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Sistemas Dinâmicos Caóticos Jorge Maysson C Silva Junho 2020 1 Considerações Importantes Em sistemas dinâmicos estudamse equações de uma única variável indepen dente, o tempo. Do ponto de vista da variável t, tempo, o sistema pode ser discreto ou contínuo, isto é, quando t é inteiro, geralmente t ∈ Z+, ou quando t é um nú mero real, geralmente t ∈ R+, respectivamente. Seja como for, existem sistemas dinâmicos lineares e nãolineares. Em tese, a linearidade garante certa correspon dência do resultado final com os valores empregados inicialmente ao sistema. Já os nãolineares, não. Isto se deve ao fato de que, em sistemas dinâmicos lineares, vale o princípio da superposição de efeitos. O leitor interessado pode consultar a referência [9], da qual também retirouse informações contidas nesta seção, junta mente com a referência [7] Quando estudamos sistemas dinâmicos com variável contínua, é evidente que as equações governantes de tais sistemas são equações diferenciais, pois a deri vada trata de taxas de variação que, no nosso caso, vão estar relacionadas com t. Por outro lado, existem sistemas que não apresentam, em sua evolução temporal, mudanças nos intervalos de um instante para outro, possibilitando um tratamento no qual t varia discretamente. Nesse caso, trabalhamos com equações de diferen ças, ou recorrência. Em geral a maioria dos sistemas dinâmicos que encontramos na natureza se traduzem em equações nãolineares,e é muito difícil ou até mesmo insolúvel resolver tais equações, no sentido de obter soluções analíticas, ou seja, satisfazêlas para todos os valores da variável independente. Porém, podem existir soluções pontuais, isto é, para configurações específicas do sistema. Um exemplo disso está nosso sistema solar. Denominado como o problema dos n corpos, essas equações se referem ao movimento de n pontos de massa (ou n esferas homogêneas) num espaço tridimensional, sujeitos apenas à atração gra vitacional mútua. Isaac Newton (16421727) resolveu esta questão para n = 2 (digamos o sistema TerraLua), encontrando ummodelo analítico que descrevesse 1 este sistema. Poincaré (18541912) tentou solucionar o problema com três corpos, digamos M1,M2 e m, considerando M1 > M2 ≫ m, afim de facilitar a resolu ção, pois, desta forma, poderia resolver a dinâmica envolvendoM1 eM2 e depois aplicar o resultado a m, encontrando a fórmula final do problema. Porém, não conseguiu. Poincaré concluiu que a questão dos n corpos para n ≥ 3 era insolú vel no que tange a encontrar uma forma analítica que o descreva corretamente a dinâmica do sistema para uma posição inicial qualquer. (ver a figura 1 abaixo) Figura 1: Problema dos 3 copros gravitivos Fonte: Google No entanto, J.L. Lagrange (17361813) , em 1772, mostrou que nesse sistema há pontos de equilíbrio. Assumindo que M2 > M1 e que esses corpos descrevem órbitas circulares em torno do seu centro de massa, Lagrange mostrou a existência de duas posições de equilíbrio na órbita de M1, que são estáveis. Uma posição é considerada posição de equilíbrio se, colocando a massa m nesse ponto, ela ali permanece. Uma posição de equilíbrio é estável se m volta a esse ponto ou permanece na sua vizinhança após sofrer qualquer deslocamento perturbativo. Sem se afasta em consequência de alguma pertubação, o equilíbrio é dito instável. Os pontos de equilíbrio estável descobertos por Lagrange estão sobre a órbita terrestre, na intersecção com as retas que fazem ângulos de +60◦ e de −60◦ com relação à reta que passa pelos centros de massa da Terra e do Sol. Em tais pontos, m gira em torno de M2 e mantém uma distância angular fixa de M1. Assim, M1, M2 em formam, em todo instante, um triângulo equilátero que gira com um vértice fixo em M2. (ver a figura 2 abaixo) 2 Figura 2: Pontos de Lagrange no problema dos 3 corpos. Fonte: Google Na figura, os pontos marcados como L1, L2, L3, L4 e L5 são todos pontos de equilíbrio descobertos por Lagrange. Porém, os três primeiros assim listados são instáveis. Quando não se consegue obter uma solução exata, podese conseguir uma so lução aproximada através de expansão em série, é o que denominamos de obter numericamente a solução. Lançando mão desse meio, podese calcular a trajetória dos planetas tendo como base as leis de Newton e J.Kepler (15711630). Apesar das soluções de equações nãolineares não existirem de maneira fechada, ainda assim podemos estudar suas propriedades intrínsecas, como: equilíbrio, estabili dade, tipo de convergência e divergência, etc. A este tipo de leitura do sistema, chamamos de teoria qualitativa. Poincaré foi responsável por revolucionar o estudo das equações diferenci ais não lineares, através da introdução de técnicas qualitativas de geometria e topologia, sobrepondo as rigorosos métodos analíticos na solução dos sistemas. 3 2 Definições Importantes Muito do que será abordado neste trabalho são estudos com alicerce na topo logia matemática, que por sua vez só faz sentido se estivermos trabalhando numa estrutura na qual nos permita falar efetivamente em definições como proximidade, vizinhança de um ponto, pontos de acumulação, fecho de um conjunto, etc. Para isso, consideramos para todo caso que o domínio das transformações aqui estuda das são conjuntos imbuídos de uma métrica, isto é, são espaços métricos. Para o leitor que não está familiarizado com tal assunto, faremos nesta seção um rápido resumo. Observação. Não falamos de espaços topológicos em si, pois existem espaços topológicos que não são métricos. Ao leitor que queria estudar com mais profun didade, acreditamos que a referência [5] seja uma obra bem completa. Definição 1. Uma métrica num conjunto M é a função d : M ×M → R que faz associar cada par x, y ∈ M um real d(x, y), denominado distância entre x e y tal que i) d(x, y) = 0; ii) d(x, y) > 0 se x ̸= y; iii) d(x, y) = d(y, x); iv) Desigualdade triangular: d(x, z) ≤ d(x, y) + d(y, z), onde z ∈ M . Um espaço métrico é o par (M,d) do conjunto M nãovazio da métrica d em M . Um exemplo muito comum é o espaço métrico Rn, constituído por nuplas x = (x1, . . . , xn), cuja métrica, com x, y ∈ Rn, é definida por: d(x, y) = √∑n i=1(xi − yi)2. Provemos este fato: Queremos provar que d(x, y) = √∑n i=1(xi − yi)2 é uma métrica emRn. Para isto, precisamos verificar se tal função cumpre as propriedades de uma métrica para pontos do Rn. Pois bem, que d(x, x) = 0, d(x, y) > 0 se x ̸= y e d(x, y) = d(y, x) é óbvio. Nos resta demonstrar a desigualdade triangular. Isto é, veremos se√∑n i=1(zi − xi)2 ≤ √∑n i=1(yi − xi)2 + √∑n i=1(zi − yi)2 realmente é verdade. Primeiramente, vamos supor que 4 yi − xi = ai e zi − yi = bi para cada n > 0. Portanto, teremos√∑n i=1(ai + bi) 2 ≤ √∑n i=1(ai) 2 + √∑n i=1(bi) 2. Elevando ambos os membros a quadrado, chegamos a seguinte desigualdade∑n i=1(aibi) 2 ≤ ∑n i=1(ai) 2 ∑n i=1(bi) 2, que é a chamada desigualdade de Couchy. Então, demonstrada a desigualdade de Couchy, teremos a prova da nossa métrica em questão. Observe: 1) se ∑n i=1(bi) 2 = 0, temos:∑n i=1(aibi) 2 = 0 = ∑n i=1(ai) 2 ∑n i=1(bi) 2. 2) se ∑n i=1(bi) 2 > 0, temos que o seguinte trinômio em x:∑n i=1(ai + bix) 2 = ∑n i=1(ai) 2 + 2 ∑n i=1(aibi)x+ ∑n i=1(bi) 2x2 ≥ 0, para qualquer x em R. Logo seu discriminante deve ser menor ou igual a zero: (2 ∑n i=1(aibi)x) 2 − 4 ∑n i=1(ai) 2 ∑n i=1(bi) 2 ≤ 0. O que prova a desigualdade de Couchy. Logo, d(x, y) = |y−x| é uma métrica em R, por exemplo. Assim como d(x, y) = √ (y1 − x1)2 + (y2 − x2)2 é uma métrica em R2. Observação. Na demonstração damétrica doRn, estamos considerando, junto com a hipótese 2), que ∑n i=1(ai) 2 > 0 também, pois, caso contrário, cairíamos no vamente na hipótese 1). Justificativa: Um dos principais conceitos na matemática é a continuidade, que por sua vez faz surgir o conceito de convergência e limite. O fato é que tais definições envolvem uma ideia de proximidade de dois pontos num espaço. Ob serve a noção destes conceitos: i) Uma função f : A → B é contínuase, dados x, y ∈ A com x ̸= y, eu puder tornar f(x) e f(y) tão próximos quanto queira, desde que se aproxime numa determinada distância x e y. ii) Dada uma sequência (xn), com n = 1, 2, . . . , n, . . . de pontos de um con junto X , dizemos que (xn) converge para um certo a ∈ X , se for possível tornar xn tão próximo de a quanto se queira, com n suficientemente grande. Portanto, percebese que estas definições só fazem sentido se a estrutura na qual trabalhamos, ou seja, o espaço em questão, me permitir medir distâncias, é neste sentido que a definição de métrica é importante. 5 3 A família quadrática Qc(x) = x2 + c É dado do nome de família quadrática a funçãoQc(x) = x2+c pois o parâme tro c ∈ R pode ser qualquer valor. Estudaremos, no cume do trabalho, a dinâmica de Qc para certos parâmetros, aqueles que tornam o comportamento da função in teressante para a nossa finalidade de entender a dinâmica caótica. Porém, antes disto, vamos estudar um pouco a dinâmica desse sistema. Começaremos obser vando para quais parâmetros Qc pode ser viável dinamicamente. Primeiramente vamos resolver a equaçãoQc(x) = x com a intenção de estabe lecer parâmetros para os quais a família terá pontos fixos, assim, dando o primeiro passo para a análise precisa da função. Segue então: Qc(x) = x ⇔ x2 + c = x x2 − x+ c = 0. Resolvendo, temos que x = 1 2 (1± √ 1− 4c). (1) Observe que existe em (1) três possibilidades: a) Se c > 1 4 não existiram pontos fixos em R. b) Se c = 1 4 existirá precisamente um único ponto fixo, p = 1 2 . c) Se c < 1 4 vão existir dois pontos fixos em R, distintos, nos quais denominaremos: p+ = 1 2 (1 + √ 1− 4c) e p− = 1 2 (1− √ 1− 4c). Perceba que na transição dos valores de c, aumentase de um para dois pontos fixos assim que c passa pelo valor de 1 4 . A este comportamento de duplicação de algum ponto fixo, chamaremos de bifurcação. Agora vamos estudar a natureza dos pontos fixos de Qc ao passo em que c se afasta de modo regressivo de 14 , ou seja, para c ≤ 1 4 . Conhecemos qual o tipo de ponto fixo estamos lidando através do módulo da derivada da função no ponto em questão. Então seja a derivada Q′c(x) = 2x, (2) temos que: 6 Q′c(p) = 1, Q′c(p+) = 1 + √ 1− 4c e Q′c(p−) = 1− √ 1− 4c. Sendo assim, temos o seguinte resultado. Proposição 2. (PrimeiraBifurcação)Considerando a família quadráticaQc(x) = x2 + c. a. Se c > 1 4 , não existem pontos fixos. Portanto, todas as órbitas tendem ao infinito; b. Se c = 1 4 , Qc tem apenas um único ponto fixo igual a p = 12 , que é neutro; c. Para todo c < 1 4 , Qc têm dois pontos fixos, p+ = 12(1 + √ 1− 4c) e p− = 1 2 (1 − √ 1− 4c), onde p+ é sempre repulsor e, para −34 < c < 1 4 , p− é atrator, sendo, também, neutro em c = −3 4 e repulsor para c < −3 4 . Demonstração: a. É muito óbvio. b. Ora, sendo c = 1 4 , existe apenas um ponto fixo cujo valor é p = 1 2 que se aplicado a deriva de Qc, temos |Q′c(p)| = 1. Portanto, p é neutro. c. Temos Q′c(p+) = 1 + √ 1− 4c e Q′c(p−) = 1− √ 1− 4c. Observe que para p+ ser atrator, ou neutro, bastaria |Q′c(p+)| ≤ 1, respectiva mente. Mas isso implicaria em √ 1− 4c ≤ 0, ou seja, c ≥ 1 4 , contrariando em partes a hipótese inicial na qual supomos que c < 1 4 . Concluímos, assim, que p+ é sempre repulsor para c < 1 4 . Vejamos agora o ponto p−. Notemos que para p− ser atrator, é necessário e suficiente que |Q′c(p−)| < 1, isto é |1− √ 1− 4c| < 1 ⇔ −1 < 1− √ 1− 4c < 1 −1 < √ 1− 4c− 1 < 1 ⇔ 0 < √ 1− 4c < 2 −1 < −4c < 3 ⇔ −3 4 < c < 1 4 . Veja, agora, que para p− ser neutro, basta |Q′c(p−)| = 1, que equivale a |1− √ 1− 4c| = 1 ⇔ 1− √ 1− 4c = 1 ou 1− √ 1− 4c = −1 c = 1 4 ou c = −3 4 . 7 Finalmente, para obter p− de modo a ser repulsor, é preciso que |Q′c(p−)| > 1, ou seja, |1− √ 1− 4c| > 1 ⇔ 1− √ 1− 4c > 1 ou 1− √ 1− 4c < −1. Sendo a primeira hipótese um absurdo, pois, caso não a fosse, culminaria que c > 1 4 . Então, trabalharemos com a segundo hipótese 1− √ 1− 4c < −1 ⇔ c < −3 4 . Encerrando a demonstração da proposição. 2 A figura 3 consiste no chamado diagrama de bifurcações, no qual tem por finalidade demonstrar o comportamento dos pontos fixos de Qc conforme seu pa râmetro varia nos termos dados anteriormente. Figura 3: Diagrama de Bifurcações Primeira Bifurcação de Qc Fonte: Autoria Própria O diagrama de bifurcações nada mais é que representar o comportamento dos pontos fixos quando, no caso de uma família de funções qualquer cujo parâmetro, digamos c, varia em seus valores e, no decorrer disto, observamos a aparição de novos ciclos conforme o valor do parâmetro c permite a existência de tais ciclos. Veja que na figura 1 mostramos o comportamento dos pontos fixos, porém, ob serve que o diagrama se refere ao comportamento dos pontos fixos para primeira aplicação deQc, isto é, sem a existência de novos ciclos. É como se analisássemos separadamente uma pequena parte de um diagrama de bifurcações que representa tal função em sua etapa de nésima iteração, pois o diagrama acima serve somente para nos dizer o comportamento dos pontos emQc e não nos diz quase nada sobre Q2c , Q3c e assim em diante. 8 Observação. O termo ciclo é empregado para designar um conjunto de pontos periódicos de período n ∈ Z. Por isto, dizse que um ponto x0 faz parte de um ciclo de período n se fn(x0) = x0 mas f j(x0) ̸= x0 para j < n. Dito isso, veremos agora a segunda bifurcação. Analisaremos para quais pa râmetros isto ocorre. Em outras palavras, iremos analisar os pontos fixos para função Q2c . Seja Q2c(x) = x 4 + 2x2c+ c2 + c. (3) Resolvendo Q2c(x) = x, obtemos x4 + 2x2c− x+ c2 + c = 0. (4) Lembramos que p+ e p− são pontos fixos de Qc, logo Q2c(p+) = p+ e Q2c(p−) = p−. Portanto, p+ e p− são raízes de (4). Utilizaremos isso para encontrarmos as outras raízes de Q2c(x) = x, ou seja, os pontos fixos de Q2c , que também são chamados de ciclos de período 2. Efetuamos a divisão de (4) por (x− p+)(x− p−), isto é, por x2 − x + c, que vai resultar em x2 + x+ c+ 1. (5) Igualando a expressão (5) a zero, obtemos as outras raízes de (4) q+ = −12(1 + √ −3− 4c) q− = −12(1− √ −3− 4c. Portanto, q+ e q− são os ciclos de período 2. Assim como fizemos com os ciclos de período 1, p+ e p−, abordaremos a natureza dos pontos fixos de Q2c . Observe que o discriminante da solução da equação (5) em questão é −3− 4c e que q± só vão existir em R se −3− 4c > 0 ⇔ c < −3 4 , pois, se c = −3 4 , então p− = q+ = q−. Então ciclos de período 2 só vão existir de em Qc quando c < −34 . Firmado isso, veja o seguinte resultado. Proposição 3. (SegundaBifurcação)Considerando a família quadráticaQc(x) = x2 + c, temos a. Para −3 4 < c < 1 4 , Qc tem um ponto fixo atrator em p− e não possui ciclos de período 2. b. Para c = −3 4 , Qc tem um ponto fixo neutro em p− = q+ = q− e nenhum ciclo de período 2. 9 c. Para −5 4 < c < −3 4 , Qc tem dois pontos fixos repulsores, p+ e p−, sendo q+ e q− um ciclo de período 2 atrator. d. c = −5 4 , em Qc, p+ e p− continuam sendo, evidentemente, repulsores. Porém, q+ e q− são neutros. e. c < −5 4 , Qc tem dois pontos fixos repulsores, p+ e p−, e q+, q− é um ciclo de período 2 repulsor. Demonstração: As primeiras duas situações já foram demonstradas bem acima da proposição. Seguiremos a partir da terceira. c. O fato de p+ e p− serem repulsores quando c < −34 foi explicado na pro posição da primeira bifurcação. Porém, daí q+ e q− existem para os parâmetros propostos. De fato (isso foi provado um pouco antes de enunciarmos a proposição 2). Agora, para ambos serem atratores, deve ocorrer |[Q2c(q±)]′| < 1. Temos que [Q2c(x)] ′ = Q′c(Qc(x)).Q ′ c(x) = [(x 2 + c)2 + c]′.(x2 + c)′ [Q2c(x)] ′ = 4x3 + 4xc. (6) Além disso, obtemos que [Q2c(q±)]′ = Q′c(q+)Q′c(q−). Então Q′c(q+)Q′c(q−) vai servir para classificar ambos. Temos Q′c(q+)Q ′ c(q−) = 4c+ 4 Logo, |[Q2c(q±)]′| < 1 se, e só se, |4c+ 4| < 1 ⇔ −54 < c < − 3 4 . d. Bom, como já foi mostrado que para c = −3 4 os ciclos de período 2 não existem, concluímos que para |[Q2c(q±)]′| = 1é necessário e suficiente que c = −5 4 . e. Para q+ e q− serem repulsores, bastaria que |[Q2c(q±)]′| > 1 ⇔ |4c+4| > 1 que vai implicar que c > −3 4 ou c < −5 4 . Como c > −3 4 não pode ocorrer, pois, se ocorresse, q+ e q− nem se quer existiriam, então é a segunda hipótese, o que equivale a dizer que ambos são repulsores quando c < −5 4 . Concluindo, assim, a demonstração da proposição. Veja a figura 4 que representa o diagrama da segunda bifurcação de Qc. 2 10 Figura 4: Diagrama de Bifurcações Segunda Bifurcação de QC(x) = x2 + c Fonte: Autoria Própria A figura 5 é um exemplo de como aparenta um diagrama de bifurcações em elevadas iteradas da função na qual o diagrama se refere. Figura 5: Diagrama de Bifurcações Mapa Logístico Fa(x) = ax(1− x) Fonte: Google Aproveitando o gancho, pontuamos que este diagrama de bifurcações (figura 5) é advindo do chamado Mapa Logístico Fa(x) = ax(1− x). Tal função possui diversas aplicações na área da biologia no que tange a população de alguma espécie em particular. Uma coisa interessante é que esta função, que também é quadrática, apresenta comportamento caótico para certos valores de a. O leitor interessado pode consultar a referência [3] e [7]. Na próxima seção vamos introduzir um conceito importantíssimo para a aná lise de sistemas dinâmicos caóticos. Posteriori vai se verificar que as definições contidas na seção a seguir são aplicadas a família quadrática Qc de modo a verifi carmos seu comportamento caótico. 11 4 Dinâmica Simbólica. Dinâmica Simbólica é uma dos recursos mais eficientes para se entender o comportamento caótico. Em suma, vamos converter a dinâmica complicada de um dado sistema para outro que, de início, aparenta ser totalmente diferente. Mas, na verdade, verificamos que tais sistemas são os mesmos, possibilitando a com preensão do sistema primário, que se fosse abordado em particular de maneira analítica seria muito, se não impossível, compreendêlo. Pois bem, a função da qual nos referimos, a que vai intermediar nosso entendimento de outros sistemas caóticos, é a função popularmente conhecida como ”shift”, mas seguindo as li teraturas usuais, chamemos de função deslocamento ou desvio. As definições e resultados aqui expostos serão condições sine quibus non para se entender a dinâ mica caótica na qual ocorre nos exemplos que serão dados no ápice do trabalho. Definição 4. O conjunto Σ = {s = (s0s1s2 . . . ); sj = 0 ou sj = 1} é chamado de espaço das sequências de dois símbolos. Definição 5. Sejam s = (s0s1s2 . . . ) e t = (t0t1t2 . . . ) dois pontos em Σ. A distância entre s e t é definido por: d(s, t) = ∑∞ i=0 |si−ti| 2i . Proposição 6. A distância d em Σ definida por: d(s, t) = ∑∞ i=0 |si−ti| 2i , é uma métrica em Σ. Demonstração: Sejam s = (s0s1s2 · · · ), t = (t0t1t2 · · · ) e u = (u0u1u2 · · · ). Claramente d(s, t) ≥ 0 e d(s, t) = 0 se, e somente se, si = ti para todo i. Como |si − ti| = |ti − si|, segue que d(s, t) = d(t, s). Finalmente, para qualquer três números si, ti e ui, temos a desigualdade triangular |si − ti|+ |ti − ui| ≥ |si − ui|. Daí deduzimos que d(s, t) + d(t, u) ≥ d(s, u). 12 Completando a demonstração. 2 Definição 7. A aplicação deslocamento, ou desvio, σ : Σ → Σ é definida por σ(s0s1s2 . . . ) = (s1s2s3 . . . ). Teorema 8. (Teorema da Proximidade). Sejam s, t ∈ Σ tais que si = ti com i = 1, 2, 3, . . . , n, então d[s, t] ≤ (1 2 )n. Reciprocamente, se dados s, t ∈ Σ, tais que d(s, t) ≤ (1 2 )n, então si = ti, para i ≤ n. Demonstração: Se si = ti para i ≤ n, logo: d(s, t) = ∑n i=0 |si−ti| 2i + ∑∞ i=n+1 |si−ti| 2i . Sendo ∑n i=0 |si−ti| 2i = 0, então: d(s, t) = ∑∞ i=n+1 |si−ti| 2i ≤ ∑∞ i=n+1 1 2i = 1 2n . Por outro lado, se sj ̸= tj para j ≤ n, então d(s, t) ≥ 1 2j ≥ 1 2n . Consequentemente d(s, t) < 1 2n , com si = ti para i ≤ n. 2 Teorema 9. A função σ : Σ → Σ é contínua em todo ponto do conjunto Σ . Demonstração: Dado ϵ > 0 qualquer, sabemos que existe n ∈ N tão grande quanto se queira tal que 1 2n < ϵ. Consideremos δ = 1 2n+1 se s, t ∈ Σ e d[s, t] < δ. Pelo teorema da proximidade, isto significa que si = ti para i = 0, 1, . . . , n + 1. Então s = t pelas primeiras n+2 entradas, ocasionando σ(s) = σ(t) até as n+1 entradas iniciais e assim d(σ(s), σ(t)) ≤ 1 2n < ϵ. Provando, assim, a continuidade da função deslocamento. 2 5 Sistema Dinâmico Caótico Uma das principais características de um sistema dinâmico caótico é sua sen sibilidade às condições inicias. Isso diz respeito ao seguinte: suponha F um mapa em R. Considere agora que F tenha sensibilidade às condições inicias, mesmo essa ideia ainda sendo bem vaga. Isso quer dizer que se você tomar dois pontos 13 x0, y0 ∈ R, arbitrariamente próximos um do outro, vai existir n > 0 tal queF n(x0) e F n(y0) vão estar abruptamente distantes um do outro. Vejamos um exemplo disto. Tal exemplo está no livro do James A. Yorke, referência [8]. Seja a transformação expansoraE3(x) = 3x mod 1 . Observamos que se considerarmos E3 em R nos pontos x = 13 ou x = 2 3 , E3 não é contínua. Porém, se pensarmos na expansora como sendo uma função que faz corresponder o círculo unitário nele mesmo, percebemos que a transformação é contínua (ver a figura 6). Figura 6: Aplicação de E3 no plano (a), e no círculo unitário (b) Fonte: ALLIGOOD, SAUER, YORKE, 1997, p.25 14 Mas se a transformação expansora E3 é contínua ou descontínua não importa muito quando nos restringimos a analise de sua dinâmica. O fato é que E3 apre senta sensibilidade às condições iniciais. Na figura 5 temos dois pontos separados por uma diferença de 0, 001. Observe que essa distância aumenta muito após uma certa iteração e, além disso, fica numa ”dança”de valores imprevisíveis. (ver a figura 7) Figura 7: Iterações em E3 Fonte: ALLIGOOD, SAUER, YORKE, 1997, p.25 Definiremos formalmente esta ideia. Definição 10. Seja F : X → X um sistema dinâmico no qualX é um espaço munido da métrica d. O sistema dinâmico F depende sensivelmente das condi ções iniciais se existe β > 0 tal que, dados x ∈ X e ϵ > 0, temse y ∈ X com d(x, y) < ϵ e d(F k(x), F k(y)) ≥ β, para algum k natural. Em outras palavras: um sistema dinâmico F depende sensitivamente das con dições iniciais se existe β > 0 de tal forma que para qualquer x e qualquer ϵ > 0, existe um y a uma distância menor do que ϵ de x e existe um número natural k, tal que a distância entre F k(x) e F k(y) é pelo menos β. Outra característica importante de um sistema dinâmico caótico é que o mapa, ou seja, a função que o representa é transitiva. Definição 11. Um sistema dinâmico F : X → X é transitivo se para qualquer par de pontos x, y ∈ X e quaisquer ϵ > 0, há um terceiro ponto z ∈ X tal que d(x, z) < ϵ e d(F k(z), y) = ϵ com k ∈ N. Dito de outra forma: um sistema dinâmico transitivo tem a propriedade que, dado dois pontos, podemos encontrar uma órbita que vem arbitrariamente perto 15 de ambos. Claramente, um sistema dinâmico que tem uma órbita densa é transi tivo, pois a órbita densa chega arbitrariamente perto de todos os pontos. O fato é que o inverso também é verdade— um sistema dinâmico transitivo tem uma órbita densa. Observação. Não demonstraremos este fato, mas ao leitor interessado: esse resultado pode ser encontrado na referência [1] no capítulo de dinâmica topológica. Uma consequência importante da transitividade em um sistema é que o mesmo não pode ser dividido em dois outros subsistemas e nem ter seu espaço, onde tal sistema opera, ”dobrado”ou decomposto, pelo simples fato de existir um ponto ar bitrariamente próximo de qualquer outro. Em suma, transitividade, que é eminente num mapa com dinâmica caótica, implica imediatamente em indecomposição. O interessante é que, apesar das características vistas, um sistema dinâmico caótico possui, intrinsecamente, um elemento de regularidade. Tal particularidade se traduz na matemática pelo fato de que as órbitas periódicas na função, com efeito, são densas. Já expostas estas ideias, podemos definir um sistema dinâmico caóticoda se guinte forma: Definição 12. O sistema dinâmico F é caótico se: 1. Pontos periódicos em F são densos; 2. F é transitiva; 3. F depende sensivelmente das condições iniciais. Partiremos agora para os exemplos de sistemas dinâmicos caóticos. 6 Exemplos 6.1 A Função Desvio Teorema 13. σ : Σ → Σ é um sistema dinâmico caótico. Demonstração: 1) O subconjunto de Σ que consiste em todos os pontos pe riódicos em σ, a qual denominaremos H , é denso em Σ. De fato. Devemosmostrar que dado um s = (s0s1s2 . . . ) ∈ Σ podemos encon trar sempre algum t ∈ H periódico arbitrariamente próximo de s. Tomemos ϵ > 0 en ∈ Z, tais que (1 2 )n ≤ ϵ. Consideremos o ponto tn = (s0s1s2 . . . sns0s1s2 . . . sn). 16 Ou seja, tn têm as primeiras n+ 1 entradas idênticas as de s, então, pelo teorema da proximidade, temos: d(s, tn) ≤ 12n < ϵ. Como s e ϵ são arbitrários, isto é, podemos tomar os valores que queremos para ambos, encontramos uma sequência tn tal que lim n→+∞ tn = s, provando que H é denso em Σ. 2) Existe um ponto em Σ cuja órbita por σ é densa em Σ. Isto é, existe um ponto emΣ cuja órbita em σ é arbitrariamente próxima e qual quer ponto em Σ. Evidentemente esta órbita não é periódica, pois, como vimos, isso significaria que uma certa quantidade de pontos na órbitas se acumulariam neles mesmos, limitando completamente o ”alcance”de tal órbita. Vamos descrever um ponto s℘ ∈ Σ da seguinte forma: s℘ = ( ︷︸︸︷ 01 00011011︸ ︷︷ ︸ ︷ ︸︸ ︷000001010011 . . . ). Ou seja, s℘ consiste em todos os blocos possíveis de 0′s e 1′s de comprimento 1, 2, 3, ..., respectivamente, como está acima. O ponto s℘ tem órbita densa em Σ (e tal órbita é um subconjunto de Σ). Tomemos s = (s0s1s2 . . . ), ϵ > 0 e n ∈ Z, tal que 1 2n < ϵ. Mostraremos que a órbita de s℘ está a uma distância de 12n de s. Pegamos umdos blocos de s℘ de comprimenton+1, cujos dígitos são s0s1s2 . . . sn. Digamos que o dígito s0 é a késima entrada de s℘, portanto se aplicarmos σk em s℘, teremos que as primeiras (n + 1) entradas de σk(s℘) serão idênticas as de s. Então, pelo teorema da proximidade, segue: d(s, σk(s℘)) ≤ 12n < ϵ. Tal resultado verifica a transitividade de σ. 3) A função σ depende sensivelmente das condições iniciais. Com efeito, consideramos B = 1. Para qualquer s ∈ Σ e ϵ > 0, escolhamos n ∈ Z tal que 1 2n < ϵ. Suponha t ∈ Σ satisfazendo d[s, t] ≤ 1 2n < ϵ, mas s ̸= t o que implica que temos si = ti, com i = 1, . . . , n, porém existe k > n tal que sk ̸= tk. Logo |sk−tk| = 1 (pela aritmética binária). Assim, tendo emmãos σk(s) e σk(t), as entradas iniciais de cada uma das sequências são diferentes, portanto d(σk(s), σk(t)) ≥ |sk−tk| 20 + ∑∞ i=1 0 2i = 1 ⇒ B = 1. 17 Então d(σk(s), σk(t)) ≥ B (pelo menos B). Isto demonstra a sensibilidade de σ às condições iniciais. 2 Na seção de Dinâmica Simbólica foi explicado que a função σ vai nos ajudar a compreender a dinâmica de outros sistemas. Nos exemplos a seguir veremos como isso de fato acontece. 6.2 A caoticidade da família quadrática Qc(x) = x2 + c Vamos iniciar nossa demonstração de caos na família quadrática pontuando dois casos importantes. Caso 1. c = −2 Toda a dinâmica que é interessante em Qc está no intervalo [−p, p] na qual p é um ponto fixo repulsor para c = −2, isto é, p = 2. Portanto analisaremos as órbitas de Q−2 no intervalo I = [−2, 2]. Recordamos do estudo básico de siste mas dinâmicos o seguinte teorema: Teorema 14. Supondo F : [a, b] → [a, b] é contínua. Então existe um ponto fixo de F em [a, b]. Demonstração: Ver referência [4]. Com isso emmente, partimos para a análise deQ−2: observamos que a função leva os subintervalos [2,0] e [2,0] de maneira injetora em I . Percebese que todos os pontos de I possuem uma préimagem em cada subintervalo, logo existe um ponto fixo em cada para Q−2. (ver a figura 8) 18 Figura 8: Q−2(x) = x2 − 2 Fonte: Autoria Própria Para Q2−2, existem dois subintervalos em [−2, 0] e mais dois em [0, 2] que são levados injetivamente em I porQ2−2. Sabese agora que I possui em cada intervalo [−2, 0] e [2, 0] duas préimagens para cada um de seus pontos. Para cada um desses quatro novos subintervalos existe um ponto fixo para Q2−2, ou seja, quatro pontos 2periódicos para Q−2. (ver a figura 9) Figura 9: Q2−2(x) Fonte:Autoria Própria Prosseguindo desta forma, chegamos ao seguinte resultado: Teorema 15. A função Q−2 têm no mínimo 2n pontos nperiódicos, para todo inteiro n > 0, no intervalo −2 ≤ x ≤ 2. 2 19 Caso2. c < −2 Iniciase aqui uma ”transição para o caos”. Com o parâmetro c < −2 existem alguns pontos de I cuja aplicação em alguma iterada de Qc faz com que tal ponto deixe o intervalo I . Organizaremos isso. Chamemos de A1 o conjunto de pontos em I cuja a aplicação à primeira iterada de Qc deixa o conjunto I , isto é, por exemplo, a ∈ I;Q2c(a) /∈ I . A2 o conjunto de pontos cuja aplicação à segunda iterada deQc fica fora do intervalo I e assim em diante. Removendo todos esses An de I , obtemos o conjunto Λ assim definido: Λ = {x ∈ I;Qnc ∈ I, para todo n}. Se um ponto tem uma órbita que eventualmente escapa de I , então este ponto pertence a An para algum n. Daí o complemento de Λ em I é apenas a união de An para todo n. Isto é: I − Λ = ⋃ n≥1An. Vamos recordar dos estudos de análise real os seguintes teoremas: Teorema 16. a) SeA1 eA2 são conjuntos abertos então a interseçãoA1∩A2 é um conjunto aberto. b) Se (Aλ)λ∈L é uma família qualquer de conjuntos abertos, a reunião A =⋃ λ∈L Aλ é um conjunto aberto. Demonstração: a) Se x ∈ A1 ∩ A2 então x ∈ A1 e x ∈ A2. Como A1 e A2 são abertos, existem ϵ1 > 0 e ϵ2 > 0 tais que (x − ϵ1, x + ϵ1) ⊂ A1 e (x−ϵ2, x+ϵ2) ⊂ A2. Seja ϵ omenor dos dois números ϵ1, ϵ2. Então (x−ϵ, x+ϵ) ⊂ A1 e (x−ϵ, x+ϵ) ⊂ A2 logo (x−ϵ, x+ϵ) ⊂ A1∩A2. Assim todo ponto x ∈ A1∩A2 é um ponto interior, ou seja, o conjunto A1 ∩ A2 é aberto. b) Se x ∈ A,∃λ ∈ L;x ∈ Aλ. Como Aλ é aberto, existe um ϵ > 0; (x− ϵ, x+ ϵ) ⊂ Aλ ⊂ A, logo todo ponto x ∈ A é interior, isto é, A é aberto. (A = intA) 2 Teorema 17. Um conjunto F ⊂ R é fechado se, e somente se, seu comple mentar A = R− F é aberto. Demonstração: Sejam F fechado e a ∈ A, isto é, a ̸∈ F . Pelo teorema 2, existe alguma vizinhança V ; a ∈ V que não contém pontos de F , isto é, V ⊂ A. Assim, todo ponto a ∈ A é interior a A, ou seja, A é aberto. Reciprocamente, se 20 o conjunto A é aberto e o ponto a é aderente a F = R− A então toda vizinhança de a contém pontos de F , logo a não é interior a A. Sendo A aberto, temos que a ̸∈ A, ou seja, a ∈ F . Assim, todo ponto a aderente a F pertence a F , logo F é fechado. 2 Esse teorema será fundamental na prova do próximo. Teorema 18. a) Se F1 e F2 são fechados, então F1 ∪ F2 é fechado. b) Se (Fλ)λ∈L é uma família qualquer de conjuntos fechados então a interse ção F = ⋂ λ∈L Fλ é um conjunto fechado. Demonstração: a) Os conjuntos A1 = R − F1 e A2 = R − F2 são abertos, pelo teorema 16. Logo, pelo teorema 15 e 16, (A1∩A2) = R−(F1∪F2) é aberto. Novamente pelo teorema 3, F1 ∪ F2 é fechado. b)Para cada λ ∈ L, Aλ = R − Fλ é aberto. Seguese que A = ⋃ λ∈L Aλ é aberto. Mas A = R− F . Logo F é fechado. 2 Ora, o conjunto An consiste em exatamente de 2n−1 conjuntos abertos, para cada n. Com o embasamento dos teoremas acima, Λ é um conjunto fechado ao passo que a união dos intervalos abertos An é um conjunto aberto. Portanto, na construção de Λ, tiramos A1 deixando dois subintervalos de I fechados para trás, nos quais usaremos mais tarde e serão denotados por I0 e I1. (ver a figura 10) Figura 10: Qualquer órbita no intervalo A1 tende ao infinito Fonte: DEVANEY, 1992, p.73 Então removemos A2, sobrando quatro subintervalos fechados. Por conse guinte retiramos A3, restando oito subintervalos fechados (ver figura a 11). Pros seguindo assim, quando removemos An, ficamos com 2n subintervalos fechados. Λ é o que resta quando removemos todos esses intervalos abertos. 21 Figura 11: Os intervalos (a) A1 e A2 (b) A1 e A3 Fonte: DEVANEY, 1992, p.74 Para findar o entendimento do conjunto Λ, segue o seguinte teorema:Teorema 19. Suponha c < −2. Então o conjunto Λ cujas órbitas sobre Qc não tendem ao infinito é um conjunto fechado, não vazio em I e que não contém intervalos. Demonstração: Seja Ai o conjunto de pontos cuja iésima iterada em Qc sai do intervalo I e, evidentemente, diverge. Temos que os extremos do intervalo I pertencem aΛ. Além disso, os extremos de cada intervaloAi, com i = 1, 2, . . . , n, retirados de I pertencem também ao conjunto Λ. Logo Λ é não vazio. Agora vamosmostrar queΛ não contém intervalos. Umamaneira mais fácil de provar isto é supor que c < − (5+2 √ 5) 4 ≃ −2.368. Isto é importante pois |Q′c(x)| > 1 para todo x ∈ I − A1. Em particular, existe uma constante µ > 1 tal que |Q′c(x)| ≥ µ para todo x ∈ I−A1. Suponhamos agora queΛ contém um intervalo J . Seja l o comprimento de J . Então l > 0. Como |Q′c(x)| ≥ µ para todo x ∈ J , se x e y são dois pontos quaisquer de J , pelo teorema do valor médio, temos: |Qc(x)−Qc(y)| > µ|x− y|. Concluindo daí que o comprimento do intervalo Qc(J) é maior que µl, isto é: Qc(J) > µl. Como µ > 1, temos que µn → ∞ quando n → ∞, culminando que a órbita de todos os pontos do intervalo J divergem. Isto é evidentemente uma contradição. Por fim observamos que Λ é um subconjunto fechado de I , pois o complemento de Λ é a união dos conjuntos abertos de todos os An. 2 22 Com o teorema 18 podemos afirmar que Λ é, na verdade, um conjunto de Can tor. Nesta passagem é importante explicar que lançaremos mão da conjugação topológica entre Qc para c < −2 e a função desvio σ. Uma conjugação deve ser vista como uma correspondência entre dois sistemas para atribuir coordenadas, semelhantemente a uma tradução de um idioma para outro. Primeiro vamos de finir a base desta conjugação: Definição 20. Seja x ∈ Λ. O itinerário de x é a sequência infinita de 0’s e 1’s dado por S(x) = (s0s1s2 . . . ), onde sj = 0 se Qjc(x) ∈ I0 e sj = 1 se Qjc(x) ∈ I1 . Observação. Como foi dito brevemente antes, os intervalos fechados I0 e I1 são advindos da remoção de A1 de I , ou seja, I − A1 = I0 ∪ I1 com I0 ∩ I1 ̸= 0. (ver, novamente, a figura 10) Teorema 21. Suponha c < (5+2 √ 5) 4 . Então S : Λ → Σ é um hemeomorfismo. Demonstração: 1. Injetividade: Suponhamos x, y ∈ Λ com x ̸= y. Assu mimos que S(x) = S(y). Isto significa que Qnc (x) e Qnc (y) sempre permanecem no mesmo intervalo I0 ou I1. Sabemos que Qc é injetora em cada um destes in tervalos e que |Q′c(x)| > µ > 1 para todo x ∈ I0 ∪ I1 para algum µ. Agora considere o intervalo [x, y]. Para cada n, Qnc leva este intervalo de forma injetiva sobre [Qnc (x), Qnc (y)]. Pelo Teorema do Valor Médio, temos |d(Qnc (x), Qnc (y))| ≥ µn|d(x, y)|. Quando n tende para +∞, temos uma contradição a menos que x = y. Por tanto S é uma função injetiva. 2. Sobrejetividade: Primeiro introduzimos a seguinte situação: seja J ⊂ I um intervalo fechado. Seja também Q−nc (J) = {x ∈ I;Qnc (x) ∈ J}. Em particular, Q−1c (J) denota a préimagem de J . Se J ⊂ I é um intervalo fechado, então Q−1c (J) consiste de dois subintervalos fechados, um em I0 e outro em I1. Para encontrar um x ∈ Λ com S(x) = s, definimos: Is0s1s2...sn = {x ∈ I | x ∈ Is0 , Qc(x) ∈ Is1 , . . . , Qnc (x) ∈ Isn}. 23 Desde que sj = 0 ou sj = 1 para cada j, o conjunto Isi é I0 ou I1. Daí temos Is0s1s2...sn = Is0 ∩Q−1c (Is1) ∩Q−2c (Is2) ∩ · · · ∩Q−nc (Isn). Para qualquer par de intervalos A e B, temos Q−1c (A ∩B) = Q−1c (A) ∩Q−1c (B). Assim, também podemos escrever Is0s1s2...sn = Is0 ∩Q−1c (Is1s2...sn). Temos que Is0s1s2...sn é um intervalo fechado, logo Is1s2...sn também é um intervalo fechado. Lema 1. (Intervalos Encaixados)Dada uma sequência crescente · · · ⊂ Xn ⊂ Xn−1 ⊂ Xn−2 ⊂ · · · ⊂ X3 ⊂ X2 ⊂ X1 de conjuntos compactos nãovazios, existe (pelo menos) um número real que pertence a todos os Xn. Demonstração do Lema 1: Definimos uma sequência (xn) escolhendo, para cada n ∈ N, um ponto xn ∈ Xn. Esta sequência está no compactoX1, logo possui uma subsequência (xn1 , xn2 , . . . , xnk , . . . ) convergindo para um ponto a ∈ X1. Dado qualquer n ∈ N, temos xnk ∈ Xn sempre que nk > n. Como Xn é com pacto, seguese que a ∈ Xn. Isto prova o lema. 2 Com este resultado auxiliar, note que⋂ n≥0 Is0s1s2...sn é não vazio. De fato, porque: Is0s1s2...sn = Is0s1s2...sn−1 ∩Q−1c (Isn) ⊂ Is0s1s2...sn−1 , uma vez que a intersecção de uma sequência de intervalos encaixados não é vazio, pelo lema 1. Note que se x ∈ ⋂ n≥0 Is0s1s2...sn , temse x ∈ Is0 , Q(x) ∈ Is1 , e assim em diante. Daí S(x) = (s0s1s2 . . . ). Isto prova que S é sobrejetora. 3. Continuidade: Seja x ∈ Λ e suponhamos que S(x) = (s0s1 . . . ). Seja ϵ > 0. Tome n tal que 1 2n < ϵ. Considere os subintervalos Is0...sn fechados definidos para todas as possíveis possibilidades de combinações t0 . . . tn. Estes intervalos são todos disjuntos e Λ está contido em um deles. Existem 2n+1 intervalos e Is0...sn é um deles. Escolhe mos δ tal que se |x − y| < δ e y ∈ Λ, implica que y ∈ Is0...sn . Simplesmente escolhemos δ tão pequeno tal que o intervalo de comprimento 2δ centrado em x não intercepta nenhum dos It0...tn com exceção do intervalo Is0...sn . Portanto, S(y) coincide com S(x) nas primeiras (n+1) entradas. Daí, pelo teorema da proximi dade (Teorema 7), temos que 24 d[S(x), S(y)] ≤ 1 2n < ϵ. Isto prova a continuidade de S. É fácil ver que S−1 também é continua. Logo, S é um hemeomorfismo. 2 Teorema 22. Se x ∈ Λ, temos S ◦Qc(x) = σ ◦ S(x) Demonstração: Ver referência [4]. Sabendo do teorema 21 e do teorema 22, o que na verdade acabamos de provar foi o seguinte teorema. Teorema 23. A função deslocamento em Σ é conjugada a Qc em Λ quando c < (5+2 √ 5) 4 . 2 Finalmente, seguímos para o resultado que nos mostra para quais parâmetros Qc é caótica. Teorema 24. Suponha c < (5+2 √ 5) 4 . Então a aplicação quadrática Qc(x) = x2 + c é caótica no conjunto Λ. Demonstração: Temos que S : Λ → Σ é uma conjugação para valores c < (5+2 √ 5) 4 . Usaremos o seguinte fato nesta demonstração: Lema 2. (Proposição Densidade) Suponha F : X → Y contínua e sobreje tora e suponha D ⊂ X um subconjunto denso. Então F (D) é denso em Y . Demonstração do Lema 2: Tome y0 ∈ Y e ϵ > 0. Como F é sobrejetora, existe x0 ∈ X tal que F (x0) = y0. Como F é contínua, existe δ > 0 tal que se x ∈ (x0 − δ, x0 + δ), então F (x) ∈ (y0 − ϵ, y0 + ϵ). Como D é denso em X , podemos tomar a ∈ D, com a ∈ (x0 − δ, x0 + δ). Portanto, z = F (a) ∈ F (D) e z ∈ (y0 − ϵ, y0 + ϵ). Logo F (D) é denso em Y . 2 Portanto, a Proposição Densidade garante que o conjunto de pontos periódi cos de Qc é denso em Λ, desde que S−1 leve pontos periódicos de σ em pontos periódicos de Qc. Se s℘ é uma órbita densa em σ, então a Proposição Densidade assegura que a órbita de S−1(s℘) é uma órbita densa para Qc, então Qc é transitiva. Agora, para provar que Qc é uma função caótica, precisamos exibir uma de pendência sensitiva. Lembramos que Λ está contido na união disjunta de dois intervalos I0 e I1. Escolhemos β menor que a distância mínima entre esses dois 25 intervalos. Seja x, y ∈ Λ com x ̸= y. Como S nos termos propostos é um he meomorfismo, S(x) ̸= S(y). Consequentemente essas duas sequências, S(x) e S(y), diferem em alguma entrada na qual diremos ser a késima. Isto significa que Qkc (x) e Qkc (y) permanecem cada um num intervalo Ii. Sendo assim, a distância entre Qkc (x) e Qkc (y) é ao menos β implicando que qualquer órbita próxima de x em algum momento se separa da órbita de x por uma distância maior ou igual a β. Logo, a família quadrática Qc(x) = x2 + c é caótica no conjunto Λ para c < (5+2 √ 5) 4 . 2 Observação. O Teorema é válido para (5+2 √ 5) 4 < c < 2 também, mas é bem mais difícil de se provar. 26 6.3 Ferradura de Smale Sejam Q = [0, 1]× [0, 1], A e B dois semicírculos de raio 1 2 , um abaixo de Q e outro acima, respectivamente. Convencionamos N = B ∪Q∪A. Sejam também Hj com j ∈ {0, 1} duas faixas horizontais tais queHj = {(x, y) ∈ R2; 0 ≤ x ≤ 1 e yj1 ≤ y ≤ y j 2} com 0 ≤ y01 ≤ y02 ≤ y11 ≤ y12 ≤ 1. Analogamente, firmamos Vj para j ∈{0, 1} duas faixas verticais tais que Vj = {(x, y) ∈ R2; 0 ≤ y ≤ 1 e xj1 ≤ x ≤ x j 2} com 0 ≤ x01 ≤ x02 ≤ x11 ≤ x12 ≤ 1. Concomitantemente, sejamG a faixa horizontal compreendida entreH0 eH1, H2 a faixa horizontal inferior em Q por baixo de H0 e H3 uma faixa horizontal superior em Q por cima de H1. (ver a figura 12) Figura 12: Construção da Ferradura de Smale. (1) Fonte: Autoria Própria Descreveremos agora como ocorre a dinâmica da Ferradura de Smale na qual vamos, por conveniência, denominar comoF : N → N . H0 eH1 são préimagens da primeira Iterada. Esta colocação vai facilitar o entendimento de F . O primeiro passo é ”esmagar”horizontalmente Q por um fator δ < 1 2 . Em seguída ”estica mos”verticalmente por um fator 1 δ e, finalmente, dobramos a resultante dos dois processos anteriores em forma de ferradura ”∩ ”e recolamos isso por cima de Q. (ver a figura 13) Figura 13: Construção da Ferradura de Smale. (2) Fonte: Autoria Própria 27 Na figura 13, bastaria fazer o mesmo com N e os pontos de A e B estariam em A. (ver a figura 14) Figura 14: Construção da Ferradura de Smale. (3) Fonte: Autoria Própria Observamos que F (N) ⊂ N e que F é injetiva, mas não sobrejetiva, en tão F−1 não está globalmente definida. Com vista à descrição da dinâmica de F em N , notemos que a préimagem de Q ∩ F−1(Q) consiste nos dois retângu los horizontais H0 e H1 que podemos assumir sem perca de generalidade serem transformados sobrejetiva e linearmente nos componentes verticais V0 e V1, pois F (Hj) = Vj para j ∈ {1, 0}. A largura de V0 e V1 é δ tal como é a altura de H0 e H1. A é um espaço métrico completo. De fato, A é um subconjunto fechado do R2 que é um espaço métrico completo. Dito isso, observamos que F é uma contração em A. Suponha x, y ∈ A e estão a uma distância d em A, porém, quando A passa pela transformação, visualmente a distância entre x e y diminui drasticamente, o que culmina em concordância com o Princípio de Contração de Banach. Então, pelo Princípio de Contração de Banach, existe um único ponto fixo, digamos p, em A para qual toda a dinâmica de F converge, acontecendo o mesmo com B, pois, F (B) ⊂ A. Qualitativamente, isto nos diz que estudar a dinâmica em A e B não nos é interessante no momento. Sendo assim, a dinâmica de F é realmente compreendida quando a vimos no conjunto Q, de modo que as órbitas dos pontos pertencentes a Q estejam em Q, pois caso contrário tenderiam a p. De maneira semelhante ao que fizemos com a família quadrática, vamos descrever um conjunto que vai reunir os pontos cujas órbitas não saem de Q. Portanto, temse ∆ = {q ∈ Q | F k(q) ∈ Q, ∀k ∈ Z}. 28 Para começarmos a entender como ocorre a construção de ∆, primeiro obser vemos a segunda forma da figura 12. Veja que agora estamos analisando a dinâ mica da Ferradura de Smale sobre o conjunto Q. Portanto perceba que F 2(N), do ponto de vista de Q, se trata, na verdade, de quatro componentes verticais de largura δ2. Assim, ao aplicarmos novamente a Ferradura em F 2, vamos ”esma gar”, ”esticar”e dobrar tudo em forma de ”∩”, obtendo, assim, oito componentes verticais de largura δ3. Prosseguindo assim, temos que F n(N) sobreQ se trata de 2n componentes verticais de largura δn, nas quais serão denotadas pelo conjunto ∆+ = {q ∈ Q | F k(q) ∈ Q, k = 1, . . . , n}. Temos que ∆+ é o produto cartesiano C1 × [0, 1] de um conjunto de Cantor por um intervalo vertical, ou seja, é um conjunto de Cantor com faixas verticais. (ver a figura 15) Figura 15: Construção da Ferradura de Smale. (4) Fonte: Autoria Própria A única diferença processual ao analisarmos a inversa de F é que, ao final da contração horizontal e estiramento vertical, é que, ao dobrarmos a resultante disto em forma de ferradura, a colocamos ”deitada”como ”⊂”. Então o conjunto F−1(N)∩Q é a uniãoH0 ∪H1 que são duas faixas horizontais de altura δ, como já foi explicado. Portanto, pensando semelhantemente, F−n(N) ∩Q consiste em 2n faixas horizontais de altura δn, nas quais serão denotadas pelo conjunto ∆− = {q ∈ Q | F−k(q) ∈ Q, k = 1, . . . , n}, que é, na verdade, o produto [0, 1]×C2 de um intervalo horizontal por um conjunto de Cantor. (ver a figura 16) 29 Figura 16: Construção da Ferradura de Smale. (5) Fonte: Autoria Própria Finalmente, temos ∆ = ∆+ ∩∆−. Logo, o conjunto∆ ⊂ Q é invariante em F , pois, qualquer ponto de∆+ ou∆− é transportado porF para um ou outro ponto que também está em∆. A intersecção dos dois conjuntos em termos de conjuntos de Cantor é também dada por ∆ = C1 × C2. Assim,∆ é um conjunto de Cantor. De fato,∆ é um conjunto perfeito (fechado e formado somente por pontos de acumulação), pois C1 e C2 são conjuntos per feitos. Observamos que o conjunto Qn−n+1 = ⋂n k=−n+1 F k(Q) é a união disjunta de 22n quadrados de lado δn (ver a figura 17). Figura 17: Construção da Ferradura de Smale. (6) Fonte: Autoria Própria 30 E ainda: ∆ = ⋂+∞ k=−∞ F k(Q). Concluindo que as componentes conexas do conjunto ∆ são pontos. Logo, ∆ sa tisfaz as três propriedades do conjunto de Cantor (compacto, perfeito e totalmente desconexo). Codificação dos pontos de ∆. Definimos anteriormente a função desvio σ nos termos do conjunto Σ = {s = (s0s1s2 . . . ); sj = 0 ou sj = 1}. Porém, para construirmos uma ”ponte”entre a Ferradura de Smale e a codificação binária, com a finalidade de obtermos a representação simbólica dos pontos de ∆, neces sitaremos expandir os termos das sequências binárias em Σ. Então definimos o conjunto: Definição 26. Σ2 = {s = (. . . s−2s−1s0s1s2 . . . ); sj = 0 ou sj = 1, i ∈ Z} de sequências binárias biinfinitas. Neste conjunto definiremos mais uma vez a função desvio. Definição 27. Seja σ : Σ2 → Σ2 definida por σ(. . . s−2s−1s0s1s2 . . . ) = (. . . s−1s0s1s2 . . . ). A função desvio σ, mesmo com tal ”aperfeiçoamento”, ainda mantém todas as propriedades anteriormente estudadas. Isto é, σ continua sendo caótica. Deste modo: Definição 28. A função h : ∆ → Σ2 definida por h(q) = (. . . s−2s−1s0s1s2 . . . ) onde sj = k se, e só se, F j(q) ∈ Hk, fornece o itinerário do ponto q ∈ ∆. Observação. O leitor que quiser entender minuciosamente como esta codifi cação acontece, única para cada ponto de ∆, veja referência [6]. Teorema 29. Seja σ : Σ2 → Σ2 a função desvio definida no espaço Σ2 de símbolos formado por sequências binárias biinfinitas. A função h : ∆ → Σ2 é uma conjugação topológica entre as funções F |∆ e σ. Demonstração: Comecemos por verificar que σ×h = h×F |∆. Seja q ∈ ∆ e ponhamos s = h(q) e t = h(F (q)). Implica 31 F j+1(q) ∈ Hsj+1 e F j+1(q) = F j(F (q)) ∈ Htj . Assim, sj+1 = tj , e, portanto, σ(s) = t, isto é, σ(h(q)) = h(F (q)). Vejamos, agora, que h é contínua. Consideremos a vizinhança Y = {t; tj = sj, j ∈ {−n0, . . . , n0}} de s = h(q). Para n0 fixo, a continuidade de F garante que existe δ > 0 tal que para a ∈ ∆ com |a− q| ≤ δ, F j(a) ∈ Hsj , para j ∈ {−n0, . . . , n0}. Se t = h(a) e |a− q| ≤ δ, então t ∈ Y , o que prova a continuidade de h. Mostramos queh é sobrejetiva provando, por indução, que o conjunto ⋂n j=1 F j(Hs−j) é uma faixa vertical com largura δn, para qualquer s ∈ Σ2. Seja, então, s ∈ Σ2. Para n = 1, aquele conjunto é F (H−1) = Vs−1 , que é uma faixa vertical de largura δ. Como ⋂n j=1 F j(Hs−j) = F ( ⋂n j=2 F j−1(Hs−j)) ∩ F (Hs−1) e, por hipótese de indução, ⋂n j=2 F j−1(Hs−j) é uma faixa vertical de comprimento δn−1, resulta que ⋂n j=1 F j(Hs−j) é uma faixa vertical de comprimento δn. Fa zendo n → +∞, concluímos que ⋂+∞ j=1 F j(Hs−j) é um segmento de reta vertical. Analogamente, ⋂0 −∞ F j(Hs−j) é um segmento de reta horizontal e o conjunto⋂+∞ −∞ F j(Hs−j) é constituído de apenas um ponto, q. Em particular, esse conjunto é nãovazio. Para esse ponto q resulta que h(q) = s, comprovando a sobrejetivi dade de h. Finalmente, mostramos que h é injetiva. Suponhamos que h(a) = h(q) = s. Para qualquer j, temos que F−j(a), F−j(q) ∈ Hs−j , pelo que a, q ∈ F j(Hs−j). Como j é arbitrário, resulta que a, q ∈ ⋂+∞ j=1 F j(Hs−j), ou seja, a e q estão no mesmo segmentode reta vertical quando n → +∞. Um pensamento análogo nos diz que a e q também estão no mesmo segmento de reta horizontal. Assim, porque o conjunto ⋂+∞ −∞ F j(Hs−j) é singular, concluímos que a = q e a demonstração está concluída. 2 Obviamente, tendo como base o teorema 28, é evidente que, assim como de monstramos com a família quadrática Qc, através da demonstração da existência da conjugação topológica com a função σ, ou seja, da dinâmica simbólica, é mais facilmente possível mostrar que Ferradura de Smale é um sistema com dinâmica caótica. 1. Existe um conjunto infinito numerável de pontos em ∆ com órbitas pe riódicas. Obviamente, x é periódico se sua sequência simbólica for periódica: ai = ai+n, para todo valor de i. Para cada valor de n, existem 2n sequências binárias biinfinitas diferentes que são periódicas de período n. Cada uma dessas sequências identifica um ponto em ∆. 32 2. Existe um conjunto infinito nãoenumerável de pontos em∆ que não são periódicos: são aqueles cujas sequências simbólicas não são periódicas. Existe pelo menos um ponto em ∆ cuja órbita é arbitrariamente próximo de qualquer ponto de ∆, o que significa que uma iterada de valor suficiente mente elevado da Ferradura de Smale fica próxima de qualquer ponto em ∆. Uma consequência importante disto é que o conjunto invariante ∆ não pode ser desdobrado em duas ou mais partes separadas, pois pelo menos um ponto pode eventualmente aproximarse de qualquer ponto em ∆ . Finalmente, Smale mostrou que as propriedades listadas acima se verificam, mesmo que a função seja distorcida por um valor pequeno (um pertubação), em bora de forma arbitrária. Quer dizer, o comportamento recorrente da Ferradura de Smale é estruturalmente estável. 33 Referências [1] BARREIRA, Luís; VALLS, Cláudia. Teoria dos Sistemas Dinâmicos: Uma Introdução. São Paulo. Editora Livraria da Física, 2012. [2] LENARDOZZI, F.N.; MORITA, A.; PRECIOSO, J.Caos e Fractais, São José do Rio Preto, v.3, n.3, 9 de dezembro de 2009. [3] SARMENTO,Carlos Felipe da Silva. Dinâmica de Aplicações Simples: Pro posta de Abordagem para o Ensino Básico. Dissertação (PROFMATUFRPE) Departamento de Matemática, Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2015. [4] DEVANEY, Robert L. A First Course in Chaotic Dynamical Systems: Theory and Experiment, AddisonWesley Publishing Company, 1992. [5] LIMA, Elon Lages.EspaçosMétricos, Rio de Janeiro, Instituto deMatemática Pura e Aplicada, CNPq, 1977. [6] FERREIRA, Fernanda Amélia. Dinâmica Simbólica e Ferradura de Smale. Revista de Estudos Politécnicos, 22 de outubro 2007, Vol V, nº 8, 183199. [7] ARAUJO, Rodrigo Carlos. Sistemas Dinâmicos e Conjunto de Cantor: Uma breve introdução à dinâmica unidimensional.Trabalho de Conclusão de Curso (PROFMATUFERJ) Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2016. [8] K. T. Alligood, T. D. Sauer, J. A. Yorke. Chaos, an introduction to dynamical systems, Springer, 1997. [9] MONTEIRO, Luis H. A. Sistemas Dinâmicos. Editora Livraria da Física, 2019. [10] Geogebra: http: www.geogebra.org 34
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