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1 MEDICINA INTERNA I DISCUSSÃO DE CASOS AULA 8 DE NEFROLOGIA CASO CLÍNICO 1: Paciente, sexo feminino, 86 anos, portadora de artrite reumatoide de longa data, compensada após o uso de medicamentos imunobiológicos, evolui com edema de MMII, acompanhada por dispneia e dispneia paroxística noturna, ascite e redução do volume urinário. Chegou ao hospital onde foram realizados exames: Hb 10, creatinina 4,5mg/dL, proteínas totais 6,8g/dl, albumina 1,7g/dl, colesterol 320mg/dl, urina I – proteínas 3+ e hemácias 0. Ecocardiograma com disfunção sistólica e sinais de depósito em musculatura cardíaca. RX de tórax com sinais de derrame pleural bilateral. US de abdome com presença de ascite moderada, hepato-esplenomegalia e rins de tamanhos normais. Recebeu medidas terapêuticas sem melhora do quadro, seguindo por diminuição do volume urinário. Perguntas: a) Quais prováveis hipóteses diagnósticas sindrômicas? R: As prováveis hipóteses diagnosticas sindrômicas desse caso são: ✓ Síndrome nefrótica: edema + proteinúria + hipoalbuminemia. → decorrente do quadro de amiloidose, apresentado pela paciente, por meio do qual, o glomérulo fica cheio de depósitos, afetando a barreira de filtração glomerular. ✓ IC por uma provável síndrome cardiorrenal: edema, dispneia, ascite, disfunção sistólica e sinais de depósito em musculatura cardíaca. b) A doença renal é aguda ou crônica? R: A doença renal apresentada pela paciente é aguda. → quadro de IRA, uma vez que, os rins estão de tamanho normal e a Hb está normal também – ambos, indicativos importantes de lesão renal. c) Qual o próximo passo terapêutico para manuseio do quadro? R: O próximo passo terapêutico para manuseio do quadro é: 1. Administrar furosemida EV. → diurético de alça potente, crucial frente ao quadro de anúria e hipervolemia apresentado pela paciente. 2. Encaminhar para diálise. → se a paciente continuar apresentando anúria ou volume urinário insuficiente, mesmo com a administração de furosemida EV. 3. Solicitar biópsia renal. → para sabermos o que está gerando essa síndrome nefrótica apresentada pela paciente, direcionando a terapêutica. 4. Resultado da biópsia revelou o diagnóstico de amiloidose (doença que não tem cura). → iniciar tratamento paliativo + albumina. Evolução do caso: após piora do padrão respiratório, optou-se por realizar hemodiálise para redução da volemia. Com cerca de 5 sessões diárias, a equipe resolveu investigar realizando uma biópsia renal, que revelou: LETÍCIA MARABESI T1 – 6° SEMESTRE 2 MEDICINA INTERNA I AMILOIDOSE: Definição: é uma doença que ocorre por uma deposição de proteína amiloide. Proteína amiloide: independentemente do tipo de proteína amiloide, ela partilha de uma estrutura em comum que é a estrutura beta sheet ou folha beta. Alguns exemplos de proteínas amiloides são: beta amiloide, cadeia leve e beta 2 microglobulina. Outras características que as proteínas amiloides apresentam em comum são: ✓ São proteínas extracelulares; ✓ Coram pelo vermelho congo, que quando em birrefringência temos a chamada birrefringência em maçã verde. Classificação: PROTEÍNAS EXTRACELULARES CORADAS PELO VERMEHO CONGO BIRREFRINGÊNCIA EM MAÇÃ VERDE QUAIS ACHADOS DE BIÓPSIA PODEM SER OBSERVADOS? R: Depósito de fibrilas e teste com vermelho do congo positivo. QUAL PRINCIPAL HIPÓTESE DIAGNÓSTICA? R: Amiloidose AA. 3 MEDICINA INTERNA I Diagnóstico: se dá pela biópsia no local acometido pela amiloidose. Quando não soubermos o local exato acometido, temos alguns lugares mais recorrentes para biopsiar, tais como: TGI, gordura abdominal, glândulas salivares e reto. Amiloidose AL: é uma amiloidose sistêmica e primária, adquirida, sendo a amiloidose sistêmica mais comum, acometendo indivíduos mais idosos (média 65 anos de idade). Em relação ao seu quadro clínico, a amiloidose AL pode acometer qualquer órgão, exceto o SNC. O paciente pode apresentar sintomas constitucionais e, o envolvimento cardíaco e renais são comuns (ditando o prognóstico do paciente). ✓ Envolvimento renal: através de um quadro de síndrome nefrótica (edema + proteinúria + hipoalbuminemia). ✓ Envolvimento cardíaco: através de um quadro de cardiomiopatia restritiva. Outros sintomas podem ser: hepatomegalia, polineuropatia, síndrome do túnel do carpo e disautonomia. E, algumas alterações presentes no EF do paciente com AL são: Pode haver também alargamento de quadril ´falso´, por conta do depósito amilóide. Os exames complementares que nos ajudam são a biópsia renal, primeiramente. E, se formos fazer uma avaliação cardíaca, realizamos ECG, ecocardiograma e RNM cardíaca (padrão outro para avaliação de amiloidose cardíaca – é mais precoce que os outros exames). E, em relação ao tratamento da amiloidose AL, ele dá pode meio de um tratamento quimioterápico, com base no melfalan e dexametasona. Amiloidose AA: amiloidose sistêmica secundária, adquirida e relacionada a processos inflamatórios, neoplásicos e infecciosos. Em relação as doenças reumatológicas, que mais cursam com amiloidose AA, temos: ✓ Artrite reumatoide. ✓ Espondilite anquilosante. OLHOS DE GUAXINIM MACROGLOSSIA SINAL DA OMBREIRA: dá impressão que o paciente é super musculoso, mas não é, isso é apenas depósito amiloide mesmo. 4 MEDICINA INTERNA I ✓ Artrite idiopática juvenil. ✓ Febre familiar do mediterrâneo. É comum também, o envolvimento renal, através da síndrome nefrótica, podendo o rim estar de tamanho normal ou aumentado. Diferentemente da amiloidose AL, na AA, o comprometimento cardíaco é raro, assim como, a neuropatia. E, a hepatomegalia pode acontecer. O tratamento se dá pelo controle da doença de base, primordialmente. CASO CLÍNICO 2: Paciente, 58 anos, masculino, morador de Piracicaba, sedentário, iniciou quadro de dor intensa em membros inferiores há 4 dias, após sessão de spinning. No dia seguinte, houve piora progressiva do quadro doloroso, associado a um grande edema em coxa direita, com posterior urina de coloração acastanhada, com diminuição progressiva do volume urinário. Paciente procurou serviço médico há 2 dias, desidratado 2+/4, onde recebeu hidratação vigorosa de 4000ml em 24 horas, com volume urinário de 300ml de coloração escura. Exames: Hb 17.7g/dl, (paciente hemoconcentrado) creatinina 1,9mg/dl, Na 143mEq/l, CPK > 50mil, FENa 2%, urina I – cor acastanhada, sem aumento de hemácias ou proteínas. Perguntas: a) Qual provável hipótese diagnóstica e mecanismo fisiopatológico? R: A provável hipótese diagnóstica é de rabdomiólise, devido ao quadro de mialgia intensa pós exercício físico atenuante em um paciente sedentário. E, o mecanismo fisiopatológico é baseado na quebra do músculo estriado esquelético, liberando CPK (creatina fosfoquinase – enzima muscular) em excesso pelo organismo todo do paciente. A CPK em excesso gera a liberação de mioglobina na corrente sanguínea, o que acaba desencadeando, a urina acastanhada (mioglobinúria) e anúria (mioglobina em excesso chega no rim, paralisando-o, por meio do entupimento dos glomérulos e filtros renais). b) Qual etiologia da IRA? R: A etiologia da IRA é renal, tendo em vista que, o paciente apresenta FENa de 2% e anúria. c) Quais condutas terapêuticas para manuseio do quadro? R: As condutas terapêuticas para manuseio do quadro são: 1. Hidratação vigorosa o quanto antes possível; 2. Administrar bicarbonato para alcalinizar a urina 3. Compressa gelada para diminuir o edema na coxa D (podia evoluir com uma síndrome compartimental se não tratado). Paciente foi para diálise devido permanência do quadro de anúria, mesmo após hidratação vigorosa, e CPK ainda muito alta (não melhora a curto prazo). E, o tempo médio de sua recuperação foi em torno de 2-4 semanas. RABDOMIÓLISE: Definição: é uma síndrome clínica aguda e potencialmente fatal, que ocorrepor conta da lise da musculatura estriada, liberando componentes intracelulares na corrente sanguínea. 5 MEDICINA INTERNA I Epidemiologia: obesos mórbidos, pós operatório, uso de drogas ilícitas, uso crônico de hipolipemiantes e exercício físico atenuante. Quadro clínico: é varável de acordo com a gravidade da lesão e com as suas causas. Sendo sua apresentação clássica um quadro de mialgia aguda e pigmentúria. Paciente apresenta dor, sensibilidade e edema. Nos casos mais graves ou com sintomas inespecíficos, pode haver náuseas, vômitos, dor abdominal e alteração do estado mental. Fisiopatologia: pode ser por hipoxia (redução do aporte de oxigênio), por lesões de reperfusão ou por lesão na membrana íntegra do músculo. A liberação de mioglobina pela lesão muscular desencadeia lesão tubular diretamente pela mioglobina e obstrução intratubular. E, a depleção de volume circulante, desencadeia a ativação do ADH, SRAA e do sistema nervoso simpático – levando a vasoconstrição renal, podendo gerar isquemia renal. → 3 formas principais da lesão renal na rabdomiólise. Diagnóstico: se dá avaliação clínica (anamnese + exame físico – qual foi o mecanismo de lesão?) e por exames complementares, tais como, urina simples, gasometria arterial e a dosagem de creatinina, mioglobina, eletrólitos e ácido úrico. Pode ocorrer hiperpotassemia, hiperfosfatemia, hiperucinemia e hipocalcemia, por conta da lesão muscular. Além disso, pode haver acidose metabólica e o aumento das enzimas musculares (AST, ALT, DHL, CPK, aldolase, mioglobina). Tratamento: é direcionado em preservar a função renal do paciente. Tendo uma conduta baseada de acordo com os sinais vitais, débito urinário, valores séricos de eletrólitos e de CK do paciente. → hidratação precoce é crucial, estimulando a diurese e reduzindo risco de obstrução. Complicações: podem ser locais ou sistêmicas, sendo as principais síndrome compartimental, arritmias, CIVD e IRA. CASO CLÍNICO 3: Paciente, 28 anos, sexo feminino, parda, moradora de Piracicaba, desenvolveu quadro de febre baixa, fadiga, mialgia, emagrecimento, associado a tristeza e depressão, nos últimos 3 meses. Familiares relatam fenômenos de delírios e alucinações recentemente. Notou ainda lesões difusas de pele, descamativas e não ulceradas. Relata edema de MMII em tornozelos e artralgia esparsa. Refere mãos frias e azuladas em presença de clima mais frio no último inverno. Procurou USF para exames gerais: Hb 9,7, leucócitos 2.300, plaquetas 130.000, creatinina 1,45mg/dl, DHL 550mg/dl, bilirrubina 2,5mg/dl, Na 140, K 4,5mEq/l, urina I com proteínas 4+/4, hemácias 3+/4, C3 12mg/dl, C4 6mg/dl, anti- DNA + e Anti-P +, FAN +. Perguntas: a) Qual provável hipótese diagnóstica? R: A provável hipótese diagnóstica é de nefrite lúpica. → síndrome nefrítica com complemento reduzido, decorrente do diagnóstico de LES presentado pela paciente. b) Quais comprometimentos orgânicos atuais do quadro? R: A nefrite lúpica é uma doença com comprometimento sistêmico, que ataca em crises. 6 MEDICINA INTERNA I Paciente apresentando um quadro de anemia hemolítica clássico do LES: DHL, bilirrubina e Hb diminuídos. c) Qual significado para anti-DNA e Anti-P? R: Anti-DNA é um marcador específico de nefrite lúpica e Anti-P é um marcador específico de LES. → marcadores autoimunes específicos, que nos auxiliam na realização de diagnósticos diferenciais. d) Qual principal ferramenta diagnóstica para doença renal? R: A principal ferramenta diagnóstica em relação a doença renal é a biópsia renal. → a biópsia renal guia o tratamento de acordo com os seus achados. O tratamento muda de acordo com o comprometimento renal apresentado na biópsia. Sendo o tratamento do LES feito, geralmente, com prednisona e cloroquina. Nefrite lúpica: Introdução: o LES é uma doença autoimune caracterizada pela produção de vários anticorpos, incluindo anticorpos para antígenos nucleares (FAN), contra DNA, histonas e ribonucleoproteínas (RNP). O envolvimento renal, com o propósito de atender aos critérios acima, é definido pela presença de proteinúria persistente acima de 500mg/dia e/ou pela presença de hematúria e/ou leucocitúria e/ou cilindros celulares no sedimento urinário, desde que outras causas de alterações na urinálise estejam afastadas (ITU, por exemplo). Ocasionalmente, alguns pacientes, no início da doença, não preenchem os critérios clínicos e sorológicos para o diagnóstico de LES e já se apresentam com quadro renal sugestivo de nefropatia lúpica. A presença de doença renal é o preditor mais importante de morbidade e mortalidade em pacientes com LES. O curso clínico do LES, passando por atividades e remissões, requer uso de corticoides por longo período, além de outras drogas imunossupressoras. Epidemiologia: o LES acomete, preferencialmente, mulheres, com pico de incidência entre 15- 40 anos de idade, com um possível predomínio da doença nos afrodescendentes. O envolvimento renal é comum no LES, com doença renal clinicamente evidente ocorrendo em 50% dos casos. A nefrite lúpica aparece entre 6-36 meses após o diagnóstico de LES, não sendo rara, entretanto, pode ser a manifestação inicial de LES. 7 MEDICINA INTERNA I Patogênese: relacionada à formação de imunocomplexos, compostos principalmente de anticorpos contra DNA, nucleossomas e cromatina. Esses complexos imunes se depositam no mesangio e no espaço subendotelial, promovendo a ativação da cascata de complemento e influxo de neutrófilos e monócitos. Histologicamente, essas mudanças podem expressar uma proliferação mesangial ou uma proliferação mais intensa focal ou difusa. E, clinicamente, este processo inflamatório traduz-se pela presença de sedimento urinário rico (hematúria, leucocitúria, cilindrúria e proteinúria) e graus variados de declínio da filtração glomerular. Podem ocorrer também, depósitos de imunocomplexos em região subepitelial, havendo ativação da cascata de complemento, porém, sem o influxo de células inflamatórias. Esse depósito se manifesta clinicamente por proteinúria nefrótica e histologicamente por nefropatia membranosa. Classificação da nefrite lúpica: o diagnóstico histológico do tipo de nefrite lúpica requer a realização de exame de microscopia óptica e imunofluorescência. Mais recentemente, a microscopia eletrônica foi incorporada como método adicional para o diagnóstico de lesões glomerulares. Os achados esperados na imunofluorescência de uma nefrite lúpica são de depósitos de vários tipos de imunoglobulinas (IgG, IgM, IgA), além de complemento (C3, C4 e C1q). A nefrite lúpica pode ser classificada em: A transformação entre as classes histológicas pode ocorrer tanto de classes mais graves para as menos graves, como no sentido inverso, sobretudo em situações de recidivas ou tratamento inadequado. Manifestações clínicas: os pacientes com as formas mais leves de nefrite lúpica (classes I e II) costumam apresentam sedimento urinário pouco ativo e a proteinúria, quando presente, é inferior a 1g/dia. É comum encontrar títulos elevados de anti-DNA e hipocomplementemia. 8 MEDICINA INTERNA I Pacientes com histologia de classe III apresentam hematúria e cilindros hemáticos em 50% dos casos, com proteinúria nefrótica em 30%, HAS é pouco frequente e as provas sorológicas para LES geralmente estão positivas. Já os pacientes com classe IV apresentam alterações de sedimento urinário mais frequentes e mais exuberantes que as demais classes, com síndrome nefrótica em mais da metade dos casos. Insuficiência renal moderada também é comum, e evolução com rápida perda de função pode ocorrer em 20% dos casos. Na classe V, a manifestação é de síndrome nefrótica geralmente com função renal normal, podendo haver casos de comprometimento de função renal que sugerem um componente proliferativo junto com a histologia de membranosa. Indicaçãode biópsia renal em nefrite lúpica: A biópsia renal deve ser feita no paciente com LES quando houver sedimento urinário rico (hematúria, leucocitúria e cilindrúria), proteinúria e/ou perda de função renal, pois a terapêutica depende da classificação histológica. Entretanto, a biópsia renal não deve atrasar o tratamento, como nos casos de nefrite lúpica proliferativa (classe III ou IV), cuja clínica de perda de função renal e urina com sedimento ativo é muito característica. Nesta situação, deve-se iniciar o tratamento independentemente do momento da realização da biópsia renal. Além do diagnóstico do tipo de nefrite, a biópsia renal também permite avaliar o grau de comprometimento túbulo-intersticial e vascular do rim. Tratamento: As nefrites lúpicas classes I e II são de bom prognóstico e não necessitam de terapêutica específica, a não ser que progridam para classes mais graves. As lesões de classe III ou IV, ou qualquer forma que apresentar declínio de função renal ou crescentes celulares à histologia renal, devem ser tratadas com imunossupressão rígida de duração aproximada de 24 meses. O esquema clássico proposto para esses casos é o do National Institute of Health (NIH): A nefrite lúpica classe V tem sua terapêutica ainda sem consenso. Entretanto, a maioria dos autores optam por tratamento com prednisona 1 mg/kg/dia por 8 semanas sendo diminuído progressivamente e mantido em dose de 5 a 10 mg/dia por pelo menos 5 anos sem nenhuma atividade imunológica, associado a azatioprina ou micofenolato por 6 meses. Como dito anteriormente, é considerada uma forma histológica de evolução benigna, com sobrevida renal de 90%.
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