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A cópia do material didático utilizado ao longo do curso é de propriedade do(s) autor(es), não podendo a contratante vir a utilizá-la em qualquer época, de forma integral ou parcial. Todos os direitos em relação ao design deste material didático são reservados à Fundação Getulio Vargas. Todo o conteúdo deste material didático é de inteira responsabilidade do(s) autor(es), que autoriza(m) a citação/divulgação parcial, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. Adicionalmente, qualquer problema com sua turma/curso deve ser resolvido, em primeira instância, pela secretaria de sua unidade. Caso você não tenha obtido, junto a sua secretaria, as orientações e os esclarecimentos necessários, utilize o canal institucional da Ouvidoria. ouvidoria@fgv.br www.fgv.br/fgvmanagement 1 Recuperação de Empresas 1. PROGRAMA DA DISCIPLINA 1.1 Ementa Falência: pressupostos. Rito Processual. Declaração da falência e seus efeitos. Arrecadação e Alienação de bens, habilitação de créditos, ações revocatória e de restituição. Extinção do processo. Recuperação Judicial. Legitimidade Ativa. Litisconsórcio. Requisitos para o deferimento. Apresentação do plano de recuperação. Aprovação do Plano de Recuperação. Sentença Homologatória. Cumprimento do Plano de Recuperação. Sentença de Encerramento. Aspectos principais do Plano Especial das Micro e Pequenas Empresas. Recuperação Extrajudicial. 1.2 Carga horária total 24 horas/aula 1.3 Objetivos Objetivo da disciplina é introduzir o aluno nos questionamentos acerca das mais relevantes questões que abordam a recuperação das empresas, como instituto criado com a finalidade de dar cumprimento ao princípio da preservação da empresa, bem como as figuras jurídicas envolvidas nestes fenômenos. Deve-se ainda levar ao aluno o conhecimento das questões falimentares mais relevantes, todos pela utilização de casos concretos. 1.4 Metodologia Aulas teóricas expositivas intercaladas com sessões de estudo de casos e análise de jurisprudências com utilização do PowerPoint e divisão de alunos em grupos, mediante a utilização da metodologia participativa dos alunos na discussão dos conceitos e sua aplicabilidade nas questões práticas por análises de casos concretos. 1.5 Critérios de avaliação O aluno será avaliado a partir de uma prova escrita, discursiva e individual, com consulta apenas à legislação não comentada, a qual serão abordadas questões discutidas em sala de aula (que podem ou não constar expressamente desta apostila), cuja nota poderá atingir até o conceito 7, e por trabalhos desenvolvidos em grupo e/ou individual, cuja a nota poderá atingir até o conceito 3. 1.6 Bibliografia recomendada BEZERRA, Manoel Justino Filho, Lei de Recuperação de Empresas e Falências Comentada, 12ª Edição, Ed. RT, 2017; AYUBI, Luiz Roberto, Cavalli Cássio, A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas. 3ª Edição, 2017; COELHO, Fábio Ulhoa, Comentários À Lei de Falências e de Recuperação de Empresas - 11ª edição, Ed. Saraiva 2016; 2 Recuperação de Empresas CAMPINHO, Sérgio, Falência e Recuperação de Empresas, 8ª Edição, Ed. Renovar, 2017; FAZZIO JUNIOR, Waldo Lei de Falência e Recuperação de Empresas, 7ª edição, Ed. Atlas SA, 2015; Curriculum vitae do professor Dones Nunes, Doutorando pela Universidade Federal Fluminense, Mestre pela Universidade Federal Fluminense – UFF, especializado Master of Business Administration em Direito Empresarial, Professor e Palestrante de Direito Empresarial de diversas instituições, dentre as quais destacamos: FGV – Fundação Getúlio Vargas, IBMEC – Faculdade de Economia e Finanças, PUC-IAG – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, FEMPERJ – Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, IBEF – Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças, FBT – Faculdade Brasileira de Tributação, Grupo Kroton, Grupo Anhaguera. Advogado com larga experiência no segmento empresarial, membro do IBRADEMP – Instituto Brasileiro de Direito Empresarial membro do IAB – Instituto dos Advogados do Brasil, membro fundador do IPOJUR – Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas em Ciências Políticas e jurídicas membro da Comissão de Recuperação Judicial da OAB-RJ, Administrador Judicial Certificado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Autor da obra, “Dos Créditos Trabalhista na Nova Lei de Falências”. 3 Recuperação de Empresas 2. ESTRUTURA DA LEI 11.101/2005 CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES PRELIMINARES – Arts. 1° ao 3° (4° vetado) CAPÍTULO II – DISPOSIÇÕES COMUNS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL E À FALÊNCIA SEÇÃO I - DISPOSIÇÕES GERAIS – Arts. 5° ao 6° da LRE SEÇÃO II - DA VERIFICAÇÃO E DA HABILITAÇÃO DE CRÉDITOS – Arts. 7° ao 20 da LRE SEÇÃO III - DO ADMINISTRADOR JUDICIAL E DO COMITÊ DE CREDORES – Arts. 21 ao 34 da LRE SEÇÃO IV - DA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES – Arts. 35 ao 46 da LRE CAPÍTULO III – DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL SEÇÃO I - DISPOSIÇÕES GERAIS – Arts. 47 ao 50 da LRE SEÇÃO II - DOS PEDIDOS E DO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Arts. 51 ao 52 da LRE SEÇÃO III - DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Arts. 53 ao 54 da LRE SEÇÃO IV - DO PROCEDIMENTO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Arts. 55 ao 69 da LRE SEÇÃO V - DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL PARA MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE – Arts. 70 ao 72 da LRE CAPÍTULO IV – DA CONVOLAÇÃO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM FALÊNCIA - Arts. 73 ao 74 da LRE CAPÍTULO V – DA FALÊNCIA SEÇÃO I - DISPOSIÇÕES GERAIS – Arts. 75 ao 82 da LRE SEÇÃO II - DA CLASSIFICAÇÃO DOS CRÉDITOS – Arts. 83 ao 84 da LRE SEÇÃO III - DO PEDIDO DE RESTITUIÇÃO – Arts. 85 ao 93 da LRE SEÇÃO IV - DO PROCEDIMENTO PARA A DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA – Arts. 94 ao 101 da LRE SEÇÃO V - DA INABILITAÇÃO EMPRESARIAL, DOS DIREITOS E DEVEES DO FALIDO – Arts. 102 ao 104 da LRE SEÇÃO VI - DA FALÊNCIA REQUERIDA PELO PRÓPRIO DEVEDOR – Arts. 105 ao 107 da LRE SEÇÃO VII - DA ARRECADAÇÃO E DA CUSTÓDIA DE BENS – Arts. 108 ao 114 da LRE 4 Recuperação de Empresas SEÇÃO VIII - DOS EFEITOS DA DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA SOBRE AS OBRIGAÇÕES DO DEVEDOR – Arts. 115 ao 128 da LRE SEÇÃO IX - DA INEFICÁCIA E DA REVOGAÇÃO DE ATOS PRATICADOS ANTES DA FALÊNCIA – Arts. 115 ao 128 da LRE SEÇÃO X - DA REALIZAÇÃO DO ATIVO – Arts. 139 ao 148 da LRE SEÇÃO XI - DO PAGAMENTO AOS CREDORES – Arts. 149 ao 153 da LRE SEÇÃO XII - DO PAGAMENTO AOS CREDORES – Arts. 154 ao 160 da LRE CAPÍTULO VI – DA RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL Arts. 161 ao 167 da LRE CAPÍTULO VII – DISPOSIÇÕES PENAIS SEÇÃO I - DOS CRIMES EM ESPÉCIE – Arts. 168 ao 178 da LRE SEÇÃO II - DISPOSIÇÕES COMUNS – Arts. 179 ao 181 da LRE SEÇÃO III - DO PROCEDIMENTO PENAL – Arts. 183 ao 188 da LRE CAPÍTULO VIII – DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS Arts. 190 ao 201 da LRE 5 Recuperação de Empresas 3. RECUPERAÇÃO JUDICIAL 3.1 Introdução A Lei nº 11.101/2005 (“Nova Lei de Falências”) contemplou duas formas de se evitar a falência de um devedor em crise econômico-financeira: a recuperação judicial e a recuperação extrajudicial. A recuperação extrajudicial tem natureza contratual, sendo precedida de um acordo homologado pelo Juízo competente. O presente trabalho versa, no entanto, sobre a análise dos principais aspectos relativos à recuperação judicial, bem como do respectivo plano de recuperação. Inicialmente, cabe ressaltar que a introdução deste novel instituto em nosso ordenamento jurídico não dependeu exclusivamente da aprovação da Nova Lei de Falências, tendo sido também necessária uma alteração no Código Tributário Nacional, o que se deu por meio da Lei Complementar nº 116/2005. Note-se ainda que também será necessária, para viabilizar a recuperação judicial, a aprovação do Projeto de Lei nº 245-04, que trata do parcelamentode dívidas tributárias do devedor em recuperação. De acordo com o art. 47 da Nova Lei de Falências, a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.1 A redação do dispositivo acima denota a preocupação do legislador com a preservação da empresa. Tal preocupação, em relação às sociedades anônimas, é ressaltada pelo professor José Edwaldo Tavares Borba, ao afirmar que tais sociedades não são apenas “um mero instrumento de produção de lucros para a distribuição aos detentores do capital”2, mas sim uma “instituição destinada a exercer o seu objeto para atender aos interesses de acionistas, empregados e comunidade”.3 3.2 Legitimidade e Requisitos para o Pedido de Recuperação Judicial – Fase Postulatória O processo de recuperação judicial será instaurado por iniciativa do devedor em crise econômico-financeira, ou seja, “somente aquele que está exposto ao risco de ter a falência decretada pode pleitear o benefício da recuperação judicial”3. Assim sendo, é o devedor o único legitimado para tal ação, de modo que credores ou empregados do devedor, ainda que tenham um plano de recuperação, não poderão apresentá-lo em juízo.4 O parágrafo único do artigo 48 da Nova Lei de Falências estende a legitimidade para o pedido de recuperação judicial ao cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor ou 1 Art. 47, caput da lei 11.101/2005. 2 BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 8a ed, 2003, p. 134. 3 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentário à Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 124. 4 Idem. p. 124. 6 Recuperação de Empresas inventariante, caso se trate de empresário individual falecido, bem como aos sócios remanescentes, quando se tratar de sociedade empresária.5 O art. 48 da Nova Lei de Falências traz os requisitos para o devedor poder requerer a recuperação judicial. De acordo com o referido dispositivo legal, o devedor deve exercer regularmente suas atividades há mais de dois anos e deve preencher cumulativamente os seguintes requisitos: I – não ser falido, e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial; III – não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo; IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.6 O primeiro requisito diz respeito ao tempo mínimo de exercício da atividade empresarial, tendo sido exigidos pelo legislador dois anos. De acordo com o professor Fábio Ulhoa Coelho, a razão de ser deste prazo reside no fato de se presumir a importância local, regional ou nacional de uma sociedade empresária ou empresário individual em atividade a mais de dois anos.7 O inciso I do art. 48 da Nova Lei de Falências determina como requisito que o devedor não tenha tido sua falência decretada. Note-se que a lei fala em decretação de falência, ou seja, se, por exemplo, um devedor já teve sua falência requerida, mas esta ainda não foi decretada, ele poderá requerer a sua recuperação judicial. Caso a falência do devedor já tenha sido decretada, existe ainda uma alternativa: a reabilitação do falido. O terceiro requisito é de ordem temporal, não sendo possível o pedido de recuperação judicial pelo devedor que a tenha obtido há menos de 5 anos. Segundo o professor Fábio Ulhoa, “se foi concedida a uma sociedade empresária a recuperação judicial nesse período (no qüinqüênio anterior) e está ela necessitando de novo socorro para reorganizar seu negócio, isso sugere falta de competência suficiente para a exploração da atividade econômica em foco”.8 Na hipótese de tratar-se de sociedade microempresária ou empresária de pequeno porte, tal prazo é elevado, por determinação do inciso III do art. 48 da Nova Lei de Falências, para oito anos. 5 Note-se que o professor Fábio Ulhoa afirma que, quando o legislador se referiu a sócio remanescente, quis referir-se a sócio minoritário, permitindo, assim, que os sócios que discordaram, em assembleia geral, de eventual rejeição de proposta de recuperação judicial possam aduzir em juízo o pedido de recuperação. COELHO. Ob. cit. p. 126. 6 Art. 48, I a IV da Lei 11.101/2005. 7 Idem. p. 125. 8 COELHO. Ob. cit. p. 125. 7 Recuperação de Empresas O último requisito impede que o devedor tenha sido condenado por crime falimentar. Tal proibição estende-se ao controlador ou administrador da sociedade empresária. Além dos requisitos acima enumerados, o art. 51 da Nova Lei de Falências determina que a petição inicial esteja instruída com os seguintes documentos: I – a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira; II – as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de9: a) balanço patrimonial; b) demonstração de resultados acumulados; c) demonstração do resultado desde o último exercício social; d) relatório gerencial de fluxo de caixa e de sua projeção; III – a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente; IV – a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento; V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores; VI – a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor; VII – os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras; VIII – certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial; IX – a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados.10 Note-se que um dos documentos exigidos (inciso VI) é a relação dos bens particulares dos sócios ou acionistas controladores e administradores. O professor Paulo Penalva Santos, em palestra proferida na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, em 07 de março de 2005, criticou referido dispositivo, por estar o legislador presumindo uma fraude que não 9 O § 2o do art. 51 da Nova Lei de Falências autoriza as microempresas e as empresas de pequeno porte a apresentar livros e escrituração contábil simplificados, que poderão ser depositados em cartório. 10 Art. 51, I a IX da Lei 11.101/2005. 8 Recuperação de Empresas necessariamente existe. Ademais, tal exigência pode colocar em risco os bens particulares dos controladores e administradores. Outra exigência criticada pelo professor Paulo Penalva diz respeito à apresentação de extratos de contas bancárias e aplicações financeiras ou em bolsa, porentender desnecessárias neste primeiro momento. Estando a inicial devidamente instruída, e preenchidos todos os requisitos acima enumerados, o juízo competente determinará o processamento do pedido de recuperação judicial, encerrando, assim, a sua fase postulatória. 3.3 Credores sujeitos à recuperação judicial De acordo com o art. 49, caput da Nova Lei de Falências, em regra a recuperação judicial irá atingir “todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos”.11 Assim, os créditos constituídos após o pedido de recuperação não sofrerão os efeitos da recuperação judicial pois, caso contrário, “o devedor não conseguiria mais acesso a nenhum crédito comercial ou bancário, inviabilizando-se o objetivo da recuperação”.12 O professor Fábio Ulhoa Coelho considera o dia da distribuição do pedido como marco a ser considerado para determinar se um crédito se sujeita ou não à recuperação.13 Também não estará sujeito aos efeitos da recuperação judicial, de acordo com o § 3o do art. 49 da Nova Lei de Falências, o credor titular da posição de fiduciário, arrendador mercantil ou negociante de imóvel (vendedor, promitente vendedor ou titular de reserva de domínio), cujo contrato tenha cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade.14 No mesmo sentido, dispõe o § 4o do referido dispositivo legal, que afasta dos efeitos da recuperação os bancos credores por adiantamento a contrato de câmbio para exportação. Em relação aos credores sujeitos à recuperação judicial, é importante ressaltar que, conforme dispõe o § 1o do art. 49 da Nova Lei de Falências, seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso serão mantidos. Acrescente-se que as obrigações anteriores à recuperação conservarão “as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial”.15 3.4 Processamento da Recuperação Judicial Conforme acima mencionado, preenchidos os requisitos legais – legitimidade ativa e instrução da inicial nos termos da lei –, o juiz deferirá o processamento do pedido de recuperação judicial. Tal despacho de processamento, conforme ensina o professor Fábio Ulhoa, não se confunde com a decisão concessiva da recuperação judicial, já que se limita a acolher o pedido de tramitação do mesmo.16 11 Art. 49, caput da Lei 11.101/2005. 12 COELHO. Ob. cit. p. 132. 13 Idem. p. 131. 14 Idem. p. 131-132. 15 Art. 49, § 2o da Lei 11.101/2005. 16 COELHO. Ob. cit. p. 154-155. 9 Recuperação de Empresas O art. 52 da Nova Lei de Falências prevê o conteúdo do despacho de processamento. Dispõe o referido dispositivo legal que o juiz, no mesmo ato que deferir o processamento da recuperação judicial: I – nomeará o administrador judicial, observado o disposto no art. 21 desta Lei; II – determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, exceto para contratação com o Poder Público ou para o recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, observando o disposto no art. 69 desta Lei; III – ordenará a suspensão de todas as ações e execuções contra o devedor, na forma do art. 6o desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos parágrafos 1o, 2o e 7o do art. 6o desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos parágrafos 3o e 4o do art. 49 desta Lei; IV – determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores; V – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento17. Uma vez proferida a decisão, o juiz determinará a expedição de edital, na forma do § 1o do art. 52 da Nova Lei de Falências, contendo o resumo do pedido e da decisão, a relação nominal dos credores, a discriminação do valor atualizado e a classificação de cada crédito, além das advertências acerca dos prazos para habilitação dos créditos e para que os credores apresentem objeção ao plano de recuperação judicial. Note-se, ainda, que o devedor não pode desistir do pedido de recuperação judicial após o processamento deste, salvo se com a aquiescência da Assembleia Geral de Credores.18 3.4.1 Nomeação do Administrador Judicial O administrador judicial, de acordo com o art. 21 da Nova Lei de Falências, deve ser “pessoa idônea, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada”.19 Note-se que o administrador é originalmente nomeado pelo juiz, no despacho que defere o processamento da recuperação judicial. Contudo, é possível que ele seja substituído pela Assembleia dos Credores, caso em que o substituto será nomeado por este órgão colegiado.20 Se existir Comitê instaurado, caberá ao administrador judicial a verificação dos créditos, a presidência da Assembleia dos Credores e a fiscalização do devedor. Caso não tenha sido 17 Art. 52, I a V da Lei 11.101/2005. 18 Art. 52, § 4o da Lei 11.101/2005. 19 Art. 21, caput da Lei 11.101/2005. 20 COLEHO. Ob. cit. p. 63. 10 Recuperação de Empresas instaurado o Comitê, o administrador também exercerá a competência atribuída por lei a este órgão.21 Na hipótese de o juiz ter afastado os administradores do devedor, o administrador judicial irá assumir a administração da sociedade empresária e representá-la. 3.4.2 Dispensa da apresentação de certidões negativas O inciso II dispensa o devedor da apresentação de certidões negativas para o exercício de suas atividades. Tal dispositivo é importante, já que a inexistência desta previsão legal poderia inviabilizar o prosseguimento das atividades empresárias pelo devedor e, consequentemente, a sua recuperação. Contudo, referido inciso excepciona a contratação com o Poder Público e o recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, casos em que será imprescindível a apresentação das certidões devidas. 3.4.3 Suspensão das ações e execuções O despacho de processamento da recuperação judicial irá suspender as ações e execuções em curso contra o devedor requerente. Contudo, não serão suspensas as seguintes ações: a) ação que demandar quantia ilíquida; b) ações de natureza trabalhista; c) execuções fiscais em que não tenha sido concedido parcelamento, na forma do Código Tributário Nacional; e d) execuções movidas por credores não sujeitos aos efeitos da recuperação judicial. De acordo com o § 4o do art. 6o da Nova Lei de Falências, a suspensão é temporária, não podendo exceder o prazo improrrogável de 180 dias contados do despacho de processamento. Cessará a suspensão antes dos 180 dias previstos em lei, caso seja aprovado o plano de recuperação judicial pela Assembleia de Credores. 3.5 Plano de Recuperação Com o despacho de processamento, inicia-se, segundo o professor Fábio Ulhoa Coelho, a fase de deliberação, cujo objetivo é a votação do plano de recuperação do devedor.22 O plano de recuperação não precisa ser apresentado ao Juízo no momento do ajuizamento da inicial. O devedor, conforme dispõe o art. 53 da Nova Lei de Falências, terá o prazo improrrogável de sessenta dias, contados da publicação do despacho de processamento, para apresentar o plano em juízo. O plano deverá, por determinação do art. 53 da lei de falências, discriminar o meio de recuperação, dentre os do art. 50 da Nova Lei de Falências, bem como demonstrar a sua viabilidade e trazer laudo econômico e financeiro. Recebido o plano de recuperação do devedor, o juiz determinará a publicação de edital com aviso aos credores sobre o recebimento do plano e fixará prazo para que eventuais objeções.23 Havendo impugnação por parte de qualquer credor, o plano de recuperação21 Idem. p. 64. 22 COELHO. Ob. cit. p. 156. 23 Art. 53, parágrafo único da Lei 11.101/2005. 11 Recuperação de Empresas deverá ser aprovado pela Assembleia Geral de Credores, convocada pelo juiz, na forma do art. 56 da Nova Lei de Falências. 3.5.1 Meios de Recuperação Judicial O art. 50 da Nova Lei de Falências, em seus incisos, elenca meios pelos quais poderá ser realizada a recuperação judicial do devedor em crise econômico-financeira. Note-se que o rol trazido por tal dispositivo é meramente exemplificativo, sendo admitido qualquer meio lícito para a recuperação. 3.5.2 Cumprimento do Plano Primeiramente, cumpre-nos destacar que não há prazo fixado em lei para o cumprimento do plano de recuperação do devedor. Contudo, em relação aos credores trabalhistas, a lei determinou que estes sejam pagos em até um ano, “devendo ser quitados os saldos salariais em atraso em 30 dias”.24 Assim sendo, o devedor deverá pagar, em um ano e trinta dias, até cinco salários mínimos por empregado. É possível dividir, para fins didáticos, o cumprimento do plano em cinco fases. Inicialmente, o plano de recuperação é apresentado pelo devedor. Caso haja impugnação por algum dos credores, o plano deverá ser aprovado pela Assembleia Geral de Credores. Poderá a assembleia, com a anuência expressa do devedor, alterar o plano de recuperação25, o qual deverá ser aprovado na Assembleia Geral em três classes de credores: credores trabalhistas26 ou titulares de crédito decorrente de acidente de trabalho, credores com garantia real e credores quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados.27 É facultado ao Juízo competente conceder a recuperação judicial sem aprovação da Assembleia-geral de credores se, na mesma assembleia, forem obtidos cumulativamente: I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes; II – a aprovação de 2 classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 delas; III – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 dos credores, computados na forma dos parágrafos 1o e 2o do art. 45 desta Lei.28 24 Idem. p. 159. 25 Art. 56, § 3o da Lei 11.101/2005. 26 Note-se que o art. 37, § 5o da Nova Lei de Falências permite a representação dos credores trabalhistas pelo sindicato, o que, segundo o professor Paulo Penalva Santos, viabiliza a realização da assembleia geral em sociedades com muitos empregados, conforme manifestado na referida palestra proferida na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, em 07 de março de 2005. 27 Art. 41, I a III da Lei 11.101/2005. 28 Art. 58, I a III da Lei 11.101/2005. 12 Recuperação de Empresas Não sendo aprovado o plano pela Assembleia-geral, o juiz decretará a falência do devedor. Por outro lado, se os credores reunidos em assembleia aprovarem o plano de recuperação, este será apresentado em juízo. Depois de juntado o plano aprovado, devem ser apresentadas as certidões negativas tributárias, conforme determina o art. 57 da Nova Lei de Falências. O legislador suprimiu o parágrafo único do art. 57, o qual aplicava sanção para a não apresentação das certidões. O professor Paulo Penalva entende que tal supressão não impede que o juiz fixe prazo para a apresentação das certidões, sob pena de aplicação de sanção, inclusive a decretação da falência.29 Posteriormente, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor. Proferida tal decisão, o devedor permanecerá em recuperação até que se cumpram as obrigações previstas no plano, que se venceram após dois anos da concessão de recuperação (art. 61 da Nova Lei de Falências). Depois deste processo, será decretado o encerramento da recuperação (art. 63 da Nova Lei de Falências). Ressalte-se que se nesse prazo houver descumprimento de alguma condição fixada no plano de recuperação, será decretada a falência do devedor. Caso tal inadimplemento se dê após os dois anos acima mencionados, a falência não poderá ser decretada, podendo o credor executar o devedor ou requer sua falência. É importante observar ainda que o art. 96, VII da Nova Lei de Falências, autoriza a apresentação do plano de recuperação na contestação da falência. 3.6 Convolação da Recuperação em Falência A possibilidade de convolação da recuperação judicial em falência encontra previsão no art. 73 da Nova Lei de Falências. De acordo com o referido dispositivo legal, ocorrerá a convolação em quatro hipóteses: a) Deliberação da assembleia geral de credores, pelo voto favorável de credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia- geral (art. 73, I c/c art. 42 da Nova Lei de Falências). b) Não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo improrrogável de sessenta dias, contados do despacho de processamento (art. 73, II c/c art. 53, caput da Nova Lei de Falências). c) Rejeição do plano de recuperação pela assembleia-geral de credores (art. 73, III c/c art. 56, § 4o da Nova Lei de Falências). d) Descumprimento de obrigações assumidas no plano, durante o período de recuperação, que poderá chegar a dois anos a partir da sua concessão. Para o professor Fábio Ulhoa Coelho, existe, em toda recuperação judicial, uma “cláusula resolutiva tácita”30 para as hipóteses de inadimplemento de obrigações. Por fim, cumpre destacar que o parágrafo único do art. 73 da Nova Lei de Falências acrescenta que será possível a decretação da falência “por inadimplemento de obrigação não sujeita à recuperação judicial, nos termos dos incisos I ou II do caput do art. 94 desta Lei, ou por prática de ato previsto no art. 94, III”.31 29 Em palestra proferida na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, em 07 de março de 2005. 30 COELHO. Ob. cit. p. 190. 31 Art. 94, parágrafo único da Lei 11.101/2005 13 Recuperação de Empresas 4. DELIBERAÇÃO PELOS CREDORES. APROVAÇÃO OU REJEIÇÃO. CUMPRIMENTO DO PLANO. 4.1 Plano de Recuperação – Noções Gerais Primeiramente, cumpre-nos destacar, de modo sucintamente descrito, que o processo de recuperação judicial será instaurado por iniciativa do devedor em crise econômico- financeira, devendo a peça exordial vir instruída com os documentos previstos no art. 51 da Lei nº 11.101/2005 (“Nova Lei de Falências”). Preenchidos os requisitos exigidos – quais sejam, legitimidade ativa e instrução da inicial nos termos da lei –, o juiz deferirá o processamento do pedido de recuperação judicial. Com o despacho de processamento, o devedor terá 60 (sessenta) dias para apresentar o Plano de Recuperação Judicial, após a qual se inicia a fase de deliberação, cujo objetivo é a votação do plano de recuperação do devedor.32 Note-se que, a partir do deferimento do processamento, o devedor somente poderá desistir do pedido de recuperação mediante aprovação da Assembleia Geral de Credores. O plano de recuperação deverá atingir todos os credores do devedor, discriminando, conforme determina o art. 53 da Nova Lei de Falências, a forma de recuperação. Acrescente-se que deverá restar demonstrada a viabilidade da recuperação, mediante a apresentação de laudo econômico e financeiro. Após o recebimento do plano, será publicado edital com aviso aos credores, visando a permiti-lhes eventuais objeções.33 Na hipótese de algum credor manifestar objeção, o plano de recuperação deverá ser submetido à Assembleia Geral de Credores, a ser convocada pelo juiz, para aprovação, conforme dispõe o art. 56 da Nova Lei de Falências. Será objeto do presente trabalho a deliberação dos credores sobre o Plano de Recuperação, bem como o seu cumprimento. 4.2 Deliberação pelos Credores De acordo com o art. 55 da Nova Lei de Falências, “qualquer credor poderá manifestar ao juiz sua objeção ao plano de recuperação judicial noprazo de 30 (trinta) dias contado da publicação da relação de credores de que trata o parágrafo 2o do art. 7o desta Lei.”34 Nesse sentido, acrescenta o parágrafo único do art. 53 que, apresentado o plano pelo devedor, o juiz irá ordenar a publicação de edital contendo aviso aos credores, fixando- lhes prazo para a manifestação de eventuais objeções, as quais poderão ser realizadas por qualquer credor. Note-se que o prazo para as objeções – de 30 dias – começa a correr da data da publicação da relação de credores, elaborada pelo administrador judicial para a verificação dos créditos. No entanto, caso na data da publicação da referida publicação ainda não tenha 32 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 156. 33 Art. 53, parágrafo único da Lei 11.101/2005. 34 Art. 55, caput da Lei 11.101/2005. 14 Recuperação de Empresas sido publicado aviso de recebimento do plano de recuperação, o prazo começará a correr a partir desta segunda publicação, conforme determina o art. 55, caput e parágrafo único. Ressalte-se, entretanto, que segundo o professor Fábio Ulhoa Coelho, essa última hipótese é impossível, já que “sem a apresentação da relação de credores, o juiz não pode determinar o processamento da recuperação judicial”.35 Na hipótese de o plano apresentado sofrer objeção, o juiz irá convocar a Assembleia Geral de credores, que deverá se realizar até 150 dias após o deferimento do processamento da recuperação judicial, a fim de que esta delibere sobre o plano. Neste sentido, dispõe o § 1o do art. 56 que “a data designada para a realização da assembleia geral não excederá 150 dias contados do deferimento do processamento da recuperação judicial”. Assim sendo, a competência para apreciar o conteúdo da objeção não é do juiz da causa, mas sim da Assembleia Geral de Credores.36 Convocada a Assembleia Geral, existem três possíveis alternativas: a) a assembleia rejeita o plano; b) a assembleia altera o plano; ou c) a assembleia aprova o plano. Para que haja aprovação total do plano de recuperação, este deverá ser aprovado na Assembleia Geral em três classes de credores: credores trabalhistas37 ou titulares de crédito decorrente de acidente de trabalho, credores com garantia real e credores quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados.38 De acordo com o art. 41 da Nova Lei de Falências, tais são as classes de credores que compõem a assembleia geral, conforme segue: Art. 41. A assembleia-geral será composta pelas seguintes classes de credores: I – titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho; II – titulares de crédito com garantia real; III – titulares de créditos quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados. § 1o Os titulares de créditos derivados da legislação do trabalho votam com a classe prevista no inciso I do caput deste artigo com o total de seu crédito, independentemente do valor. § 2o Os titulares de créditos com garantia real votam com a classe prevista no inciso II do caput deste artigo até o limite do valor do bem gravado e com a classe prevista no inciso III do caput deste artigo pelo restante do valor de seu crédito. 35 COELHO. Ob. cit. p. 165. 36 Idem. Ob. cit. p. 166. 37 Note-se que o art. 37, § 5o da Nova Lei de Falências permite a representação dos credores trabalhistas pelo sindicato, o que, segundo o professor Paulo Penalva Santos, viabiliza a realização da assembleia geral em sociedades com muitos empregados. 38 Art. 41, I a III da Lei 11.101/2005. 15 Recuperação de Empresas O quorum de deliberação do plano de recuperação é qualificado, devendo, conforme acima mencionado, ser aprovado nas três classes de credores que compõem a assembleia, conforme dispõe o art. 45 da Nova Lei de Falências: Art. 45. Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta. § 1o Em cada uma das classes referidas nos incisos II39 e III40 do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes. § 2o Na classe prevista no inciso I41 do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito. Note-se que o credor cujo direito não for atingido pelo plano de recuperação “não terá direito a voto e não será considerado para fins de verificação de quorum de deliberação”.42 Ao mesmo tempo, é importante destacar que “se o plano prevê a alienação de bens onerados (hipotecados ou empenhados), a supressão ou substituição da garantia real depende da expressa aprovação do credor que a titulariza”.43 Aprovando o plano, a Assembleia Geral poderá indicar membros do Comitê de Credores, o qual terá as atribuições previstas no art. 27 da Nova Lei de Falências: Art. 27. O Comitê de Credores terá as seguintes atribuições, além de outras previstas nesta Lei: I – na recuperação judicial e na falência: a) fiscalizar as atividades e examinar as contas do administrador judicial; b) zelar pelo bom andamento do processo e pelo cumprimento da lei; c) comunicar ao juiz, caso detecte violação dos direitos ou prejuízo aos interesses dos credores; d) apurar e emitir parecer sobre quaisquer reclamações dos interessados; e) requerer ao juiz a convocação da assembleia-geral de credores; f) manifestar-se nas hipóteses previstas nesta Lei; II – na recuperação judicial: a) fiscalizar a administração das atividades do devedor, apresentando, a cada 30 (trinta) dias, relatório de sua situação; b) fiscalizar a execução do plano de recuperação judicial; c) submeter à autorização do juiz, quando ocorrer o afastamento do devedor nas hipóteses previstas nesta Lei, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e outras garantias, 39 Titulares de crédito com garantia real. 40 Titulares de créditos quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados. 41 Titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho. 42 Art. 45, § 3o da Lei 11.101/2005. 43 COELHO. Ob. cit. p. 159. 16 Recuperação de Empresas bem como atos de endividamento necessários à continuação da atividade empresarial durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial. A Assembleia Geral poderá alterar o conteúdo do plano. Contudo, para tanto é necessária –conforme previsão do § 3o do art. 56 da Nova Lei de Falências – a aquiescência do devedor. Ressalte-se que não será permitida a realização de alterações que importem na redução dos direitos exclusivamente dos credores ausentes.44 Neste sentido, dispõe o art. 56, § 4o: “o plano de recuperação judicial poderá sofrer alterações na assembleia geral, desde que haja expressa concordância do devedor e em termos que não impliquem diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes.” Por fim, é possível que o plano de recuperação seja rejeitado pela Assembleia Geral. Nesta hipótese, conforme determina o art. 56, § 4o da Nova Lei de Falências, o juiz decretará a falência do devedor. 4.3 Cumprimento do Plano A primeira fase do cumprimento do plano corresponde ao requerimento da recuperação e apresentação do plano pelo devedor em crise econômico-financeiro. De acordo com o art. 66 da Lei de Falências e Recuperação Judicial e Extrajudicial, “após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo permanente, salvo evidente utilidade reconhecida pelo juiz, depois de ouvido o Comitê, com exceção daqueles previamente relacionados no plano de recuperação judicial”.45O juiz, quando do deferimento do processamento, irá nomear administrador, ordenar a suspensão das ações e execuções movidas contra o devedor. Apresentado o Plano de Recuperação, o que, conforme já mencionado, deve ser feito nos 60 dias que seguirem o processamento, sob pena de decretação da falência do devedor, será determinada a publicação de editais com aviso aos credores. Assim, apresentado o plano, a próxima fase será a realização da Assembleia Geral de Credores. Note-se, no entanto, que a realização da assembleia não é obrigatória, determinando o art. 56 da nova lei que esta se realize na hipótese de haver objeção pelos credores ao plano. Tal objeção deve ser manifestada, por qualquer dos credores, no prazo de 30 dias, contados da data da publicação do edital contendo aviso aos credores. Note- se que a Assembleia Geral de Credores deverá ser realizada em 150 dias, contados da data do processamento. A assembleia geral de credores poderá, de acordo com o art. 35, I da Nova Lei de Falências, aprovar, modificar ou rejeitar o plano de recuperação. Note-se que, para a modificação, é necessária a aprovação do devedor, de acordo com o art. 56, § 3° da lei. 44 Art. 56, § 3o da Lei 11.101/2005. 45 Art. 66 da Lei 11,101/2005. 17 Recuperação de Empresas Na hipótese de rejeição do plano, será decretada a falência do devedor. Contudo, é importante observar que a deliberação a respeito do plano segue quoruns diferenciados, conforme acima mencionado. Caso o plano seja aprovado ou modificado com a anuência do devedor, este será apresentado em juízo. Ao mesmo tempo, de acordo com o art. 57 da Nova Lei de Falências, após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembleia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional. Assim, as certidões negativas tributárias do devedor empresário devem ser apresentadas em Juízo, de modo a permitir a concessão da recuperação judicial. Note-se que a Nova Lei de Falências e o Código Tributário Nacional, alterado pela Lei Complementar nº 118/2005, condicionam a recuperação à quitação de todos os tributos.46 É importante mencionar ainda que o art. 57 da Nova Lei de Falências, em sua redação original, trazia, em seu parágrafo único, sanção para o devedor que não apresentasse as certidões a que o mesmo se refere. Com a supressão de tal norma, o professor Paulo Penalva sustenta que o Juiz, ainda assim, poderá fixar prazo para a apresentação das certidões e, caso não o faça, poderá determinar a aplicação de sanções, dentre elas a decretação da falência.47 Apresentado o plano de recuperação aprovado pelos credores e exibidas as certidões negativas de débito tributário, será concedida a recuperação judicial do devedor em crise econômico-financeira. Observe-se que a aprovação do plano de recuperação pela Assembleia Geral de Credores poderá ser suprida pelo juiz competente e, consequentemente, concedida a Recuperação Judicial, caso se obtenha: a) voto favorável dos credores representantes de mais da metade do valor dos créditos, independentemente de classe, presentes na assembleia de credores; b) a aprovação de duas classes de credores, conforme dispõe o art. 45 da lei ou, na hipótese de haver apenas duas classes de credores votantes, a aprovação de apenas uma delas; e c) o voto favorável de mais de um terço dos credores, na classe que houver rejeitado o plano. 48 Concedida a Recuperação Judicial, o devedor nela permanecerá até o cumprimento integral das obrigações previstas no plano de recuperação aprovado pelos credores e apresentado em Juízo. Observe-se que não há previsão legal sobre o prazo de duração da recuperação do devedor, devendo esta, portanto, se estender pelo prazo previsto no plano. No entanto, no momento da elaboração do plano, somente poderão ser contemplados credores cujos créditos se vençam até dois anos após a concessão da recuperação, conforme dispõe o art. 61 da Nova Lei de Falências. É importante observar ainda que enquanto perdurar a recuperação judicial, caso haja descumprimento pelo devedor de alguma obrigação imposta no plano de recuperação, 46 Art. 191 – A do Código Tributário Nacional. 47 Em palestra proferida na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. 48 Art. 58, I a III da Lei 11.101/2005. 18 Recuperação de Empresas deverá ser decretada a sua falência, já que de acordo com o professor Fábio Ulhoa Coelho, o plano de recuperação é imutável.49 Contudo, ressalte-se que “a decisão concessiva da recuperação judicial é título executivo judicial”50, ou seja, poderá, ao invés de ser decretada de plano a falência do devedor, ser instaurada ação de execução contra o devedor em recuperação, para que se o obrigue ao cumprimento do plano. Note-se, todavia, que caso o devedor não atenda a créditos não abrangidos pela recuperação – ou seja, créditos cujo vencimento se dá fora dos dois anos acima mencionados –, poderá ser requerida a sua falência. Dessa forma, conforme acima exposto, é possível que o plano preveja a recuperação, por exemplo, em quatro anos. No entanto, somente abrangerá créditos vencidos em dois anos, nos termos do art. 61 da nova lei. Assim, se, no terceiro ano, o devedor deixa de atender a um crédito vencido naquele ano, tal credor poderá requerer a falência do devedor, ainda que este esteja em recuperação. Observe-se também que, não obstante a lei não ter fixado prazo para o cumprimento do plano em relação aos credores trabalhistas, determinou-se o pagamento destes em até um ano, de modo que sejam “quitados os saldos salariais em atraso em 30 dias”.51 Quanto ao prazo para pagamento dos credores trabalhistas, o professor Paulo Penalva Santos, em palestra proferia na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, defendeu a possibilidade de sua dilação, caso haja concordância de sindicatos e empregados. Encerrado o prazo da recuperação judicial e cumpridas todas as obrigações fixadas no plano, o juiz decretará, conforme determina o art. 63 da Nova Lei de Falências, o encerramento da recuperação. Em relação ao cumprimento do plano, deve-se mencionar que na hipótese de o plano de recuperação aprovado “envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142”52 da Nova Lei de Falências, ou seja, a venda deverá ser realizada em hasta pública. O professor Fábio Ulhoa Coelho ressalta que o plano de recuperação pode estabelecer um preço mínimo para a hasta.53 Finalmente, acrescente-se que, de acordo com o disposto no art. 96, VII da Nova Lei de Falências, é possível que o pedido de recuperação judicial seja formulado como defesa a um requerimento de falência e, neste caso, o deferimento de processamento da recuperação irá suspender a falência requerida. 4.3.1 Substituição dos administradores do devedor durante o cumprimento do plano de recuperação Em regra, os administradores da sociedade em processo de recuperação judicial permanecem no exercício de suas funções. No entanto, tal regra não é absoluta, cabendo exceção nas hipóteses em que o administrador: I – houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores 49 COELHO. Ob. cit. p. 173. 50 Idem. p. 171. 51 Idem. p. 159. 52 Art. 60 da Lei 11.101/2005. 53 COELHO. Ob. cit. 171. 19 Recuperação de Empresas ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente; II – houver indícios veementes de ter cometido crime previsto nesta Lei; III – houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores; IV – houver praticado qualquer das seguintes condutas: a) efetuar gastospessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial; b) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas; c) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular; d) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação de que trata o inciso III do caput do art. 51 desta Lei, sem relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial; V – negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê; VI – tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial. Estando presente alguma das hipóteses acima, o administrador deverá ser afastado pelo juízo, “que convocará a assembleia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial”.54 4.4 Encerramento da Recuperação Judicial pelo Cumprimento do Plano Cumpridas as obrigações consubstanciadas no plano de recuperação judicial no prazo de dois anos, o juiz proferirá sentença de encerramento da recuperação judicial e determinará: I – o pagamento do saldo de honorários ao administrador judicial, somente podendo efetuar a quitação dessas obrigações mediante prestação de contas, no prazo de 30 (trinta) dias, e aprovação do relatório previsto no inciso III do caput deste artigo; II – a apuração do saldo das custas judiciais a serem recolhidas; III – a apresentação de relatório circunstanciado do administrador judicial, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, versando sobre a execução do plano de recuperação pelo devedor; IV – a dissolução do Comitê de Credores e a exoneração do administrador judicial; V – a comunicação ao Registro Público de Empresas para as providências cabíveis. 54 Art. 65, caput da Lei 11.101/2005. 20 Recuperação de Empresas 5. RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL 5.1 Introdução Na recuperação extrajudicial, o devedor em crise econômico-financeira reúne-se com algum(s) de seu(s) credor(es) ou com todos eles e celebra acordo, que será homologado em juízo. De acordo com o professor Paulo Penalva Santos, em palestra proferida na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, realizada em 07 de março de 2005, existem dois tipos de acordo que podem ser objeto de homologação: a) plano de recuperação que abrange apenas os credores que a ele aderiram; e b) plano de recuperação que abrange todos os credores, desde que aceito por 3/5 de cada classe de credores.55 O art. 167 da Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 (“Nova Lei de Falências”) indica que será possível qualquer espécie de acordo entre credor e devedor, ao prever que o disposto no capítulo atinente à Recuperação Extrajudicial não implicará a “impossibilidade de realização de outras modalidades de acordo privado entre devedor e seus credores”.56 Para o devedor que opta pela recuperação judicial, a lei também não conferiu, segundo o professor Paulo Penalva Santos, qualquer vantagem prática. A recuperação extrajudicial evitaria que os credores do devedor requeressem sua falência, pois, na vigência do Decreto-Lei nº 7.661/45, o simples fato de renegociar com seus credores configurava causa para o requerimento da falência do devedor. No entanto, a negociação com credores não é mais considerada ato de falência. 5.2 Requisitos subjetivos para Homologação da Recuperação Extrajudicial O art. 161 da Nova Lei de Falências remete o intérprete para ao art. 48 deste diploma, indicando, com isso, requisitos que devem ser preenchidos pelo devedor que pretende “propor e negociar com credores plano de recuperação extrajudicial”.57 O professor Fábio Ulhoa Coelho afirma que os requisitos subjetivos exigidos pelo art. 161 somente serão necessários para a homologação do plano em juízo, ou seja, qualquer devedor pode “simplesmente procurar seus credores e tentar encontrar, em conjunto com eles, uma saída negociada para a crise”58 mas, se precisar requerer homologação da recuperação extrajudicial, deverá preencher os seguintes requisitos: I – não ser falido, e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial; 55 Sobre Classes de Credores, ver apostila XIV. 56 Art.167, in fine da Lei 11.101/2005. 57 Art. 161, caput, in fine da Lei 11/101/2005. 58 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 394.. 21 Recuperação de Empresas III – não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V desde Capítulo; IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.59 60 Acrescente-se, ainda, como requisito subjetivo, o fato de o devedor não poder ter pendente pedido de recuperação judicial, ou ter obtido “recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos”.61 5.3 Requisitos Objetivos para Homologação da Recuperação Extrajudicial Os requisitos objetivos necessários à homologação do plano de recuperação extrajudicial referem-se ao conteúdo do plano e se encontram dispersos no capítulo da Nova Lei de Falências referente à Recuperação Extrajudicial. Os dois primeiros requisitos objetivos têm previsão no § 2o do art. 161 da Nova Lei de Falências. De acordo com o referido dispositivo legal, “o plano não poderá contemplar o pagamento antecipado de dívidas nem tratamento desfavorável aos credores que a ele não estejam sujeitos”. O plano de recuperação somente poderá abranger credores de créditos já constituídos à data do pedido de homologação, de acordo com o disposto no art. 163, § 1o, in fine da Nova Lei de Falências. Outro requisito objetivo diz respeito aos credores com garantia real. Conforme dispõe o art. 163, § 4o, o plano de recuperação somente pode prever a alienação de bem objeto de garantia real, a supressão de garantia ou a sua substituição, se houver aquiescência expressa do credor garantido. Por fim, o último requisito trata das hipóteses que em o plano abrange créditos em moeda estrangeira. Prevê o art. 163, § 5o da Nova Lei de Falências que o credor de crédito em moeda estrangeira deve aprovar plano que afaste a variação cambial. 5.4 Desistência de Adesão ao Plano de Recuperação Extrajudicial De acordo com o art. 161, § 5o da Nova Lei de Falências, “após a distribuição do pedido de homologação, os credores não poderão desistir da adesão ao plano, salvo com a anuência expressa dos demais signatários”.62 De acordo com o professor Fábio Ulhoa Coelho, “a anuência do devedor e de todos os credores é condição para existência, validade e eficácia do arrependimento porque o plano de recuperação deve sempre ser considerado em sua integralidade”63. Acrescenta, ainda, que não se pode fazer uma interpretação a contratio sensu do art. 161, § 5o da Nova Lei 59 Art. 48, I a IV da Lei 11.101/05. 60 Os requisitos subjetivos são os mesmos exigidos para a recuperação judicial, portanto, vide apostila XIII. 61 Art. 161, § 3o da Lei 11.101/05. 62 Art. 161, par. 5o da Lei 11.101/05. 63 COELHO. Ob. cit. p. 395. 22 Recuperação de Empresas de Falências, de modo a sustentar que até a distribuição da homologação do plano qualquer credor pode desistir, unilateralmente, de sua adesão.64 5.5 Credores Excluídos da Recuperação Extrajudicial Existem credores que, por determinação legal, não podem participar do plano de recuperação extrajudicial, ou seja, não terão seus créditos atingidos pela recuperação.De acordo com o § 1o do art. 161 da Nova Lei de Falências, não serão atingidos pela recuperação extrajudicial os “titulares de créditos de natureza tributária, derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho, assim como aqueles previstos nos art. 49, § 3o, e 86, inciso II do caput, desta Lei”. A razão de o credor tributário estar excluído do regime de recuperação encontra-se no fato de ser tal categoria de crédito disciplinada por normas de direito público, somente podendo ser concedida remissão, conforme bem salienta o professor Fábio Ulhoa, mediante lei65. Ao contrário dos titulares de crédito tributário, os credores identificados no art. 49, § 3o da Nova Lei de Falência, segundo o professor Fábio Ulhoa Coelho, não estão impossibilitados de renegociar seus créditos. Entretanto, não será possível, em hipótese alguma, que a homologação de recuperação extrajudicial atinja seus créditos. Incluem-se, no rol do artigo 49, § 3o da lei de falências, o proprietário fiduciário, o arrendador mercantil, o vendedor ou promitente vendedor de imóvel por contrato irrevogável e o vendedor titular de reserva de domínio. Por fim, de acordo com o art. 86, II da Nova Lei de Falências, também não se sujeitarão aos efeitos da recuperação extrajudicial a instituição financeira credora por adiantamento ao exportador. 5.6 Homologação do Plano de Recuperação Extrajudicial A homologação do plano de recuperação extrajudicial poderá ser facultativa ou obrigatória. De acordo com as lições do professor Fábio Ulhoa Coelho, será facultativa a homologação quando todos os credores do devedor aderirem ao plano. Ou seja, o plano será implementado ainda que não haja homologação judicial.66 Não obstante dispensável para a produção de efeitos do plano de recuperação extrajudicial, a Nova Lei de Falências, em seu art. 162 prevê a possibilidade de homologação. Para o professor Fábio Ulhoa, duas são as razões que podem levar o devedor a requerer a homologação do plano: “revestir o ato de maior solenidade e possibilitar a alienação por hasta judicial de filiais ou unidades produtivas isoladas, quando prevista a medida”.67 Esta segunda razão se refere ao art. 166 da Nova Lei de Falências, segundo o qual quando o plano de recuperação extrajudicial previr alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas, a venda se dará por hasta e, para tanto, é necessário que haja homologação judicial do plano. Para requerer a homologação do plano de recuperação, quando esta for facultativa, o devedor deverá apresentar ao Juízo competente justificativa para a recuperação, e documento que contenha os termos e condições do plano. 64 Idem. p. 395. 65 Idem. p. 396. 66 Idem. p. 397. 67 Idem. p. 398. 23 Recuperação de Empresas A hipótese de homologação obrigatória está prevista no art. 163 da Nova Lei de Falências. A homologação será obrigatória quando o devedor não conseguir a adesão da totalidade de seus credores ao plano de recuperação extrajudicial. Contudo, para que haja a homologação, é necessário que 3/5 dos titulares de créditos de cada classe68 tenham assinado o plano. Conforme salienta o professor Fábio Ulhoa Coelho, “com a homologação judicial do plano de recuperação extrajudicial, estendem-se os efeitos do plano aos minoritários nele referidos, suprindo-se desse modo a necessidade de sua adesão voluntária”.69 Para o requerimento da homologação do plano de recuperação extrajudicial, quando esta for obrigatória, o devedor deverá instruir a inicial com os seguintes documentos: a) plano de recuperação; b) justificativa para a recuperação; c) exposição da situação patrimonial do devedor; d) demonstrações contábeis relativas ao último exercício social; e) demonstrações contábeis levantadas especialmente para instruir o pedido; f) documentos que comprovem os poderes dos subscritores para novar ou transigir, relação nominal completa dos credores, com indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente.70 5.7 Processamento do Pedido de Homologação O pedido de homologação, seja ele facultativo ou obrigatório, será processado de acordo com o disposto no art. 164 da Nova Lei de Falências. A inicial, instruída com os documentos acima mencionados, será recebida pelo juízo competente. Recebido o pedido, o juiz determinará a “publicação de edital no órgão oficial e em jornal de grande circulação nacional ou das localidades da sede e das filiais do devedor, convocando todos os credores do devedor para apresentação de suas impugnações ao plano de recuperação extrajudicial”.71 Para os credores domiciliados ou sediados no estrangeiro, o devedor deverá enviar cartas, no prazo do edital, informando a distribuição do pedido de homologação, as condições do plano e prazo para impugnação. O prazo para impugnação do plano pelos credores será, de acordo com o art. 164, § 2o da Nova Lei de Falências, de 30 (trinta) dias. A impugnação dos credores somente poderá versar sobre as matérias elencadas nos incisos do § 3o do art. 164 da Nova Lei de Falências: “I – não preenchimento do percentual mínimo previsto no caput do art. 163 desta Lei72; II – prática de qualquer dos atos previstos no inciso III do art. 94 ou do art. 130 desta Lei, ou descumprimento de requisito previsto nesta Lei; III – descumprimento de qualquer outra exigência legal.” 68 São classes de credores, a serem considerados na recuperação extrajudicial: a) credores com garantia real; b) credores com privilégio especial; c) créditos com privilégio geral; d) crédito quirografário; e e) crédito subordinado. 69 Idem. p. 400. 70 Art. 163, § 6o da Lei 11.101/2005. 71 Art. 164, caput da Lei 11.101/2005. 72 Refere-se ao percentual de 60% (3/5) dos credores de cada classe, que devem ter aderido ao plano. 24 Recuperação de Empresas Apresentada a impugnação, a Nova Lei de Falências determina que seja aberto prazo de cinco dias para que o devedor se manifeste sobre ela.73 Após, o juiz decidirá, no prazo de cinco dias, sobre o plano de recuperação extrajudicial, deferindo ou indeferindo a homologação do mesmo. Da sentença, em qualquer hipótese, caberá apelação sem efeito suspensivo (art. 164, § 8o da Nova Lei de Falências). O pedido de homologação será deferido caso o juiz verifique que o cumprimento do plano não implica a prática de atos previstos no art. 130 da lei de falências, ou seja, atos com intenção de prejudicar credores, e que não há outras irregularidades que impeçam a homologação. Caso o pedido seja indeferido, o professor Fábio Ulhoa Coelho salienta que não há impedimento para nova apresentação do pedido, desde que afastado o motivo que levou à denegação do pedido.74 5.8 Efeitos da Homologação De acordo com o art. 165 da Nova Lei de Falências, “o plano de recuperação extrajudicial produz efeitos após sua homologação judicial”.75 Contudo, é possível que o plano disponha de forma diversa, estabelecendo a produção de efeitos imediatos “em relação à modificação do valor ou da forma de pagamento dos credores signatários”.76 Nesta hipótese, caso o juízo a que for submetido o plano para homologação o rejeite, os credores poderão exigir seus créditos nas condições originais, deduzindo-se os valores já pagos. 73 Art. 164, § 4o da Lei 11.101/2005. 74 COELHO. Ob. cit. p. 404. 75 Art. 165, caput da Lei 11.101/2005. 76 Art. 165, § 1o da Lei 11.101/2005. 25 Recuperação de Empresas 6. FALÊNCIAS 6.1 Introdução: A reforma da legislação concursal e suas justificativas O risco é inerente a qualquer atividade econômica. No desenvolver de sua atividade, empresários e sociedades empresárias, inevitavelmente, passarão por períodos de crise, as quais, de acordo com Fábio Ulhoa Coelho, podemser de três tipos: crise econômica, financeira e patrimonial77. A crise econômica seria caracterizada por uma retração nos negócios do empresário. A crise financeira, por seu turno, seria uma crise de liquidez: ocorreria quando falta ao empresário montante em caixa necessário para honrar suas obrigações imediatas. Por fim, a crise é patrimonial quando o ativo do empresário é inferior ao seu passivo total, caracterizando o estado de insolvência. Crises podem ser passageiras, mas também podem inviabilizar o prosseguimento das atividades empresárias. Sob certa ótica, por análise essencialmente econômica, a quebra de um empresário ou sociedade empresária que não possui condições de prosseguir com seus negócios é considerada positiva, eis que permite que os recursos escassos da empresa sejam alocados do modo mais eficiente possível, priorizando-se os credores que gozem de privilégios no recebimento dos valores que lhe são devidos. Ademais, não se pode fechar os olhos para o fato de existir grande responsabilidade social de quem desempenha uma atividade empresarial, de modo que, em última instância, será quem absorverá a força de trabalho, efetuará o recolhimento de tributos e fará circular riquezas. Desse modo, o empresário pode ser considerado, sob certos aspectos, um destacado responsável pelo desenvolvimento econômico da nação. Desta feita, quando as atividades do empresário ou da sociedade empresária78 não obtêm sucesso, a impossibilidade de sua manutenção no mercado pode acarretar graves problemas sociais. Assim, o encerramento das atividades empresariais é um fato bastante relevante não só em termos individuais e privados, mas também para a comunidade na qual se insere o exercício daquela atividade. Implica, dentre outros malefícios, o fechamento de postos de trabalho e a perda de arrecadação por parte do Estado que, em consequência, passa a dispor de menos recursos para aplicar em suas atividades. Cientes de tais fatos, os modernos ordenamentos jurídicos buscam criar regras que possibilitem a recuperação de empresas que, embora em crise, ainda sejam economicamente viáveis e socialmente relevantes. Verifica-se, assim, que a recuperação da empresa não é um valor que deva ser defendido independentemente do custo desta decisão, de modo que se o devedor não possuir mecanismos suficientes ou possibilidades vislumbradas de recursos para se reerguer, deve encerrar suas atividades. O sistema concursal brasileiro foi, durante mais de meio século, regido pelo Decreto-lei 7.661/45, alcunhada “Lei de Falências”, a qual só veio a ser efetivamente revogada pela lei 11.101/2005 – a nova Lei de Falências. A longevidade do referido diploma não significa 77 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, vol. 3. São Paulo: Editora Saraiva, 2002, pp. 215 e ss. 78 Doravante, irá ser utilizada a expressão devedor para se referir tanto ao empresário individual quanto à sociedade empresária. 26 Recuperação de Empresas que o mesmo tenha tido uma existência tranquila. Ao contrário, há muito se advoga que o referido diploma dificultava excessivamente a recuperação das empresas viáveis, havendo portanto a necessidade de edição de normas mais eficientes. Nesse sentido, a edição da nova lei de falências – Lei nº 11.101/2005 – representou uma tentativa do legislador atual de possibilitar a recuperação da empresa viável. O encerramento das atividades empresariais não é, contudo, um processo simples. O processo ordinário de execução afigura-se como injusto nas hipóteses em que o empresário não possui bens suficientes para pagar todas as suas dívidas. Nesses casos, apresenta-se como medida de justiça a instauração de um único processo para a liquidação da atividade, sendo certo que não se trata de uma execução coletiva, pois, ao contrário do processo de execução, na falência, mesmo que não sejam satisfeitos os créditos, a extinção do processo será engendrada. A falência é justamente o procedimento utilizado para os casos de empresários e sociedades empresárias que não possuem modo de se recuperar. O processo falimentar é, assim, uma execução concursal que visa a liquidação do patrimônio do devedor. Em termos bastante simplificados, trata-se do procedimento que regula o modo pelo qual os credores concorrerão na partilha dos bens do devedor a fim de verem satisfeitos seus créditos, ressaltando-se que, na maioria das vezes, tal desiderato não será alcançado. A toda evidência, a instauração da falência pressupõe que os devedores encontram-se incapacitados de prosseguir com suas atividades. Por tal motivo, só podem ser requeridas as falências de quem se apresentar presumidamente insolvente, isto é, incapaz de honrar as obrigações assumidas ou praticando atos que evidenciem sua dificuldade ou que sejam capazes de dilapidar o patrimônio que suportará a execução a ponto de prejudicar os interesses dos credores. O requerimento de falência é o processo por meio do qual os credores e outros legitimados pretendem a falência do devedor empresário. O requerimento de falência constitui um processo de conhecimento constitutivo, que segue um procedimento especial, previsto pela Lei 11.101/2005. O processo tem natureza constitutiva, porque a falência é declarada a partir da criação, modificação e extinção de diversas situações jurídicas. 6.2 Sujeitos da Falência Antes de se passar à análise dos atos caracterizadores da insolvência, importa verificar quais pessoas encontram-se sujeitas à legislação falimentar – em outras palavras, o requisito subjetivo da falência. De acordo com o art. 1º da nova Lei de Falências, são sujeitos aos seus efeitos o empresário e a sociedade empresária. Em seu art. 2º, a lei ressalva não se aplicar às empresas públicas, às sociedades de economia mista, às instituições financeiras públicas ou privadas, às cooperativas de crédito, aos consórcios, às entidades de previdência complementar, às sociedades operadoras de plano de assistência à saúde, às sociedades seguradoras, às sociedades de capitalização e quaisquer outras entidades legalmente equiparadas às anteriores. Note-se, todavia, que o art. 197 da Lei de Falências ressalva a regra em tela, prevendo que ainda deverão ser editadas normas específicas para as falências dessas sociedades. Até o advento dessas novas leis, a Lei nº 11.101/2005 deverá ser subsidiariamente aplicada a esses procedimentos de quebra. 27 Recuperação de Empresas 6.3 A definição de empresa e de empresário Na vigência da lei revogada, até o advento do Código Civil de 2002, a legislação falimentar destinava-se aos comerciantes. A superação do conceito de “comerciante” em favor do de “empresário” na letra da lei falimentar veio em boa hora, visto que, desde a edição do novo Código Civil – Lei nº 10.406/ 2002, que a teoria dos atos de comércio havia sido substituída pela teoria da empresa. As definições de empresário e de sociedade empresária encontram-se, respectivamente, nos arts. 966 e 982 do Código Civil, in verbis: Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. (grifos nossos) Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objetivo a atividade própria de empresário sujeito a registro; e simples, as demais. Parágrafo Único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir em elemento de empresa. A teoria da empresa tem sua origem no direito italiano, tendo sido inicialmente formulada por Alberto Asquini em seu clássico estudo “Perfis da Empresa”79. Em termos resumidos, pode-se entender que a atividade é empresária quando a atividade é (1) econômica, isto é, voltada para a criação de riquezas, bens ou serviços, (2) organizada, ou seja, envolve acoordenação e organização dos fatores de produção, trabalho, natureza e capital, e (3) profissional – exercida com habitualidade, de forma sistemática e com ânimo de lucro. 6.4 As sociedades de economia mista e as empresas públicas Ainda em sede dos sujeitos à falência, deve-se ressaltar que o novo diploma, ao excluir as sociedades de economia mista e as empresas públicas do rol das empresas passíveis de falir, retrocedeu. Isto porque a reforma da Lei das S.A. – Lei nº 6.404/76 –, promovida pela edição da Lei nº 10.303/2001, já havia revogado o artigo 242 da lei do anonimato, o qual vedava a falência das sociedades de economia mista80. Há, no direito administrativo, uma corrente doutrinária que sustenta que a imunidade falimentar das sociedades de economia mista e das empresas públicas somente se aplicaria àquelas que prestassem serviços públicos. As sociedades de economia mista que explorassem atividades econômicas eminentemente privadas estariam assim sujeitas à falência, em razão do princípio da isonomia81. Note-se, contudo, que essa argumentação cai por terra com a entrada em vigência da nova lei de falências, que em seu art. 19582 prevê expressamente a possibilidade de empresas prestadoras de serviço público falirem. 79 ASQUINI, Alberto. “Perfis da Empresa” in Revista de Direito Mercantil 104, pp. 109-126. Tradução de Fábio Konder Comparato para “Profili dell’imprensa”, publicado na Revista Del Diritto Commerciale, 1943, vol. 41, I. 80 Para uma discussão mais aprofundada sobre o assunto, veja-se MODESTO CARVALHOSA, “Comentários à Lei de Sociedades por Ações”, vol 4, tomo I, São Paulo: Editora Saraiva, pp. 421 e ss. 81 Art. 173, § 1º da Constituição Federal. 82 Lei nº 11.101/ 2004, art. 195: “A decretação da falência das concessionárias de serviços públicos implica extinção da concessão, na forma da lei”. 28 Recuperação de Empresas Em vista de tal fato, parece injustificável a manutenção desse privilégio concedido às sociedades de economia mista e empresas públicas, havendo questionamentos, em sede doutrinária, a respeito da constitucionalidade de tal dispositivo. 6.5 A caracterização da insolvência empresarial No ordenamento jurídico brasileiro, para existir falência é necessário o concurso de três requisitos. O primeiro é a qualidade de empresário do devedor, requisito subjetivo da falência, discutida no item 1.2 supra. O segundo pressuposto, abordado no presente item, é que o empresário devedor ou a sociedade empresária devedora encontre-se em estado de insolvência. Trata-se do requisito objetivo. O terceiro e último pressuposto consiste na declaração judicial do estado de falência (requisito formal da falência). Como visto acima, a falência decorre da impossibilidade de o empresário saldar as obrigações que possui com seus credores. Note-se, contudo, que a insolvência é um estado de fato, consubstanciado na incapacidade do empresário devedor de honrar suas obrigações, a qual só passa a produzir efeitos na esfera jurídica com a decretação judicial da falência. Verifica-se, destarte, que, na sistemática da lei de falências, a insolvência caracteriza-se pela impontualidade de pagamentos ou pela verificação de certos atos enumerados em lei – conhecidos como “atos de falência”. Assim, não cabe ao juiz que analisa um requerimento averiguar a desproporção negativa patrimonial do empresário, mas apenas se este se encontra em impontualidade ou se praticou algum ato de falência. Ao optar pela caracterização da insolvência empresarial, via impontualidade ou prática de atos de falência, a nova Lei de Falência não inovou. Ambas as hipóteses - que eram listadas nos artigos 1º e 2º do antigo diploma - encontram-se agora elencadas no art. 94 da Lei nº 11.101/ 2005. As subseções seguintes tratam separadamente de cada uma dessas hipóteses. 6.6 Caracterização da falência 6.6.1 Impontualidade O sistema da impontualidade é o principal mecanismo adotado na legislação brasileira para a caracterização do estado de insolvência83 e encontra-se regulado no inciso I do art. 94 da nova lei de falências, in verbis: Art. 94. Será decretada a falência do devedor que: I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência; Para a caracterização da insolvência pela impontualidade basta que um credor ou um grupo de credores que, em conjunto, possuam títulos executivos protestados cuja soma das dívidas líquidas ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos. Satisfeitas essas condições, e não havendo alguma relevante razão por parte do credor para o inadimplemento das obrigações por ele assumidas, deve o juiz decretar a falência sem 83 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa, vol. 3. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 59. 29 Recuperação de Empresas analisar se a impontualidade decorre de um real estado de insolvência econômica. Veja- se, nesse sentido, as ementas de decisões judiciais abaixo transcritas: 6.6.1.1 Relevantes razões de direito para o não pagamento da dívida Note-se que não é qualquer impontualidade que enseja a decretação de falência do devedor empresário, mas tão somente a impontualidade injustificada. Também nesse ponto, a Lei de Falências não inova, mantendo o sistema já existente na antiga lei. O artigo 96 da nova lei enumera algumas hipóteses em que haveria “relevante razão de direito” para o não pagamento do título apresentado no pedido da falência. Seriam essas: a falsidade de título; a sua prescrição; a nulidade de obrigação ou de título; o pagamento da dívida; qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime a cobrança de título; vício em protesto ou em seu instrumento; a apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação e a cessação das atividades empresariais mais de dois anos antes do pedido de falência. As hipóteses previstas no art. 96 da nova Lei de Falências traz rol de hipóteses elencadas não exaustivo, mas sim exemplificativo. 6.6.1.2 Obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos O inciso I do art. 94 da nova Lei de Falências exige que a impontualidade advenha de obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos. Anota Ricardo Negrão, valendo-se da lição de Waldemar Ferreira, que “obrigação líquida é a certa quanto à existência e determinada quanto ao seu objeto”84. Essas obrigações deverão estar materializadas em títulos executivos judiciais ou extrajudiciais, previstos nos artigos 584 e 585 do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 584 – São títulos executivos judiciais: I – a sentença condenatória proferida no processo civil; II – a sentença penal condenatória transitada em julgado; III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que verse matéria não posta em juízo; IV – a sentença estrangeira, homologada pelo Supremo Tribunal Federal; V – o formal e a certidão de partilha; VI – a sentença arbitral. Parágrafo único – Os títulos a que se refere o nº V deste artigo têm força executiva exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título universal ou singular. Art. 585 – São títulos executivos extrajudiciais: I – a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque; 84 Idem, p. 60. 30 Recuperação de Empresas II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores; III – os contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem como de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resulte morte ou incapacidade; IV
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