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Leonan José – T5 FARMACOLOGIA – BBPM III Farmacologia da Cardiopatia Isquêmica – Danielle INTRODUÇÃO Será estudado agora o tratamento para a angina de peito (chamada de dor no peito). Geralmente, essa angina vem de uma isquemia tecidual. Dentro disso, existem alguns tipos de angina com características próprias, por exemplo: → Angina estável/típica: oclusão por uma placa aterosclerótica fixa na artéria coronária epicárdica (mais superficial). Quando ocorre a necessidade de maior demanda de oxigênio (por esforço físico ou estresse emocional), essa estenose pode dificultar o trabalho cardíaco. Nesse sentido, tem-se uma demanda maior do que a oferta. → Angina instável: ruptura de placa aterosclerótica, podendo haver a formação de um trombo que reduzirá o fluxo coronariano → Angina variante: também pode ser chamada de angina prinzmetal. É diferente das outras pois decorre de um vasoespasmo coronariano – é como se o vaso fosse contraído com uma certa frequência. Quando isso acontece, ocorre certa redução do fluxo coronariano e do suprimento de oxigênio para o miocárdio. A cardiopatia isquêmica pode ser classificada de duas maneiras: Doença arterial coronariana crônica (DAC, angina estável) ou Síndrome coronariana aguda (SCA, angina instável). Essa aula irá tratar apenas de DAC. FISIOPATOLOGIA DA CARDIOPATIA ISQUÊMICA A doença arterial coronariana crônica (DAC) ocorre devido a perde de um equilíbrio importante. Numa situação normal, existe o equilíbrio entre a demanda e o suprimento de oxigênio pelo miocárdio. Ou seja, se houver aumento da demanda, haverá aumento do suprimento. O aumento da demanda pode ocorrer por aumento da contratilidade, da força de contração, da frequência cardíaca, etc., devido ao esforço físico ou a descarga simpática. Numa situação de equilíbrio, o fluxo sanguíneo coronariano supre o coração adequadamente, então, o aumento da demanda é balanceado pelo aumento do suprimento. Na isquemia, a demanda de oxigênio é maior do que o suprimento. Assim, percebemos que os fármacos podem atuar reduzindo a demanda ou aumentando o suprimento – ou as duas coisas. Fluxo sanguíneo coronariano O fluxo coronariano é a razão entre a pressão de perfusão e a resistência. Fluxo coronariano = Pressão de perfusão Resistência A região mais superficial superior representa um artéria coronária e mais inferiormente estão os vasos subendocárdicos. Normalmente, uma vasodilatação endocárdica dos vasos mais profundos pode aumentar o suprimento de oxigênio para o coração. Os vasos mais superficiais são os epicárdicos. Esses são os locais mais comuns de ocorrer uma estenose e isso pode ser responsável por reduzir o fluxo coronariano. Sabendo que o fluxo coronariano é pressão de perfusão dividido por resistência, aumentar a pressão de perfusão ou diminuir a resistência significa aumentar o fluxo. Na hipótese acima, onde ocorreu uma estenose de artéria epicárdica superficial, uma forma de aumentar o fluxo é diminuir a resistência. Isso ocorre da seguinte forma: os vasos endocárdicos sofrem vasodilatação (diminuindo a resistência), resultando em aumento do fluxo. Quando existe nos vasos epicárdicos cerca de 80% de estenose, os vasos endocárdicos sofrem vasodilatação máxima – ou seja, quando esse indivíduo realizar uma atividade física (situação em que ocorre vasodilatação endocárdica para aumentar o suprimento de oxigênio), pelo fato de esses vasos já estarem na sua vasodilatação máxima, não poderão se dilatar mais para aumentar o suprimento de oxigênio, saindo do equilíbrio e causando angina naquele indivíduo. Importância do tônus vascular Fisiologicamente, existe um equilíbrio entre o tônus arteriolar e o tônus venoso. Tônus arteriolar: as arteríolas são vasos que controlam a resistência vascular periférica (RVP), ou seja, controlam a pós carga, de modo que, quanto maior a pós carga, maior é a tensão da parede sistólica, o que faz com que aumenta a demanda por oxigênio. Desse modo, uma das formas de reduzir a demanda por oxigênio é reduzir o tônus arteriolar, que reduzirá a RVP e, consequentemente, a tensão da parede sistólica. Leonan José – T5 FARMACOLOGIA – BBPM III Tônus venoso: relacionado com os vasos de capacitância venosa e com o retorno venoso. Quando eles são dilatados, mais sangue se acumula neles e menos sangue chega para o coração, diminuindo a pré carga, o que faz diminuir a tensão da parede diastólica. Pacientes com uma pré carga aumentada (aqueles com insuficiência cardíaca, por exemplo), trabalham sob uma maior tensão da parede diastólica. Para modular o tônus vascular, precisamos observar a importância dos canais de cálcio do tipo L, que permitem a entrada do cálcio. Quando entra, o cálcio forma um complexo com a calmodulina, que ativa uma enzima chamada Quinase da cadeia leve de miosina (MLCK). Como seu próprio nome diz, ela fosforila a cadeia leve da miosina. Quando fosforilada, essa permite a contração do músculo liso vascular. Assim, fica claro o papel do cálcio, ao passo que, quando o canal de cálcio é bloqueado, diminui-se o cálcio disponível e a contração é reduzida. Devemos observar também alguns mediadores importantes: o AMPc é um mediador que coloca mais um grupo fosfato na enzima MLCK, tornando-a inativa. Ou seja, o AMPc inativa a MLCK, impedindo a contração e causando relaxamento. Outro mediador é o GMPc (que pode ter sua produção aumentada pelo óxido nítrico, NO) retira o grupo fosfato da cadeia leve da miosina e ocorre o relaxamento ao invés da contração. Dessa forma, o GMPc desfosforila a cadeia leve da miosina. É por esses mecanismos que os nitratos vão atuar, pois esses aumentam o GMPc. Essas reações acima descritas são pontos de ação farmacológica importantes para a regulação do tônus vascular – o objetivo do fármacos é promover o relaxamento. IMPORTANTE RELEMBRAR: A cardiopatia isquêmica é classificada em DAC e em SCA. Por enquanto, apenas será estudada a DAC (angina estável), que é caracterizada por presença de placa aterosclerótica fixa ocluindo o vaso que, quando houver maior necessidade de oxigênio, essa não é acompanhada pelo aumento do suprimento. Por isso, os fármacos na DAC vão tentar trazer um equilíbrio entre a demanda e o suprimento de oxigênio. CLASSES DE FÁRMACOS PARA ANGINA ESTÁVEL Existem tanto os fármacos para prevenção quanto para o alívio de crises. NITRATOS E NITRITOS Possuem tempo de duração de ação curta (15 a 30 minutos), com rápido inicio de ação. Possuem baixa biodisponibilidade oral e rápida inativação hepática. Uma forma de escapar desse metabolismo de primeira passagem é por meio da administração sublingual. Devido sua ação rápida, são usados para alivio dos sintomas de angina. Esses fármacos precisam ser bioativados por algumas enzimas. No entanto, é mais importante entendermos que os nitratos, seja o nitrato orgânico ou seja o nitroprussiato de sódio, aumentam a produção de óxido nítrico (NO), que é um potente vasodilatador por seu efeito de aumento de produção de GMPc, que é capaz de desfosforliar a cadeia leve da miosina, promovendo o relaxamento. A nitroglicerina é um dos exemplos de fármacos dessa classe. Como isso pode ser hemodinamicamente favorável? Esses fármacos possuem uma preferência em fazer vasodilatação venosa, ou seja, vão promover venodilatação causando aumento da capacitância. Desse modo, o sangue se acumula nas veias, levando à redução do retorno venoso, da pré carga, do volume e da pressão diastólica final e, consequentemente, reduz-se o estresse da parede diastólica e isso reduz a demanda de oxigênio. Leonan José – T5 FARMACOLOGIA – BBPM III Além disso, esses fármacos promovem uma redistribuição do fluxo sanguíneo para as regiões isquêmicas do coração. Eles são capazes de fazer vasodilatação das artérias coronáriasepicárdicas, assim, aumentam o fluxo coronariano. Ademais, em concentrações maiores, realizam vasodilatação arteriolar (que controla a resistência periférica), levando a uma redução de RVP, que leva a uma redução da pós-carga e redução da tensão da parede sistólica. Ou seja, se o trabalho cardíaco é diminuído, consequentemente, a demanda de oxigênio também é diminuída. Logicamente, a redução da resistência trás como efeito adverso uma resposta compensatória, que seria o aumento da frequência cardíaca (FC) e a contratilidade. Por isso, o uso dos nitratos pode levar à taquicardia e aumento da contratilidade cardíaca. Preparações A administração é sublingual, a ação é rápida (em cerca de 4 minutos a nitroglicerina atinge sua concentração máxima), a meia vida é bem curta (de 1 a 3 minutos). Efeitos adversos Outros possíveis efeitos são a hipotensão postural que pode causa síncope. Um efeito bastante comum é a cefaleia. Interações Uma interação extremamente importante ocorre entre os nitratos e os inibidores da fosfodiesterase 5 (PDE5), que degrada GMPc. Existem alguns fármacos, como o sildenafil (princípio ativo do viagra), são inibidores da PDE5. Ao fazer isso, os níveis de GMPc aumentam muito quando associado ao NO, que pode causar uma vasodilatação acentuada e uma queda pronunciada da pressão arterial – que pode ser muito perigoso. Usos clínicos Esses fármacos podem ser usados na angina variante que acontece quando ocorre vasoespasmo das artérias coronarianas. Por promoverem vasodilatação coronariana, podem abolir episódios dessa angina. BLOQUEADORES DE CANAIS DE CÁLCIO São fármacos que bloqueiam os canais de cálcio do tipo L. Esses canais promovem a entrada de cálcio para contração e os fármacos podem bloquear a entrada tanto no músculo cardíaco quanto no músculo liso. Ao fazerem o bloqueio no coração, haverá diminuição da força de contração cardíaca (efeito inotrópico negativo) e haverá também redução da taxa de disparo do nó sinoatrial e a velocidade de condução do nó atrioventricular, deixando o coração mais lento. Ao fazer o bloqueio no músculo liso dos vasos, não haverá cálcio para a contração, resultando em relaxamento do músculo liso e vasodilatação do leito arterial (o efeito nas veias é muito pequeno). Seletividade Existem alguns tipos de bloqueadores de canal de cálcio que possuem certa seletividade pelo músculo liso ou cardíaco. Por exemplo, o nifedipino (da classe das diidropiridinas) possui principalmente efeito vasodilatador e baixo efeito no coração. Enquanto isso, o verapamil e o diltiazem possuem efeito maior no coração (mais seletivo para o coração). Em geral, esse fármacos podem atuar sobre o coração reduzindo: FC, automaticidade, velocidade de condução AV, pós carga e demanda de oxigênio. Nas coronárias, causam vasodilatação e aumento do suprimento de oxigênio. Nas arteríolas periféricas, causam vasodilatação, diminuindo a pós carga e, consequentemente, a demanda de oxigênio. Nas veias, o efeito é mínimo. Leonan José – T5 FARMACOLOGIA – BBPM III Diidropiridinas As diidropiridinas possuem como exemplo o nifedipino e seu efeito vasodilatador é muito importante, melhorando o fluxo sanguíneo coronariano. Ademais, seu efeito sobre o coração é muito pequeno. Contudo, quando ocorre uma redução da a redução da RVP e da pressão arterial (PA), o efeito compensatório é de aumento da FC e da contratilidade. Isso pode ser ruim para o efeito das diidropiridinas, uma vez que a taquicardia e o inotropismo positivo aumentam a demanda por oxigênio, sendo esse o contrário do que se busca com o uso desse fármaco. Verapamil e diltiazem Também faz vasodilatação, redução de RVP e PA, mas possui efeito depressor cardíaco: reduz FC (cronotrópico negativo), reduz velocidade de condução AV (dromotrópico negativo) e reduz força de contração (inotrópico negativo). Ou seja, o problema de taquicardia reflexa e inotropismo positivo das diidropiridinas não acontece nesse caso, pois mesmo que o mecanismo compensatório tente atuar, o verapamil age sobre o coração impedindo que isso aconteça. Interações Uma interação importante corre entre esse fármacos e os betabloqueadores, pois ambos lentificam o coração. Assim, pode haver até bloqueio cardíaco. Contraindicação Pacientes com disfunção ventricular (como IC), distúrbios de condução do nó AS ou AV e PA inferior a 90mmHg não devem usar bloqueadores de canal de cálcio, principalmente aqueles com ação seletiva para o coração, como o diltiazem e verapamil. Usos clínicos Podem ser usados na angina por esforço (angina estável ou típica) pois reduzem a demanda de oxigênio e vasodilatação coronariana. Além disso, são usados na angina variante pois essa vasodilatação coronariana atenua o vasoespasmo. Os betabloqueadores não agem nesse tipo de angina. BETABLOQUEADORES Agem sobre os receptores beta-1-adrenérgicos (principal isoforma presente no coração). Quando ativados, o beta-1 promove aumento da FC e da força de contração, logo, o uso de um betabloqueador vai levar aos efeitos contrários: redução da FC (cronotrópico negativo), redução da força de contração (inotrópico negativo), redução da PA. Por esses mecanismos, os betabloqueadores reduzem a demanda de oxigênio pelo miocárdio. Por isso, são uteis na angina por esforço/estável que aparece em atividades físicas ou estresse emocional. Outros fármacos mais novos: RANOLAZINA Atua sobre a corrente de sódio tardia, que acontece próxima da fase de platô e auxilia na entrada de cálcio na célula. Para relembrar, sabemos que existe o canal de sódio e o trocador sódio-cálcio (chamado de NCX). Quando ocorre a entrada de sódio na corrente tardia, o sódio se acumula na célula. Com esse acúmulo, o trocador começa a colocar o sódio para fora e trazer o cálcio para dentro, aumentando a concentração de cálcio. Essa é a situação fisiológica. Leonan José – T5 FARMACOLOGIA – BBPM III A ranolazina inibe a corrente de sódio tardia de forma que o sódio não irá entrar e, consequentemente, não irá sair para que o cálcio entre. Isso auxilia na melhora do estresse da parede diastólica pois, numa situação de isquemia, o acúmulo intracelular de cálcio contribui para a disfunção diastólica e para a piora da isquemia. Dessa forma, ao reduzir o acúmulo de cálcio, a ranolazina ajuda na melhora da isquemia. Em doses mais altas, ela também atua como fármaco metabólico. Isso acontece da seguinte forma: o coração utiliza preferencialmente ácidos graxos no seu metabolismo. Contudo, esse consumo de ácidos graxos leva a um maior consumo de oxigênio do que se ele utilizasse a glicose. Por isso, numa situação de isquemia, é preferível que a glicose seja oxidada. Então a ranolazina e a trimetazidina são capazes de promover a oxidação da glicose ao invés de ácidos graxos diminuindo o consumo de oxigênio pelo coração. Para isso, elas inibem uma enzima chamada de pFOX. IVABRADINA Inibe a corrente funny (If) que ocorre pelos canais HCN responsáveis pela fase 4 do potencial de ação do nodo SA (importante para a FC). A ivabradina bloqueia esse canal HCN e reduz a corrente funny, ou seja, reduz a FC (bradicardia). A FC é um dos determinantes do consumo de oxigênio – reduzir a FC é reduzir a demanda.
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