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Júlia Figueirêdo - DOR PROBLEMA 5 – ABERTURA: AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA E ESTRATÉGIAS ANESTÉSICAS: A avaliação pré-operatória tem como finalidade a redução do risco de complicações e da mortalidade em cirurgias, além de diminuir o custo dos procedimentos. Esse é o primeiro contato entre o anestesiologista e o paciente, no qual o primeiro irá definir o plano anestésico com base no histórico clínico do último. Principais itens que direcionam o planejamento anestésico No atendimento pré-anestésico, a anamnese completa e o exame físico são imprescindíveis, podendo até mesmo descartar a necessidade de exames complementares. Os principais tópicos da história clínica a ser avaliados são: Indicações para a cirurgia: determinados procedimentos podem implicar em maior risco de descompensação, seja ela peri ou pós- operatória; Uso prévio de anestesia: permite avaliar a tolerância individual ao anestésico, bem como coletar informações sobre via aérea difícil ou histórico de complicações; Alergias medicamentosas; Avaliação funcional do paciente: corresponde à determinação da aptidão do paciente em METs (equivalentes metabólicos), determinando possíveis comprometimentos prévios que devam sofrer intervenções clínicas perioperatórias; Classificação funcional em METs (excelente > 7 / moderado 4 a 6 / ruim < 4) Principais intervenções perioperatórias Avaliação cardiovascular: visa identificar condições preexistentes que devem ser controladas antes do procedimento, além de estabelecer o risco cardiovascular desse indivíduo (índice de risco de Goldman): Júlia Figueirêdo - DOR Elaboração do Índice de Risco de Goldman A identificação de pacientes que apresentam risco para Doenças Arteriais Coronarianas (DAC) também é crucial, destacando-se os portadores de diabetes e HAS, e tabagistas. O teste de tolerância ao exercício sempre deve ser aplicado, sendo que bons resultados podem minimizar a necessidade de outros exames. Indivíduos com resultados satisfatórios no teste de tolerância ao exercício apresentam maior resistência ao estresse, mesmo se forem portadores de DAC. Itens a serem avaliados no exame cardiovascular pré-cirúrgico Testes complementares, como ECG e ecocardiograma, devem ser solicitados somente a pacientes cardiopatas ou com suspeita diagnostica para esse quadro, de forma a identificar possíveis isquemias ou disfunções valvares que afetem o manejo perioperatório. Avaliação respiratória: tem como finalidade identificar pacientes com risco aumentado para intervenções pré ou pós-operatórias em ventilação. Esse tipo de comprometimento é mais comum que o cardiovascular. Os preditores mais fortes para essas complicações são o local (tórax e metade superior do abdome) e o tipo de cirurgia. A duração do procedimento também é importante, principalmente quando > 2h. Os principais fatores de risco associados ao paciente são: o Tabagismo (deve ser interrompido ao menos 8 semanas antes do procedimento); o Asma: é necessário considerar o número de crises nos últimos 6 meses (risco de reatividade pulmonar) e o uso de esteroides (insuficiência adrenal); o Apneia obstrutiva do sono: pacientes apresentam maior sensibilidade à depressão respiratória induzida por anestésicos. É comum principalmente em obesos; Pacientes com > 60 anos, com doenças pulmonares obstrutivas crônicas ou com baixa tolerância ao exercício, além de indivíduos com insuficiência cardíaca, devem ser considerados candidatos à implementação de medidas invasivas de ventilação. Avaliação pré-operatória do sistema respiratório Avaliação neurológica: pode ser laudada pela própria capacidade de resposta às perguntas da história clínica. Cabe também questionar a respeito de convulsões, doenças neuromusculares ou lesões neuromusculares prévias; Identificação de disfunções endócrinas e/ou metabólicas: pacientes diabéticos com HbA > 6ª 8% devem ter seus procedimentos cirúrgicos adiados até a resolução do quadro. A diabetes também eleva o risco de complicações cardiovasculares, lesões por posicionamento e dificulta Júlia Figueirêdo - DOR o acesso das vias aéreas (síndrome das articulações rígidas). Critérios de controle glicêmico pré-operatório Distúrbios de coagulação: medicações anticoagulantes devem ser avaliadas e substituídas quando necessário, de modo a evitar complicações por trombose (risco maior que o de uma possível hemorragia); Avaliação gastrintestinal: gestantes (2º e 3º trimestres), pacientes com manifestações graves de refluxo gastresofágico e indivíduos com estômago cheio apresentam risco elevado para broncoaspiração, o que fortalece a recomendação de intubação. A ingesta de fluidos ainda é um aspecto sem consenso dentre os pesquisadores, não havendo resultados que desencorajem a administração modesta de fluidos claros em até 2 h antes da cirurgia. Alimentos sólidos, no entanto, não devem ser ofertados a menos de 6 h da realização do procedimento. Recomendações para o jejum em pacientes previamente hígidos submetidos a procedimentos eletivos Na avaliação física, o paciente deve ser submetido a uma análise sistêmica (sinais vitais + sistemas cardiovascular, respiratório e musculoesquelético), sendo imprescindível a avaliação das vias aéreas (antes de todo procedimento). São avaliados: Estrutura da cavidade bucal; Distância interincisivos (maior que 3 dedos ou 5 cm – distância para passagem da lâmina); Avaliação da distância interincisivos Distância tireomentoniana (difícil de ser avaliada por variações na estatura, corresponde ao intervalo entre a ponta do queixo e a cartilagem tireóidea, devendo estar entre 6 e 6,5 cm); Júlia Figueirêdo - DOR Posição para a avaliação da distância tireomentoniana A avaliação da distância entre o mento e o osso hioide também pode ser utilizada na análise das vias aéreas. Avaliação da distância hiomentoniana, com pescoço em posição neutra Distância esternomentoniana (medida entre o mento e a ponta do manúbrio esternal, deve ser de, ao menos 12,5 cm); Avaliação da distância esternomentoniana, realizada com pescoço hiperestendido Capacidade de extensão e flexão do pescoço (identifica a capacidade de alinhamento dos eixos oral, faríngeo e laríngeo. Não é recomendada em pacientes com trauma raquimedular). Avaliação da mobilidade de cabeça e pescoço O sinal da Prece (incapacidade de encostar as palmas dos dedos com as mãos postas) pode auxiliar a identificar pacientes com imobilidade cervical e impedimentos na movimentação cefálica. Sinal da Prece, comum em diabéticos Principais componentes da avaliação das vias aéreas A classificação de Mallampati que descreve a relação língua-cavidade bucal é importante para determinar a complexidade do acesso às vias aéreas, mas não pode ser analisada isoladamente. Ela busca identificar toda a estrutura posterior da cavidade oral, sem obstruções à visão. Júlia Figueirêdo - DOR Classificação das vias aéreas (Mallampati) por meio da observação da cavidade oral e da análise laringoscópica Representação visual das classes de Mallampati Alguns protocolos podem predizer o risco de vias aéreas difíceis, que tornam o processo de intubação mais arriscado. Um desses instrumentos é o LEMON. Descrição do protocolo LEMON para identificação da via aérea difícil Tabela de preditores para dificuldade de ventilação por máscara Nesse instrumento, a avaliação faz uso da regra 3-3-2, que consiste em abertura da cavidade oral de ao menos 3 dedos, a mesma medida para a distância hiomentoniana, e 2 dedos para o intervalo entre o hioide e a borda da cartilagem tireoidiana. Aplicaçãoda regra 3-3-2 Os exames laboratoriais perioperatórios devem ser recomendados por meio da relação de “custo-benefício”, guiados pelos achados do exame clínico. As análises mais solicitadas são: Hemograma completo: a concentração mínima de hemoglobina deve ser de 7 g/dL para permitir a realização da cirurgia; Dosagem sérica de ureia e creatinina: devem ser solicitadas para idosos (assim como exame de urina para detecção de glicose) e indivíduos em uso de medicações nefrotóxicas; Estudos de coagulação: caso o paciente apresente história prévia de distúrbios de sangramento ou esteja em uso de medicações quimioterápicas, são solicitados tempo de protrombina e tempo parcial de tromboplastina; Radiografia de tórax: indicada para pacientes com história ou suspeita de doença pulmonar; Testes de função pulmonar (cada vez menos solicitados fora de cenários específicos, graças à oximetria de pulso); Teste de gravidez: aplicável somente em cirurgias eletivas de mulheres em idade fértil. Júlia Figueirêdo - DOR Indicações dos principais exames complementares, lembrando que pacientes > 40 anos sem comorbidades não são beneficiados pela realização destes Após o término da avaliação pré-operatória, o anestesiologista define a modalidade anestésica e os eventuais analgésicos pós- operatórios a serem utilizados, sempre de forma conjunta ao paciente, que deve compreender e aceitar a propedêutica antes de sua implementação. Além disso, são definidas alterações nos regimes terapêuticos vigentes, sempre que os medicamentos elevarem o risco de complicações, e implementada antibioticoterapia quando necessário. Recomendações de suspensão medicamentosa frente a cirurgias eletivas Direcionamento da antibioticoterapia, iniciada ao menos 30 min antes do procedimento O risco de transfusões sanguíneas e de possível internamento em UTI deve ser informado nesse momento. O paciente, ciente dos procedimentos e riscos deles decorrentes, deve assinar o termo de consentimento informado, imprescindível para a realização da cirurgia. ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO CIRÚRGICO: A definição do risco inerente a uma cirurgia pode ser realizada por meio da classificação do seu porte (quanto mais invasiva, maior a chance de complicações). Os critérios utilizados para essa estratificação são a intensidade do trauma tecidual e a perda sanguínea média esperada. Classificação do porte/caráter da cirurgia de acordo com sua magnitude Exemplos de cirurgias de baixo, médio e alto risco De forma a classificar o risco associado ao paciente para a realização de procedimentos, a escala mais empregada é a classificação ASA, que considera comorbidades prévias e a resposta Júlia Figueirêdo - DOR terapêutica a elas ao enquadrar o indivíduo em 6 possíveis categorias, com índice de mortalidade crescente entre elas. Em procedimentos de emergência, a letra “E” deve ser indicada ao lado da classificação mais adequada ao paciente Classificação ASA para risco cirúrgico Com base na Classificação ASA e na estratificação do porte cirúrgico, médicos podem direcionar adequadamente medidas de avaliação perioperatória, poupando assim o paciente de riscos desnecessários. Correlação entre a classificação ASA e o tipo de procedimento para a definição da avaliação pré- operatória Outras modalidades de classificações para risco cirúrgico podem ser utilizadas, em sua maioria associadas a características cardiovasculares, como: Índice de Goldman (exemplificado anteriormente); Índice de Lee: considera 6 variáveis distintas para determinar 4 classes de risco; Índice de Lee para risco cardíaco EMAPO: estratifica 5 categorias de risco (de muito baixo a muito elevado) a partir de 27 variáveis, abrangendo fatores cardiovasculares, funções renal e hepática, porte cirúrgico e idade como determinantes de risco; ACC/AHA: é um algoritmo que abrange o risco inerente à cirurgia, a avaliação da capacidade funcional do paciente, história de revascularização miocárdica prévia, além de sintomas clínicos e de alterações eletrocardiográficas. Júlia Figueirêdo - DOR Algoritmo da ACC/AHA para determinação do risco cirúrgico MECANISMOS ANESTÉSICOS: ANESTÉSICOS LOCAIS: A anestesia local corresponde à perda de sensibilidade focal, decorrente da inibição da propagação de impulsos aferentes. Alguns efeitos secundários incluem a paralisia muscular e a diminuição de reflexos, podendo ou não ser desejáveis. A recuperação geralmente não apresenta efeitos residuais, sendo espontânea e previsível. O principal exemplo dessa modalidade de medicamentos são a lidocaína (referência para duração intermediária). Essa modalidade anestésica apresenta como diferencial a capacidade de ser administrada diretamente no órgão (ou tecido) alvo, não sendo potencializada pela circulação periférica (pelo contrário, ela provoca redução do efeito). Os compostos apresentam estrutura lipofílica, o que garante duração mais longa e maior potência. Sua absorção é mais rápida ao ser aplicado em áreas densamente vascularizadas (ex.: mucosas), sendo o uso de vasoconstrictores empregado para diminuir a ação sistêmica do fármaco. A distribuição dessas substâncias pode ser localizada, diretamente para o tecido-alvo, utilizando-se de diferenças entre a densidade do medicamento e a viscosidade do meio, ou sistêmica, decorrente da passagem por dois compartimentos (órgãos de elevada e baixa perfusão). Os anestésicos locais são metabolizados no fígado ou no plasma, sendo excretados pela urina (raramente em sua forma inalterada). Os mecanismos de ação desses fármacos baseiam-se na inativação de canais de Na+ voltagem dependentes, que ocorre por meio da ligação destes a receptores próximos ao meio intracelular. A aplicação de concentrações crescentes de anestésico (ligação progressiva a canais iônicos) causa o declínio na taxa de crescimento do potencial de ação, gradualmente impedindo a deflagração de novos impulsos. Júlia Figueirêdo - DOR Representação gráfica do mecanismo de ação de analgésicos locais Os fármacos que compõem a lista dos anestésicos locais apresentam baixa afinidade e pouca seletividade por canais de sódio, podendo causar a desativação temporária de vários tipos de canais iônicos e receptores. A progressão do bloqueio ocorre de forma ordenada, inicialmente com a transmissão simpática (fibras B), evoluindo para as sensações de temperatura, dor (fibras C), toque leve e ação motora (fibras A). Resumo da ação dos analgésicos locais ANESTESIA GERAL: Os anestésicos gerais produzem alterações neurofisiológicas reversíveis ditadas pela perda de consciência, amnésia, analgesia, supressão de reflexos autônomos e relaxamento da musculatura esqueléticas, porém nenhum fármaco é atualmente capaz de gerar todos esses efeitos isoladamente. Relação entre nível (objetivo) e conteúdo de consciência (subjetivo) Os medicamentos pertencentes a essa classe afetam neurônios de forma difusa, tendo predileção por sinapses, seja de forma anterior, inibindo a liberação de neurotransmissores (canais de Na+ e K+), ou posterior a ela, modulando e reduzindo a propagação dos impulsos (ação sobre a acetilcolina, glutamato e serotonina). Ação anestésica geral por aumento da capacidade inibidora no SNC Ação anestésica por meio da supressão de estímulos excitatórios Os fármacos utilizados para o alcance da sedação geral podem ser segmentados de acordo com sua via de administração. Dessa forma, destacam-se: Anestésicos inalatórios: são subdivididos em voláteis (halotano, enflurano, isoflurano, etc.) e gasosos (óxido nítrico e xenônio), sendo que os últimos apresentamelevadas pressão de vapor e ponto de ebulição baixo, Júlia Figueirêdo - DOR justificando a necessidade de administração por meio de máscaras. A absorção desses medicamentos, independentemente da classe, se dá por meio da troca gasosa alveolar, modificável por meio do aumento ventilatório, capaz de elevar a concentração medicamentosa sérica. Exemplo do impacto da ventilação para a absorção anestésica (FA = [] alveolar / FI = [] inspirada) Esse gradiente se eleva principalmente em compostos pouco solúveis no sangue, exigindo poucas moléculas para alterar a tensão total (maior solubilidade = maior dissolução). Agentes menos solúveis apresentam maior velocidade na aproximação entre FA e FI Quanto mais rápida for a velocidade de aproximação entre a pressão inspirada e alveolar de um medicamento, mais acelerada é a indução anestésica. Esse gradiente irá variar entre os diversos órgãos e tecidos, dependendo de sua perfusão sanguínea, da solubilidade do medicamento e de seu coeficiente de partição. Esquema demonstrando a diferença entre anestésicos pouco solúveis no sangue (óxido nitroso) e muito solúveis (halotano), evidenciando o papel do equilíbrio de pressões para a passagem a outros compartimentos Os anestésicos inalatórios apresentam efeitos nos mais diversos sistemas orgânicos, a saber: o Efeitos no cérebro: todos os anestésicos gerais diminuem a atividade metabólica cerebral, o que em geral indica redução do fluxo sanguíneo local, porém o efeito resultante dependerá da concentração alveolar mínima do composto (quanto maior, maior ação vasodilatadora e menor potência). Podem ser identificados 4 estágios de depressão do SNC (sinais de Guedel): Estágio I: analgesia seguida por amnésia; Estágio II: excitação, com aumento da FR, FC e PA, e o paciente pode emitir sons, porém já há amnésia. A duração dessa fase é limitada pela administração de mais anestésico; Estágio III: anestesia cirúrgica, iniciado com a lentificação da FR, termina com a supressão dos movimentos respiratórios espontâneos; Estágio IV: depressão medular, com supressão da atividade de estruturas vegetativas, Júlia Figueirêdo - DOR podendo preceder a morte na ausência de manejo adequado. o Efeitos cardiovasculares: há redução no consumo de O2 pelo miocárdio, causando redução da FC e da PA; o Efeitos respiratórios: ocorre depressão respiratória, inibição de batimentos mucociliares e elevação na PCO2. Anestésicos intravenosos: permitem que a anestesia seja rapidamente induzida, uma vez que os fármacos são liberados diretamente na corrente sanguínea, e podem ser utilizados na manutenção da sedação. Os compostos mais utilizados são lipofílicos e com partição preferencial em tecidos lipofílicos com alta perfusão (ex.: cérebro), justificando o início quase imediato de seus efeitos. O término da ação anestésica ocorre apenas quando há a redistribuição dos compostos para áreas menos irrigadas, como músculos e tecido adiposo, condição que não aria com o metabolismo. Gráfico que indica a atividade do anestésico em relação ao tempo, tomando como base os sítios de distribuição Do mesmo modo que os medicamentos inalatórios, a realização de anestesia balanceada é utilizada para “compensar” a inexistência de um fármaco capaz de produzir os 5 efeitos desejados anteriormente. Os principais compostos usados são: o Propofol: é um potente indutor anestésico e hipnótico, mas não apresenta caráter analgésico. Há redução do metabolismo cerebral, porém alguns movimentos espontâneos podem ser observados. A vasodilatação geral é bastante pronunciada, aumentando com a idade, assim como a depressão respiratória; o Benzodiazepínicos: são ansiolíticos e indutores de amnésia anterógrada empregados ainda na fase perioperatória. Por penetrarem facilmente no SNC, apresentam rápido início de ação. o Etomidato: corresponde a um hipnótico não-analgésico com pouca ação hemodinâmica, agindo sobre receptores GABAérgicos, potencializando sua ativação. A presença de efeitos adversos ao sistema endócrino limita sua utilização; o Cetamina: apresenta ação analgésica significativa, além de induzir estado de amnésia dissociativa, na qual o paciente entra em estado cataléptico, mas com aumento da atividade cerebral (sonhos vívidos e respostas mioclônicas) e cardiovascular. Seu mecanismo de ação possível mente está associado ao bloqueio de receptores NDMA. É bastante empregada na pediatria. BLOQUEIO DE NEUROEIXO: As anestesias raquidiana e peridural correspondem a métodos de infusão espinal de medicamentos para redução da resposta estressora à cirurgia, permitindo também menor perda sanguínea Júlia Figueirêdo - DOR intraoperatória e melhor controle analgésico após o procedimento. Não existem contraindicações absolutas para nenhum desses procedimentos além da recusa do paciente e de reações de hipersensibilidade. A escolha da anestesia dependerá do tipo de cirurgia a ser realizada. Critérios de escolha para a anestesia raquidiana ou peridural A aplicação de ambos os métodos supracitados depende do conhecimento anatômico sobre a coluna vertebral. Destacam-se algumas estruturas, como: Processos vertebrais; Marcos anatômicos para a localização dos espaços intervertebrais Ligamento amarelo: espesso e distante das meninges, principalmente entre l4 e L6, minimizando o risco acidental de punção com uma agulha peridural; Espaço peridural: corresponde ao espaço entre as meninges e a porção lateral do canal vertebral, estendendo- se desde o forame Magno até o ligamento sacrococcígeo, limitado posteriormente pelo ligamento amarelo e pedículos vertebrais. É repleto de gordura e apresenta drenagem venosa abundante nas porções lateral e anterior. Com a injeção de líquidos ou ar, os espaços até então descontínuos passam a se comunicar. Graças a composição lipídica dessa região, anestésicos solúveis passam a ser “sequestrados” localmente, tendo sua biodisponibilidade reduzida. Representação anatômica do espaço peridural Meninges: o Dura-máter: estende-se por quase toda a extensão da coluna vertebral e segue o trajeto de raízes nervosas. Sua porção interna é altamente vascularizada, favorecendo o processo de eliminação dos medicamentos administrados por via peridural. O espaço subdural corresponde ao intervalo virtual entre a dura-máter e a aracnoide, podendo ser o destino acidental de medicamentos administrados localmente; Corte axial da medula, com destaque para os espaços meníngeos. O espaço subdural é representado pela linha azul-escura o Aracnoide: avascular, separa os espaços subdural e subaracnóideo, este último repleto de LCR, situado ao redor da pia-máter. o Pia-máter: é intimamente aderida à medula espinal; Júlia Figueirêdo - DOR o LCR: é substituído a cada 6 h, “circulando” pelo espaço subaracnóideo por meio de oscilações decorrentes da contração e dilatação cerebral. Não é um bom difusor de medicamentos, de forma que esse fluxo depende da baricidade da solução e da energia cinética associada à injeção; Medula espinal: estende-se até o nível de L1 (cede lugar à cauda equina, mais distante dos forames), originando 31 pares de nervos compostos por uma porção motora e outra sensorial (refletida nos dermátomos). Distinção entre a porção final da medula espinal (dilatada) e a cauda equina (em amarelo) Ambos os mecanismos anestésicos supracitados devem ser administrados somente em ambientes com equipamentos adequados para manejo de vias aéreas e ressuscitação. As agulhas empregadas apresentam pontas com nomenclaturas específicas, que auxiliam em sua identificação e distinção.Aquelas empregadas em peridurais são mais grossas (favorecem a passagem de fluidos ou cateteres por perda de resistência) em relação às da raquianestesia. Agulhas raquidianas (esq.), e peridurais (dir.), estas últimas com maior calibre A sedação dos pacientes antes da aplicação da anestesia deve ser mínima, pois ele pode colaborar com a equipe de forma a potencializar os efeitos esperados do medicamento (facilita o posicionamento e a confirmação da perda sensorial). A técnica de aplicação é específica para cada tipo de anestesia: Anestesia raquidiana: Nesse procedimento, o paciente deve estar em decúbito lateral, com ombros e quadris perpendiculares à cama e o lado a ser operado para baixo (se a solução for hiperbárica). Os joelhos e pescoço devem estar de encontro ao tórax (posição fetal). O sítio de punção deve ser identificado com o auxílio das cristas ilíacas, destacando os interespaços de L2-L3, L3-L4 e L4-L5. Posicionamento do paciente durante a aplicação da raquianestesia A aplicação da solução antisséptica deve ser realizada de forma a não Júlia Figueirêdo - DOR contaminar as agulhas ou anestésicos, pois esses compostos são amplamente neurotóxicos. A abordagem mediana ocorre por meio do avanço da agulha até a aracnoide (4 a 6 cm), havendo uma quebra de resistência ao perfurar a dura-máter (som “pop” audível). O local adequado é confirmado pelo gotejamento de LCR pela agulha. Aplicação da anestesia raquidiana e peridural É necessário atentar-se a possível perfuração de raízes nervosas peridurais (o paciente refere parestesia). Em pacientes incapacitados de flexionar a coluna, a abordagem deve ser alterada para a modalidade paramediana. Após a injeção do anestésico, a verificação do bloqueio deve ocorrer por meio de teste de tolerância à dor ou por sensação térmica, sendo seu início praticamente imediato. O bloqueio simpático pode estender-se de 2 a 6 dermátomos acima do bloqueio sensorial, que, por sua vez, se estende de 2 a 3 dermátomos além do bloqueio motor. Caso o paciente ainda apresente reação, o ideal é inclinar a superfície na qual o paciente está deitado. Anestesia peridural: Todos os processos inerentes ao posicionamento, monitorização e assepsia são idênticos aos aplicados acima, porém a anestesia peridural pode ser administrada em qualquer espaço intervertebral. O avanço da agulha é permeado por diversas mudanças sensoriais, percebidas pelo dedo que guia o catéter. Ao atravessar o ligamento interespinal é sentido um aspecto áspero, seguindo até o contato com o ligamento amarelo, momento no qual há um aumento da resistência seguida por perda súbita desta, indicando que essa barreira foi puncionada e não houve contato com as meninges (agulha no espaço peridural). A posição adequada é comprovada ao comprimir uma seringa com solução salina e ar acopladas à agulha, Se a bolha de ar for comprimida sem injetar o soro, o local é correto. Após o teste de confirmação da posição, pode ser injetado o anestésico (inicialmente em dose-teste, para averiguar possíveis inserções venosas), num processo capaz de causar um pouco de dor. O início do bloqueio ocorre cerca de 5 minutos após a aplicação, começando pelos dermátomos associados. Representação do preenchimento peridural por anestésicos Júlia Figueirêdo - DOR Segmentos apropriados para administração anestésica de acordo com o tipo de cirurgia As principais complicações associadas a esse procedimento são dor no local da punção, cefaleia pós-punção (perda de LCR, piora com a posição ortostática), raquianestesia total (bloqueio medular completo, alterando funções vegetativas), lesões neurológicas por perfuração e sintomas neurológicos transitórios (dor ou alterações sensoriais nas nádegas e pernas). BLOQUEIO PERIFÉRICO: A anestesia regional por bloqueio de nervos periféricos gera efeitos anestésicos e analgésicos bem localizados, eficazes e duradouros, seja como mecanismo isolado, em conjunto com a anestesia geral ou como estratégia de manejo pós-operatório. As técnicas mais empregadas para identificar os sítios de bloqueio são a estimulação neural e a ultrassonografia: Estimulação de nervos periféricos: o uso de um cateter-eletrodo com emissão de baixa corrente é capaz de gerar estimulação de fibras motoras, confirmando a localização do nervo sem que haja contato com a agulha, diminuindo incômodos e complicações ao paciente. Confirmado o posicionamento, uma dose-teste de anestésico é instilada, de forma a observar se há supressão dos reflexos motores. Quando esse desfecho é observado, o restante do medicamento pode ser injetado. Ultrassonografia: mais acessível, permite a identificação de estruturas anatômicas e referenciais para a localização do nervo, tendo como base a impedância acústica. Essa distinção evita punções vasculares acidentais. Assim que o nervo for encontrado, ele deve ser posicionado no centro da imagem e alinhado com a agulha, que deve ser visualizada na USG assim que penetrar a pele. Achados anatômicos numa USG para bloqueio periférico As técnicas de aplicação variam conforme o membro ou estrutura-alvo, sendo necessário o conhecimento anatômico regional de forma a identificar marcos e referências nos exames de imagem.
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