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Síndrome da imunodeficiência adqui- rida (SIDA), mas mais usada em sua sigla em inglês: acquired immunodeficiency syndrome (AIDS), é uma doença do sistema imunoló- gico humano causada pelo vírus da imuno- deficiência humana (HIV). A transmissão do HIV se dá através do contato de fluidos cor- porais, por exemplo, sexo sem proteção, seja oral anal, ou vaginal, compartilhamento de seringas e agulhas, transfusão de sangue contaminado, via vertical ou instrumentos perfurocortantes não esterilizados. É válido destacar que o vírus é transmitido mesmo com indivíduo portador assintomático. Algumas semanas depois da infecção pelo HIV, podem ocorrer sintomas semelhan- tes aos da gripe, como febre, dor de gar- ganta e fadiga. A doença costuma ser as- sintomática até evoluir para aids, a qual é caracterizado por um conjunto de sintomas desenvolvidos após o portador do vírus ad- quirir doenças oportunistas. Assim, se vê muito importante diferen- ciar as duas siglas. Contudo, os critérios de definição e estadiamento da aids são com- plexos e abrangentes, estando bem estabe- lecidos para propósitos de vigilância em vez da prática clínica com os pacientes. As- sim, o médico não deve preocupar-se com o fato de o paciente adequar-se ou não à definição estrita de aids, mas considerar a doença causada pelo HIV como um espec- tro que inclui infecção primária com ou sem a síndrome aguda, período assintomático e doenças oportunistas avançadas. A entrada do vírus na célula hospe- deira requer a presença de receptores de membrana. As primeiras células que entram em contato com o HIV-1 são aquelas que fazem parte da linhagem de monócitos, prin- cipalmente as células dendríticas. O HIV in- fecta células que tenham o marcador CD4 (CD4+), principalmente linfócitos T auxiliares, mas também macrófagos teciduais e células da micróglia do sistema nervoso central, o que resulta em uma doença crônica e pro- gressiva, ocasionando uma depressão imu- nológica. O ciclo replicativo do HIV-1 pode ser dividido em duas fases, a fase precoce e a fase tardia. A fase precoce começa com o reconhecimento da célula alvo pelo vírus maduro e envolve todos os processos que conduzem à integração do cDNA genômico no cromossoma da célula hospedeira. A fase tardia começa com a expressão do genoma proviral, envolvendo todos os processos que incluem a formação e maturação de novas partículas virais. Na fase precoce do ciclo replicativo, as partículas virais ligam-se especificamente na célula CD4+ através da proteína de su- perfície gp120. A ligação do receptor CD4 permite que a gp120 se ligue a correcepto- res (CCR5 ou CXCR4) sobre a superfície da célula hospedeira. Após a ligação da gp120 e correceptores, a glicoproteína gp41 é incorporada na membrana celular, resultando na fusão do revestimento viral e da membrana da célula alvo, produzindo um poro, através do qual o núcleo viral pe- netra no citoplasma da célula. Após a fusão, o processo de transcri- ção reversa se inicia. A transcrição reversa do RNA genômico é feita por meio da en- zima viral, transcriptase reversa, no cito- plasma da célula hospedeira. O produto da transcrição reversa, cDNA de cadeia dupla, é transportado para dentro do núcleo onde o cDNA é integrado, ou seja, incorporado no genoma da célula hospedeira, resultando no DNA proviral. Esta integração é devida à atividade catalítica da enzima integrase. Inicia-se então a fase tardia com a expressão regulada do genoma proviral. O processamento das proteínas virais com as proteases virais ocorre, seguido pela monta- gem do novo vírion, que é liberado através da membrana da célula hospedeira por brotamento. A maioria das infecções pelo HIV-1 ocorre por meio das mucosas do trato geni- tal ou retal durante a relação sexual. Nas primeiras horas após a infecção pela via sexual, o HIV e células infectadas atravessam a barreira da mucosa, permi- tindo que o vírus se estabeleça no local de entrada e continue infectando linfócitos T- CD4+, além de macrófagos e células dendrí- ticas. Após a transmissão do vírus, há um pe- ríodo de aproximadamente dez dias, deno- minado fase eclipse, antes que o RNA viral seja detectável no plasma. Estudos que uti- lizaram técnicas avançadas de sequencia- mento genético das primeiras partículas vi- rais detectadas no plasma permitiram de- monstrar que aproximadamente 80% das in- fecções sexuais pelo HIV-1 dos subtipos B e C são iniciadas por um único vírus. A homogeneidade do vírus, dito fun- dador, indica que o estabelecimento da in- fecção é resultado de um único foco de lin- fócitos T-CD4+ infectados da mucosa. A res- posta imunológica inata que se estabelece no foco da infecção atrai uma quantidade adicional de células T, o que, por sua vez, aumenta a replicação viral. A partir dessa pequena população de células infectadas, o vírus é disseminado inicialmente para os linfonodos locais e de- pois sistemicamente, em número suficiente para estabelecer e manter a produção de vírus nos tecidos linfoides, além de estabele- cer um reservatório viral latente, principal- mente em linfócitos T-CD4+ de memória. A re- plicação viral ativa e a livre circulação do vírus na corrente sanguínea causam a for- mação de um pico de viremia por volta de 21 a 28 dias após a exposição ao HIV. Essa viremia está associada a um declínio acen- tuado no número de linfócitos T-CD4+. Na fase de expansão e disseminação sistêmica, há a indução da resposta imuno- lógica, mas esta é tardia e insuficiente em magnitude para erradicar a infecção. A ati- vação imune, por outro lado, produz uma quantidade adicional de linfócitos T-CD4+ ativados que servem de alvo para novas in- fecções. Ao mesmo tempo, o número cres- cente de linfócitos T-CD8+ exerce um con- trole parcial da infecção, mas não suficiente para impedir, na ausência de terapia, a lenta e progressiva depleção de linfócitos T- CD4+ e a eventual progressão para a sín- drome da imunodeficiência adquirida (aids). A ativação de linfócitos T-CD8+ espe- cíficos contra o HIV ocorre normalmente an- tes da soroconversão. O aparecimento de uma resposta imune celular HIV-específica e a subsequente síntese de anticorpos anti- HIV levam a uma queda da carga viralG plasmática (viremia) – até um nível (set point) que é específico de cada indivíduo e à cro- nicidade da infecção pelo HIV. A resposta imune mediada por células é mais importante do que a resposta imune humoral no con- trole da replicação viral durante a infecção aguda, mas os anticorpos têm um papel re- levante na redução da disseminação do HIV na fase crônica da infecção. A resposta imunológica humoral con- tra vários antígenos virais é vigorosa. A mai- oria das proteínas do HIV é imunogênica, mas uma resposta de anticorpos precoce e preferencial é induzida contra as glicopro- teínas do envelope, a gp120 e a gp41, e contra a proteína do capsídeo viral, a p24. Como em qualquer outra infecção vi- ral, a primeira classe de anticorpo produ- zida durante uma resposta imune primáriaG é a imunoglobulina M (IgM). Devido à per- sistência do HIV, nosso organismo é continu- amente exposto aos mesmos antígenos e a produção inicial de IgM é substituída pela produção de imunoglobulina G (IgG). Entre- tanto, ao contrário de outras doenças infec- ciosas, a presença da IgM não permite di- ferenciar uma infecção recente de uma in- fecção crônica, tendo em vista que a IgM pode reaparecer em outros momentos du- rante o curso da infecção. A IgG anti-HIV atinge níveis séricos elevados e persiste por anos, enquanto os níveis séricos de IgM ten- dem a desaparecer com o tempo ou apre- sentar padrão de intermitência. É observado um aumento da afini- dade do anticorpo pelo antígeno, ou seja, os anticorpos de baixa afinidade que são produzidos no início da resposta humoral são pouco a pouco substituídos por anti- corpos de alta afinidade. Esse é um fenô- meno devido à ocorrência de mutações so- máticas em determinadasregiões (hot spots) dos genes que codificam a imunoglobulina (Ig). Essas mutações ocorrem ao acaso e o aparecimento de clones de linfócitos B com maior especificidade antigênica é o resul- tado de um processo de seleção positiva decorrente dessas mutações. Essa caracte- rística de aumento de afinidade (ou avidez), juntamente com o aumento da concentra- ção sérica de anticorpos específicos anti- HIV durante a fase inicial da resposta imune humoral, é a base racional para o desenvol- vimento de testes laboratoriais que classifi- cam a infecção em recente ou crônica. INFECÇÃO AGUDA Cerca de 70% dos indivíduos com in- fecção primária pelo HIV têm linfadenopatia. A maioria dos pacientes recupera-se espon- taneamente dessa síndrome e pode persistir apenas com ligeira redução da contagem de células T CD4+, que se estabiliza por um período variável antes de começar o declí- nio progressivo; em alguns indivíduos, as contagens de células T CD4+ voltam à faixa normal. Cerca de 10% dos pacientes têm de- terioração clínica e imunológica fulminante depois da primoinfecção, mesmo depois do desaparecimento dos primeiros sintomas. São vários os desafios associados à implementação de novos fluxogramas que visem caracterizar com acurácia e precisão uma amostra biológica submetida a testes para o diagnóstico da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana. Esses desafios abrangem o planeja- mento de políticas públicas e incluem desde questões estruturais (políticas, legais, de custo-efetividade, entre outras) até as ope- racionais (formação de pessoal, validação dos testes e boas práticas de laboratório). Alguns desafios permanecem constan- tes: a evolução tecnológica que introduz, periodicamente, novas metodologias no mercado de testes, sua aprovação pelas agências reguladoras e, ainda, sua aceita- ção para uso na rotina diária do diagnós- tico em diferentes situações e instalações. Resultados indeterminados ou inconclusivos, falso-reagentes ou falso-não reagentes, po- dem surgir com a utilização de qualquer teste ou metodologia, independentemente do fluxograma utilizado, seja devido à limi- tação da própria metodologia e do que ela é capaz de detectar na amostra analisada, seja pela característica singular com que a infecção pode progredir em diferentes indi- víduos. A reatividade cruzada de anticorpo que podem estar presentes na amostra em virtude de várias doenças autoimunes, ou mesmo na gravidez, dentre outras situações, pode produzir resultados falso-reagentes ou indeterminados em qualquer ensaio imunoló- gico. Em amostras que apresentam resulta- dos indeterminados em testes como o wes- tern blot (WB), imunoblot (IB) ou imunoblot rá- pido (IBR), os testes moleculares (TM) são muito úteis para confirmar a presença da in- fecção pelo HIV. Porém, existe um período entre a exposição do indivíduo e a detec- ção do vírus, durante o qual nenhum teste atualmente disponível pode definir o resul- tado da amostra. Como a maioria das in- fecções pelo HIV-1 ocorre por meio das mu- cosas do trato genital ou retal durante a relação sexual. Nas primeiras horas após a infecção pela via sexual, o HIV e células in- fectadas atravessam a barreira da mucosa, permitindo que o vírus se estabeleça no lo- cal de entrada e continue infectando linfó- citos T-CD4+, além de macrófagos e células dendríticas. Atualmente, os testes moleculares são os mais eficazes para a confirmação diag- nóstica, por permitirem o diagnóstico de in- fecções agudas e/ou recentes e apresenta- rem melhor custo-efetividade. Contudo, re- sultados com falso-reagentes ainda existem nesses testes e, diante dessa diversidade de cenários, não é possível a utilização de apenas um fluxograma para cobrir todas as situações que se apresentam para o diag- nóstico da infecção pelo HIV. Assim, casos de infecção recente são mais bem identifi- cados com a utilização de um teste de 4ª geração como teste inicial e um teste mole- cular como teste complementar. Pessoas na fase crônica da infecção são identificadas com sucesso por meio de qualquer combi- nação de testes iniciais, seguidos por um teste complementar (WB, IB, IBR ou TM). No Brasil, ainda há uma porcentagem conside- rável de indivíduos diagnosticados na fase crônica da infecção. Os testes para detecção da infecção pelo HIV são principalmente empregados em três situações: para triagem sorológica do sangue doado e garantia da segurança transfusional, dos hemoderivados e dos ór- gãos para transplante; para os estudos de vigilância epidemiológica; e para realizar o diagnóstico da infecção pelo HIV. Os testes complementares utilizam diferentes formatos e princípios. Estão incluídos nessa categoria: western blot (WB), imunoblot (IB) ou imunoen- saios em linha (LIA, do inglês line immunoas- say), incluindo o imunoblot rápido (IBR) e imunofluorescência indireta (IFI). Mais recen- temente, os testes moleculares (TM) também foram incluídos como testes complementares, uma vez que auxiliam no esclarecimento dos resultados da infeção aguda pelo HIV, como nos casos de reatividade no teste de 4ª ge- ração por detecção do antígeno e ausên- cia de anticorpos circulantes A seguir, estão descritos os testes mais comumente utilizados no diagnóstico da infecção pelo HIV. IMUNOENSAIOS O ensaio de primeira geração tem o formato indireto, ou seja, a presença de an- ticorpos específicos é detectada por um conjugado constituído por um anticorpo anti-IgG humana. O ensaio de segunda ge- ração também tem formato indireto, porém, utiliza antígenos recombinantes ou peptí- deos sintéticos derivados de proteínas do HIV. O ensaio de terceira geração tem o for- mato “sanduíche” (ou imunométrico) e sua característica é utilizar antígenos recombi- nantes ou peptídeos sintéticos tanto na fase sólida quanto sob a forma de conjugado. Assim, esse formato permite a detecção si- multânea de anticorpos anti-HIV IgM e IgG. Já o quarto e último ensaio, detecta simulta- neamente o antígeno p24 e anticorpos es- pecíficos anti-HIV. O ELISA é um imunoensaio de 4ª ge- ração que detecta o antígeno p24 e anti- corpos anti-HIV, tendo uma janela imunoló- gica de 15 dias. Sua sensibilidade e espe- cificidade é de 99%. TESTES RÁPIDOS Os testes rápidos (TR) são imunoen- saios (IE) simples, com resultados em até 30 minutos, realizados preferencialmente de forma presencial em ambiente não laborato- rial com amostra de sangue total obtida por punção digital ou amostra de fluido oral. Como consequência do desenvolvimento e da disponibilidade de TR, a testagem para a infecção pelo HIV atualmente pode ser re- alizada em ambientes laboratoriais e não laboratoriais, permitindo ampliar o acesso ao diagnóstico. Existem vários formatos de TR, e os mais frequentemente utilizados são: dispositivos (ou tiras) de imunocromatografia de fluxo lateral, imunocromatografia de du- plo percurso (DPP) e imunoconcentração. A terapia antirretroviral (TARV) combi- nada, também conhecida como terapia an- tirretroviral altamente ativa (HAART), é a base do tratamento dos pacientes infecta- dos pelo HIV. A supressão da replicação do HIV é um requisito importante para prolongar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida dos pacientes HIV-positivos. Atualmente, os fármacos disponíveis para o tratamento da infecção pelo HIV como parte de um regime combinado são classificados em quatro grupos: inibidores da enzima viral transcriptase reversa (inibi- dores nucleosídeos e nucleotídeos da trans- criptase reversa; inibidores não nucleosídeos da transcriptase reversa); inibidores da en- zima viral protease (inibidores de protease); inibidores da enzima viral integrase (inibido- res de integrase); e fármacos que interferem com o acesso do vírus (inibidores de fusão; antagonsitas do CCR5). Esse são 21 medi- camentos, em 37 apresentações farmacêuti- cas, conforme relação abaixo: A terapia inicial deve sempre incluircombinações de três ARV, sendo dois ITRN/ ITRNt associados a uma outra classe de an- tirretrovirais (ITRNN, IP/r ou INI). No Brasil, para os casos em início de tratamento, o esquema inicial preferencial deve ser a associação de dois ITRN/ITRNt – lamivudina (3TC) e te- nofovir (TDF) – associados ao inibidor de in- tegrase (INI) – dolutegravir (DTG). Exceção a esse esquema deve ser observada para os casos de coinfecção TB-HIV, MVHIV com possibilidade de engravidar e gestantes KASPER, Dennis L; HAUSER, Stephen L; JAMESON, J Larry; FAUCI, Anthony S; LONGO, Dan L; LOSCALZO, Joseph. Medicina interna de Harrison. 19ª Ed. Porto Alegre: Mc Graw-Hill, 2017 Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção pelo HIV em Adultos / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância, Preven- ção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. – Brasília: Ministério da Saúde, 2018. SanarFlix. Sanarflix.com.br. Disponível em: <https://aluno.sanarflix.com.br/#/portal/sala- aula/5daa0b7e132ed4001119e520/5daa07b4132ed4001119e518/docu- mento/5e6fa149480598001c751672>. Acesso em: 27 Apr. 2021.