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Genética molecular do câncer _ MedicinaNET

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Índice
Genética molecular do câncerGenética molecular do câncer
Última revisão: 29/01/2016
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Você está em: Inicial acp-medicine Oncologia 
Leif W. Ellisen, MD, PhD*
 
Associate Professor of Medicine, Harvard Medical School, Boston, MA
Artigo original: Ellisen LW, MD, PhD. Molecular genetics of cancer. ACP
Medicine.
[The original English language work has been published by DECKER
INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2015
Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]
Tradução: Paulo Henrique Machado.
Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon.
 
Câncer como doença genética
A expansão clonal descontrolada de uma célula, que geralmente provoca a
invasão dos tecidos adjacentes e disseminação metastática, produz câncer. As alterações
genéticas iniciais nessa célula que desencadeiam proliferação aberrante são
acompanhadas pelo acúmulo de mutações adicionais entre os descendentes genéticos.
No final ocorre um processo seletivo em que subclones com propriedades intensificadas
de crescimento se tornam dominantes no interior do tumor – fenômeno conhecido por
progressão tumoral. Definiu-se para alguns tumores uma clara evolução genética
histológica e molecular de lesões pré-cancerígenas para câncer maligno e invasivo (p.ex.,
câncer no cólon e câncer na bexiga); entretanto, em muitos tipos de câncer esse processo
talvez não seja clinicamente evidente. Os genes que se alteram no desenvolvimento e na
progressão do câncer ainda estão sendo objeto de uma profunda investigação. Em muitos
casos, a identificação desses genes levou a uma visão mais detalhada dos mecanismos
fisiológicos normais que controlam a proliferação celular. Os produtos desses genes estão
envolvidos em atividades como regulação do ciclo celular básico, transmissão de sinais de
crescimento, regulação da diferenciação e da morte das células, e estabelecimento da
imortalidade celular. De maneira geral, o rompimento desses genes ocorre exclusivamente
nas células somáticas cujo destino é se tornarem cancerígenas. Entretanto, em casos
raros, possivelmente ocorram mutações que sejam transmitidas pela linha germinal,
resultando em uma predisposição genética para o câncer (i.e., síndromes de câncer
familiar).
Acredita-se que fatores ambientais também contribuam para o desenvolvimento
de câncer. Em alguns casos, interações entre fatores ambientais e variações genéticas
sutis na linha germinal que distinguem os indivíduos podem constituir um determinante
importante de risco de câncer na população em geral.1 Em outros casos há uma ligação
direta entre o efeito do carcinógeno sobre o DNA somático e mutações específicas que
promovem tumores, como aquelas que ocorrem no gene supressor tumoral p53 (p.ex.,
exposição ao tabaco ou à aflatoxina, uma toxina fúngica). A exposição à radiação
ionizante é outra fonte de câncer com ligação direta aos danos genéticos. A incidência de
leucemia e de vários tumores sólidos nos sobreviventes da bomba atômica produziu uma
grande quantidade de dados para os estudos clássicos sobre a dosagem de radiação e
suas consequências. Os dados mais recentes surgiram de casos de câncer como
complicações tardias de radioterapias e de quimioterapias radiomiméticas usadas no
tratamento de malignidades em fase inicial.
Para finalizar, as infecções virais foram vinculadas ao desenvolvimento de tipos
específicos de câncer. As ligações câncer-vírus incluem carcinoma cervical e orofaríngeo
de células escamosas com subtipos específicos de papilomavírus humano; carcinoma
hepatocelular com infecção crônica causada pelo vírus da hepatite B; carcinoma
nasofaríngeo e linfomas com vírus de Epstein-Barr em hospedeiros imunossuprimidos; o
caso raro de leucemia aguda de células T transformando o vírus linfotrópico de células T
humanas tipo I; e sarcoma de Kaposi com herpesvírus humano tipo 8. Cabe observar que
esses casos são exceções à regra; a maior parte dos casos de câncer em seres humanos
não é consequência de infecções virais. Entretanto, grande parte de nossos
conhecimentos sobre os genes humanos envolvidos nos casos de câncer surgiu
originalmente do estudo de vírus que produzem tumores em galinhas e roedores. A
apropriação indevida dos vírus dos genes de hospedeiro envolvidos na proliferação celular
MicroRNAs e progressão de câncer
Mortalidade e imortalidade celular
Metástase e angiogênese
Mecanismos genéticos de sensibilidade e
resistência aos tratamentos
Sensibilidade e resistência à quimioterapia
citotóxica
Genética tumoral e resposta à terapia do câncer alvo
Projeto de medicamento racional e sensibilidade à
terapia com foco na rota
Mecanismos genéticos de resistência a terapias-alvo
Tendências emergentes na genômica do câncer e
avaliação de riscos
Análise genômica ampla de células cancerígenas e
aplicação terapêutica
A áli éti li h i l li ã d
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por esses vírus resultou na identificação de oncogenes e forneceu a primeira pista para os
eventos genéticos que causam câncer em seres humanos.
 
*O autor e os editores expressam seus sinceros agradecimentos às
contribuições do autor da versão anterior, Daniel A. Haber, MD, PhD no
desenvolvimento e na redação deste capítulo.
 
As informações financeiras estão no final deste capítulo, antes das referências.
 
Alterações genéticas na linha germinal versus
Alterações genéticas somáticas
Na maior parte dos casos, as lesões genéticas que promovem tumorigênese são
adquiridas por meios somáticos e não envolvem alterações na linha germinal. Essas
alterações genéticas podem resultar na ativação ou no ganho funcional (de oncogenes) e
na perda funcional (de supressores tumorais). Em situações mais raras, as anormalidades
hereditárias na linha germinal contribuem para a patogênese do câncer. Tipicamente,
nessas circunstâncias, herda-se apenas uma única cópia defeituosa de um gene, sendo
que a transformação exige a perda do segundo alelo (não mutante) em uma célula
somática. Levando-se em consideração que a velocidade de uma perda alélica somática
simples é exponencialmente mais elevada que a mutação independente de doisalelos no
interior da mesma célula, a incidência de tipos específicos de câncer nos portadores da
mutação é dramaticamente elevada, em comparação com a incidência na população em
geral. De maneira geral (mas nem sempre), nos casos de predisposição para câncer
hereditário a perda funcional, e não o ganho funcional, desses genes promove a
carcinogênese. Consequentemente, por definição, esses genes são supressores tumorais.
Tipos histológicos diferentes de câncer estão associados a padrões sobrepostos
e distintos de alterações genéticas. Alguns eventos genéticos, em particular translocações
cromossômicas somáticas específicas, estão associados exclusivamente a um tipo de
câncer. Por exemplo, a translocação cromossômica EWS-FLI 1 é específica para o
sarcoma de Ewing; consequentemente, essa translocação é um marco diagnóstico
bastante útil para esse tipo de tumor.2 Outras anormalidades genéticas somáticas, como a
ativação mutacional do oncogene KRAS ou a desativação do gene supressor tumoral p53,
estão associadas a muitos tipos diferentes de câncer. De maneira geral, no caso de
defeitos genéticos na linha germinal a predisposição para um padrão tecidual específico
de câncer é o resultado da herança de alguma anormalidade em um gene supressor
tumoral específico. Em muitos casos, a base biológica dessa especificidade tecidual ainda
permanece obscura. Por exemplo, o gene BRCA1 é importante para a estabilidade
genômica e para o reparo do DNA em todos os tipos de células, porém, mesmo assim, as
mutações herdadas do BRCA1 estão associadas quase que exclusivamente à
predisposição para câncer de mama e ao câncer de ovário. Uma das descobertas
relacionadas a esse fato é que os genes associados à predisposição hereditária para o
câncer possivelmente também estejam sujeitos à desativação somática, embora esse
conceito se aplique somente a um subgrupo distinto de tipos de câncer.
Consequentemente, os carcinomas de pulmão de pequenas células (CPPCs) se
caracterizam pela desativação somática do gene supressor do tumor retinoblastoma
(RB1).3 Todavia, a mutação de RB1 na linha germinal não está associada a uma
incidência elevada de CPPC, mas está relacionada à incidência de retinoblastoma e
osteossarcoma. Teoricamente, esse paradoxo aparente reflita papeis contextuais
específicos desempenhados pelo gene RB1, de modo que sua ativação seja suficiente
para estimular a proliferação de alguns tipos de câncer, enquanto que em outros tipos a
ativação talvez seja necessária, porém insuficiente para a tumorigênese, e ainda em
outros tipos a ativação possivelmente desencadeie respostas compensatórias, incluindo
morte celular. Seja qual for o caso, em geral temos uma compreensão relativamente
limitada sobre a razão pela qual anormalidades genéticas específicas estão associadas a
padrões teciduais específicos de tumorigênese.
 
Anormalidades genéticas do tipo condutor e
passageiro na patogênese do câncer
A maior parte dos tipos de câncer em seres humanos, principalmente o câncer
comum em adultos, abriga uma quantidade equivalente a dezenas ou mesmo centenas de
anormalidades genéticas somáticas. Em um dos estudos, os investigadores preparam
uma sequência ampla de carcinomas na mama e no cólon com base no DNA.4 Uma
mediana de aproximadamente 80 mutações, que deram origem a uma truncagem proteica
precoce ou a uma alteração na sequência proteica, foram encontradas em cada tumor.
Todavia, acreditava-se que apenas uma pequena minoria dessas mutações (em torno de
15 por tumor) era “significativa”, tendo em vista a recorrência em vários tipos de câncer.
Essas mutações, observadas com maior frequência em genes cancerígenos bem
definidos como o p53 e o KRAS, foram denominadas mutações “condutoras” porque se
acreditava que estimulassem transformações e progressões malignas. Entretanto, de um
modo geral, a maior parte das mutações somáticas específicas de tumores não foram
observadas de forma repetitiva em vários tipos de tumor. Presume-se que essas
mutações ocorram casualmente e não reflitam qualquer instabilidade genética associada
ao processo da tumorigênese. Portanto, passaram a ser conhecidas como mutações do
tipo “passageiro”. A distinção entre anormalidades genéticas associadas a tumores do tipo
condutor e passageiro pode se tornar um grande desafio e envolve análises de larga
escala de genomas tumorais e estudos funcionais das vias cancerosas. A identificação
das anormalidades do tipo condutor está se tornando cada vez mais relevante em face do
desenvolvimento de uma nova geração de terapias para tratamento de câncer com foco
nessas vias específicas.
 
Oncogenes e Proto-Oncogenes
Os genes causadores de câncer, ou oncogenes, foram descobertos quando os
pesquisadores observaram que os genes específicos de galinhas e os retrovírus de
roedores poderiam transformar as células normais de mamíferos em culturas. Comprovou-
se que esses genes transformadores virais eram homólogos ativados de genes de
mamíferos (conhecidos por proto-oncogenes) que foram roubados da célula de
hospedeiro durante a evolução viral por sua capacidade de estimular a proliferação
celular.5 Embora não sejam causados por infecções virais, descobriu-se que os cânceres
humanos primários abrigam alelos ativados semelhantes de proto-oncogenes. Entre os
primeiros oncogenes que foram descobertos estavam aqueles que codificavam as
proteínas diretamente envolvidas na transmissão de sinais de proliferação celular. Isso
inclui os receptores de fatores de crescimento (p.ex., receptor do fator de crescimento
derivado das plaquetas [PDGR, do inglês platelet-derived growth factor receptor] ou o
receptor do fator de crescimento epidérmico [EGFR, do inglês epidermal growth factor
receptor]) que se tornam constitutivamente ativados como se estivessem respondendo à
presença contínua de um fator de crescimento e de moléculas sinalizadoras que se
localizam no sentido do fluxo (p.ex., HRAS, KRAS e NRAS) que normalmente respondem
à sinalização do fator de crescimento e alternam rapidamente entre os estados ativado e
desativado, mas sofrem mutações para células cancerígenas em uma posição
permanentemente ativada. Os mecanismos através dos quais esses proto-oncogenes
celulares normais são ativados nos cânceres humanos incluem pontos de mutação,
amplificação genética e translocações cromossômicas [ver a Tabela e a Figura 1]. Essas
mutações são conhecidas como mutações de ganho funcional, considerando que
resultam em propriedades funcionais novas ou alteradas para a proteína codificada e são
geneticamente dominantes sobre o segundo alelo normal.
Embora a ativação de oncogenes possa promover uma proliferação anormal e/ou
sobrevivência de células cancerígenas nascentes, esses efeitos têm um custo. De
maneira geral, a religação da sinalização de células cancerígenas que resultar da ativação
de oncogenes torna as células cancerígenas atipicamente dependentes de rotas
controladas pelo(s) oncogene(s) ativado(s) no interior daquelas células. Acredita-se que
esse fenômeno, às vezes conhecido como “dependência de oncogene”, reflita estresses
metabólicos específicos associados à proliferação desenfreada. Consequentemente,
embora o resultado da inibição química do receptor do fator de crescimento epidérmico
(EGFR) nas células normais seja apenas modesto, o bloqueio da sinalização do EGFR
nas células cancerígenas do pulmão, que abriga as mutações ativadoras somáticas do
EGFR, poderá induzir morte celular imediata. Da mesma forma, as células cancerígenas
que não apresentarem ativação de um oncogene específico podem ser relativamente
insensíveis a um agente terapêutico com alvo específico que, em outras circunstâncias,
seria altamente eficaz nos tipos de câncer com a mutação relevante. Por exemplo, em um
grande teste randomizado que fez a comparação entre quimioterapia e inibidor específico
para o EGFR para tratamento de adenocarcinomas pulmonares, os pacientes com
tumores com mutação no EGFR obtiveram benefícios substancialmente maiores com o
inibidor com alvo específico, enquanto que os pacientessem essas mutações obtiveram
melhores resultados com a quimioterapia.6 Observações como essas resultaram em uma
ênfase maior sobre a análise da genética tumoral na prática oncológica clínica.
 
Tabela 1 Mutações Selecionadas de Oncogenes no Câncer Humano
 
Gene Mecanismo de
Ativação
Função do
Produto
Proteico
Tipos de Câncer Mutação na Linha
Germinal
KRAS Ponto de
mutação
p21 GTPase Pancreático,
colorretal,
pulmonar
(adenocarcinoma),
endometrial,
outros
carcinomas.
 
Síndrome de
Noonan (SN)
NRAS Ponto de
mutação
p21 GTPase Leucemia
mielocítica
 
ND
NRAS Ponto de
mutação
p21 GTPase Bexiga
 
Síndrome de
Costello
BRAF Ponto de
mutação
Quinase na
rota de
RAS/MAPK
Melanoma,
leucemia,
mieloma, câncer
colorretal
 
NS, síndrome
cardiofaciocutânea
EGFR Amplificação,
ponto de
mutação.
Receptor de
EGF
Gliomas,
carcinoma
escamoso e
outros
carcinomas.
 
ND
ERBB2
(HER-2)
Amplificação Receptor do
fator de
crescimento
Carcinomas de
mama, ovário,
gástrico e outros
carcinomas.
 
ND
PIK3CA Ponto de
mutação
Subunidade
da quinase
catalítica PI3
Câncer de mama,
colorretal e
pulmonar,
HNSCC.
 
ND
MYC (c-
myc)
Amplificação,
translocação
cromossômica.
Fator de
transcrição
Linfoma de Burkitt,
CPPC, outros
carcinomas.
 
ND
MYCN
(N-myc)
Amplificação Fator de
transcrição
Neuroblastoma,
CPPC.
 
ND
MYCL1
(L-myc)
Amplificação Fator de
transcrição
 
CPPC ND
BCL2 Translocação
cromossômica
Proteína
antiapoptose
Linfoma de células
B (tipo folicular)
 
ND
 
Tabela 1 Mutações Selecionadas de Oncogenes no Câncer Humano
 
Gene Mecanismo de
Ativação
Função do
Produto
Proteico
Tipos de
Câncer
Mutação na
Linha
Germinal
CCND1 Amplificação,
translocação
cromossômica.
Ciclina D,
controle do ciclo
celular.
Carcinoma de
mama e outros
carcinomas,
linfoma de
células B,
adenomas
paratireoideos.
 
ND
BCR-ABL Translocação
cromossômica
Tirosina quinase
quimérica não
receptora.
 
LMC, LLA
(células T)
ND
RET Translocação
cromossômica
Receptores de
tirosina quinase
para GDNF.
Câncer tireoideo
(tipo papilar),
câncer tireoideo
(tipo medular).
 
NEM II
CDK4 Amplificação,
ponto de
mutação.
Quinase
dependente da
ciclina.
 
Sarcoma Melanoma
familiar
MET Ponto de
mutação,
amplificação.
Receptores de
tirosina quinase
para HGF
Câncer gástrico,
câncer
pulmonar.
Câncer renal
hereditário, tipo
papilar.
 
SMO Ponto de
mutação
Molécula de
sinalização
transmembranar
em rotas
sônicas
hedgehog.
 
Pele de células
basais.
ND
CTNNB1
(catenina-
ß)
Ponto de
mutação,
mutação na fase
de leitura.
Coativador
transcricional;
liga a caderina-E
ao
citoesqueleto.
 
Melanoma,
câncer
colorretal.
ND
HST Amplificação Fator de
crescimento
(semelhante ao
FGF).
 
Câncer gástrico ND
PML-
RAR-a
Translocação
cromossômica
Fatores de
transcrição
quiméricos.
 
LPA ND
W2A-
PBX1
Translocação
cromossômica
Fatores de
transcrição
quiméricos.
Pré-B LLA ND
 
MDM2 Amplificação Proteína de
ligação com p53
Sarcoma ND
 
Tabela 1 Mutações Selecionadas de Oncogenes no Câncer Humano
 
Gene Mecanismo de
Ativação
Função do
Produto
Proteico
Tipos de
Câncer
Mutação na
Linha Germinal
 
GLI1 Amplificação Fator de
transcrição.
 
Sarcoma,
glioma
ND
NOTCH1 Translocação
cromossômica,
ponto de
mutação.
Receptor de
superfícies
celulares, fator
de transcrição.
 
LLA de células
T
ND
ERG/ETV Translocação
cromossômica
Fator de
transcrição.
 
Carcinoma na
próstata
ND
LLA = leucemia linfocítica aguda; LPA = leucemia promielocítica aguda; EGF (epidermal growth factor) =
fator de crescimento epidérmico; FGF (fibroblast growth factor) = fator de crescimento de fibroblastos; GDNF (glial cell-
derived neurotrophic factor) = fator neurotrófico derivado das células gliais; GTPase (guanosine triphosphatase) =
guanosina trifosfatase; HGF (hepatocyte growth factor) = fator de crescimento dos hepatócitos; HNSCC (head and neck
squamous cell carcinoma) = carcinoma de células escamosas da cabeça e pescoço; MAPK (mitogen-activated protein
kinase) = proteinoquinase ativada por mitógeno; NEM =neoplasia endócrina múltipla; ND = não determinada; PI3 kinase
=fosfoinositol-3 quinase; CPPC =câncer de pulmão de pequenas células.
 
Ponto de mutações
Os pontos de mutações capazes de ativar um produto genético são pouco usuais
e, tipicamente, são observados em um grupo altamente restrito de sítios codificadores de
proteínas no interior do gene. Por exemplo, somente alterações específicas em três
códons das proteínas da família RAS levaram a uma ativação constitutiva da sinalização
RAS.7 Presume-se que outras mutações possam ocorrer no interior desses genes,
embora sejam funcionalmente silenciosas ou resultem em proteínas inativas e,
consequentemente, não sejam selecionadas nas transformações malignas. Da mesma
forma, alterações em aminoácidos específicos nos receptores do fator de crescimento ou
outras moléculas sinalizadoras produzem um efeito ativo indutor do crescimento ou
impedem a infrarregulação por sinais fisiológicos apropriados. Há um interesse especial
nas mutações no gene RET, que codifica um receptor do fator de crescimento, além de
ser o proto-oncogene raro que é modificado na linha germinal de pacientes com
predisposição para câncer. As substituições de aminoácidos dentro de domínios
funcionais distintos da proteína estão associadas à neoplasia endócrina múltipla tipo IIA
das síndromes de predisposição para câncer familiar ou ao câncer tireoideo medular. Por
outro lado, a desativação das mutações no gene RET causa a doença de Hirschsprung,
um defeito evolutivo que afeta as inervações colônicas.8 Essa ligação impressionante
entre mutações diferentes no gene RET e tipos distintos de câncer e as síndromes de
desenvolvimento possivelmente seja o resultado de propriedades funcionais diferentes
que são mediadas pelos vários domínios da proteína RET e de rotas diferentes
associadas à RET que podem ser ativadas em tipos diferentes de tecidos.
 
 
 
 
 Figura 1 - Mecanismos de ativação de proto-oncogenes. Os genes celulares
podem ser ativados no câncer como resultado de (a) pontos de mutações que alteram a
sequência de aminoácidos, codificando a proteína possível de ser ativada sob o ponto de
vista constitutivo; (b) amplificações do gene celular resultando em níveis mais elevados de
expressão proteica; ou (c) translocações cromossômicas que levam à justaposição de um
promotor forte, aumentando a expressão proteica, ou que produzam uma proteína
quimérica nova, derivada de fragmentos de genes normalmente presentes em
cromossomos diferentes.
 
Amplificação gênica e translocações cromossômicas
Além das substituições de aminoácidos resultando em produtos genéticos
ativados, os proto-oncogenes podem ser convertidos nas respectivas formas oncogênicas
por alterações cromossômicas macroscópicas. A amplificação de genes – replicação
excessiva de grandes fragmentos cromossômicos – é um mecanismo comum para
superexpressão aberrante de genes específicos em tumores.9 Os genes amplificados ,
que ocasionalmente podem chegar a algumas centenas de cópias de genes diploides
normais, poderão ser integrados em uma única localização cromossômica ou, menos
frequentemente, poderão estar presentes em pequenos elementos extracromossômicos
(cromossomos de minuto duplo). O MYCN (N-myc) é o mais conhecido entre os
oncogenes sujeitos a amplificação nas células cancerígenas. Esse gene codifica o fator de
transcrição que desempenha um papel fisiológico na estimulação da proliferação celular,
sendo usualmente amplificado no neuroblastoma de câncer pediátrico; o prognóstico
clínico para esses pacientes não é bom.10 A superexpressão de um oncogene pode
também ser o resultado de alguma translocação ou reorganização cromossômica, que
remove o gene celular de seu promotor regulado fisiologicamente e passa a controlá-lo
através de um promotor estranho e mais ativo.11 No linfoma de Burkitt, por exemplo, o
lócus cromossômico contendo o MYCN (N-myc) é reorganizado de modo que as regiões
reguladoras negativas que se localizam no contrafluxo do MYCse perdem e, por outro
lado, a expressão do gene é direcionada pelo intensificador forte da cadeia pesada de
imunoglobulina, que é altamente ativo nas células B.12,13 Consequentemente, a
desregulação da expressão do MYC nessas células é uma grande força estimuladora da
proliferação celular. Da mesma forma, em um subgrupo de leucemias linfocíticas de
células T, o fragmento de um gene conhecido por NOTCH1, que é extremamente
importante para o desenvolvimento normal de muitos tipos de células, apresenta uma
superexpressão como resultado da translocação nas proximidades do intensificador
genético do receptor ß de células T.14 Entretanto, a situação mais comum é aquela em que
o gene NOTCH1 não seja nem translocado nem superexpresso em leucemias causadas
por células T, mas, em vez disso, seja o alvo do ponto de ativação de mutações.15
Acredita-se que a sinalização aberrante do gene NOTCH1 promova uma diferenciação e
proliferação anormais de células leucêmicas, não importando se o gene seja ativado por
translocação ou por ponto de mutação.
A primeira translocação cromossômica específica identificada no câncer humano
foi o cromossomo de Filadélfia, que é subjacente à leucemia mielocítica crônica (LMC). A
fusão dos cromossomos 9 e 22 resulta na união de dois genes não relacionados, o gene
ABL1 (c-abl), que codifica a tirosina quinase e se localiza no cromossomo 9, e o gene
BCR (breakpoint cluster region), que se localiza no cromossomo 22.16 Uma proteína
quimérica com novas propriedades transformadoras forma-se a partir dessa
reorganização cromossômica específica. A fase acelerada ou imatura da LMC geralmente
está associada à duplicação do cromossomo de Filadélfia, sugerindo que o aumento nas
cópias desse gene aberrante produz um efeito transformador dependente da dose. A
fusão entre os genes BCR e ABL1 também demonstra uma visível especificidade do tipo
celular; o ponto clássico de ruptura cromossômica está associado à proliferação
mielocítica, enquanto que um ponto de ruptura variante, resultando em uma alteração sutil
na proteína quimérica, leva a uma leucemia linfoide pediátrica cujo prognóstico não é
bom.17 A importância da translocação BCR-ABL1 como evento genético inicial nos casos
de LMC tem o suporte de um modelo de camundongo em que a expressão transgênica da
proteína quimérica BCR-ABL1 nas células hematopoiéticas é suficiente para desencadear
a proliferação mielocítica e linfoide.18 A descoberta do imatinib mesilato, um inibidor
eficiente da quinase BCR-ABL1, levou a respostas dramáticas na leucemia mielocítica
crônica e revolucionou o tratamento desse tipo de leucemia19 [ver Genética Tumoral e
Resposta à Terapia-alvo para o Câncer, abaixo].
As translocações cromossômicas que geram proteínas quiméricas novas foram
associadas a outros tipos de leucemia.20 Nos casos de leucemia promielocítica aguda
(LPA), uma reorganização cromossômica se une a um novo gene – LPM – ao gene do
receptor-alfa do ácido retinoico (RARA, do inglês retinoic acid receptor-a). Embora as
propriedades funcionais exatas da molécula quimérica, LPM-RARA, sejam
desconhecidas, essa translocação é subjacente à responsividade dramática desse tipo de
leucemia ao tratamento com ácido transretinoico, que revolucionou os cuidados clínicos
de pacientes com leucemia promielocítica aguda (LPA).21 Identificou-se também um novo
produto da translocação cromossômica, o TEL-AML1, que é subjacente a uma forma
comum e responsiva ao tratamento de leucemia linfoblástica aguda pediátrica.22
A capacidade de cultivar células leucêmicas em culturas suficientemente longas
para permitir a realização de análises citogenéticas facilitou a caracterização de
translocações cromossômicas nos casos de leucemia. Entretanto, translocações
cromossômicas específicas também foram observadas em tumores sólidos. Entre os
casos mais dignos de nota estão o sarcoma de Ewing e a família de tumores
neuroectodérmicos primitivos (PNETs, do inglês primitive neuroectodermal tumors). Esses
tumores que anteriormente eram distintos, atualmente são definidos por uma translocação
cromossômica, fundindo o gene EWS a um número de fatores de transcrição da família do
gene ETS (a proteína quimérica mais comum é a EWS-FLI1).23 Presume-se que esse
produto quimérico tenha uma ação direta sobre os promotores-alvo para direcionar a
expressão de genes indutores da transformação celular. A identificação das translocações
do gene EWS possibilitou o agrupamento celular de uma classe de tumores cuja
proliferação é acionada por alterações genéticas semelhantes que respondem a regimes
quimioterápicos semelhantes.
Até muito recentemente, acreditava-se que as translocações cromossômicas
fossem bastante incomuns nos carcinomas que ocorrem em adultos. Entretanto, uma
série de estudos recentes demonstrou que a maioria dos carcinomas da próstata abriga
translocações entre genes que codificam um ou dois fatores de transcrição relacionados
ao gene ETS, ERG ou ETV1, e o gene TMPRSS2 regulado por androgênios.24 Como
resultado dessas translocações, ERG ou ETV1 é expresso de uma forma dependente de
androgênios, criando, consequentemente, um mecanismo tecidual específico de
transformação celular. Embora as implicações terapêuticas dessa descoberta ainda não
tenham sido definidas, a descoberta de que ETV1 é superexpresso por mecanismos
independentes de androgênios em um subgrupo de casos25 sugere que esses últimos
tumores podem ser resistentes às terapias antiandrogênicas comuns.
 
Genes supressores de tumores
Reversão da tumorigenicidade
Anteriormente conhecidos por antioncogenes, os supressores tumorais formam
uma família de genes celulares cuja desativação durante a tumorigênese promove o
crescimento maligno [ver a Tabela 2]. Uma das descobertas iniciais que sugeriam a
presença de genes supressores de tumores foi que a fusão de uma célula maligna a uma
célula não maligna resultou em uma célula híbrida que acabou perdendo as propriedades
malignas.26 Essa descoberta inesperada indicou que o estado maligno era recessivo,
sugerindo que os genes das células não malignas poderiam recuperar o controle do
crescimento normal de uma célula maligna que, presumidamente, havia perdido as
informações genéticas.
O estudo dos vírus de tumores do DNA também propiciou uma visão importante
dos genes supressores de tumores em seres humanos. Ao contrário dos retrovírus que
ativaram versões dos proto-oncogenes celulares incorporados em seus próprios genomas,
os vírus de tumores do DNA tais como o adenovírus, o vírus símio 40 (SV40, do inglês
simian virus 40) e o papilomavírus codificam proteínas específicas de vírus com
capacidade para transformar células de roedores, macacos e seres humanos. Uma
descoberta importante sobre a etiologia do câncer foi que os genes transformadores
derivados desses três vírus tumorais não relacionados têm a mesma função – ou seja, a
desativação dos genes supressores de tumores celulares p53 e RB1.27
Consequentemente, o câncer surge do ganho de sinais proliferativos e da perda de genes
que inibem a proliferação celular.
 
Modelo de Knudson e mutações com perda funcional
A incidência dos tipos mais comuns de câncer aumenta com o avanço da idade,
provavelmente refletindo o acúmulo de danos genéticos somáticos nas células-tronco em
processo de envelhecimento. Os cânceres pediátricos, embora sejam raros na população
em geral, podem ocorrer com grande frequência em famílias com propensão para o
câncer. Nesses casos, os tumores que surgem frequentemente são bilaterais ou
multicêntricos e se desenvolvem mais cedo que os casos que surgem esporadicamente
no seio da população em geral. Usando a distribuição de Poisson para calcular a
probabilidade do desenvolvimento de câncer como uma função da idade em cânceres
familiares versus cânceres pediátricos esporádicos, Alfred Knudson propôs o modelo que
atualmente é a base da genética do câncer humano [ver a Figura 2].28
O modelo de Knudson prevê que as crianças com tumores familiares herdaram
um hit genético inicial (i.e., um supressor de tumor mutante/nãofuncional) e precisam
apenas de um hit genético adicional limitador de velocidade para iniciar a tumorigênese.
Por outro lado, crianças com tumores esporádicos precisam adquirir dois hits genéticos
independentes dentro da mesma célula, um evento pouco provável que explica a
apresentação unilateral menos frequente e o início tardio de tipos esporádicos de câncer.
Estudos genéticos subsequentes envolvendo dois dos tumores estudados por Knudson
identificaram os genes supressores de tumores críticos dessas famílias: o gene RB1 em
retinoblastomas29 e o gene WT1 no tumor de Wilms.30 Além disso, o modelo explica o
paradoxo de que as mutações de genes supressores de tumores são mutações com
perda funcional ou mutações recessivas [ver a Tabela 2], embora o câncer familiar se
apresente como uma característica autossômica dominante. Embora a perda de um único
alelo de um gene supressor de tumores seja funcionalmente silenciosa na presença de
um segundo alelo normal, a frequência de mutações espontâneas é suficientemente
elevada para assegurar que pelo menos uma célula no interior do tecido-alvo
provavelmente perca o segundo alelo e inicie uma transformação maligna [ver a Figura 2].
Além disso, modelos sofisticados de animais e estudos genéticos em seres humanos
revelaram que, em alguns casos, a perda de ambos os alelos do gene supressor de tumor
não seja necessária para a transformação maligna. Em contextos celulares específicos e
em combinação com outros eventos genéticos somáticos, a perda de um único alelo pode
ser suficiente para desencadear a tumorigênese. O gene supressor de tumores com essa
propriedade se denominam “haploinsuficientes” e incluem os genes p53 e PTEN.31
Embora a mutação de linha germinal inicial que desativa um alelo de um gene
supressor de tumores seja tipicamente um ponto de mutação no interior do próprio gene, a
perda do segundo alelo em uma célula somática geralmente resulta de uma deleção ou
reorganização cromossômica básica.32 Como resultado, as análises moleculares dos
tecidos tumorais mostram a perda de marcadores genéticos polimórficos intimamente
ligados ao gene alvo. Esse fenômeno, conhecido por perda de heterozigosidade (PDH), é
uma indicação da desativação do gene supressor de tumores mais próximo em um câncer
[ver a Figura 3]. Essas perdas alélicas, que poderão ser mapeadas em todos os
cromossomos localizados no interior de um determinado tumor, poderão ser usadas para
identificar as localizações de genes supressores de tumores potencialmente novos.
 
Progressão do ciclo celular e rota do gene RB1
O primeiro supressor tumoral identificado foi o gene RB1, que está envolvido nos
retinoblastomas, que são tumores pediátricos nos olhos.29 De várias maneiras o gene RB1
continua sendo o protótipo dessa classe de genes, e sua estreita conexão com o
mecanismo básico da progressão do ciclo celular ilustra a íntima conexão entre
proliferação celular normal e transformação maligna. Conforme previa o modelo de
Knudson,28 um alelo de RB1 é desativado na linha germinal de crianças com
retinoblastoma familiar; seus tumores demonstram perda de heterozigosidade, indicando
que há uma perda somática do alelo remanescente. As crianças que abrigam uma
mutação na linha germinal em um alelo RB1 também têm propensão para
osteossarcomas, embora, conforme observamos acima, elas não demonstrem qualquer
aumento na suscetibilidade para outros tipos de câncer em que a perda somática tenha
sido comprovada, como, por exemplo, o câncer de pulmão de pequenas células (CPPC).
A despeito da importância desses casos familiares, as crianças com retinoblastoma
representam 90% dos casos; nessas crianças ambos os alelos RB1 são desativados no
interior de uma única célula somática.
A proteína codificada por RB1 é uma fosfoproteína nuclear que se liga aos
produtos de uma família genética que se denomina E2F que, por sua vez, estão
associados às proteínas da família de genes DP.33
 
Tabela 2 Genes Supressores de Tumores Selecionados, Associados a
Síndromes Predisponentes na Linha Germinal e a Mutações de Câncer Somático
 
Gene Função do
Produto
Proteico
Cânceres com
Mutações
Somáticas
Síndrome de Mutação na
Linha Germinal
RB1 Regulador
transcricional,
ligação com E2F1
Retinoblastoma,
osteossarcoma,
CPPC, câncer de
mama, próstata e
bexiga.
 
Retinoblastoma familiar
TP53 (p53) Fator de
transcrição
˜50% de todos os
cânceres (raro em
alguns tipos de
câncer, p.ex.,
carcinoma da
próstata,
neuroblastoma).
 
Síndrome de Li-Fraumeni
CDKN2A
(P16)
Inibidor da
quinase
dependente da
ciclina.
˜20 a 25% de muitos
tipos diferentes de
câncer (p.e., câncer
de mama, pulmão,
pâncreas, bexiga).
 
Melanoma familiar,
carcinoma pancreático
familiar.
APC Regula a função
da beta-catenina,
ligação com
microtúbulos.
Mutações
colorretais, raro ou
ausente na maioria
dos outros tipos de
câncer.
Polipose adenomatosa
familiar, síndrome de
Gardner, síndrome de
Turcot, doença desmoide
familiar.
 
MSH2, MLH1,
MSH16, PM52
Reparo de DNA
incompatível
Colorretal,
endométrico,
gástrico.
Câncer colorretal
hereditário sem polipose.
 
WT1 Fator de
transcrição
Tumor de Wilms. WAGR e síndromes de
Denys-Drash.
 
NF1 P21-RAS-
GTPase, ligação
com
microtúbulos.
Melanoma,
neuroblastoma.
 
Neurofibromatose
tipo 1
NF2 Ligação da
justamembrana
com o
citoesqueleto.
Schwanomas,
meningiomas,
ependimomas.
 
Neurofibromatose tipo 2
VHL Regulador da
estabilidade
proteica.
Hemangioblastoma
(tipo células claras)
renal.
Doença de von Hippel-
Lindau.
 
 
Tabela 2 Genes Supressores de Tumores Selecionados, Associados a
Síndromes Predisponentes na Linha Germinal e a Mutações de Câncer Somático
 
Gene Função do Produto
Proteico
Cânceres com
Mutações
Somáticas
Síndrome de
Mutação na Linha
Germinal
BRCA1,
BRCA2
Reparo de DNA,
complexo com
Rad51, regulação
transcricional
(BRCA1,).
 
Raro Carcinoma
hereditário de mama
e ovário,
pancreático.
MEN1 Desconhecida Adenomas
paratiroideos,
adenomas
hipofisários, tumores
endócrinos no
pâncreas.
 
Neoplasia endócrina
múltipla tipo 1.
PTCH Receptor
transmembranar para
a via de sinalização
Pele de células
basais,
meduloblastoma.
Síndrome de nevo
de células basais.
hedgehog sônica;
regulador negativo de
proteína smoothened.
 
PTEN Tirosina fosfatase Glioma; câncer de
mama, próstata,
cabeça e pescoço;
câncer de células
escamosas; câncer
tireóideo folicular.
 
Doença de Cowden,
síndrome tumoral
com vários
hamartomas.
STK11 LKB1 quinase que
regula o crescimento
e a polaridade das
células.
Carcinoma pulmonar,
carcinoma de células
escamosas.
 
Síndrome de Peutz-
Jeghers.
TSC1, TSC2 Complexo de
proteínas ativadoras
da GTPase.
 
Raro Esclerose tuberosa.
CDH1 Molécula de adesão
celular mediada pela
transmembrana E-
caderina.
Câncer gástrico
difuso e câncer de
mama lobular;
mutações raras em
outros tipos de
câncer (p.ex., câncer
endometrial e
ovariano).
 
Câncer gástrico
difuso hereditário.
DPC4 Sinalização no
sentido do fluxo na
rota de TGF-ß.
Mutações
pancreáticas raras
em outros tipos de
câncer (p.ex., câncer
no cólon e câncer
gástrico).
 
Desconhecida
IDH1, IDH2 Conversão de
intermediários do
ciclo de Krebs.
 
Glioma, LMA. Desconhecida
 
Tabela 2 Genes Supressores de Tumores Selecionados, Associados a
Síndromes Predisponentes na Linha Germinal e a Mutações de Câncer Somático
 
Gene Função do Produto
Proteico
Cânceres com
Mutações
Somáticas
Síndrome de
Mutação na Linha
Germinal
TGF-ß II R TGF-ß do receptor
transmembranar.
Câncer colorretal e
gástrico, 7 outros
tipos de câncer.
 
Desconhecida
LMA = leucemia mielocítica aguda; GTPase = guanosina trifosfatase; CPPC =
câncer de pulmão de pequenas células; TGF-ß (transformating growth factor-beta) = fator
de crescimento transformador ß; WAGR (Wilm’s tumor, aniridia, genitourinary anomalies,
and mental retardation) = tumor de Wilms, aniridia, malformações geniturinárias e
deficiência intelectual.
 
Os complexos E2F-DP desempenham um papel importante na ativação da
transcrição dos genes exigidos na síntese do DNA;a ligação a RB1 suprime esse efeito,
essencialmente bloqueando células na fase G1 do ciclo celular. Durante a proliferação
celular normal, os complexos quinase regulados pelo ciclo celular, incluindo um que
contém ciclina D e quinase 4 dependente da ciclina (CDK4, do inglês cyclin dependent
kinase 4), fosforilatos RB1, provocam sua liberação de E2F-DP; este fato, por sua vez,
permite que as células entrem na fase (S) da síntese do DNA do ciclo celular. Embora a
desativação fisiológica de RB1 através de hiperfosforilação seja transitória e reversível, a
desativação mutacional de RB1, comum a muitos tipos diferentes de tumor, assegura um
estímulo contínuo para a proliferação celular. Da mesma forma, os vírus oncogênicos do
DNA codificam proteínas que desativam, especifica e irreversivelmente, o produto do gene
RB1, incluindo a proteína E1A de adenovírus, o antígeno T de SV40 e a proteína E7 de
papilomavírus. O próprio gene RB1 é um membro de uma família de genes, sendo que
dois deles são genes intimamente relacionados denominados RBL1 (p107) e RBL2
(p130). Ainda não se conhece a razão pela qual RB1 é o alvo frequente de mutações nos
cânceres humanos, enquanto esses genes semelhantes não sofrem nenhuma mutação.
Uma melhor compreensão das diferenças sutis na função fisiológica dos membros dessa
família de genes possivelmente explique essa especificidade impressionante.
 
 
 
 
Figura 2 - Modelo two-hit de Knudson do início tumoral. De acordo com a
formulação original, esse modelo prevê a desativação de ambos os alelos de um gene
supressor de tumores e limita a velocidade da fase inicial do câncer. No caso de câncer
esporádico, a desativação desses dois alelos no interior da mesma célula depende de
dois eventos genéticos raros e independentes. Por outro lado, as pessoas que têm um
alelo do gene supressor de tumores com mutação em sua linha germinal, herdado de um
dos pais ou como resultado de nova mutação na linha germinal, precisa apenas de um
evento genético (i.e., perda do segundo alelo) para o início tumoral. Essa única mutação
possivelmente ocorra no interior de alguma célula do órgão-alvo, o que explica a alta
frequência da incidência de câncer, o início precoce e a frequente apresentação
multicêntrica em pessoas com predisposição genética para o câncer.
 
 
 
 
Figura 3 - Perdas de alelos em tumores e perda de heterozigosidade (PDH). A
perda de material genético que acompanha o desenvolvimento tumoral foi utilizada para
mapear a localização cromossômica dos genes de supressão de tumores. Embora,
tipicamente, o hit genético inicial seja o resultado de um ponto de mutação no interior do
gene supressor de tumores, o evento de desativação do segundo gene geralmente resulta
de uma perda cromossômica grave. Esse processo poderá incluir o cromossomo normal
inteiro, uma pequena deleção que remove um segmento cromossômico que contém o
gene, ou uma duplicação do cromossomo que carrega o alelo mutante, com a perda do
cromossomo normal. Esses eventos cromossômicos podem ser mapeados com auxílio de
polimorfismos do comprimento do fragmento da restrição, polimorfismos com um único
nucleotídeo, ou outros métodos moleculares que fazem a distinção entre os alelos
herdados da mãe e os alelos herdados do pai. A identificação do lócus cromossômico
sujeito à perda de heterozigosidade em tipos específicos de câncer é o ponto de partida
para a identificação dos genes com predisposição para câncer.
 
A compreensão da regulação normal de RB1 propiciou uma visão importante de
outros genes cancerígenos que desempenham algum tipo de papel na regulação do ciclo
celular [ver a Figura 4]. O CCND1 (ciclina D1), gene cuja expressão leva à
hiperfosforilação e desativação de RB1, geralmente é amplificado e superexpresso no
câncer de mama. Por outro lado, o CDKN2A, gene que codifica o inibidor p16INK4a de
CDK4 que favorece a forma ativa e hipofosforilada de RB1, é deletado em uma grande
variedade de tumores. As mutações de CDKN2A na linha germinal são umas das causas
de melanoma familiar.34 Para finalizar, a presença do gene CDK4 dependente da quinase,
que codifica a proteína insensível à inibição de p16INK4a, favorecendo a desativação de
RB1, também foi confirmada em cânceres humanos e em famílias de melanomas. Uma
das características marcantes de mutações nesses componentes diferentes da rota do
ciclo celular é que, aparentemente, eles são mutuamente exclusivos.
 
 
 
 
Figura 4 - Rota do ciclo celular do gene do retinoblastoma (RB1). A divisão
celular das células de mamíferos é desencadeada por um ponto de controle crítico entre a
fase G1 e a síntese de DNA (fase S). O complexo proteico E2F-DP, que ativa os genes
necessários para a síntese de DNA, é inibido diretamente pelo produto do gene supressor
de tumores RB1. A progressão normal do ciclo celular exige a desativação reversível da
proteína RB1 por fosforilação induzida pela ciclina D e CDK4. As mutações de RB1
impedem a inibição normal da progressão do ciclo celular, contribuindo para a
desregulação da divisão de células. A amplificação da ciclina D, ativando mutações em
CDK4, e a desativação do inibidor p16INK4a do CDK4 (codificado por CDKN2a) são
outros mecanismos por meio dos quais a rota de RB1 é interrompida nos cânceres
humanos.
 
De maneira geral, um único tumor apresenta alguma anormalidade em apenas
um desses genes – evidência de que essas mutações são funcionalmente equivalentes e
que o acúmulo de mutações complementares em componentes da mesma rota não
produz nenhuma vantagem adicional no crescimento.35
 
Genes com estabilidade genomica: p53 E BRCA 1/2
Embora o gene supressor de tumores RB1 seja um componente central da
regulação do ciclo celular, o gene p53 tem um papel importante na manutenção da
integridade genômica – que deu origem à designação popular de “guardião de genoma”.36
O gene p53 geralmente é expresso em baixos níveis em todas as células. Entretanto,
lesões genéticas, como aquelas que ocorrem através de radiação ionizante, disparam a
estabilização e a ativação de p53.
 
 
 
 
Figura 5 - Rota da resposta dos danos ao DNA e ao estresse celular de p53. A
proteína p53 é ativada em resposta aos danos no DNA, ao estresse oncogênico (p.ex.,
desativação de RB1) e a outros estresses celulares. A proteína p53 induz a transcrição de
uma grande variedade de genes que fazem a mediação de suas diversas funções,
incluindo a interrupção do ciclo celular da fase G1 e a morte celular programada. Em
tumores com mutações de p53, o reparo nos danos no DNA não é adequado, levando a
um acúmulo de mutações e de reorganizações genéticas. Dois genes celulares
importantes regulam a ativação de p53: MDM2 e p19ARF. O gene MDM2 induz a
degradação normal da proteína p53 e, em alguns tumores, a amplificação de MDM2
resulta na perda de função de p53. O gene p19ARF, que é induzido por E2F, inibe os
efeitos de MDM2 e contribui para a ativação de p53 após a desativação de RB1. A
proteína p19ARF geralmente se perde nos cânceres humanos juntamente com
p161NK4a, considerando que essas proteínas são expressas a partir do sítio genético de
CDKN2a. ERO = espécies reativas de oxigênio.
 
As funções da proteína p53 como fator de transcrição direcionam a expressão de
uma grande variedade de genes que controlam a resposta celular aos danos no DNA e a
outros estresses celulares [ver a Figura 5]. Entre os genes ativados por p53, o CDKN1A
(p21), que codifica um inibidor de quinases que depende da ciclina, é o gene que regula o
ciclo celular.37 A ativação de p53 provoca uma interrupção na fase G1 do ciclo celular,
permitindo que as células façam o reparo nos danos do DNA antes de passarem para a
fase S e da replicação do DNA. Nas outras células, a ativação de p53 resulta na ativação
de múltiplos efetores, causando apoptose – um programa de suicídio celular cujo DNA
possivelmente tenha sido irreparavelmente danificado. Não é de causar nenhuma
surpresa que as mutações de p53 sejam comuns nos cânceres em seres humanos, fato
que é demonstrado em torno de 50% de casos.38 Aocontrário das maioria dos
supressores tumorais que estão sujeitos principalmente a mutações truncadas (mutações
sem sentido), grande parte das mutações de p53 são substituições de aminoácidos dentro
do domínio de p53 que faz ligação com o DNA. Essas alterações resultam na
estabilização e na consequente expressão de alto nível da proteína mutante p53,
explicando o paradoxo de que níveis elevados da proteína p53 em espécimes tumorais
geralmente são considerados evidências da ocorrência de uma mutação em p53.
Acredita-se que a proteína mutante p53 propriamente dita contribua para a tumorigênese
através do rompimento da função de p53 do tipo selvagem (efeito conhecido como
negativo-dominante) e através de outros mecanismos que ainda se encontram atualmente
em fase de investigação.
Em alguns casos, as constelações de mutações de p53 em tumores
possivelmente reflitam o mecanismo presumido de carcinogênese. Por exemplo,
mutações específicas de p53 em cânceres hepáticos foram encontradas em populações
que vivem em uma região da China onde há exposição a níveis elevados de aflatoxina,
um carcinógeno hepático fúngico muito potente, sendo que as mutações que foram
observadas no câncer no fígado estão correlacionadas com aquelas induzidas pelos
carcinógenos policíclicos do tabaco. Por outro lado, as mutações de p53 deletadas nos
carcinomas colorretais frequentemente são observadas em nucleotídeos suscetíveis a
metilação que, aparentemente, é um mecanismo comum das mutações espontâneas.39
A mutação de um alelo na linha germinal de p53 é responsável pelo fenótipo de
múltiplos cânceres conhecido por síndrome de Li-Fraumeni.40 As famílias afetadas por
essa rara característica autossômica dominante demonstram uma predisposição
altamente penetrante para tipos distintos de câncer, incluindo sarcomas, câncer de mama,
tumores cerebrais e leucemia. Acredita-se que o mecanismo através do qual a
desativação da função de p53 leva ao desenvolvimento de câncer seja a perda de um
ponto de verificação que monitora a integridade do material genético antes da replicação
do DNA. A proteína p53 também desempenha um papel importante no desencadeamento
do suicídio celular, em resposta a sinais de crescimento inadequado, como aqueles
induzidos pela perda de outros supressores tumorais ou pela ativação de oncogenes.
Consequentemente, na ausência de p53, os danos genéticos persistem e, em última
análise, induzem a tumorigênese. Em alguns tipos de câncer, como aqueles que surgem
como consequência da síndrome de Li-Fraumeni, a perda de p53 inicia a tumorigênese;
em outros, como o câncer colorretal, a desativação de p53 é um evento genético tardio
importante para a progressão do fenótipo maligno.
Da mesma forma como o R1, o p53 é alvo específico de produtos de oncogenes
virais, incluindo a proteína E1B do adenovírus, o antígeno T de SV40 e a proteína E6 do
papilomavírus. Consequentemente, os vírus tumorais de DNA agem com uma capacidade
dupla: induzem a proliferação celular através da desativação de RB1 enquanto interrompe
a capacidade de p53 para desencadear a morte de células em resposta a esse sinal
proliferativo aberrante.41 Observou-se que as proteínas celulares também regulam a
função de p53. Entre elas, a proteína MDM2, induzida por p53 e ela própria intensifica a
degradação de p53, produzindo um ciclo de realimentação negativo crítico [ver a Figura
5]. O fato de p53 e MDM2 fazerem parte de uma rota celular comum tem o suporte de
alterações mutuamente exclusivas nos cânceres em seres humanos: os osteossarcomas
resultam de uma mutação que desativa o p53 ou de uma amplificação do gene MDM2,
levando a uma superprodução do produto genético.42 Os camundongos sem ambos os
alelos de MDM2 morrem logo no início do desenvolvimento embrionário, a menos que não
tenham também p53, sendo que, nessa hipótese, eles se desenvolvem normalmente para
a vida adulta – evidência de que MDM2 é importante para impedir atividade sem oposição
de p53 durante o crescimento normal.43
Muitas proteínas que regulam a função de p53 têm envolvimento no câncer
humano [ver a Figura 5]. A ativação de p53 em resposta à radiação ionizante ocorre
através da ATM (ataxia-telangiectasia mutante) quinase em resposta ao dano no DNA e
as respectivas quinases no sentido do fluxo, CHK1 e CHK2.44 Aparentemente, a
fosforilação de p53 reduz a ligação pelo MDM2 e aumenta a estabilidade da proteína p53
e intensifica sua atividade. Um segundo regulador importante de p53 é o CDKN2A, um
gene atípico que codifica os produtos de duas proteínas distintas, p19ARF e p16INK4a.45
A proteína p19ARF interage com MDM2 para regular a renovação de p53; o seu papel no
câncer humano é sugerido por tumores com delações genômicas frequentes que
desativam p19ARF e p16INK4a. Acredita-se que a ativação de p53 através da rota de
p19ARF seja disparada principalmente por sinais aberrantes de proliferação associados
com a indução de E2F, um regulador transcricional de p19ARF.46 Consequentemente, os
danos no DNA e os sinais aberrantes de proliferação podem ativar p53 através de rotas
distintas, porém complementares. Cabe observar que dois membros da família do gene
p53 que passaram despercebidos por muito tempo, TP73 (p73) e TP63 (p63),
compartilham algumas das mesmas propriedades funcionais do p53 in vitro, embora as
respectivas participações no câncer humano ainda estejam em fase de investigação.47,48
Embora o p53 seja o gene supressor de tumores estudado com mais intensidade
no processo de estabilidade genômica, aparentemente os genes associados a doenças
adicionais funcionam em rotas semelhantes ou paralelas. O gene da ataxia-telangiectasia
mutante (ATM, do inglês ataxia telangiectasia mutated) é responsável por uma síndrome
autossômica recessiva que se caracteriza pela presença de condições como degeneração
cerebelar, disfunção imunológica e predisposição para o câncer; conforme observamos
acima, esse tipo de gene funciona no contrafluxo da rota de p53 e é muito importante na
ativação de p53 após a radiação ionizante.49,50 Dois outros genes que têm função
importante na estabilidade genômica – BRCA1 e BRCA2 – são responsáveis por uma
fração substancial do câncer de mama e de ovário familiar de início precoce.51,52 Os
produtos desses genes agem em parte para mediar um mecanismo de reparo de DNA
conhecido por recombinação homóloga.53 Os tumores que surgem nos transportadores de
mutações de BRCA1 e BRCA2 apresentam defeitos no reparo de DNA, assim como
características clínicas e respostas distintas à terapia, em comparação com os cânceres
esporádicos de mama e de ovário mais comuns. Recentemente, alguns estudos
bioquímicos descobriram a existência de uma ligação funcional entre os genes BRCA1/2 e
a anemia de Fanconi (AF). Essa síndrome de predisposição para o câncer resulta de
mutações na linha germinal em um dos vários genes da anemia de Fanconi, que codifica
proteínas de reparo que atuam em rotas sobrepostas aos genes BRCA1/2.54
 
Instabilidade de microssatélites e reparo de incompatibilidades de
DNA
Nos casos de síndrome de Lynch ou de câncer colorretal hereditário sem
polipose (CCHSP), uma rota distinta para reparos de DNA está sujeita a mutações na
linha germinal associadas à incidência de câncer. Essa síndrome, que inclui predisposição
para cânceres no cólon, ovário e endométrio, é o resultado de mutações nos genes, tais
como MSH2 e MLH1, que são imprescindíveis para os reparos de incompatibilidades de
DNA.55
 
 
 
 
Figura 6 - Instabilidade de microssatélites e reparo de incompatibilidades de
DNA. Microssatélites são sequências curtas repetidas de DNA que se distribuem ao longo
do genoma e são altamente variáveis, facilitando a distinção entre alelos de herança
materna e alelos de herança paterna. Ao contrário dos tumores com perda de
heterozigosidade, que têm perda de um alelo em comparação com a linha germinal, os
tumores com instabilidade de microssatélites (erro positivo de replicação [RER+, do inglês
replication error positive) mostram marcadores de microssatélites com alteração nocomprimento. Isso resulta de erros no reparo das incompatibilidades de DNA. Na
presença de sequências de microssatélites dentro da região de codificação de um gene,
esses erros produzem mutações e perda de função genética.
 
Uma das marcas registradas dos tumores com defeitos no reparo de
incompatibilidades de DNA denomina-se instabilidade de microssatélites (MSI, do inglês
microsatellite instability) [ver a Figura 6]. Os microssatélites são prolongamentos de
nucleotídeos repetitivos cujos comprimentos variam entre indivíduos. Os tumores com MSI
possivelmente tenham microssatélites com tamanhos diferentes em comparação com os
microssatélites de células normais de um mesmo paciente.56 Levando-se em
consideração que as variações de microssatélites resultam de erros introduzidos durante
a replicação de DNA, esse tipo de tumor é conhecido por erro positivo de replicação
(RER+ do inglês replication error positive). Além dos tumores associados ao câncer
colorretal hereditário sem polipose (CCHSP), aproximadamente 10% dos cânceres
colorretais esporádicos apresentam instabilidade de microssatélites, indicando que o
rompimento de algum reparo de incompatibilidades também contribui para a incidência de
câncer colorretal na ausência de predisposição familiar.57 Embora a MSI seja um
marcador de deficiência em reparos de incompatibilidades, as alterações nos
microssatélites propriamente ditas não são oncogênicas. Em vez disso, acredita-se que a
deficiência em reparos de incompatibilidades produza mutações em outros genes
associados às principais rotas de sinalização celular. Nos casos de câncer no cólon, por
exemplo, a MSI possivelmente esteja associada a mutações que ocorrem no interior do
gene receptor do fator de crescimento transformador ß (TGF-ß, do inglês transformating
growth factor-ß), que abriga uma repetição de microssatélites dentro da sequência de
codificação.58 A mutação dessa sequência, resultante de problemas nos reparos de
incompatibilidades, induz a interrupção na sinalização do TGF-ß, um evento precoce
importante na carcinogênese do cólon. Uma caraterística importante que faz a distinção
entre defeitos nos reparos de incompatibilidades e outros mecanismos supressores de
tumores é que os defeitos nos reparos de incompatibilidades produzem tumores
indiretamente através de mutações em outros genes. Embora a expectativa seja que a
reintrodução de p53 em tumores com deficiência de p53 induza uma interrupção no
crescimento e/ou apoptose, teoricamente a recuperação do gene com reparo de
incompatibilidades não tenha nenhum valor terapêutico. Provavelmente esse fenômeno
ocorra muito tarde e não permita reverter o fenótipo maligno. Os genes supressores de
tumores geralmente são descritos como “cuidadores” de genoma em vez de “guardiães”
de rotas específicas que estimulam a proliferação de células cancerígenas.57
 
Supressores tumorais envolvidos na sinalização e diferenciação
A identificação de genes supressores de tumores envolvidos nas síndromes de
predisposição para o câncer criou visões importantes nos mecanismos de sinalização
celular que regulam o metabolismo das células. Por outro lado, a compreensão detalhada
desses mecanismos revelou que vários genes de supressão tumoral agem dentro de uma
rota reguladora comum. Um exemplo típico desse princípio é a rota que controla a
atividade de uma quinase conhecida como alvo da rapamicina em mamíferos (mTOR, do
inglês mammalian target of rapamycin) [ver a Figura 7]. A quinase mTOR, que está
presente em diversos complexos de proteínas distintas, é uma integradora mestre de
sinais de fatores de crescimento e uma reguladora do crescimento e da proliferação
celular através do controle da translação proteica, autofagia (autocatabolismo) e
angiogênese. Diversos genes envolvidos na regulação da atividade do complexo da
quinase mTOR 1 (mTORC1) em células normais são mutantes nas síndromes humanas
de predisposição tumoral [ver a Figura 7].59
 
 
 
 
Figura 7 - Oncogenes múltiplos e função de supressores tumorais em uma rota
molecular comum que converge na regulação do complexo da quinase 1 alvo da
rapamicina em mamíferos (mTORC1). O gene STK11 sofre uma mutação na síndrome de
Peutz-Jeghers e codifica a quinase LKB1 que atua através da quinase AMPK e do
complexo TSC 1/2 como inibidor de mTORC1. O gene PTEN – que sofre mutações em
diversas síndromes de predisposição tumoral, incluindo a síndrome de Cowden – codifica
uma fosfatase que bloqueia a ativação de mTORC1 através da inibição da rota da quinase
AKT/PI3. Essa rota é também ativada em tumores por meio da mutação somática de
genes que codificam as próprias quinases AKT e PI3. Os genes que codificam as
proteínas inibidoras de mTORC1 – TSC1 e TSC2 – sofrem mutações na síndrome de
esclerose tuberosa. O complexo mTORC1 promove a translação proteica e o crescimento
celular por meio da fosforilação de substratos, incluindo as proteínas quinases S6
ribossômicas (S6K) e a proteína de ligação eIF-4E do fator de início da translação (4E-
BP1). A ativação de mTORC1 suprarregula o fator induzível por hipoxia (HIF, do inglês
hypoxia-inducible fator), que também é suprarregulado pela mutação do supressor tumoral
de von Hippel-Lindau (VHL). Todas essas síndromes compartilham uma predisposição
para hamartomas benignos e uma incidência variável de tumores malignos. Análogos da
rapamicina, um inibidor de pequenas moléculas de mTORC1, encontram-se atualmente
em fase de testes clínicos para uma grande variedade de tumores benignos e malignos.
Os genes de supressão tumoral estão indicados na cor azul escuro na figura.
 
A mutação do gene PTEN na linha germinal está associada a diversas
síndromes, como, por exemplo, a doença de Cowden, que se caracteriza pela presença
de tumores benignos conhecidos como hamartomas e pela predisposição para câncer de
mama.60 Mutações no gene PTEN também são encontradas em muitos tipos diferentes de
câncer esporádico. O gene PTEN codifica um tipo de fosfatase que catalisa a remoção de
moléculas de fosfato dos lipídeos principais (fosfoinositídeos), regulando,
consequentemente, de forma negativa a rota da fosfoinositídeo 3-quinase (PI3K, do inglês
phosphoinositide 3- kinase) que é muito importante para a ativação de mTORC1. A
mutação do gene STK11 (LKB1) na linha germinal é uma das causas da síndrome de
Peutz-Heghers, que está associada aos hamartomas intestinais e aos tumores malignos
no intestino, pâncreas e em outros sítios.61 A quinase LKB1 codificada por STK11 ativa a
quinase detectora de energia AMPK, que age como reguladora negativa de mTORC1. A
síndrome da esclerose tuberosa é o resultado de mutações em TSC1 (hamartina) ou
TSC2 (tuberina). Embora não tenha sido associada a um risco elevado de incidência de
tumores malignos, a esclerose tuberosa está relacionada a uma taxa elevada de
morbidade em decorrência de hamartomas no sistema nervoso central, nos rins e em
outros tecidos.62 As proteínas de TSC1 e TSC2 formam um complexo que atua como um
guardião essencial para restringir a atividade de mTORC1. Outro supressor tumoral
envolvido nessa rota é o gene de von Hippel-Lindau (VHL) que, com frequência, sofre
mutações nos cânceres de células renais adultas e na linha germinal de pessoas com
alguma síndrome que inclua tumores vasculares benignos e malignos. Embora não seja
um regulador no contrafluxo do mTORC1, o produto do gene VHL controla a degradação
de determinadas proteínas, incluindo o fator induzível por hipoxia (HIF, do inglês hypoxia-
inducible fator), um regulador importante da angiogênese.63 Levando-se também em
consideração a regulação positiva do HIF pelo mTORC1, as síndromes mencionadas
acima compartilham algumas semelhanças fenotípicas com a doença de von Hippel-
Lindau; a atividade do HIF é elevada, levando a tumores altamente vasculares. Talvez o
fato mais importante seja a previsão de que os tumores benignos e malignos que abrigam
uma quantidade elevada de atividade mTOR/ HIF possam ser responsivos aos inibidores
da atividade de mTOR, em especial os derivados de compostosda rapamicina, que
atualmente estão em fase de testes clínicos.
Diversas outras síndromes de supressão tumoral estão associadas a tumores
malignos, tumores benignos (hamartomas) ou a ambos os tipos de tumor e,
consequentemente, apresentam semelhanças fenotípicas com as síndromes descritas
acima, embora ainda não tenha sido comprovada a existência de alguma ligação direta
com a sinalização de mTOR. Essas outras síndromes incluem polipose adenomatosa
familiar (PAF), síndrome que se caracteriza pelo desenvolvimento de inúmeros pólipos
colônicos e por um risco muito elevado de transformações malignas. As mutações no
gene APC na linha germinal produzem esta síndrome, enquanto que as mutações
somáticas no gene APC são a etapa mais precoce do desenvolvimento de câncer
colorretal esporádico. O gene APC é um regulador importante na rota de sinalização de
WNT através dos efeitos sobre a catenina-ß, um cofator importante de transcrição que
atua por meio da mediação da família de LEF/TCF de fatores de transcrição.64 A alteração
no gene SMAD4 está associada à polipose juvenil e às malignidades gastrointestinais.65
As proteínas SMAD atuam fazendo a mediação da sinalização de TGF-ß. Outros genes
de supressão tumoral ligados às rotas de sinalização celular são o gene NF1, que é uma
das causas de neurofibromatose (doença de von Recklinghausen) e cujo produto gênico
infrarregula o proto-oncogene RAS66; o gene NF2, que sofre frequentes mutações em
mesoteliomas e schwanomas e que codifica uma proteína estrutural que possivelmente
esteja envolvida na aderência e na proliferação celular67; e o gene PTCH que codifica um
receptor para o fator de crescimento que se denomina hedgehog, cuja mutação
representa um alto risco de câncer de pele na síndrome do nevo de células basais.68
Algumas das rotas descritas acima, incluindo WNT, TGF-ß, hedgehog e outras,
contribuem para os processos evolutivos normais. O gene WT1 é o paradigma de um
gene supressor de tumores envolvido no desenvolvimento normal, que codifica um
regulador de transcrição expresso especificamente em podócitos e no glomérulo em
desenvolvimento. As mutações em WT1 produzem o tumor de Wilms, um tipo de câncer
embrionário nos rins; as mutações na linha germinal causam defeitos no desenvolvimento
genitourinário. Aparentemente, os genes que são normalmente regulados pelo produto
gênico WT1 estão envolvidos na proliferação e na diferenciação.69 Foi identificado um
segundo gene associado ao tumor de Wilms que se localiza no cromossomo X.70 Esse
gene, conhecido por WTX, aparentemente controla a sinalização da catenina-ß/WNT, uma
descoberta que evidencia a conservação de rotas evolutivas lingadas à tumorigênese.71
 
Progressão tumoral
Acúmulo de lesões genéticas
Progressão gradual de lesões genéticas durante a tumorigênese
A presença de uma lesão genética no interior de um único gene limitante de
velocidade é imprescindível para iniciar uma transformação maligna. Entretanto, a
progressão do fenótipo maligno depende da aquisição de mutações adicionais que
confiram uma vantagem complementar de crescimento e, consequentemente, sejam
selecionadas durante a expansão do clone maligno [ver a Figura 8]. Um determinado tipo
de gene poderá ser limitante de velocidade para transformação em um tipo de célula,
embora possa ter uma participação secundária em outro tipo. O câncer colorretal é o
modelo de progressão tumoral estudado com mais intensidade, para o qual Kinzler e
Vogelstein estabeleceram uma correlação entre a progressão histológica de pólipo para
carcinoma e o acúmulo de eventos genéticos.72
 
 
 
 
Figura 8 - Após o início de um evento genético neoplásico e limitante de
velocidade, a proliferação de células cancerígenas é estimulada por vantagens seletivas
de crescimento que são confirmadas por mutações cumulativas. A divisão celular
constante e a perda gênica exigida para manter a estabilidade genômica facilitam a
ocorrência de mutações. Propriedades como perda de morte celular, invasão,
angiogênese e resistência aos medicamentos tipificam a progressão fenotípica de células
tumorais. As cores indicam os descendentes clonais de células individuais.
 
A mutação que desativa o gene APC está associada ao desenvolvimento de
hiperplasia epitelial. As mutações que ativam KRAS e alteram a metilação do DNA se
correlacionam com a progressão para pólipos adenomatosos; as alterações em um ou
mais genes que se localizam no cromossomo 18q denotam a transição para adenomas de
alto grau; e, finalmente, a desativação de p53 acompanha a evolução para carcinoma
maligno [ver a Figura 9]. As lesões pré-neoplásicas que produzem câncer colorretal são
definidas imediatamente porque ocorrem no interior da mucosa colônica e são acessíveis
para coleta de biópsias colonoscópicas. Outros modelos de progressão tumoral estão em
fase de estudos e incluem cânceres no esôfago, na cabeça e pescoço, e na bexiga.
 
Alterações epigenéticas e silenciamento genético
Além dos eventos genéticos, a progressão tumoral é também acompanhada de
alterações dramáticas no perfil epigenético das células cancerígenas em seres humanos.
As alterações epigenéticas se referem às alterações cromossômicas não hereditárias que
influenciam a expressão gênica. Acredita-se que os dois tipos de modificações que foram
identificados tenham uma participação significativa no processo de progressão tumoral.
Essas modificações envolvem a metilação do próprio DNA e a metilação ou acetilação das
proteínas que compactam o DNA conhecidas por histonas.73 A metilação do DNA ocorre
no interior de regiões reguladoras de muitos genes nos sítios denominados ilhas de CpG,
que são sequências de DNA enriquecidas pelo dinucleotídeo citosina/guanina, que é o
alvo das enzimas DNA metiltransferases. Nas células normais, essas regiões são
metiladas com pouca frequência, levando a uma expressão gênica ativa. Entretanto, nas
células cancerígenas, as ilhas de CpG de muitos genes são hipermetiladas, resultando no
silenciamento de genes específicos, incluindo genes supressores de tumores bem
estabelecidos como os genes CDKN2A, MLH1 e muitos outros.73 Paradoxalmente, apesar
de terem aumentado a metilação de ilhas de CpG específicas, as células tumorais se
apresentam com hipermetilação global, que se torna mais pronunciada durante a
progressão, como, por exemplo, de pólipos colônicos para carcinoma [ver a Figura 9].
 
 
 
 
Figura 9 - Alterações genéticas durante a progressão de câncer colorretal. Este
modelo, proposto por Bert Vogelstein, geralmente conhecido por “Vogelgrama”, liga
características histológicas da progressão de câncer colorretal a lesões genéticas
específicas. A mutação do gene APC da polipose familiar é o evento inicial do câncer
colorretal familiar. Lesões genéticas adicionais estão associadas a pólipos de gravidade
crescente, enquanto que p53 geralmente marca a transição para câncer colorretal
invasivo. A progressão de outros tipos de tumor pode ser desencadeada pela perda de
genes supressores de tumores diferentes ou por uma ordem cumulativa diferente,
incluindo o gene p53. PDH = perda de heterozigosidade.
 
Um segundo mecanismo que contribui para o silenciamento gênico epigenético
nas células tumorais envolve metilação e acetilação de resíduos de histonas específicas
associadas ao DNA. Essas modificações ocorrem em resíduos específicos de
aminoácidos de determinadas histonas, sendo que seu padrão está intimamente
correlacionado com a expressão gênica, de modo que, às vezes, esses padrões são
conhecidos como “código de histonas”, análogo ao código genético (DNA) propriamente
dito. As modificações nas histonas e a metilação do DNA são mecanismos reguladores
interdependentes dramaticamente alterados nas células cancerígenas.74 O fato de que
essas alterações epigenéticas nas células tumorais são potencialmente reversíveis abre
as portas para novas oportunidades terapêuticas. Por exemplo, atualmente o vorinostat,
um inibidor da histona desacetilase, é usado no tratamento de linfomas cutâneos de
células T. Este agente emais de uma dúzia de compostos relacionados estão atualmente
em fase de testes para aplicação em uma grande variedade de cânceres.75
 
MicroRNAs e progressão de câncer
Trata-se de um paradigma completamente novo na regulação gênica, relevante
para células normais e células tumorais, que foi criado após a descoberta de microRNAs
(miRNAs). Essas moléculas extremamente pequenas de RNA (comprimento de 16 a 29
nucleotídeos, em comparação com o RNA mensageiro com uma média de 1.500
nucleotídeos) não codificam proteínas, porém, em vez disso, agem como reguladores
potentes da expressão gênica e da translação proteica através da capacidade de fazer
par com as moléculas de RNA que codificam proteínas celulares. Embora se acredite que
tenham evoluído inicialmente como um sistema de defesa contra espécies estranhas de
RNA associadas a infecções virais, reconhecidamente os miRNAs atuam como
reguladores importantes de uma ampla variedade de processos celulares, incluindo
proliferação, diferenciação e sobrevivência de células.76 As células tumorais apresentam
expressão alterada de muitos miRNAs em comparação com as células normais. A
significância dessas alterações não é totalmente compreendida, porém há sugestões
bastante claras de que os próprios miRNAs possivelmente atuem como oncogenes ou
como genes supressores de tumores. Um subgrupo de casos de leucemia linfocítica
crônica de células ß (LLC-ß) mostra uma perda na região cromossômica 13q14, sendo
que os únicos genes expressos nessa região são dois miRNAs conhecidos como miR-15a
e miR-16-1.77 Atualmente, acredita-se que esses miRNAs funcionem como inibidores do
fator de sobrevivência BCL2 e sejam silenciados na maioria dos casos de LLC-ß, assim
como em diversos outros tipos de câncer, potencializando a sobrevivência das células
tumorais. Da mesma forma, a família de let-7 dos miRNAs pode atuar também como
supressor tumoral através da inibição do proto-oncogene RAS; na realidade, a expressão
desses miRNAs tem uma correlação inversa com a expressão do RAS em câncer de
pulmão de células não pequenas.78 Entre os miRNAs potencialmente oncogênicos estão o
miR-372 e o miR-373, que são superexpressos nos carcinomas testiculares e
aparentemente interrompem o ciclo celular dependente de p53, explicando possivelmente
porque o gene p53 propriamente dito raramente sofre mutações nesses tumores.79 Além
de dar uma visão mais profunda da genética tumoral, a caracterização em curso da
expressão do miRNA no câncer humano poderá levar a novos meios de determinar
prognósticos e de prever respostas terapêuticas.
 
Mortalidade e imortalidade celular
O estímulo inicial à proliferação celular que ocorre após algum evento
transformador geralmente é acompanhado de um aumento na morte celular ou apoptose,
um mecanismo compensatório que impede o crescimento rápido de algum tipo de câncer.
A desativação do supressor tumoral p53 é a lesão genética mais comum que anula a
resposta da morte celular, permitindo o crescimento rápido no número de células
cancerígenas. O BCL2 é outro gene envolvido na regulação da apoptose que codifica uma
proteína mitocondrial que evita o desencadeamento da cascata de protease exigida para
o suicídio celular.80 O papel do gene BCL2 no câncer humano é mais bem ilustrado no
linfoma folicular de células B, um tipo de tumor indolente em que a translocação
cromossômica coloca o gene BCL2 sob controle do ativador do gene das
imunoglobulinas.81 O aumento na expressão de BCL2 nessas células linfoides impede a
programação de sua morte celular, resultando no aumento da massa de células linfoides
que tipificam esse linfoma de crescimento lento. Conforme observamos acima, a função
de BCL2 pode ser mais intensa em alguns tumores, incluindo a leucemia linfocítica
crônica (LCC), através do silenciamento de microRNAs cuja função normal é inibir sua
expressão. O BCL2 faz parte de uma grande família de genes em que alguns membros
apresentam efeitos pró-apoptóticos e outros antagonizam a morte celular programada.80 O
gene BAX, membro pró-apoptótico da família do BCL2, contém uma sequência repetitiva
de nucleotídeos que é alvo de mutações em tumores com instabilidade nos
microssatélites.81,82 Consequentemente, a superexpressão de membros antiapoptóticos da
família do gene BCL2 ou a desativação de genes pró-apoptóticos possivelmente contribua
para o fenótipo maligno.
Além de evitar os controles sobre a proliferação e os mecanismos de morte
celular, as células tumorais finalmente atingem a imortalidade celular, isto é, a capacidade
de sofrer divisões celulares ilimitadas. As células somáticas são programadas para sofrer
apenas um número limitado de divisões celulares, após o que elas entram em um estado
que se denomina senescência. Embora os mecanismos moleculares subjacentes à
senescência celular ainda não sejam bem compreendidos, a participação dos genes
supressores de tumores CDKN2A e p53 é teoricamente possível em modelos de
camundongos. As células normais que são direcionadas para a proliferação por meio da
transformação oncogênica evitam a senescência e entram em crise, ou em morte celular
maciça, na medida em que se aproximam do final do espectro de vida.
Consequentemente, o relógio biológico das células somáticas normais é a salvaguarda
mais potente contra transformações malignas e devem ser dominadas por todas as
células cancerígenas para crescerem além do tempo de vida originalmente previsto. Esse
relógio biológico está ligado aos telômeros, que são as extremidades dos cromossomos
que precisam ser protegidas para manter a integridade cromossômica [ver a Figura 10].
 
 
 
Figura 10 - Senescência celular e ativação da telomerase. A divisão celular
normal exige a manutenção de telômeros, que são as extremidades dos cromossomos.
Nas células germinativas programadas para a vida eterna, a manutenção desses
telômeros é o resultado da atividade da enzima telomerase. O crescimento de células
somáticas em culturas resulta no encurtamento progressivo dos telômeros, até o momento
em que cessar a divisão celular e se atingir a senescência. As células que forem
estimuladas a proliferar além daquele ponto pela expressão de genes transformadores
continuam a encolher os respectivos telômeros até entrarem em crise, ponto em que os
cromossomos se tornam instáveis provocando morte celular maciça. Em números
pequenos de células, a telomerase poderá ser ativada no momento da crise e produzir
linhas de células imortais que poderão crescer indefinidamente in vitro. A maior parte dos
cânceres humanos expressam altos níveis de telomerase, sugerindo que uma pressão
seletiva semelhante in vivo contribui para seu potencial ilimitado de crescimento.
 
Os telômeros se compõem de uma prolongação de nucleotídeos repetidos e de
um “tampão” de proteína que impede que as extremidades dos cromossomos sejam
reconhecidas como quebras de DNA.83 Os telômeros funcionam como um mecanismo de
contagem de células, tendo em vista que se encurtam ligeiramente em cada divisão
celular, resultante da perda de nucleotídeos necessária para a força motora durante o
início da síntese do DNA. A crise inicia a partir do momento em que os telômeros ficarem
tão curtos que o tampão de proteína se rompa, induzindo uma resposta aos danos no
DNA na medida em que tenta fazer o reparo ou recombinar o DNA telomérico. O pequeno
número de células que sobreviver à crise estabiliza os respectivos telômeros, geralmente
através da suprarregulação da enzima telomerase. No caso da ribonucloproteina com
atividade reversa da transcriptase, a telomerase utiliza um modelo de DNA para adicionar
repetições apropriadas de nucleotídeos nas extremidades dos telômeros, acompanhando,
consequentemente, o encurtamento progressivo que acompanha a divisão celular [ver a
Figura 10].84,85 Ao contrário das células somáticas, que têm vida finita e em geral
expressam níveis baixos de telomerase, as células germinativas, as células-tronco e as
células cancerígenas expressam altos níveis dessa enzima. As propriedades enzimáticas
exclusivas da telomerase

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