pontos de vista que iremos conhecer através da literatura sobre este assunto que estudaremos nesta Disciplina. E podemos começar demarcando certa distinção que há no uso dos termos “trabalho” e “processo de trabalho”. O termo “trabalho”, isoladamente, não oferece uma compreensão adequada para aquilo que deve ser entendido por este conceito. Isoladamente, o termo “trabalho” é uma abstração. Já o termo “processo de trabalho”, por 2 sua vez, oferece uma noção mais objetiva daquilo que se quer significar com o uso do termo “trabalho”, pois, em última instância, trata-se sempre do processo de trabalho, trata-se, do método de organização e de realização da produção, do processo produtivo, ou seja, diz respeito ao modo pelo qual a espécie humana cria, constrói e faz coisas úteis para o seu consumo, para a sua sobrevivência e que não resulta de uma geração espontânea da natureza. Consiste em algo que para existir precisou do trabalho humano para ser criado. Por exemplo, o processo de trabalho dos primeiros grupos humanos na face da terra, na Pré-História, tinham como método a coleta, caça e pesca, não dominavam ainda a habilidade de produzir o seu próprio alimento e não domesticavam os animais, não fabricavam o próprio abrigo etc. Eram totalmente dependentes do que o ambiente que os cercava, a natureza, lhes provinha. Por isto, migravam de uma região para outra sempre quando as condições de sobrevivência em dado território ficavam escassas ou comprometidas. Eram nômades. Por outro lado, quando desenvolveram a capacidade de cultivar e de domesticar os animais puderam se fixar em determinado território, tornaram-se sedentários e, ao contrário do período do nomadismo, os seres humanos passaram a “forçar” a natureza a produzir segundo as suas necessidades, quantidades e de acordo com o tempo humano. Assim, passaram a depender cada vez menos da “vontade” da natureza. Eles passaram a interferir e alterar o curso natural das coisas, instituindo o “tempo humano”. E conforme avançavam no conhecimento do ciclo da natureza, do metabolismo dos animais e de si mesmos, na criação de instrumentos de trabalho e de novas técnicas para a realização das ações as quais precisavam para atender às suas necessidades de subsistência, aumentava, também, a sua capacidade produtiva, extraindo da natureza toda matéria-prima disponível e depois transformando-a, modificando-a, adaptando-a ao seu modo de vida e às suas necessidades: humanas. O trabalho é a fonte de toda riqueza, afirmam os economistas. Assim é, com efeito, ao lado da natureza, encarregada de fornecer os materiais que ele converte em riqueza. O trabalho, porém, é muitíssimo mais do que isso. É a condição básica e fundamental de toda a vida humana. E em tal grau que, até certo ponto, podemos afirmar que o trabalho criou o próprio homem (ENGELS, 1999, p. 04)). É neste sentido que Saviani (1994, 1995, 2007) irá dizer que ao contrário dos animais, que se adaptam à natureza, os seres humanos adaptam a natureza a si. E isto só foi possível à espécie humana devido ao processo de trabalho. 3 Ora, afinal, o que é então trabalho? Trabalho/processo de trabalho é, nesta acepção, uma atividade de transformação da natureza em benefício da existência humana, de produção de coisas úteis para o consumo e uso humanos. Conforme afirma Saviani, A medida em que determinado ser natural se destaca da natureza e é obrigado, para existir, a produzir sua própria vida é que ele se constitui propriamente enquanto homem. Em outros termos, diferentemente dos animais, que se adaptam à natureza, os homens têm que fazer o contrário: eles adaptam a natureza a si. O ato de agir sobre a natureza, adaptando-a às necessidades humanas, é o que conhecemos pelo nome de trabalho. Por isto podemos dizer que o trabalho define a essência humana. Portanto, o homem, para continuar existindo, precisa estar continuamente produzindo sua própria existência através do trabalho. Isto faz com que a vida do homem seja determinada pelo modo como ele produz sua existência. (SAVIANI, 1994, p. 02, grifos nossos). E esta “atividade” é uma ação criativa, própria dos seres humanos, de fazer existir o que não existia, de criar o novo. Essa ação de trans-forma-ação nada mais é do que esta capacidade humana de, pela sua “ação” direta, poder “transcender”, “ir além” da “forma” natural dada e atribuir-lhe outro formato, mais adequado aos interesses e necessidades humanas. Pense, por exemplo, na árvore, que na natureza em estado bruto, in natura, é derrubada pelo homem e dela ele faz uma mesa, uma canoa, madeiramento para construção de abrigos etc. A matéria continua sendo a árvore, mas, na forma, ela foi trans- formada em outra coisa, distinta e imprevista pela natureza, porém, mais adequada aos seres humanos. Imprevista pela natureza, pois não se pode contar com a geração espontânea destes produtos pela natureza. Trata-se de algo que para existir precisou da intervenção humana, do trabalho humano e que sem isto ele não existiria. Faça um exercício e olhe a sua volta, neste momento, e de tudo que você pode observar o que aí é totalmente natural, espontâneo, gerado pela natureza, sem intervenção humana alguma? A água é encanada, a luz é artificial, até o ar é condicionado, se possuir aparelho de ar-condicionado ou ventilador etc. Por isto tudo se percebe o quanto os seres humanos rompem com o padrão natural das coisas (NETTO e BRAZ, 2010, p. 30), impondo o seu padrão: humano. É bom que se diga que “artificial” significa, em linhas gerais, o que se faz por arte ou indústria; produzido pelo homem; que não é natural. Neste caso podemos afirmar que o mundo artificial é o mundo propriamente humano, criado por ele e é o que o diferencia dos demais seres da natureza, porém, vale lembrar que nunca o ser humano irá se desligar totalmente da natureza, pois sempre ele será parte 4 dela também. Os seres humanos são sim diferentes, mas não completamente independentes da natureza. Então, todo tipo de trabalho é uma ação de “trans-forma-ação” (ação de modificar a forma natural de algo), ação de criação. Daí que podemos afirmar que o trabalho é o processo pelo qual o homem ser-biológico/natural se transforma em homem ser- social/cultural. O processo de trabalho, assim, é o meio pelo qual o animal humano se torna propriamente ser-humano. Ele transcende o seu padrão natural herdado da natureza e o transformaem algo “imprevisto”: o ser-social. Donde irá surgir a Sociedade. Quando o homem se separa definitivamente do macaco esse desenvolvimento não cessa de modo algum, mas continua, em grau diverso e em diferentes sentidos entre os diferentes povos e as diferentes épocas, interrompido mesmo às vezes por retrocessos de caráter local ou temporário, mas avançando em seu conjunto a grandes passos, consideravelmente. Impulsionado e, por sua vez, orientado em um determinado sentido por um novo elemento que surge com o aparecimento do homem acabado: a sociedade (ENGELS, 1999, p. 13). E mais ainda: O homem sempre enfrentou problemas em sua luta pela sobrevivência, para solucioná-los ele foi criando e inventando soluções a partir dos recursos da própria natureza [...] Para se defender do frio e o ataque de outros animais, o homem teve que aprender a produzir e a controlar o fogo, todo o planeta era muito frio, todos os diferentes grupos espalhados pela terra do planeta precisavam de fogo. É provável que cada grupo tenha descoberto diferentes técnicas de produzir fogo com os recursos e conhecimentos de que dispunham. Tudo o que o homem inventava, criava e aprendia ia sendo aplicado na solução de outros problemas, na criação de novas soluções. O domínio do fogo, por exemplo, surgiu da necessidade que o homem tinha de se proteger do frio, mais tarde o fogo passou a ser utilizado para coser alimentos, transformar metais, fabricar peças mais resistentes. Aos poucos o homem foi transformando o ambiente, criando novos elementos que antes não existiam na natureza. Sempre que o homem assimilava novas técnicas e soluções ele e seu grupo se transformavam. O homem pré- histórico, por exemplo, era caçador nômade e não possuía abrigo fixo, abrigava grutas e cavernas, e dependiam de atividades de caça, pesca e coleta. (TELECURSO SEGUNDO GRAU, s/d [a]).1 O homem sempre extraiu da natureza tudo aquilo que precisava para sobreviver. Seu alimento, seu abrigo, suas vestimentas. Mas as maneiras de extrair os elementos da natureza mudaram muito ao longo 1 Para saber mais sobre o período em que o homem na pré-história aprendeu a dominar o fogo, assistir ao clássico: “A Guerra do Fogo (1981)”. Este filme é bom também para discussões acerca do desenvolvimento da linguagem humana articulada. Disponível: ANNAUD, Jean-Jacques. A guerra do fogo. Filme, 1981. Disponível em: https://drive.google.com/open?id=1jtcxIgRioZMh6BOQLH2JcSBaTvP66gWm Acesso: 19.03.2019. https://drive.google.com/open?id=1jtcxIgRioZMh6BOQLH2JcSBaTvP66gWm 5 do tempo [...] Eles se alimentavam somente de animais e plantas que ocorriam na natureza. Com o tempo o homem foi desenvolvendo instrumentos que facilitavam o seu trabalho na busca da sobrevivência. Eram instrumentos feitos de pedra, osso e madeira, talhados e lascados. (TELECURSO SEGUNDO GRAU, s/d [b]). A concepção ontocriativa do trabalho e o seu papel no processo de humanização não é outra coisa senão isto. E é este processo de criação de si, de autoprodução do próprio ser, da sua essência, um processo também pedagógico-educativo. Isto será retomado e desenvolvido mais adiante, por ora fiquemos com a noção da importância do trabalho na formação do Ser do Homem. Trata-se do trabalho como princípio ontológico de formação do Ser/Essência do Homem em seu processo de humanização. O termo processo de humanização, é bom esclarecer, implica que o homem não nasce humano, ele se torna humano. Ao nascer a criança tem as pré-condições biológicas para se tornar humana, mas ela somente se tornará humana efetivamente se receber os condicionamentos sociais, necessários, para isto. Pense, o que aconteceria com um bebê humano se ao nascer fosse abandonado à própria sorte? Sem outro humano para alimentá-lo, cuidar dele, protegê-lo do frio, calor etc., o que aconteceria? Mesmo passada esta fase inicial, se depois a criança não contar com outro humano para ensiná-la a andar, falar, se alimentar, se proteger, como seria o desenvolvimento dessa criança? Conforme Paulo Freire, “Ninguém nasce feito. Vamos nos fazendo aos poucos, na prática social de que tornamos parte” (FREIRE, 2001, p. 40). E mais ainda: segundo Immanuel Kant, O homem é a única criatura que precisa ser educada. Por educação entende-se o cuidado de sua infância (a conservação, o trato), a disciplina e a instrução com a formação. Consequentemente, o homem é infante, educando e discípulo [...] A espécie humana é obrigada a extrair de si mesma pouco a pouco, com suas próprias forças, todas as qualidades naturais, que pertencem à humanidade [...] O homem não pode se tornar um verdadeiro homem senão pela educação. Ele é aquilo que a educação dele faz. Note-se que ele só pode receber tal educação de outros homens, os quais a receberam igualmente de outros. (KANT, 1999, p. 11-15). Em outros termos, o homem nasce inacabado e somente se faz Ser Humano pela cultura. Por cultura entendemos tudo aquilo que é feito pelos seres humanos, que não deriva de geração espontânea, natural. Por exemplo, uma árvore na floresta é natureza, uma árvore no jardim é cultura, está ali para atender a uma necessidade humana, seja ela estética ou qualquer outra. 6 7 E ainda no vídeo-aula: O Homem e a Cultura, vemos que E tem mais: Esses homens que viveram num período de quinhentos mil e vinte mil anos atrás dependiam inteiramente da natureza, dos ambientes que os 8 cercavam. Sua vida era uma luta diária contra a fome, o frio e a fúria de outros animais. Os grupos humanos que viviam próximo ao mar acabaram desenvolvendo técnicas e instrumentos específicos para pesca. Grupos que viviam na floresta desenvolveram melhor utensílios para a caça. Sendo totalmente dependentes do ambiente que os cercavam, os homens foram desenvolvendo técnicas e culturas bastante diversificadas. Hoje, homens de diferentes civilizações sabem que num solo seco e duro uma semente não pode germinar e crescer, mas para os primeiros homens que viveram na face da terra a milhares de anos atrás este era um fato novo. Foi muito lentamente, observando, experimentando, aprimorando suas técnicas e ferramentas que os homens aprenderam a plantar e a produzir o seu próprio alimento. (TELECURSO SEGUNDO GRAU, s/d [b]). 9 Segundo Marx, 10 11 Qual é afinal a diferença entre os homens e os animais? Por que não podemos denominar de “trabalho” a atividade de sobrevivência dos animais? 12 13 Engels é categórico em relação a isto: só o que podem fazer os animais é utilizar a natureza e modificá-la pelo mero fato de sua presença nela. O homem, ao contrário, modifica a natureza e a obriga a servir-lhe, domina-a. E aí está, em última análise, a diferença essencial entre o homem e os demais animais, diferença que, mais uma vez (em última análise), resulta do trabalho. (ENGELS, 1999, p. 22). Contudo, ele se apressa para explicar que isto não é sem consequências em relação a natureza e sua vingança: (...) não nos deixemos dominar pelo entusiasmo em face de nossas vitórias sobre a natureza. Após cada uma dessas vitórias a natureza adota sua vingança. É verdade que as primeiras consequências dessas vitórias são as previstas por nós, mas em segundo e em terceiro lugar aparecem consequências muito diversas, totalmente imprevistas e que, com frequência, anulam as primeiras. [...] Assim, a cada passo, os fatos recordam que nosso domínio sobre a natureza não se parece em nada com o domínio de um conquistador sobre o povo conquistado, que não é o domínio de alguém situado fora da natureza, mas que nós, por nossa carne, nosso sangue e nosso cérebro, pertencemos à natureza, encontramo-nos em seu seio, e todo o nosso domínio sobre ela consisteem que, diferentemente dos demais seres, somos capazes de conhecer suas leis e aplicá-las de maneira adequada. (ENGELS, 1999, p. 22). Se pelo trabalho, que se trata da intervenção humana sobre a natureza para transformá-la e extrair dela o que necessita para sobreviver, o ser humano encontrou o meio mais adequado para garantir a sua perpetuação como espécie no mundo, por outro lado, isto pode (tende a) causar terríveis danos à natureza em geral (estão aí para prova- 14 lo a questão ecológica, aquecimento global, enchentes, epidemias etc.), os quais irão, cedo ou tarde, voltar-se globalmente contra a própria espécie humana. Por contraditório que pareça, por outro lado, são próprios homens que pelo seu trabalho, por esta sua capacidade de intervenção na natureza, é quem pode (deve) evitar que isto aconteça. Temos conhecimentos e tecnologias para isto, não é mais uma questão de ignorância, no entanto, nossos interesses localistas, egoístas, a ganância econômica pela acumulação ampliada do capital, impede que esses conhecimentos sejam direcionados para a organização da produção do existir humanos hoje de forma sustentável, preservando a natureza. Não obstante as implicações nocivas do processo de trabalho sobre a natureza em geral, à quais iremos ainda acrescentar outras consequências no próximo item (02), mas aí em relação ao próprio ser humano, de como o trabalho pode fazer mal também ao próprio homem, em especial ao homem-que-vive-do-trabalho, aos trabalhadores, todavia, neste momento nosso objetivo é destacar o aspecto positivo do trabalho, digamos assim, ou seja, pretendemos enfatizar a concepção ontocriativa do trabalho, do trabalho como atividade fundante do ser social, do ser humano. Nesta linha citamos mais uma vez Engels, que resume a importância histórica do trabalho no processo de humanização, nos seguintes termos: Graças à cooperação da mão, dos órgãos da linguagem e do cérebro, não só em cada indivíduo, mas também na sociedade, os homens foram aprendendo a executar operações cada vez mais complexas, a propor- se e alcançar objetivos cada vez mais elevados. O trabalho mesmo se diversificava e aperfeiçoava de geração em geração, estendendo-se cada vez a novas atividades. À caça e à pesca veio juntar-se a agricultura, e mais tarde a fiação e a tecelagem, a elaboração de metais, a olaria e a navegação. Ao lado do comércio e dos ofícios apareceram, finalmente, as artes e as ciências; das tribos saíram as nações e os Estados. Apareceram o direito e a política [...] (ENGELS, 1999, p. 18). 15 16 Devemos recordar o que diz Marx de que o trabalho é humano, pois implica intencionalidade e consciência dos seus objetivos ao figurar primeiro na mente um plano antes de executá-lo. Isto implica “liberdade”, por isto os animais não trabalham, pois realizam suas ações por um condicionamento genético que os obriga a garantir a sua sobrevivência de um modo determinado e invariável. Por isto não é possível termos um “joão-de-barro” decidido a garantir o seu abrigo construindo uma toca no chão ou um castor construindo uma casinha de barro na árvore. Para o ser humano isto já é possível, pois ele se serve com liberdade do que o ambiente dispõe. Mas de que “liberdade” se trata quando nos referimos ao processo de trabalho? Marilena Chauí sugere uma forma de pensar a “liberdade” que muito se adequa à noção de “trabalho ontocriativo” que procuramos desenvolver neste texto. 17 Entender a liberdade como “o poder de criar o possível”, proposto por Marilena Chauí, alarga os horizontes e permite ir além na compreensão do papel do trabalho em nossas vidas. Vez que assim podemos pensar o processo de trabalho como uma ação humana de criação do novo, que faz existir o que não existia. Podemos recuperar assim o sentido originário do trabalho, em seu sentido ontocriativo e confrontá-lo com a experiência atual de trabalho e analisar e criticar até que ponto a vivência que se tem do trabalho na atualidade corresponde aquilo que deveria ser no seu sentido ontológico. E aí isto pode conduzir a formas de luta e engajamento por melhores condições de trabalho. Para que se exerça com dignidade o próprio trabalho, de forma livre, criativa e emancipada. Isto implica refletir sobre o tipo de trabalho que se exerce hoje, na sociedade atual, capitalista. E podemos adiantar a afirmação de que o trabalhador na sociedade capitalista exerce um trabalho alienado, estranhado. O qual pode ser tudo, menos criativo, livre e emancipado. Não é criativo porque se faz o que é determinado pela empresa; não é livre porque o trabalhador não tem ingerência alguma ou quase nenhuma sobre a forma de organização do processo produtivo, a jornada de trabalho também não; e não é emancipador porque o produto do seu trabalho não é seu, mas de um outro. Até o seu metabolismo (hora de beber, de comer, ir ao banheiro, dormir, acordar) é controlado por 18 esse outro. E por ele exercer o seu trabalho, na maior parte dos casos, por necessidade e não por opção, trabalha-se no que for possível, no que aparecer, o negócio é estar empregado etc. Veremos no próximo item dessa Unidade, que nesta acepção a noção de trabalho aqui apresentada, de trabalho ontocriativo, ontológico, como atividade de produção da existência humana, o processo de trabalho assim reconhecido foi reduzido a atividade de produção de mercadorias, ou de venda, transporte, estoque, segurança de mercadorias etc. As formas e as percepções atuais e imediatas que temos do trabalho, do processo de trabalho, reduziu-se a noção simplista e vulgar de “EMPREGO”, não importando mais o trabalho que se realiza, e sim, só interessa o salário que esta atividade irá render ao final do mês. É o que afirma FRIGOTTO, segundo o qual, o TRABALHO “(...) é um processo que permeia todo o ser do homem e constitui a sua especificidade (sic). Por isso, o mesmo não se reduz à ‘atividade laborativa ou emprego’, mas à produção de todas as dimensões da vida humana” (2008, p. 400). Para melhor elucidar esta questão devemos analisar e compreender o conceito de trabalho alienado, estranhado ou de alienação do trabalhador no trabalho. Passaremos agora a tratar deste assunto no item 02, da UNIDADE I, do Cronograma. Referências deste texto: CHAUÍ, Marilena; BORNHEIM, Gerd. Vídeo completo: “Ética e Política – O Drama Burguês”. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=I6BrqfJaaqM>. Acesso em: 19.03.2019. ENGELS, Friedrich. Sobre o papel do Trabalho na transformação do macaco em Homem. Fonte Digital: RocketEdition de 1999 / Ed. Ridendo Castigat Mores. Disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/macaco.pdf FREIRE, Paulo. Política e educação: ensaios. 5ª. ed. São Paulo: Cortez, 2001. FRIGOTTO, Gaudêncio. “Trabalho” (p.399-404). In: PEREIRA, Isabel Brasil; LIMA, Júlio César França. Dicionário da educação profissional em saúde. Rio de Janeiro: EPSJV, 2008. Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/index.php?Area=Material&Tipo=8&Num=43>. Acesso em: 18.07.2014. KANT, Immanuel. Sobre a pedagogia. 2ª. ed. Piracicaba, SP: Editora UNIMEP, 1999. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. Livro I, vol. 01. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. https://www.youtube.com/watch?v=I6BrqfJaaqM http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/macaco.pdf http://www.epsjv.fiocruz.br/index.php?Area=Material&Tipo=8&Num=43 19 NETTO e BRAZ. “Trabalho, sociedade e valor”. In: NETTO e BRAZ. Economia Política: uma introdução crítica. 6ª. Ed. São Paulo: Cortez, 2010, p. 30). SAVIANI, Dermeval. “Escola: Dominação ou Transformação? ”. In: Painel sobre educação – VI Congresso da APP-Sindicato. Foz do Iguaçu, PR: APP-Sindicato, 26 de outubro de 1995. (Vídeo da Conferência). Disponível em: https://drive.google.com/open?id=1zKiPebXGTe78lyNdXLx4REhnMb--tsxA Acesso: 19.03.2019.SAVIANI, Dermeval. “O trabalho como princípio educativo frente às novas tecnologias”. In: FERRETTI, Celso [et ali]. Novas tecnologias, trabalho e educação: um debate multidisciplinar. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. Disponível em: <http://www.forumeja.org.br/go/files/demerval%20saviani.pdf>. Acesso em: 20.jul.2018. SAVIANI, Dermeval. “Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos” – (p.01- 15). In: Revista Brasileira de Educação. Campinas, SP: Autores Associados, v. 12, n. 34, jan./abr., 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v12n34/a12v1234.pdf>. Acesso em: 20.jul.2018. TELECURSO SEGUNDO GRAU. Vídeo-aula: O Homem e a Cultura, s/d. Disponível em: https://drive.google.com/open?id=1LkzHqyPUKXOzFONDpuT2vncu2_zrbpsc Acesso: 19.03.2019. TELECURSO SEGUNDO GRAU. Vídeo-aula: Pré-História e História, s/d. 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