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HISTÓRIA DA CIRURGIA

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Breve História da Cirurgia
Chapter · January 2005
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Alexandre Campos Moraes Amato
Universidade de Santo Amaro
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85-7241-561-0
O conhecimento da história da cirurgia não é, para o
cirurgião, essencial para a sua prática, porém a erudi-
ção que ela carrega é gratificante e fornece subsídios
para uma compreensão melhor da cirurgia atual.
Os pilares cirúrgicos, aqueles descobrimentos que
revolucionaram o ato cirúrgico, são o conhecimento
anatômico, a descoberta da anestesia e a descoberta dos
microorganismos e sua atuação na infecção. Previamente
a essas descobertas, as operações eram atos brutais,
realizados em pessoas sem perspectivas, em que o pro-
cedimento era a última esperança. A história da cirurgia
pode ser dividida em duas eras: antes dos pilares cirúr-
gicos e após esses pilares.
A história da cirurgia remonta ao período neolítico
(aproximadamente 10000 a 7000 a.C.), quando proce-
dimentos invasivos como craniotomias e reduções de
fraturas eram realizadas sem conhecimento fisiopatológico
e anatômico. Época em que o homem trocou seu modo de
conseguir alimento, passando a cultivá-lo e usando para
isso instrumentos que podem ter sido utilizados nos proce-
dimentos cirúrgicos primitivos. Foram encontrados, na
Europa Mediterrânea, vários casos de trepanação cranial
dessa época apresentando alguns sinais de cicatrização
óssea. Porém, muito provavelmente, sejam provenien-
tes de rituais religiosos e não realizados com um objeti-
vo terapêutico.
Nas culturas primitivas antigas, a cirurgia se limita-
va e, atualmente, ainda se limita ao tratamento das feridas
e lesões ósseas. Conhecia-se o controle de hemorragia
por pressão com torniquetes, além do processo de cau-
terização e substâncias vegetais adstringentes. Algumas
tribos norte-americanas, os Dakota, por exemplo, suturavam
ferimentos com tiras de tendão e agulhas de ossos, colo-
cando cortiça entre as bordas para facilitar a drenagem
purulenta. A retirada de flechas e lanças era feita com
destreza e os abscessos, drenados. Amputações rituais
também eram realizadas. Algumas culturas utilizavam
substâncias alcoólicas ou outras tópicas para atenuar a
sensibilidade dolorosa. A assistência à mulher grávida
ficava a cargo de outras mulheres da tribo.
Na América pré-colombiana havia o controle da he-
morragia, o conhecimento de ervas adstringentes, sangrias,
“Devemos tomar conhecimento dos primórdios
quando quisermos dizer que entendemos de algo.”
Aristóteles
Breve História da Cirurgia 1
Alexandre Campos Moraes Amato
C a p í t u l o
Parte I
Irany_001_I.p65 10/06/2005, 17:003
4 Generalidades 85-7241-561-0
pequenas ações cirúrgicas e a realização da trepanação
com o instrumento sagrado Tumi, que representava o
adorado deus da medicina.
No Egito antigo a cirurgia se restringia à circunci-
são, com alguns relatos de suturas, e à cauterização de
lesões.
Os cirurgiões indianos tiveram oportunidade de es-
tudar e desenvolver a técnica de rinoplastia, visto que
cortar o nariz era o castigo para adultério e outras trans-
gressões; o costume de perfurar a orelha e alargar a sua
abertura também os fizeram desenvolver técnicas de reparo.
Foram criadas técnicas de reparo de lábio leporino, hérnias,
cálculos vesicais, catarata e amputações, desenvolvendo-se
assim a cirurgia independentemente da medicina grega.
Possuíam muitos instrumentos cirúrgicos e realizavam
a cesariana com destreza. Seus conhecimentos anatômicos
eram precários devido à proibição da dissecção. O médico,
nessa época, praticava tanto a medicina quanto a cirur-
gia, pois estas eram consideradas complementares.
A prática cirúrgica na China antiga se limitava à for-
mação de eunucos, com a castração total de pênis e
testículos daqueles que transgrediam as regras na corte.
Posteriormente, essa mutilação passou a ser vista como
prova de lealdade. O enfaixamento dos pés das moças
jovens de famílias abastadas, que chegava a unir a parte
anterior deles com o calcanhar, tinha um significado muito
importante de beleza e posição social. A acupuntura e a
moxibustão, colocação de uma planta pulverizada so-
bre a pele e a sua queima, constituem prática básica da
medicina chinesa há milhares de anos; dizem ser atribuídas
ao Imperador Amarelo, muito embora tenham sido uti-
lizadas antes.
Na Grécia e na Roma antigas, o tratamento cirúrgico
se limitava a cuidar de lesões externas e feridas, extra-
ção de armas cravadas no corpo no campo de batalha e
controle da hemorragia, mas tudo isso muito atrelado à
mitologia: havia guerreiros possuidores de conhecimentos
médicos especiais, como Machaon e Podalírio, filhos
do deus Esculápio, prevalecendo, nos anos subseqüen-
tes, o nome de Machaon como pai da cirurgia.
Durante os séculos que transcorreram, desde o flores-
cimento da civilização micênico-cretense até a época
dos filósofos pré-socráticos, ou melhor, no período
hipocrático, utilizava-se a cauterização no tratamento
de infecções, feridas e tumores. Havia também, para o
tratamento de luxações e fraturas, o conhecimento de
técnicas de redução, as quais alcançaram um alto grau
de complexidade e, para a analgesia, o uso do extrato de
ópio e mandrágora. A Coletânea Hipocrática ou Corpus
Hippocraticum inclui escritos de muitosautores de Cós,
Cnido, Sicília e, talvez, de outros locais. A Coletânea
foi compilada no século IV a.C. na grande biblioteca de
Alexandria e possui por volta de 72 livros e 59 tratados,
mal divididos, sendo os tratados mais completos aque-
les que discorrem sobre cirurgia. Muitas enfermidades
eram tratadas com operações, manipulação e métodos
conservadores; fraturas, luxações e ferimentos na cabe-
ça recebiam particular atenção. Tratamentos cirúrgicos
de tumores, fístulas, úlceras e hemorróidas são descri-
tos. Esses textos são atribuídos pessoalmente a Hipócrates,
pela claridade, pela consistência e pelo pragmatismo.
As técnicas operatórias são descritas com minúcias, in-
cluindo a preparação do paciente, a mesa cirúrgica, a
iluminação, o instrumental e os assistentes.
Asclepíades de Bitínia, ao redor de 120 e 70 a.C, afirmava
ser o médico, e não a natureza, que curava as enfermi-
dades, desmentindo Hipócrates. Um dos procedimentos
em que obteve mais êxito foi a traqueostomia, realizada
quando a respiração estava obstruída.
Celso (14 a 37 d.C.), um provável patrício romano
que tentou compilar todos os conhecimentos da época,
inclusive toda a medicina, ofereceu uma das primeiras
descrições de ligadura e secção de vasos sangrantes.
O Talmud babilônico, século IV, contém fatos ana-
tômicos e fisiológicos interessantes, reconhecendo 248
ossos no corpo humano, sendo um deles na coluna
vertebral, o luz, responsável pela reconstrução do corpo
na ressurreição. Haviam sido descritos procedimentos
para fístula anal, redução de luxações e cesariana.
Na medicina árabe muitos se destacaram: Rhazes ou
Abu Bakr Muhammad ibn-Zarariya al Razi (850-923)
compilou diversos trabalhos de muitos autores, servindo
de ponte entre o pensamento médico grego e o mundo
árabe. Seu trabalho mais difundido foi o Al-Hawi (Liber
Continens), sintetizando o conhecimento médico e ci-
rúrgico de seu tempo. Avicena, Abu ‘Ali al-Hussain ibn
‘Abd Allah ibn al-Hassan ibn ‘Ali ibn Sina (980-1037),
considerado um dos maiores filósofos do islamismo e
conhecido como “o Filósofo dos Árabes”, homem de
grande cultura, especializou-se na área médica. Com
somente 16 anos de idade já havia estudado medicina e
sua competência era evidente. Aos 18 anos tratou e curou
o príncipe Nuh ibn Mansur, após diversas tentativas de
outros médicos. Ganhando confiança, proteção política
e simpatia, ele teve o acesso à biblioteca dos governa-
dores Samânidas, o santuário do saber árabe na época,
liberado pelos príncipes de Buhara. Foi médico, jurista,
professor e ocupou cargos políticos. Escreveu cerca de
200 obras, sendo o Livro da Cura a mais importante.
Suas obras foram muito utilizadas na Idade Média. Aos
21 anos completou a enciclopédia al-Qanun ou Cânone,
mais considerada no seu tempo do que as obras de Rhazes
ou de Galeno. Até meados do século XVII sua obra foi
estudada e traduzida por mestres, médicos e estudan-
tes, inclusive pelos cristãos. Albucassis Abu-l-Qasim
al-Zahrawi (936-1013) escreveu os textos cirúrgicos mais
importantes da cultura muçulmana, exercendo forte
influência no Ocidente cristão. Seu al-Tasrif é o pri-
meiro texto sistemático e ilustrado sobre cirurgia, mesmo
sendo uma repetição de vários autores, como Paulo de
Égina e outros. Avenzoar, ou Abu Marwan Abd Al-Malik-
ibn Zuhr (1091-1162), descreveu a técnica da traqueostomia
com exatidão.
Durante a época das invasões germânicas perderam-se
muitos dos avanços cirúrgicos alcançados na Antigui-
dade greco-romana. Os cristãos acreditavam na cura das
doenças pelo Espírito Santo, deixando de lado todos os
procedimentos cirúrgicos, com exceção das sangrias,
amputações e extrações dentárias. Como a cirurgia foi
considerada uma disciplina importante pelos médicos
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Breve História da Cirurgia 585-7241-561-0
de Salerno, a Europa teve que seguir as escolas medi-
terrâneas. Um dos melhores cirurgiões do século XIII
foi Guilherme de Saliceto (1210?-1227), professor em
Bolonha, médico de Verona e autor de numerosas obras.
Preferiu o uso da faca à cauterização nas operações ci-
rúrgicas e escreveu o primeiro tratado sobre anatomia
topográfica, expondo o tratamento cirúrgico de fraturas
e outras enfermidades. Seu discípulo Guido Lanfranchi
(1252?-1315), de Milão, defendeu a união da cirurgia e
da medicina no seu Cirurgia Magna, concluído em 1296.
Henry de Moneville (1260-1320), cirurgião de Felipe, o
Formoso e professor de anatomia em Montpellier reco-
mendou a cura higiênica das feridas, limpando-as e sutu-
rando-as o mais rápido possível para evitar a supuração.
Guy de Chauliac (1300-1368) defendeu a necessidade
da boa formação em anatomia para a prática cirúrgica.
Durante a Idade Média os maiores avanços foram a
regularização da profissão médica e do ensino, o de-
senvolvimento das idéias sobre o contágio, a adoção de
medidas sanitárias e a criação de instituições assistenciais.
O misticismo se tornou mais profundo, apesar de a ciên-
cia ter sido utilizada com mais freqüência. A cirurgia
procedia das tradições gregas e bizantinas, pelo menos
da forma como foi transmitida pelos árabes e pelas escolas
de Salerno e Montpellier. Limitava-se ao tratamento de
feridas, fraturas, luxações, amputações, drenagem de abs-
cessos e fístulas. Os procedimentos se restringiam a cortes
e amputações, com o hábito árabe da cauterização no
lugar da ligadura. Procedimentos mais complexos, como
a correção de hérnias e a extração de cálculos vesicais,
eram evitados. A sutura, raramente utilizada, era feita
com fio de cabelo humano. Obteve-se avanço na cirur-
gia de catarata. No final da época medieval existiam dois
tipos de cirurgiões: os que recebiam uma formação mais
elevada e os que se identificavam como barbeiros. Es-
tes não se limitavam ao cuidado dos cabelos e da barba,
também extraíam dentes, executavam operações meno-
res, cuidavam de fraturas e de outros procedimentos.
Na França, essa distinção chegou a ser legalizada.
Durante o Renascimento, Ambroise Paré (1509-1590)
teve uma enorme influência. De origem campesina, foi
aprendiz de barbeiro e trabalhou no Hotel-Dieu de Pa-
ris, ajudando na cura de feridas. Em 1537, iniciou sua
ascendência na armada. Giovanni da Vigo (1460-1525),
que sustentava sua Prática copiosa na arte cirúrgica
(1515) com “as feridas que não se curam pelo ferro, se
curam pelo fogo”, passou a submeter as feridas de ar-
mas de fogo ao azeite fervendo. Paré mostrou que a cura
sem o azeite era possível e muito menos traumática,
ganhando fama e banindo esse procedimento. Durante
as últimas campanhas, voltou a introduzir a ligadura e
abandonou a cauterização. Em 1554, Henrique II o no-
meou mestre-cirurgião, embora ele não tivesse forma-
ção acadêmica e, em 1561, Paré publicou o seu tratado
Cirurgia Universal, introduzindo novas técnicas e no-
vos instrumentos. Entre outras, descreveu e inovou as
técnicas de operação de catarata, extração de cálculos
de bexiga, luxações, fraturas, transplante de nariz e de
sutura facial. Chegou a descrever a criação de membros
artificiais para amputados, com mecanismos para mo-
vimentação. Guido Guidi, ou Vidius (1508-1569), foi
um florentino que publicou o Chirurgia e Grecco in Latinum
Conversa, em 1544, e tem seu nome lembrado na ana-
tomia pelo nervo e pelo canal vidiano. Fabrizi d’Acqua-
pendente (1533-1619), prudente cirurgião e anatomista
italiano, que evitava perda de sangue e cirurgias peri-
gosas, descreveu técnicas de traqueostomia, toracocentese
e cirurgia uretral e descobriu as válvulas venosas. Fran-
cisco Diaz, cirurgião espanhol, publicou, em 1588, uma
das primeiras obras sobre as vias urinárias, cunhando
mais de 500 termos médicos.
O século XVII ficou conhecido como “Era da revo-
lução científica”, a cirurgia, porém, não acompanhou
os progressos da anatomia e da fisiologia, pois a anes-
tesia e o controle da infecção ainda não haviam sido
descobertos, muito embora a anatomia estivesse avan-
çada. Os cirurgiões não alcançaram o nível social e
acadêmico dos médicos, com algumas exceções. Os cirur-giões franceses competiam com os barbeiros e depois
se aliaram a eles contra os médicos. As cirurgias maio-
res, como suturas de perfurações intestinais, extração
de tumores, operações plásticas em lábios e nariz e fístulas
retais eram realizadas por cirurgiões, enquanto feridas,
sangrias, extração dentária, redução de fraturas e luxa-
ções e úlceras eram tratadas por cirurgiões-barbeiros.
Havia, também, os médicos itinerantes, que operavam
cataratas, cálculos de vesícula e hérnias, geralmente com
maus resultados. Wilhelm Fabry von Hilden (1560-1634),
considerado pai da cirurgia germânica, inovou ao defi-
nir que as amputações deveriam ser realizadas nos tecidos
sãos e não na parte necrosada. Marco Aurélio Severino
(1580-1656) praticou diversas vezes a traqueostomia
durante a epidemia de difteria em Nápoles, como reco-
mendado por Guido, Fabricio e Santorio, que haviam
criado um trocarte para facilitar a operação. A primeira
descrição clara de transfusão sangüínea foi feita por
Giovanni Colle (1558-1630), de Belluno, professor de
medicina em Pádua. Giuseppe Zambeccari (1655-1729)
foi pioneiro na cirurgia experimental. Peter Uffenbach
(1566-1635) compilou uma antologia cirúrgica em que
reconhece as práticas dos cirurgiões do século XVI. Johann
Schultes (1595-1645) publicou o Armamentarium
chirurgicum, um acervo iconográfico muito importante.
Matthaeus Gottfried Purmann (1649-1711) firmou as bases
anatômicas da cirurgia. Francisco Folli (1623-1685), em
1628, aconselhava a transfusão por meio da inserção de
um tubo de prata na artéria do doador e de uma cânula
de osso na veia do paciente.
O século XVIII pode ser considerado a Idade de Ouro
do charlatanismo, apesar dos progressos da ciência médica,
com direito a elixires milagrosos e até mulheres que
davam à luz coelhos. O francês Jean-Louis Petit (1674-
1760) inventou o torniquete de parafuso e uma técnica
de mastectomia de pouca letalidade. O alemão Lorenz
Heister (1683-1758), que também era um excelente
anatomista e teve íntima relação com a elevação do padrão
do ensino cirúrgico, escreveu um tratado de cirurgia
traduzido para diversos idiomas, alcançando grande fama.
William Chedelsen (1688-1752), perito na litotomia, ficou
famoso ao realizar a cirurgia em menos de um minuto
Irany_001_I.p65 10/06/2005, 17:005
6 Generalidades 85-7241-561-0
e publicar o Anatomy of the Human Body. Jean Baseilhac
(1703-1781) praticava Haut appareil, a extração
suprapúbica de cálculos vesicais. Na França, em 1713,
foi fundada a Real Sociedade de Cirurgiões. Percival
Pott (1714-1788), um observador brilhante, descreveu
a fratura hoje chamada de fratura de Pott e outros epônimos
atuais. John Hunter (1728-1793) e seu irmão William
Hunter (1718-1783), brilhante cirurgião, anatomista e
cientista, criaram um novo método de sutura dos aneu-
rismas. William Hunter foi considerado pai da cirurgia
experimental e da anatomia patológica. Durante esse
século os cirurgiões conseguiram uma posição de igual-
dade frente aos médicos da época, principalmente de-
vido a François Gigot de la Peyronie (1678-1747) que,
em 1743, realizou a separação definitiva entre barbei-
ros e cirurgiões com um decreto, proibindo o exercício
da cirurgia por barbeiros, com exceção de procedimentos
menores. Giuseppe Flaiani (1741-1808) foi bem-sucedido
na cirurgia do bócio exoftálmico. August G. Richter
(1742-1812), professor em Göttingen e pioneiro no tra-
tamento cirúrgico das hérnias, escreveu um manual muito
conhecido e editou o primeiro jornal cirúrgico: Chirur-
gishe Bibliothek. François R. Chopart (1743-1795), pio-
neiro na cirurgia da árvore urinária, criou, em 1792,
um método de amputação de pé. Michele Troia (1747-
1828), de Nápoles, escreveu sobre a cirurgia de bexi-
ga e ossos. Na Itália, Antonio Scarpa (1752-1832) fez
estudos valiosos de anatomia, aneurismas e catarata;
criou também uma técnica para correção de hérnia in-
guinal. Na Alemanha, a separação entre cirurgiões e
barbeiros veio muito depois, mas não impediu a as-
censão de grandes cirurgiões.
Na primeira metade do século XIX a cirurgia pari-
siense se encontrava relativamente bem desenvolvida gra-
ças ao progresso trazido pelas guerras napoleônicas. Um
dos cirurgiões mais famosos foi Dominique-Jean Larrey
(1766-1844), que, segundo o próprio Napoleão, era o
homem mais virtuoso que ele já conhecera. Mesmo tendo
feito mais de 200 amputações em 24h, seu feito mais
marcante foi a elaboração, no fronte, de um sistema de
ambulâncias que elevava a possibilidade de um trata-
mento eficaz. Além disso, por atender os feridos de ambos
os lados, pode ser considerado um antecessor da Cruz
Vermelha, entidade criada posteriormente nesse mes-
mo século. Guillaume Dupuytren (1777-1835), autor de
inúmeras inovações cirúrgicas e instrumental utilizado,
demonstrou grande valentia ao realizar perigosas inter-
venções com êxito e, devido à sua frieza, foi classifi-
cado pelo seu colega Pierre-François Percy (1754-1825)
como o primeiro dos cirurgiões e o último dos homens;
descreveu a fratura e a contratura de Dupuytren, entre
outros. Récamier (1774-1852) foi o primeiro a realizar
uma histerectomia; Philibert Joseph Roux (1780-1854),
a tiroidectomia e Jacques Lisfranc de Saint Martin (1790-
1847), a retossigmoidectomia. Antoine Lembert (1802-
1851) renovou a cirurgia intestinal. Prosper Ménière
(1799-1862) se dedicou às enfermidades otológicas.
Auguste Nélaton (1807-1873), médico de Napoleão III,
foi notável, principalmente com sua habilidade na ova-
riotomia, sendo o primeiro a utilizar, em 1800, um ca-
teter de borracha flexível, que traz seu nome. B. Larghi
de Vercelli (1812-1877) utilizou nitrato de prata no tra-
tamento de feridas, antes das pesquisas de Lister. Pierre-
Paul de Broca (1824-1880) demonstrou a área da linguagem
no cérebro na terceira circunvolução do lobo frontal
esquerdo. A.A.L.M. Velpeau (1795-1867) foi um cirur-
gião de primeira ordem, sendo seu lenço de Velpeau para
fratura de clavícula ensinado ainda hoje.
Na Inglaterra, o Guy’s Hospital Medical School, cons-
truído em 1724, chegou a ser mundialmente conhecido
pelos grandes homens do Guy’s: Bright, Addison,
Hodgkin, como clínicos, e Sir Astley Paston Cooper (1768-
1841), como cirurgião. Cooper, economicamente asse-
gurado pela fortuna de sua mulher, foi um homem bri-
lhante, perfeccionista e comunicativo. Como cirurgião,
era elegante e cuidadoso; deixou alguns epônimos que
reconhecem o seu trabalho. Robert Knox (1791-1862),
contemporâneo de Cooper, foi um dos mestres da ana-
tomia mais famosos de seu tempo. Benjamin Bell (1749-
1842), destacado cirurgião de Edimburgo, publicou uma
obra sobre a sistemática cirúrgica com tanta difusão quanto
o texto de Heister. Seus filhos George e Joseph, seu neto
Benjamin e seu bisneto Joseph continuaram a prestigiada
tradição cirúrgica da família até o século XX. Outra família,
Bell, que se destacou foi a de John (1763-1820) e Charles
(1774-1842), dois irmãos considerados os maiores ci-
rurgiões britânicos. Charles Bell, reconhecido por seu
trabalho no sistema nervoso, descreveu a paralisia de
Bell. John Bell, escritor e ilustrador de livros de anato-
mia, é lembrado por seus trabalhos na cirurgia vascular
e tratamento de feridas, mas pode ter sido também a
fonte inspiradora de Conan Doyle para criar seu perso-
nagem Sherlock Holmes. Robert Liston (1794-1847) foi
o mais hábil de seu tempo, extirpando tumores antes
considerados inoperáveis e foi o primeiro a utilizar a
anestesia com éter na Inglaterra. James Syme (1799-
1870) idealizou novos procedimentos que permitiram a
incisão articular, preservando o membro da amputação.
Benjamin Brodie (1783-1862), William Fergusson (1808-
1887) e Sir James Paget (1814-1899) também merecem
ser lembrados. Fergusson escreveu um sistema de ci-
rurgia com notável difusão, escreveu um livro sobre a
história da cirurgia e da anatomia, idealizou novos ins-
trumentos, além de outras inovações em áreas não rela-
cionadas. Paget descreveu as doenças, na mama e nos
ossos, que levam o seu nome e redigiu o SurgicalPathology
(1863) e o Lectures on Tumours (1851). Na época di-
ziam “Vai ver Paget para que te diagnostique o mal e
Fergusson para que o extirpe”. O russo Nikolai Ivanovich
Pirogov (1810-1881), o maior cirurgião de seu país, célebre
por sua cultura e sua técnica, introduziu a amputação
de pé que leva seu nome.
Nos Estados Unidos, Ephraim McDowell (1771-1830),
extirpou, em 1809, um cisto de ovário com 20 libras,
operando com êxito outros cistos; publicou seu traba-
lho e se tornou reconhecido internacionalmente. Philip
Syng Physick (1768-1837) foi o fundador da especiali-
dade cirúrgica na América do Norte e se atribui a ele o
primeiro amigdalótomo, o uso do sifão gástrico e de fios
absorvíveis. Joseph (1741-1775) e John Warren (1753-
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Breve História da Cirurgia 785-7241-561-0
1815) se destacaram por seu trabalho durante a Guerra
da Secessão e seus descendentes se mantiveram na pro-
fissão médica por gerações.
CONHECIMENTO ANATÔMICO
No Egito antigo, apesar do embalsamamento, o concei-
to anatômico era muito atrelado às idéias religiosas vigentes
na época. E muito do que se observava foi interpretado
erroneamente: embora conhecessem a importância do
cérebro, considerava-se o coração o centro do corpo,
interligado por um sistema de canais (metu) que distri-
buía o ar. Sua medicina baseava-se no conceito de metu:
acalmá-los, se estivessem irritados; amolecê-los, se estives-
sem endurecidos e estimulá-los, se estivessem lentos.
Na China antiga, os conhecimentos anatômicos se
baseavam mais na especulação do que na observação,
pois as doutrinas de Confúcio proibiam a profanação
de cadáveres e não foram realizados estudos anatômicos
até o século XVIII, muito depois de Vesalius.
Vários estudiosos descreveram a anatomia humana.
Alcméon de Crotona, em 500 a.C., realizou dissecções
em animais. Praxágoras de Cós, em 340 a.C., foi um
dos primeiros a diferenciar a função das artérias e veias,
embora pensasse que conduzissem ar em seu interior.
Herófilo, de Alexandria, discípulo de Praxágoras, no século
IV a.C., apesar de ter realizado dissecções regularmen-
te e descrito zonas do cérebro, intestino, vasos linfáticos,
fígado, órgãos genitais, olho e sistema vascular, teve grande
parte de suas observações queimada. Erasítrato, em 250
a.C., diferenciou os nervos sensitivos dos motores, em-
bora tenha confundido ligamentos com nervos; realizou,
também, descrições precisas do cérebro, da traquéia, do
coração e do sistema vascular.
Galeno, no século II d.C., nomeado médico dos
gladiadores, teve a oportunidade de tratar e observar a
anatomia humana ao vivo, principalmente ossos, arti-
culações e músculos. Suas observações anatômicas foram
tão consagradas, que discordar delas era heresia, mes-
mo contendo muitas descrições errôneas e muitas baseadas
em dissecções de animais. Apesar dos erros e falsos
pressupostos, são descrições anatômicas muito preci-
sas. Demonstrou que as veias estão conectadas ao coração
e que os nervos nascem do sistema nervoso central;
descreveu o nervo glossofaríngeo, a estrutura da me-
dula espinhal, dos ureteres, dos ossos e das inserções
musculares.
Com o desenvolvimento da cirurgia durante o perío-
do medieval, aumentou o interesse pela anatomia. Na
Escola de Salerno, a prática anatômica se reduzia à dis-
secção de animais, enquanto os árabes se baseavam em
trabalhos clássicos, como o de Galeno. Durante o sé-
culo XIV houve um renascimento da dissecção de cadáveres
humanos.
O melhor dissecador medieval foi Mondino De’Luzzi
(1275-1326), com sua Anothomia escrita em 1316 e publicada
em 1478; manteve, porém, os erros de Galeno. Berengario
da Carpi, em 1521, encarregado da cadeira de cirurgia e
anatomia em Bolonha, publicou seu livro Comentários a
Anothomia baseado em dissecações humanas. Embora
fossem diagramas rústicos, algumas concepções anatô-
micas equivocadas de Galeno foram corrigidas.
O responsável pela revolução na anatomia foi Andreas
Vesalius (1514-1564) (Fig. 1.1), nascido em Bruxelas.
Freqüentou as universidades de Louvain, Paris e Pádua
e se formou médico em Pádua, em 1537. Revolucionou
a anatomia ao revirar ossos em cemitérios, dissecar ca-
dáveres em seu quarto e publicar, em 1538, a Tabulae
anatomicae sex, obra que pela primeira vez, em sécu-
los, corrigiu diversos erros pequenos de Galeno, com
desenhos artísticos de ossos e músculos humanos. Mudou
a concepção da anatomia, que era ensinada à boa dis-
tância do cadáver, lendo textos de Galeno e dissecando
ele mesmo os corpos, sem luvas, anti-sépticos ou solu-
ções de conservação. Com 29 anos, em 1543, publicou
De humani corporis fabrica, libri septem, mais conhe-
cido como Fabrica (Fig. 1.2), o maior livro médico já
publicado, causando assombro na comunidade pela sua
imponência e pelo conteúdo da obra. Apontou os erros
insistentes de Galeno, desagradando a muitos contempo-
râneos. O livro 1 se dedica ao estudo dos ossos; o li-
vro 2, aos músculos; o livro 3, às artérias e veias; o livro 4,
ao sistema nervoso; o livro 5, aos órgãos abdominais; o
livro 6, ao coração e aos pulmões e, finalmente, o li-
vro 7, ao cérebro. Publicou o Epítome, uma condensa-
ção do Fabrica, para que os estudantes o utilizassem na
mesa de dissecação.
Seus alunos e sucessores também seguiram com des-
cobertas anatômicas. Realdo Colombo (1512-1559),
sucessor de Vesalius em Pádua, descreveu precisamente
Figura 1.1 – Auto-retrato de Andreas Vesalius, de sua obra-prima Fabrica.
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8 Generalidades 85-7241-561-0
a circulação sangüínea do ventrículo direito para o ven-
trículo esquerdo do coração, passando pelos pulmões e
o próprio coração, publicando o De re anatomica. Gabriel
Falópio (1525-562), sucessor de Colombo e grande ci-
rurgião, apresentou processos anatômicos não descritos
por Vesalius, como os órgãos femininos, descrevendo
pela primeira vez o ovário e as trompas do útero, que
atualmente levam o seu nome, e atribuiu nomes a vagi-
na, placenta e clitóris, que antes não os tinham. Bartolomeu
Eustáquio (1520-1574) é autor de um esplêndido ma-
nuscrito esquecido por 150 anos na Biblioteca do Vaticano.
Publicado em 1714, pelo cardiologista Giovanni Lancisi,
além de apontar erros no Fabrica, fez observações ne-
gligenciadas por Vesalius, descrevendo corretamente o
rim humano, a glândula supra-renal e a trompa, que liga
o ouvido médio à cavidade oral e leva seu nome.
Vesalius mudou conceitos e relatou uma nova ana-
tomia, mas isso não foi tudo; o principal foi a inovação
na maneira de estudar e ensinar, mostrando o caminho
para novas descobertas.
Leonardo da Vinci (1452-1519) considerou a anatomia
além do ponto de vista pictórico. Sua precisão é maior
do que a de Vesalius; seus contemporâneos, entretanto,
não viram seu trabalho. Michelangelo Buonarotti (1475-
1564) praticava dissecções pessoalmente no convento
de Santo Espírito de Florença; adquiriu conhecimento
anatômico durante 20 anos, até que passou a considerar
a anatomia, ainda que subordinada pela arte, pouco útil
para o artista. Albrecht Dürer (1471-1528) escreveu um
tratado sobre proporções do corpo humano, mas sua
preocupação com a anatomia era puramente estética.
William Harvey (1578-1657), discípulo de Acqua-
pendente, demonstrou a circulação sangüínea através do
sistema vascular e seu bombeamento pelo coração. Como
toda grande inovação, foi criticada por muitos e apoia-
da por poucos.
Thomas Willis (1621-1675), em 1664, publicou De
Anatome Cerebri, o compêndio mais detalhado sobre o
sistema nervoso, no entanto, ao localizar o nível ana-
tômico dos processos mentais, chegou a conclusões equí-
vocas. A circulação arterial da base do crânio, descrita
por ele, levou seu nome.
ANESTESIA
Cirurgias grandes, com acesso à cavidade peritoneal,
foram tentadas e realizadas, mas sem a segurança ofe-
recida pela anestesia e pela assepsia que conhecemos
hoje. No momento da cirurgia, no hospital, todos os
funcionários se encarregavam de segurar o paciente e
amordaçá-lo. A sala cirúrgica era ampla, com uma grandeclarabóia para iluminação e com portas pesadas para
evitar a propagação dos gritos. A operação tinha que
ser realizada rapidamente.
Durante centenas de anos substâncias analgésicas,
hipnóticas e narcóticas, como opiáceos, haxixe, mandrágora
e outras plantas contendo Hyosciamus, foram utiliza-
das. O álcool também foi empregado.
Os assírios, por volta de 1000 a.C., comprimiam a carótida
do paciente até que ele ficasse inconsciente. Na Europa
Medieval era comum o trauma cranioencefálico, que consistia
num golpe sobre uma tigela de madeira, colocada sobre
a cabeça do paciente, de forma que o crânio ficasse intacto
e o paciente, inconsciente. Hipócrates, em 400 a.C., uti-
lizava a esponja soporífera sob o nariz, impregnada de
ópio, mandrágora, vinho e outras plantas. No século XVI
se utilizava o gelo para congelar certas partes do corpo
antes da cirurgia. Theophrastus Phillippus Aureolus
Bombastus von Hohenheim, ou melhor, Paracelso (1493-
1541) foi o primeiro a utilizar o éter, descoberto em 1275
pelo poeta, teólogo, filósofo e alquimista espanhol Raimundo
Lúlio (1235-1315), conhecido como “doutor iluminado”,
que destilou a mistura de vitríolo (ácido sulfúrico) com
álcool. Entretanto, como era clínico, ele o utilizou para
aliviar a dor e não para anestesia cirúrgica.
Figura 1.2 – Livro Fabrica, publicado por Vesalius.
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Breve História da Cirurgia 985-7241-561-0
O mesmerismo ou “magnetismo animal”, método de
Franz Anton Mesmer (1734-1815), pode ser considera-
do um precursor do hipnotismo. James Esdaile (1808-1859),
na Índia, chegou a realizar 72 cirurgias com a técnica
do mesmerismo, sem dor, porém ele não convenceu seus
contemporâneos. John Elliotson (1791-1868), outro
defensor do método, foi muito criticado. O hipnotismo
foi batizado, em 1843, por James Braid (1795-1860).
Em 1772, Joseph Priestley (1733-1804) descobriu
o gás do riso, ou óxido nitroso, mas não observou seu
efeito anestésico. Humphry Davy (1778-1829) pensou
em utilizá-lo em cirurgias, mas não deu continuidade
à idéia. William Barton, em 1808, confirmou as obser-
vações de Davy.
Henry Hill Hickman (1800-1830), em 1824, produ-
ziu um estado de “animação suspensa” em animais, com
asfixia por dióxido de carbono, realizando cirurgias sem
dor. Chegou a propor seu uso em humanos, mas a idéia
não foi aceita.
Crawford Long (1815-1878) instituiu as folias de éter,
em substituição às festas de gás do riso, e percebeu que
não sentia dor após contusões. Em 30 de março de 1842
retirou cirurgicamente um cisto cervical de um paciente,
sob efeito do éter, sem que ele sentisse dor. O sucesso
foi tão grande que passou a utilizar o éter em suas ci-
rurgias, sendo o primeiro a usá-lo em um procedimento
obstétrico, em 1845. Horace Wells (1815-1848) anun-
ciou, em 1844, o efeito anestésico do óxido nitroso ao
extrair um dente de si mesmo, sem dor. Mas, após ter
testado a descoberta diversas vezes, ao apresentá-la para
colegas, o paciente passou a gritar, sendo Wells vaiado
por charlatanismo pela audiência. William Thomas Green
Morton (1819-1868), colega de Wells, passou a experi-
mentar o éter sulfúrico e, em 16 de outubro de 1846,
fez a primeira demonstração pública de cirurgia sem dor.
O termo anestesia foi definido por Oliver Wendell Holmes
(1809-1894), professor de anatomia em Harvard.
Depois de o éter ter sido amplamente aceito, James
Young Simpson (1811-1870) o abandonou em favor do
clorofórmio devido ao seu odor desagradável, suas proprie-
dades irritantes e ao longo período de indução necessário.
O clorofórmio foi fabricado em 1831 pelo químico nor-
te-americano Samuel Guthrie. Por um século foi usado
na Grã-Bretanha até ser descoberta sua hepatotoxidade e
seus outros efeitos tóxicos, com a constatação de que causava
cinco vezes mais mortes do que o éter.
A Igreja pregava que a dor do parto é divina, chegan-
do a punir quem pedisse alívio da dor, até o momento em
que John Snow (1813-1858), o primeiro médico anestesista,
utilizou o alívio da dor num parto da rainha Vitória.
O desenvolvimento da anestesiologia como especia-
lidade se deve a Snow, que criou técnicas e analisou os
efeitos fisiológicos de diferentes anestésicos.
Nos últimos anos do século outros agentes foram in-
troduzidos: o cloroetileno para anestesias locais e a co-
caína, estudada por Carl Koller (1857-1944), em 1884 e
por Sigmund Freud (1856-1939). Em 1888, James Leonard
Corning (1855-1923), de Nova York, injetou cocaína no
espaço epidural e foi muito bem-sucedido. William Stewart
Halsted (1852-1922), em 1898, injetou-a nos troncos
nervosos. A cocaína foi a primeira substância injetada
no espaço raquidiano para produzir anestesia, contudo,
conhecidos seus efeitos nocivos, foi necessária uma in-
vestigação para o uso de novos agentes.
William Macewan (1848-1924) criou um tubo de metal
que, colocado na traquéia, facilitava o controle da respi-
ração e a aspiração de secreções, assim foi inventado o
tubo endotraqueal. No século XX a anestesia endotraqueal
evoluiu, permitindo o controle do fluxo de ar, oxigênio
e outros gases. Franz Kuhn (1866-1929), na Alemanha,
criou um tubo suficientemente flexível para ser inserido
pelo nariz, se necessário. Kuhn Dorrance e Henry Janeway
colocaram os balões infláveis e o laringoscópio em forma
de L com iluminação. O britânico Sir Ivan Magill (1888-
1986), em 1919, desenvolveu uma técnica surpreendente
para intubação, anestesiando a garganta com cocaína. Ralph
Waters (1883-1979), na Universidade de Wisconsin, em
1932, descobriu acidentalmente a intubação seletiva,
identificando sua utilidade. Arthur E. Guedel (1883-1956)
criou a cânula que hoje leva seu nome.
No início, os próprios cirurgiões faziam suas anestesias,
porém, com a crescente complexidade, a tarefa foi
transferida para técnicos especialistas e enfermeiras, que
se dedicavam inteiramente a essa tarefa. Em 1935, Francis
Hoeffer McMechan (1879-1939) alertou a necessidade
de o anestesista ser um médico capaz de tratar as com-
plicações da anestesia.
Sobretudo após a Primeira Guerra Mundial, vários gases
anestésicos estavam sendo descobertos. Depois do trilene,
em 1917, veio o etileno, em 1923, o éter divinílico, em
1931, o ciclopropano e o halotano, em 1956.
Os indígenas da América do Sul, muito antes de se-
rem descobertos, embebiam suas flechas em substâncias
retiradas de diversas plantas venenosas, que paralisavam
suas presas. Pedro Mártir de Anghera (1455-1526) des-
creveu esse efeito em 1516, porém passaram-se 170 anos
até que George Marcgrave nomeasse a substância como
curare. Somente em 1942 essa substância começou a ser
produzida em larga escala. Seu uso foi introduzido na
anestesia, sob a forma de relaxantes musculares, facili-
tando as cirurgias e permitindo o controle da respiração.
Emil Fischer (1852-1919), em 1903, em Berlim, foi
o primeiro a desenvolver barbitúricos injetáveis, sendo o
mais seguro o pentotal, desenvolvido em 1935. Eram
utilizados para indução de um sono agradável no pa-
ciente, antes da anestesia.
A anestesia local tem uma história mais longa. Por
volta de 400 a 700 a.C, os antigos indígenas do Peru já
conheciam os efeitos da folha de coca. O alemão Albert
Niemann (1834-1861) foi o primeiro a obter, em 1859,
cocaína pura e a dar esse nome à substância.
William S. Halsted, do Hospital John Hopkins, o mais
famoso cirurgião norte-americano, foi o principal res-
ponsável pelo emprego da cocaína como anestésico local.
Foi ele também quem introduziu o conceito de residên-
cia médica.
Heinrich Braun (1847-1911), em 1897, acrescentou
epinefrina à cocaína e diminuiu a quantidade de anes-
tésico necessário, reduzindo a sua toxicidade.
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A cocaína foi substituída por novocaína, em 1899,
pelo químico alemão Alfred Einhorn (1856-1917), uti-
lizada com finalidade anestésica, em 1905, por Braun.
MICROORGANISMOS E INFECÇÃO
Athanasius Kircher (1602-1680), um jesuíta do século
XVII, em Roma, observou, por meio de um microscópio
primitivo, queo vinagre e o leite fermentados conti-
nham “vermes” e que o sangue dos que morriam de peste
albergavam “animálculos”.
No século XIX, a idéia da geração espontânea, ou
seja, de que a vida provinha de uma substância inani-
mada, era muito difundida. No século XVII já haviam
descoberto que os vermes vinham de ovos depositados
por insetos, mas a idéia da geração pela putrefação e
fermentação estava muito sedimentada. No século XVIII,
Lázaro Spallanzani (1729-1799) demonstrou que nenhum
organismo se desenvolve se o líquido for aquecido e
protegido do ar ambiente.
Regnier de Graaf (1641-1673), médico e anatomista
que descobriu os folículos ovarianos, colocou a aten-
ção da comunidade médica, em 1673, sobre o holandês
Antoni van Leeuwenhoek (1632-1723), que não era médico,
nem professor, era um lojista, fabricante de microscópios.
A carta de número 18 de Leeuwenhoek, recebida por
Henry Oldenburg (1618?-1677), em outubro de 1676, e
publicada na Philosophical Transactions, em 1677,
descrevia microorganismos presentes na água e a sua
movimentação. Muitas outras cartas trouxeram inova-
ções importantíssimas. Ele chegou muito próximo do
conceito de germe causando doenças. Examinou seu próprio
sêmen, identificando os espermatozóides.
Trinta e nove anos após a morte de Leeuwenhoek,
o austríaco Marc von Plenciz (1705-1781) declarou que
as doenças contagiosas eram causadas pelos microor-
ganismos descobertos pelo holandês. Agostino Bassi
(1773-1836), da Itália, em 1835, demonstrou que a doença
do bicho da seda era provocada por bactérias e dedu-
ziu que outras doenças também o eram. Friedrich Henle
(1809-1885), o maior anatomista da Europa na época,
aprovou a descoberta, impressionando seu aluno Robert
Koch (1843-1910) cujas obras sedimentaram a desco-
berta de Leeuwenhoek, demonstrando as bactérias como
causadoras de doenças. Koch criou o meio de cultura
sólido, essencial para o isolamento delas. Mas seu feito
mais famoso foi a identificação do agente causador da
tuberculose.
Louis Pasteur (1822-1895), aos 25 anos, mesmo ten-
do sido considerado medíocre por seu avaliador, na
Universidade de Sorbonne, iniciou a ciência da estereo-
química. Em 1857, deixou a química para adentrar no
mundo microbiológico, estudando e quebrando a teoria
da geração espontânea. Ao solucionar um problema da
época com a fabricação da cerveja e do vinho, criou um
método hoje conhecido como pasteurização e se tornou
o cientista mais reverenciado do mundo. Descobriu, em
galinhas, o efeito de uma cultura envelhecida ou enfra-
quecida de cólera, iniciando a descoberta das vacinas.
Seguiu suas pesquisas criando a vacinação para o antraz,
em vacas e carneiros. Em 1882, passou a estudar a rai-
va. Não conseguiu achar o agente etiológico, causador
da doença, que se trata de vírus, mas criou uma vacina
eficaz no combate a essa doença.
No século XVIII, Charles White, na Inglaterra, e Joseph
Clarke e Robert Collins, na Irlanda, reduziram os índi-
ces da infecção pós-parto mediante higiene pessoal,
limpeza ambiental, limitação de exames vaginais e limpeza
contínua das camas e lençóis. Poucos, porém, aceita-
vam essa prática. Oliver Wendell Holmes (1809-1894),
em 1843, atribuiu a febre puerperal à infecção trans-
mitida pelos obstetras, de uma pessoa a outra, mas sua
teoria também não foi aceita. Ignaz Semmelweis (1818-
1865) demonstrou a natureza contagiosa da infecção
puerperal, analisando os casos nos pavilhões obstétri-
cos das Allgemeines Krankenhauses de Viena: na en-
fermaria das parteiras, a mortalidade era de 3%, enquanto
na dos estudantes de me-dicina chegava a 20% em al-
guns meses. Depois de muito estudar o assunto, con-
cluiu que essa diferença decorria do fato de os estudantes
virem diretamente da sala de autópsias para examinar
as pacientes. Semmelweis estudou também a morte de
um amigo que se machucou com um bisturi utilizado na
autópsia de uma paciente falecida por infecção puerperal
e concluiu que seus órgãos se apresentavam com as mesmas
alterações presentes na infecção puerperal. Instituiu a
higiene com hipoclorito de cálcio, diminuindo a taxa de
mortalidade para 2%. Apesar do sucesso clínico, o chefe
do serviço desaprovou seus métodos, chegando a limi-
tar suas atribuições na prática médica. Em 1861, dez anos
após a descoberta inicial, concluiu seu livro Die Aetiologie
der Begriff und die Prophylaxis des Kindbettfiebers,
hostilmente recebido pela classe médica.
Joseph Lister (1827-1912) borrifava ácido fênico (fenol)
sobre o paciente durante a operação, a fim de matar as
bactérias vistas por Pasteur em outras doenças, mas seu
relato, publicado em 1967, também foi recebido com
indiferença. Embora inicialmente a atenção estivesse
voltada ao uso do fenol e não à etiologia da infecção, os
cirurgiões alemães reconheceram o papel desempenha-
do pelas bactérias na infecção e viram a importância da
assepsia e da anti-sepsia. Os cirurgiões franceses ade-
riram rapidamente à nova teoria.
William Halsted (1852-1922) introduziu o uso de luvas
de borracha para proteger as mãos de sua enfermeira e
futura esposa na sala de cirurgia. Por sugestão de um
aluno, as luvas passaram a ser usadas também pelos
cirurgiões, já que podiam ser esterilizadas. Inicialmente
grossas e desconfortáveis, somente foram amplamente
aceitas após a introdução de uma borracha mais fina.
As máscaras foram introduzidas posteriormente. Gra-
dativamente passaram a ser aceitos gorros e avental, a
mesa cirúrgica passou a ser recoberta, os pacientes também,
bacias de bicloreto começaram a ser utilizadas para assepsia
e, finalmente, o centro cirúrgico passou a ser limpo e
asseado e, o ato cirúrgico, bem coordenado.
Paul Ehrlich (1854-1915) iniciou o conceito de uma
substância que localizasse e matasse um microorganis-
mo, sem destruir as células do organismo hospedeiro.
Em 1917, Heidelberg e W.A. Jacobs anunciavam que a
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Breve História da Cirurgia 1185-7241-561-0
sulfonamida destruía bactérias. Na Alemanha, Gerhard
Domagk (1895- 1964), que já havia provado a ativida-
de antibacteriana de vários corantes, descobriu que o
prontosil, corante têxtil sintetizado em 1908, atuava contra
Streptococcus em ratos. Na França, Jacques Tréfouël
(1897-1977) demonstrou que o prontosil induzia o or-
ganismo a produzir sulfonamida. Foram sintetizados
diversos derivados dessa substância: sulfapiridina,
sulfatiazol, sulfadiacina, sulfaguanidina e sulfamidas
solúveis. Em 1911, Richard Westling nomeou de Penicillium
notatum uma espécie de mofo que impedia o crescimento
de outras bactérias. Em 1921, Lieske, e pouco depois,
Gratia, comprovaram que uma classe de Penicillium
dissolvia o bacilo do antraz e impedia o crescimento de
estafilococos. Em 1929, René Jules Dubos (1901-1982)
isolou uma enzima de um microorganismo capaz de
decompor a cápsula protetora do bacilo causador de pneu-
monia, demonstrando, posteriormente, que essa subs-
tância, a tirotricina, é composta de dois polipeptídeos,
um dos quais, a gramicidina, veio a ser o primeiro anti-
biótico produzido comercialmente e utilizado clinica-
mente. Também em 1929, Alexander Flemming (1881-1955),
ganhador do Prêmio Nobel de 1945, publicou no British
Journal of Experimental Pathology, suas observações
sobre a ação antibacteriana do Penicillium e sugeriu que
a cultura do fungo podia ser utilizada para inibir o cres-
cimento bacteriano. Sir Howard Walter Florey (1898-
1968) e Ernst Boris Chain (1906-1979), na Inglaterra,
em 1941, conseguiram produzir, com ajuda do gover-
no, a penicilina de Flemming em quantidade para uso
terapêutico. Rapidamente, outros antibióticos foram
produzidos. A estreptomicina foi obtida por Selman
Waksman (1888-1973), em 1944, a partir do Streptomyces.
Por meio de outras cepas foram obtidas a cloromicetina
e a aureomicina. A partir de 1948, com a incorporação
de agentes similares, começou aparecer a resistência
bacteriana que conhecemos e, até hoje, combatemos.
CIRURGIA MODERNA
Quando a anestesia foi garantida não havia mais a limi-
tação imposta pela dor e necessidadede um procedimento
rápido, e as técnicas cirúrgicas aumentaram em número
e complexidade. Mas, por um período, a cirurgia con-
tinuava ameaçada pela infecção cirúrgica, impedindo um
progresso ainda maior. Após Lister, conseguiu-se che-
gar ao interior do organismo e iniciar a nova era da cirurgia.
A criação de sociedades cirúrgicas, com o intuito da
disseminação da informação, ajudou muito no pro-
gresso da cirurgia. A primeira a ser criada foi a Academie
Royale de Chirurgie, em Paris, com suas Mémoires,
idealizada por Pierre Dionis (1643?-1718) e publicada
esporadicamente de 1743 até 1838. O Colégio Americano
de Cirurgiões só foi fundado em 1913, por Franklin Martin
(1857-1935) e padronizado segundo os Colégios Reais
de Cirurgiões de Inglaterra, Irlanda e Escócia.
No final do século XIX, Albert Christian Theodor
Billroth (1829-1894), o cirurgião mais inovador da Europa
e fundador da Escola de Cirurgia de Viena, efetuou com
êxito as primeiras operações importantes de faringe, laringe
e estômago, sendo o primeiro a realizar a ressecção do
esôfago, em 1872, e do piloro, em 1881, para tratamen-
to do câncer. Seu Allgemeine chirurgische Pathologie
und Therapie alcançou onze edições. A natureza da
apendicite foi elucidada em 1886 por Reginald Heber
Fitz (1843-1913), de Boston, que descreveu a tiflite. James
Marion Sims (1813-1885), um dos fundadores da mo-
derna ginecologia, abriu a vesícula biliar. Victor Horsley
(1857-1916) acessou tumores cerebrais e da medula
espinhal. Carl Ruge (1846-1926) e Johann Veit intro-
duziram o método de corte por congelação para exame
anatomopatológico durante a cirurgia. Eduardo Bassini
(1844-1924) e muitos outros modificaram a cirurgia de
reparação da hérnia, para obterem melhores resultados.
Karl Thiersch (1822-1895) e Johann-Friedrich Dieffenbach
(1792-1847) aperfeiçoaram a cirurgia plástica. Sir Thomas
Spencer Wells (1818-1897), em 1858, Robert Lawson
Tait (1845-1899), em 1871, e Wilhelm Alexander Freund
(1833-1917), em 1878, desenvolveram técnicas cirúr-
gicas em ovários, trompa de Falópio e útero, e Porro,
em 1876, e Saenger, em 1882, alcançaram maior segu-
rança e eficácia nas cesarianas. Küchler, em 1855, e Wells,
em 1866, retomaram as esplenectomias que haviam sido
iniciadas séculos atrás com Adriano Zaccarelli, em 1549,
e Giuseppe Zambeccari, em 1680. Tal foi o progresso,
que na Primeira Guerra Mundial, com exceção das ci-
rurgias torácica e cardíaca, muitos dos procedimentos
eram semelhantes aos atuais. Em 1873, Ernst von Bergmann
(1836-1907) descreveu os traumatismos cerebrais. Em
1900, Ernst Wertheim (1864-1920) descreveu a cirur-
gia radical de histerectomia abdominal, modificada
posteriormente por Joe Vincent Meigs (1892-1963).
O descobrimento dos raios X (Fig. 1.3), em 1895,
por Wilhelm Röntgen (1845-1923), teve grande impacto
na cirurgia. Röntgen observou, ao acaso, que ao passar
uma corrente através de um tubo com vácuo, aparecia
uma fosforescência esverdeada em uma tela na prateleira.
Prosseguindo com experimentos, percebeu a existência
de raios invisíveis, que tinham a curiosa capacidade de
penetrar o corpo humano.
Muitos cirurgiões se destacaram em fins do século
XIX, como Emil Theodor Kocher (1841-1917), que ganhou
o Prêmio Nobel em 1909 por seus estudos na fisiologia,
patologia e cirurgia da glândula tireóide; os germânicos
Friedrich Trendelenburg (1844-1924), que propôs um
sinal, um sintoma, um teste, uma operação e uma posi-
ção, e Johann von Mikulicz-Radecki (1850-1905), o
primeiro a extirpar o câncer do cólon, em 1903; os franceses
Jules Péan (1830-1898), Just Lucas-Championière (1843-
1913) e Marin- Theodore Tuffiér (1857-1929); os in-
gleses Sir Frederick Treves (1853-1923), Tait e Macewen;
os italianos, mais notavelmente Bassini e Antônio Ceci
(1852-1920); os americanos William Williams Keen (1837-
1932), Nicholas Senn (1844-1908) e John Benjamin
Murphy (1857-1916), notáveis com o bisturi, explora-
ram essencialmente todas as cavidades do corpo huma-
no; William Halsted introduziu um novo conceito na
cirurgia, mostrando a pesquisa baseada em princípios
anatômicos, patológicos e fisiológicos, empregando o
estudo em animais, permitiu a pesquisa de procedimen-
tos cada vez mais complexos. Criou a chamada Escola
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12 Generalidades 85-7241-561-0
Halstediana, baseada nos princípios que considerava seguros
e adequados. A cirurgia plástica renasceu com Reverdin
(1870), Ollier (1872) e Karl Thiersch (1822-1895), sendo
possível recobrir grandes superfícies cruentas e remo-
ver cicatrizes deformantes com enxertos. Charles McBurney
(1845-1913) ficou famoso com sua incisão abdominal
para apendicite e com a descrição do ponto doloroso,
em 1889. Sir Berkeley Moyniham (1865- 1936), de Malta,
escreveu muito sobre cirurgia abdominal e sua pinça ainda
é largamente utilizada.
Em 1896, Ludwig Rehn (1849-1930) realizou, com
êxito, a primeira sutura cardíaca, dando início à cirur-
gia cardíaca; em 1897 operou o esôfago torácico, com
acesso via mediastino posterior e, em 1920, instituiu o
tratamento cirúrgico para pericardite calcificada. Daí em
diante diversas inovações foram incorporadas, como
técnicas de acesso ao tórax sob anestesia, métodos de
hiperpressão. Meltzer e Auer, em 1908, propuseram a
insuflação por meio de uma cânula endotraqueal delga-
da. O primeiro êxito na correção de anomalias valvares
ocorreu em 1923, com Elliott Carr Cutler (1888-1947)
e Samuel A. Levine, que dilataram uma válvula estenosada
por cicatrizes em uma menina. Finalmente, em 1940,
C. Bailey e D. Haven, nos Estados Unidos e H. Sellors
e R. Brock, na Inglaterra, conseguiram resultados mais
satisfatórios. Em 1952, C. Hufnagel implantou uma válvula
sintética. André Cournand (1895-1988), Dickinson
Woodruff Richards Jr. (1895-1973) e Werner Forssmann
(1904-1979) que autocateterizou uma veia mediana até
o coração, com ajuda de uma lâmpada fluoroscópica e
de um espelho, receberam juntos o Prêmio Nobel, em
1956, pelo cateterismo cardíaco. Robert Gross (1905-
1988) relatou, com sucesso, a primeira ligadura de um
canal arterial permeável, em 1939, e a ressecção de
coarctação da aorta com anastomose direta das bordas,
em 1945. John Gibbons (1903-1973) e sua esposa, após
19 anos de intensos esforços, construíram um coração-
pulmão artificial, que permitiu, em 1953, a operação
com um coração aberto.
Em 1900, o cirurgião alemão Hermann Pfannenstiel
(1862- 1909) descreveu a sua técnica para incisão ci-
rúrgica suprapúbica. William Mayo (1861-1939), no mesmo
ano, apresentou os seus resultados referentes a uma gas-
trectomia parcial. O tratamento do câncer de mama foi
radicalmente modificado com George Beatson (1848-
1933), na Escócia, que propôs, em 1901, a ooforectomia
e a administração de extrato de tireóide como uma possível
cura. John Finney (1863-1942), do Hospital Johns Hopkins,
em 1903, publicou um trabalho a respeito de um novo
método de gastroduodenostomia ou piloroplastia alar-
gada. Na Alemanha, Fedor Krause (1856-1937) publicou
a respeito de cistectomia total e uretrossigmoidostomia
bilateral. Em 1905, Hugh Hampton Young (1870-1945),
de Baltimore, apresentou os seus trabalhos a respeito
da prostatectomia radical para carcinoma. William Handley
(1872-1962), cirurgião do Hospital de Middlesex, em
Londres, publicou Cancer of the Breast and its Treatment,
em 1906, apresentando a teoria de que as metástases do
câncer de mama são decorrentes de disseminação por
meio dos vasos linfáticos. Nesse mesmo ano José Goyanes
(1876-1964), de Madri, utilizou enxerto venoso para
restabelecer o fluxo arterial. William Miles (1869-1947),
da Inglaterra, publicou seu primeiro trabalho a respeito da
operação de ressecção abdominoperineal em 1908, o mes-
mo ano em que Friedrich Trendelenburg (1844-1924)
tentou a embolectomia pulmonar. Três anos mais tarde,
o alemão Martin Kirschner (1879-1942) descreveu uma
haste para tração esquelética e estabilização dos frag-
mentos ósseos ou imobilização articular. Donald Balfour
(1882-1963), da Clínica Mayo, foi responsávelpela
importante operação para ressecção do cólon sigmóide,
da mesma maneira que William James Mayo (1861-1939),
para sua operação radical de carcinoma do reto, em 1910,
e herniorrafia umbilical e hernioplastia.
Figura 1.3 – Carta de Röntgen pedindo subsídios para continuar seus estudos (arquivo particular).
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Breve História da Cirurgia 1385-7241-561-0
Em 1911, Fred Albee (1876-1945), de Nova York,
começou a utilizar enxertos ósseos vivos como talas
internas. Pierre Fredet (1870-1946) e o alemão Wilhelm
Ramstedt (1867-1963), em 1912, descreveram a pilo-
romiotomia. Em 1913, Henry Janeway (1873-1921), de
Nova York, desenvolveu uma técnica para gastrostomia,
na qual envolvia a parede anterior do estômago em torno
de um cateter e o suturava no local, estabelecendo uma
fístula permanente. Hans Finsterer (1877-1955), pro-
fessor de cirurgia de Viena, melhorou a descrição de
Franz von Hofmeister (1867-1926) de uma gastrectomia
parcial com fechamento de uma porção da pequena
curvatura e anastomose retrocólica do restante do es-
tômago ao jejuno, em 1918. Thomas Dunhill (1876-
1957), de Londres, foi o pioneiro na cirurgia da tireóide,
principalmente na sua operação para o bócio exoftálmico,
em 1919. O canadense William Gallie (1882-1959) utilizou
fios confeccionados a partir da fáscia lata para a hernior-
rafia em 1923. Barney Brooks (1884-1952), professor
de cirurgia em Tennessee, apresentou inicialmente a
angiografia clínica e a arteriografia femoral em 1924.
Cinco anos depois, Reynaldo dos Santos (l880-1970),
urologista português, relatou a primeira aortografia
translombar. Cecil Joll (1885-1945), professor de cirurgia
em Londres, descreveu, na década de 1930, o tratamento
da tireotoxicose por meio de uma tireoidectomia subtotal.
Em 1931, George Cheatle (1865-1951), professor de
cirurgia em Londres e Max Cutler (1899-1984), de Nova
York, publicaram seu tratado Tumours of the Breast. Nesse
mesmo ano, Cutler detalhou o uso sistêmico de hormônio
ovariano no tratamento de mastite crônica. Nessa época,
Ernst Sauerbruch (1875-1951), da Alemanha, completou
a primeira intervenção cirúrgica com êxito de um aneurisma
cardíaco e Rudolph Nissen (1896-1981) ressecou total-
mente um pulmão bronquiectásico. Geoffrey Keynes (1887-
1982), em Londres, desenvolveu a base de oposição à
mastectomia radical, favorecendo o tratamento do câncer
de mama por radioterapia, em 1932. O cirurgião irlandês
Arnold Henry (1886-1962) criou, em 1936, um procedi-
mento cirúrgico para a hérnia femoral. Earl Shouldice
(1891-1965), de Toronto, foi quem iniciou primeiro, durante
os anos de 1930, a experimentação da correção da hérnia
inguinal com base no jaquetão de aponeurose unida por
fio de aço contínuo. René Leriche (1879-1955) (Fig. 1.4)
propôs uma arterectomia da artéria trombosada e,
posteriormen-te, uma simpatectomia periarterial para
melhorar o fluxo arterial. Leriche também fez, em 1940,
um enunciado da doença sindrômica aortoilíaca oclusiva
que leva o seu nome. Em 1939, Edward Churchill (1895-
1972), do Hospital Geral de Massachusetts, realizou uma
pneumonectomia segmentar para bronquiectasia. Clarence
Crafoord (1899-1984) foi o pioneiro do tratamento ci-
rúrgico da coarctação da aorta, em 1945. No ano seguin-
te, Willis Potts (1895-1968) completou uma anastomose
da aorta com a veia pulmonar para certos tipos de doen-
ça cardíaca congênita. Chester McVay (1911-1987) po-
Figura 1.4 – Receita do Professor Leriche (arquivo particular).
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14 Generalidades 85-7241-561-0
pularizou a correção das hérnias inguinais com base no
ligamento pectíneo, em 1948. Em Washington, Charles
Hufnagel (1916-1989) criou e introduziu, em 1951, a pri-
meira válvula cardíaca protética funcionante em um homem.
Nesse mesmo ano, Charles Dubost (1914-1991), de Pa-
ris, realizou a primeira ressecção bem-sucedida de um
aneurisma aórtico abdominal, com a colocação de um en-
xerto homólogo. Robert Zollinger (1903-1994) e Edwin
Ellison (1918-1970) descreveram o seu primeiro resumo
a respeito da adenomatose poliendócrina, em 1955. No
ano seguinte, Donald Murray (1894-1976) realizou o pri-
meiro homoenxerto valvular aórtico que obteve sucesso.
Uma mulher, Maude Abot (1869-1940), com sua clas-
sificação de malformações congênitas cardíacas, abriu
caminho para outra mulher, Helen Brooke Taussig (1898-
1986), futuramente conduzir a idéia da correção cirúrgica
das malformações, levada em prática pelo seu colega
Alfred Blalock (1899-1964). Outras mulheres se desta-
caram na cirurgia, como Mary Dixon Jones (1828-1908),
Emmeline Horton Cleveland (1829-1878), Mary Harris
Thompson (1829-1895), Anna Elizabeth Broomall (1847-
1931) e Mane Mergler (1851-1901).
Blalock, George Crile (1864-1943), Dallas Phemister
(1882-1951) e Charles Huggins (1901-1997) se torna-
ram “cirurgiões-cientistas” renomados. Huggins foi lau-
reado ganhador do Prêmio Nobel, em 1966, por seus
estudos no tratamento hormonal do câncer prostático.
Em 1924, foi introduzida a colecistografia por Evarts
Granam (1883-1957) e Warren Cole (1898-1990). Em
1935, foi descrita a duodenopancreatectomia para o câncer
de pâncreas, realizada por Allen Oldfather Whipple (1881-
1963) e, em 1943, a vagotomia para o tratamento cirúr-
gico da úlcera péptica, por Lester Dragstedt (1893-1976).
Frank Lahey (1880-1953) enfatizou a importância do
nervo laríngeo recorrente durante as tireoidectomias; Owen
Wangensteen (1898-1981), em 1932, descomprimiu com
êxito uma obstrução mecânica do cólon, utilizando um
novo aparelho de aspiração; George Vaughan (1859-1948)
realizou, com sucesso, a ligadura da aorta abdominal
para a doença aneurismática, em 1921; Max Peet (1885-
1949) apresentou uma ressecção esplâncnica para hi-
pertensão, em 1935; Walter Dandy (1886-1946) realizou
uma secção intracraniana de vários pares cranianos, nos
anos de 1920; Walter Freeman (1869-1972) descreveu
a lobotomia pré-frontal como um método de tratamento
de várias doenças mentais, em 1936; Harvey Cushing
(1869-1939) introduziu, em 1928, a eletrocoagulação
na neurocirurgia, além de descrever a síndrome e a úl-
cera que levam seu nome; Vilray Blair (1871-1955) e
James Brown (1899-1971) popularizaram a utilização de
enxertos cutâneos parciais para cobrir grandes áreas
de feridas em granulação; Earl Padgett (1893-1946) criou,
em 1939, um dermátomo operatório que permitia a
calibração da espessura dos enxertos cutâneos; Evarts
Ambrose Graham (1883-1957) completou a primeira
ressecção bem-sucedida de um pulmão inteiro em vir-
tude de câncer, em 1933; Claude Beck (1894-1971)
implantou o músculo peitoral no pericárdio e o uniu a
um enxerto pediculado de omento na superfície do cora-
ção, obtendo assim uma circulação colateral para o órgão,
em 1935, e John Alexander (1891-1954) ressecou, em
1944, um aneurisma sacular da aorta torácica.
Evidentemente, com o progresso e o aumento expo-
nencial de técnicas cirúrgicas, se tornou humanamente
impossível para um único cirurgião dominar todas elas
e, de forma natural, ocorreram a especialização e a sub-
especialização.
Emerich Ullmann (1861-1937), em Viena, no come-
ço do século (1902), transplantou um rim canino do seu
local normal para o colo, sendo um autotransplante bem-
sucedido. Posteriormente transplantou o rim de um cão
para uma ovelha, com êxito.
Carrel (1873-1944) nasceu em Saint Foy-Lès, Lyon.
Foi batizado com o nome Auguste, mas assim que o pai
dele faleceu em 1877, foi-lhe atribuído seu nome, Alexis,
conforme costume na época para honrar os mortos.
Interessou-se, desde cedo, pela técnica de sutura de vasos
em cães, idealizando o ponto triangular ancorado assim
como a agulha curva que vêm sendo utilizados, há décadas,
em microcirurgia vascular. Na adolescência, freqüen-
tou a roda de costura de sua mãe e, quando acadêmico,
voltou ao grupo para observar como as senhoras proce-
diam. Viu a aplicabilidade de sua técnica à cirurgia vascular
e, mesmo como estudante, publicou trabalhos expondo
suas experiências em animais nessesetor. Foi o primeiro
investigador norte-americano a receber o Prêmio Nobel
de Medicina e Fisiologia, em 1912. Retomou o traba-
lho de Ullmann e, junto com Charles Guthrie (1880-1963),
realizou, em 1905, um autotransplante de rim em um
cão que, posteriormente, morreu de falência renal. Jun-
to com Henry Drysdale Dakin (1880-1952), criou um
sistema para tratamento de feridas, com irrigação con-
tínua de líquido de Dakin.
As investigações sobre transplantes não sofreram avanços
importantes até que, em 1923, Carl Williamson compro-
vou que os fracassos eram decorrentes de um processo
biológico não identificado até então. Ele descreveu, mi-
croscopicamente, as características do tecido rejeitado.
Emile Holman (1909-1976) concluiu, nos anos de 1950,
que a rejeição decorria de um anticorpo específico.
Em 1954, uma equipe cirúrgica do The Peter Bent
Brigham Hospital, de Boston, transplantou um rim de
um gêmeo para seu irmão, com êxito.
O primeiro transplante de coração foi realizado em
1967, por Christian Barnard (1922-2001), no Groote Schuur
Hospital de Capetown, na África do Sul. Euryclides de
Jesus Zerbini (1912-1993), seis meses depois do sul-
africano, em 1968, realizou no Brasil o primeiro transplante
cardíaco na América Latina. Muitos sobreviveram, mas
a técnica foi abandonada em 1977 pois quase não havia
sobreviventes tardios.
O uso de corações mecânicos para substituir comple-
tamente os corações doentes foi introduzido em animais
por Tetsuzo Akutsu e Willem Kolff em 1958 e, mais tar-
de, por Michael DeBakey (1908- ). Em 1969, Denton Cooley
(1920- ) empregou um coração artificial por dois dias,
enquanto aguardava um coração para o transplante.
Philip Bozzini (1773-1809), em 1806, visualizou a
uretra por meio de um tubo e luz de vela, aparelho nomeado
Lichtleiter, mas nunca o testou em humanos. Segeles e
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Breve História da Cirurgia 1585-7241-561-0
Antoine Jean Desormeaux, em 1867, descreveram a con-
centração de luz com espelhos, em aparelho semelhante
ao Lichtleiter, para visualização urogenital. George Kelling,
em 1901, foi o primeiro a descrever a endoscopia e a
Koelioskopie em cães, criando pneumoperitônio com ar
filtrado e visualizando a cavidade pelo citoscópio (la-
paroscópico) por intermédio de trocarte. Hans Christian
Jacobaeus (1879-1937), em 1910, esvaziava a ascite em
humanos e a substituía por ar, criando o termo Laparo-
thorakoskopie. Descreveu também a inspeção das cavi-
dades peritoneal, torácica e pericárdica em humanos.
Richard Zollikoffer passou a utilizar o CO
2
 para insuflação,
com absorção mais rápida e fácil. Janos Veress, em 1938,
criou, com o propósito de confecção de pneumotórax
para tratamento de tuberculose, a agulha que hoje é cha-
mada de Veress, utilizada para a criação de pneumo-
peritônio. Em 1960, o alemão Kurt Karl Stephan Semm
(1927-2003) inventou um insuflador automático. Em
1971, Jordan M. Phillips fundou a American Association
of Gynecological Laparoscopist. Com o advento de óticas
de excelente qualidade e aparelhos de vídeo, a laparoscopia
passou a ser videolaparoscopia, deixando de ser uma
cirurgia egoísta, com a possibilidade da participação de
toda a equipe. Assim, na década de 80, passou a ser um
procedimento mais aceito, principalmente após a pri-
meira colecistectomia videolaparoscópica, realizada por
Philippe Mouret, em Lyon, na França, em 1987.
A CIRURGIA NO BRASIL
Nosso país, colonizado sem intenção de desenvolvimento,
teve todas as formas de cultura, arte e informação atrofiadas,
inclusive a medicina. Em 1792, por exemplo, no Rio de
Janeiro, havia apenas uma livraria com obras de teolo-
gia e um livreiro que distribuía somente obras da medicina
portuguesa.
A medicina, praticada pelos curandeiros se baseava
na diversidade cultural, ocasionando uma fusão da tra-
dição popular do colono branco, das práticas mágicas
ou empíricas do africano e do índio e dos conhecimen-
tos dos jesuítas e dos raros médicos licenciados. Barbeiros
se faziam cirurgiões, negras idosas eram parteiras e os
charlatões se disseminavam.
Poucos médicos habitaram o Brasil colonial e desses
temos poucas informações. Em 1553, Jorge Valladares
foi nomeado cirurgião-mestre. Afonso Mendes, cirur-
gião-mor em Lisboa, foi nomeado, em 1557, cirurgião
no Brasil. O cargo de cirurgião-mor foi criado, em 1260,
por D. Afonso III, cabendo ao titular chefiar os cirur-
giões das tropas e fiscalizar as “artes físicas e cirúrgicas”.
Na primeira metade do século XVIII, viveu, em Recife,
o cirurgião Manoel dos Santos, autor da Narração His-
tórica sobre as Calamidades de Pernambuco desde o
Anno de 1707 a 1715. José Antonio Mendes, cirurgião-
aprovado e comissário do cirurgião- mor em toda América,
publicou, em 1771, em Lisboa, um livro que pretendia
suprir as deficiências de um Brasil sem médicos: Go-
verno da Medicina mui Necessário para os que Vivem
Distantes de Professores Seis, Oito e Mais Léguas. José
Cardoso de Miranda, cirurgião natural de S. Martinho
de Cambres, Termo de Lamego, falecido em 1773, fixou-se
na Bahia e publicou Relatório Cirúrgico e Médico, no
Qual se Trata e Declara Especialmente um Novo Methodo
para Curar Infecção Escorbutica ou Mal de Loanda.
Matheus Saraiva veio para o Brasil em 1713 como ci-
rurgião-mor e médico do presídio da Saúde.
George Marcgrave (1610-1643), nascido na Saxônia,
mesmo tendo estudado medicina em Leyden, veio ao
Brasil como astrônomo na expedição de Maurício de
Nassau. Publicou Historia Naturalis Brasiliae, descre-
vendo centenas de exemplares de nossa fauna e flora.
Nos primeiros séculos, a realização de autópsias era
vedada, com algumas exceções. Willem Piso, no século
XVII, no território sob dominação holandesa, a salvo
da Inquisição, praticou as primeiras necropsias de que
se tem notícia.
Em fins do século XVII, começou a diferenciação
entre “cirurgião-barbeiro” e “barbeiro” e o ensino era
baseado no trabalho como “aprendiz-de-cirurgião” ou
em hospitais, que formavam os “cirurgiões-aprovados”.
Muitos dos que exerceram a cirurgia no Brasil provi-
nham do Hospital Real de Todos os Santos, em Lisboa.
Antônio José de Souza Pinto, em 1790, ensinou ana-
tomia e cirurgia na Santa Casa da Misericórdia do Rio
de Janeiro e no Hospital Real Militar do Morro do Castelo.
Manoel José Estrella lecionou, em 1808, cirurgia espe-
culativa e prática no Hospital Militar e no Hospital Santa
Casa de Misericórdia da Bahia.
Em 18 de fevereiro de 1808, no antigo Colégio dos
Jesuítas, foi fundada a Faculdade de Medicina da Bahia
e, no mesmo ano, a Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro, o que remonta à transferência da Corte Real
Portuguesa para o Brasil, em 1808.
Os cirurgiões continuavam em situação de inferiori-
dade em relação aos médicos. Porém, em 1848, um decreto
legislativo os considerou habilitados para exercitarem
livremente em todo o Brasil qualquer dos ramos da ciência
médica, os antigos cirurgiões-aprovados e os formados
nas academias médico-cirúrgicas, sendo o fim da dis-
criminação entre médicos e cirurgiões, passando estes
a gozar do mesmo status social e das mesmas regalias
que aqueles.
No século XIX muitos cirurgiões se destacaram, entre
eles, José Corrêa Picanço, João Alves Carneiro, Luiz
de Sant’Anna, Domingos Ribeiro dos Guimarães Peixoto,
Estácio Gularte, Manoel Feliciano e muitos outros.
Candido Borges Monteiro (1812-1872) escreveu sobre
hérnias, queimaduras, cálculos vesicais e descreveu, em
1845, o primeiro caso de ligadura de aorta abdominal
num homem vivo, na América. Antônio da Costa
(1816-1860) publicou sobre o estreitamento da uretra e
a primeira cirurgia de ressecção completa do maxilar
superior direito e parte do esquerdo. Manoel da Gama
Lobo (1835-1883) foi um exímio cirurgião oftalmolo-
gista e publicou muito sobre o assunto. Oscar Bulhões
(1845-1898) estudou com Billroth, Langenbeck e
Bardeleben, e publicou, em 1881, entre outros traba-
lhos, Differentes methodos e processos que tendem a
diminuir o domínio do bisturi. Em 1886, junto com o
Barão de Pedro Afonso, Franco operouo presidente
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Prudente de Morais, sendo essa operação a primeira cis-
tolitotomia suprapúbica bem-sucedida no Rio de Janei-
ro. Visconde de Sabóia (1835-1909) discorreu sobre
anestesia cirúrgica, fraturas complicadas, histerectomia,
salpingectomia, ooforectomia e muitos outros assuntos.
Seu trabalho Traité theorique et pratique de la science
et de l’art dês accouchement, publicado em 1873, foi ado-
tado como compêndio nas faculdades de Montpellier
e de Liège. Arnaldo Vieira de Carvalho foi o pioneiro
na capital paulista e também no Brasil, da osteossínte-
se, da gastrectomia total (1900) e da ressecção intesti-
nal com o botão de Murphy (1895), um botão metálico
que unia as partes terminais do intestino cortado. Carlos
José Botelho praticou pela primeira vez, em 1883, a
esofagotomia para a extração de uma dentadura que o
paciente engolira quinze dias antes e ficara entalada na
porção superior, na altura do pescoço.
Alguns médicos, não cirurgiões, com feitos tão gran-
diosos que merecem ser lembrados são Chagas, Oswaldo
Cruz e Vital Brazil. Carlos Ribeiro Justiniano Chagas
(1879-1934) descreveu a tripanossomíase americana,
doença que hoje leva seu nome. Oswaldo Gonçalves Cruz
(1872-1916), responsável pela primeira campanha de
vacinação no Brasil, que provocou a Revolta da Vacina,
conseguiu erradicar do Rio de Janeiro a febre amarela,
a peste bubônica e a varíola. Vital Brazil Mineiro da
Campanha (1865-1950), nascido em Campanha, Minas
Gerais, dedicou- se com tal afinco pela ciência que chegou
a contrair, durante seus trabalhos, peste bubônica e fe-
bre amarela. Em 1898, no Instituto Bacteriológico de
São Paulo, preparou os primeiros soros eficazes contra
os venenos de crotalos e bothrops. No ano seguinte,
Adolpho Lutz (1855-1940) sugeriu ao governo a cria-
ção de um instituto soroterápico, que veio a ser o Ins-
tituto Butantan, oficializado em 1901 e dirigido por Vital
Brazil, que, em 1919, mudou-se para Niterói, onde fun-
dou o Instituto de Higiene, Soroterapia e Veterinária,
hoje Instituto Vital Brazil. Várias de suas obras se des-
tacaram, como O ofidismo no Brasil (1906) e A defesa
contra o ofidismo (1911). Ao se tornar “imortal”, teve
seu nome “abrasileirado”: de Dr. Vital Brazil passou a
ser chamado Dr. Vital Brasil.
Em 1842, Candido Borges Monteiro, futuro visconde
de Itaúna, efetuou pela quarta vez no mundo a li-
gadura da aorta abdominal para tratamento de volumoso
aneurisma da artéria ilíaca externa. Em 1847, Roberto
Jorge Haddock Lobo, no Rio de Janeiro, administrou a
primeira anestesia utilizando éter sulfúrico. O clorofórmio
foi utilizado pela primeira vez, em 1848, na Santa Casa
de Misericórdia do Rio de Janeiro, pelo professor Ma-
nuel Feliciano Pereira de Carvalho. Em 1866, Pacífico
Pereira, na Bahia, realizou a excisão de um osteoma
sublingual da mandíbula, aplicando éter tópico na mucosa,
com congelação local e vasoconstrição. Em 1903, as pri-
meiras fichas anestésicas foram feitas na Santa Casa de
Misericórdia do Rio de Janeiro. Em 1943, E. de Souza,
no Rio de Janeiro, inventou um dispositivo que foi in-
troduzido no mercado por MacIntosh, em 1950, para
saber se a agulha havia chegado ao espaço peridural.
Em 1944, Oswaldo Vital preparou alcalóides do
chondrodendron platyphyll, que possui ação relaxante
do músculo esquelético. Em 1952, Kentaro Takaoka
desenhou e fabricou o primeiro miniventilador portátil.
Na história moderna da cirurgia brasileira, diversos
nomes se destacaram. Alguns dos muitos que merecem
ser lembrados são: Arnaldo Vieira de Carvalho (1867-
1927), que renovou os métodos cirúrgicos em São Paulo,
introduzindo as novidades científicas, e praticou, pela
primeira vez no país, a gastrectomia. Alfonso Bovero
(1871-1937) e Renato Locchi (1896-1978) foram res-
ponsáveis pela formação da escola anatômica de São
Paulo. Alípio Corrêa Netto (1898-1988) (Fig. 1.5), um
dos poucos professores universitários que instituíram
uma escola verdadeiramente brasileira, introduzindo a
idéia inicial das especialidades cirúrgicas, foi discípulo
de João Alves de Lima (1872-1934), que introduziu a
neurocirurgia no nosso meio. Alípio é paradigma em
publicações, pois, muito mais do que publicar artigos e
livros, ele “publicou homens”. Em 1934, Silva Santos
publicou, na revista Brasil Médico, um trabalho intitulado
“Um coração no pé”, no qual ressaltava o papel da palmilha
venosa na circulação de retorno. São nomes que mere-
cem ser lembrados porque trouxeram contribuições valiosas
à medicina brasileira.
DANDO FUTURO AO PASSADO
Obviamente, em uma breve história da cirurgia, com
pesar, muitos nomes e fatos históricos importantes são
omitidos, no entanto, não desmerecendo seu valor, pois
toda descoberta, mesmo que falha, é válida. Maior atenção,
Figura 1.5 – Alípio Corrêa Netto, figura por Nabih Mitaini (arquivo
particular).
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Breve História da Cirurgia 1785-7241-561-0
porém, foi dada aos fatos e às pessoas que colaboraram
para que outros avanços ocorressem.
Com a proliferação de cirurgiões, especialidades e
subespecialidades, fica cada vez mais difícil a projeção
única de uma pessoa como mestre da cirurgia, assim
como ocorria antigamente. O futuro será marcado por
aqueles que se destacarem dentro das especialidades e
subespecialidades e pelos avanços tecnológicos capa-
zes de alterar o rumo da cirurgia, como as cirurgias mini-
mamente invasivas e os tratamentos clínicos para doenças
atualmente cirúrgicas.
A endocirurgia e a microcirurgia são, hoje, as gran-
des novidades na cirurgia, mas como a nanotecnologia
está sendo pesquisada, elas provavelmente serão subs-
tituídas. Novos diagnósticos e tratamentos genéticos
também resultarão na correção de um problema antes
de sua manifestação.
Sobrará, no futuro, para o cirurgião, o que iniciou a
arte da cirurgia na história: o trauma, que por muito tempo
ainda necessitará de correção cirúrgica e da habilidade
e do conhecimento do cirurgião, auxiliado, talvez, pela
precisão dos robôs e computadores.
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