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TÍTULO subtítulo anÁLisES, reFlEXõEs e pERsPecTIvaS Tayson Ribeiro Teles organizador Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129 L727 Língua(gens), literaturas, culturas, identidades e direitos indígenas 1.ed. no Brasil: análises, reflexões e Perspectivas [livro eletrônico] / organização Tayson Ribeiro Teles. – 1.ed. – Curitiba-PR: Editora Bagai, 2021. E-book. Bibliografia. ISBN: 978-65-89499-57-2 1. Análises e reflexões. 2. Culturas – Identidades indígenas. 3. Direitos indígenas. 4. Linguagens e literatura indígena. I. Teles, Tayson Ribeiro. 04-2021/65 CDD 306.8 Índice para catálogo sistemático: 1. Cultura indígena 306.8 https://doi.org/10.37008/978-65-89499-57-2.23.04.21 Este livro foi composto pela Editora Bagai. www.editorabagai.com.br /editorabagai /editorabagai contato@editorabagai.com.br ISBN 978-65-89499-57-2 9 786589 499572 > https://editorabagai.com.br https://editorabagai.com.br https://www.instagram.com/editorabagai/?hl=pt-br https://www.instagram.com/editorabagai/?hl=pt-br https://www.facebook.com/editorabagai/ https://www.facebook.com/editorabagai/ malito:contato@editorabagai.com.br malito:contato@editorabagai.com.br Tayson Ribeiro Teles organizador LÍNGUA(GENS), LITERATURAS, CULTURAS, IDENTIDADES E DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL: análises, reflexões e perspectivas 1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autores Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai. O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões gramaticais, sistema de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es). Editor-Chefe Cleber Bianchessi Revisão Os autores Imagem da Capa https://anamendina.blogspot.com/2014/08/amazonia-brasil.html?spref=pi Projeto Gráfico Alexandre Lemos Conselho Editorial Dr. Adilson Tadeu Basquerote – UNIDAVI Dr. Ademir A Pinhelli Mendes – UNINTER Dr. Anderson Luiz Tedesco – UNOCHAPECÓ Dra. Andréa Cristina Marques de Araújo - CESUPA Dra. Andréia de Bem Machado – UFSC Dra. Andressa Graziele Brandt – IFC - UFSC Dr. Antonio Xavier Tomo - UPM - MOÇAMBIQUE Dra. Camila Cunico – UFPB Dr. Carlos Luís Pereira - UFES Dr. Cledione Jacinto de Freitas – UFMS Dra. Clélia Peretti - PUCPR Dra. Daniela Mendes V da Silva – SEEDUCRJ/UCB Dra. Denise Rocha – UFC Dra. Elnora Maria Gondim Machado Lima - UFPI Dra. Elisângela Rosemeri Martins – UESC Dr. Ernane Rosa Martins – IFG Dr. Everaldo dos Santos Mendes - PUC-Rio – ISTEIN - PUC Minas Dr. Helio Rosa Camilo – UFAC Dra. Helisamara Mota Guedes – UFVJM Dr. Humberto Costa - UFPR Dr. Juan Eligio López García – UCF-CUBA Dr. Juan Martín Ceballos Almeraya - CUIM-MÉXICO Dra. Karina de Araújo Dias – SME/PMF Dra. Larissa Warnavin – UNINTER Dr. Luciano Luz Gonzaga – SEEDUCRJ Dr. Luiz M B Rocha Menezes – IFTM Dr. Magno Alexon Bezerra Seabra - UFPB Dr. Marciel Lohmann – UEL Dr. Márcio de Oliveira – UFAM Dr. Marcos A. da Silveira – UFPR Dra. María Caridad Bestard González - UCF-CUBA Dr. Porfirio Pinto – CIDH - PORTUGAL Dr. Rogério Makino – UNEMAT Dr. Reginaldo Peixoto – UEMS Dr. Ricardo Cauica Ferreira - UNITEL - ANGOLA Dr. Ronaldo Ferreira Maganhotto – UNICENTRO Dra. Rozane Zaionz - SME/SEED Dra. Sueli da Silva Aquino - FIPAR Dr. Tiago Eurico de Lacerda – UTFPR Dr. Tiago Tendai Chingore - UNILICUNGO - MOÇAMBIQUE Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS SUMÁRIO APRESENTAÇÃO .................................................................................7 O CURRÍCULO ESCOLAR DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL COMO COLONIALIDADE DO PODER DA CULTURA EUROPEIA CRISTÃ ................................................................................................11 Cleuma Roberta de Souza Marinho | José Adnilton Oliveira Ferreira ENTRE SILVESTRES E EXÓTICOS: OS ANIMAIS DENTRO DA CULTURA CHIQUITANA .................................................................28 Denildo da Silva Costa MITO E LITERATURA: UMA LEITURA DA NARRATIVA COM A NOITE VEIO O SONO (2011), DE LIA MINÁPOTY .........................35 Francisco Bezerra dos Santos | Karen Rafaela da Silva Cordeiro POESIA INDÍGENA DE TIAGO HAKIY: UMA ECOLOGIA DE SABERES ...........................................................................................47 Rosemar Eurico Coenga | Anna Mari Ribeiro F. Moreira da Costa A ORDEM DO DISCURSO BIOMÉDICO: SILENCIAMENTO, TRADUÇÃO E FALA EM LÍNGUA INDÍGENA ...............................59 Conrado Neves Sathler | Jéssica Camile Felipe Tivirolli DIREITOS FUNDAMENTAIS INDIGENAS E A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DAS TERRAS TRADICIONALMENTE OCUPADAS NO BRASIL ................................................................... 71 Edson Antônio Baptista Nunes A COMISSÃO NACIONAL DE POLÍTICA INDIGENISTA (CNPI): UM BREVE CAPÍTULO DA HISTÓRIA RECENTE DO INDIGENISMO BRASILEIRO ..........................................................82 Saulo Ferreira Feitosa | Rosane Freire Lacerda A COMPLEXIDADE DO RECONHECIMENTO JURÍDICO DE COMUNIDADES INDÍGENAS NÃO ALDEADAS E NÃO VIVENTES EM TERRAS INDÍGENAS OFICIALMENTE RECONHECIDAS PELO ESTADO ....................................................96 Tayson Ribeiro Teles OS ÍNDIOS E O NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO- AMERICANO: PERSPECTIVAS PREVISTAS PELA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988 NA ERA DA TECNODIVERSIDADE .................................................................... 109 Eduarda Aparecida Santos Golart | Ingra Etchepare Vieira | Valéria Ribas do Nascimento OS REFUGIADOS AMBIENTAIS DE BELO MONTE: A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS À CIDADANIA INDÍGENA ............ 120 Alex Gaspar de Oliveira | Eliane Cristina Pinto Moreira VISÃO SISTÊMICA: PERCEPÇÕES DA ECOLOGIA E CIDADES INTELIGENTES ................................................................................ 131 Carlos Alberto Machado Gouveia | Nádia Leite Medeiros | Eujácio Lopes Filho “VAMOS BRINCAR DE ÍNDIO”: BNCC E APROPRIAÇÃO CULTURAL INDÍGENA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ...............................................................................140 Sadrack Oliveira Alves | Márcio Evaristo Beltrão O DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIAS ATIVAS NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO PARA OS INDÍGENAS DO ESTADO DO ACRE ...........................................................................152 Müller Padilha Gonçalves | Dion Alves de Oliveira | Simone de Freitas Ferreira Alves DO ACESSO À PERMANÊNCIA: REFLEXÕES SOBRE AS POLÍTICAS AFIRMATIVAS PARA INDÍGENAS ESTUDANTES NO ENSINO SUPERIOR ................................................................. 163 Berenice Schelbauer Do Prado INDIGENOUS RIGHTS, NECROPOLITICS AND THE “DAILY GENOCIDES” OF BRAZIL’S NATIVE AND TRADITIONAL PEOPLES ...........................................................................................172 Erick da Luz Scherf | Marcos Vinicius Viana da Silva | José Everton da Silva SOBRE O ORGANIZADOR .............................................................. 181 ÍNDICE REMISSIVO ........................................................................182 7 APRESENTAÇÃO O presente livro reúne 15 estudos que versam sobre perspectivas inter, trans e multidisciplinares sobre questões indígenas. Meu objetivo, enquanto organizador desse livro, é, precipuamente, defender a promoção e a proteção do direito à liberdade dos povos indígenas. Em outro trabalho, certa vez, eu disse: “Não se trata de tolerância para com os indígenas. Tolerância tem a ver com “suportar”. Trata-se de respeito” (TELES, 2017, p. 77)1. Eu gosto muito dos povos indígenas. Meu avô materno, que faleceu neste 2021, aos 79 anos, Onório Ribeiro da Silva, era/é um indígena nascido no Peru, na fronteira com o Acre, onde nasci e moro atualmente. Acredito na força dos indígenas enquanto integrantes da origem detodos nós brasileiros. Falar/escrever sobre eles é imprescindível. Passo agora a apresentar os capítulos do livro, os quais, nas suas particu- laridades, problematizam sobre tudo isso que eu lhe falei, caro(a) leitor(a). No Capítulo 1 - O currículo escolar dos povos indígenas no Brasil como colonia- lidade do poder da cultura europeia cristã, de autoria de Cleuma Roberta de Souza Marinho e José Adnilton Oliveira Ferreira, os autores erigem um histórico de como os colonizadores europeus, ao chegarem ao Brasil, agiram tentando “civilizar” os povos indígenas, por meio da educação. Uma educação que não respeitou as culturas indígenas e que tentou apagá-las, rumo à ideia de criar uma identidade nacional una. No Capítulo 2 - Entre silvestres e exóticos: os animais dentro da cultura chiquitana, de autoria de Denildo da Silva Costa, o autor comenta sobre a importância de alguns animais para o povo chiquitano, indígenas que vivem na Bolívia e, no Brasil, em regiões do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. O autor nos mostra a relevância de alguns animais para aspectos culturais, para rituais, para crenças religiosas e para a culinária desse povo. No Capítulo 3 - Mito e literatura: uma leitura da narrativa Com a noite veio o Sono (2011), de Lia Minápoty, de autoria de Francisco Bezerra dos Santos e Karen Rafaela da Silva Cordeiro, os autores analisam uma produção literária de Lia Minápoty, a qual é uma representante das muitas mulheres indígenas escritoras de origem Maraguá. A autora analisada nasceu na aldeia Yãbetue’y, na área indígena Maraguapagy, no rio Abacaxis-AM. Os autores nos mostram como, atualmente, a literatura absorve mitos indígenas. No Capítulo 4 - Poesia indígena de Tiago Hakiy: uma ecologia de saberes, de autoria de Rosemar Eurico Coenga e Anna Mari Ribeiro F. Moreira da Costa, os autores analisam as obra literária A pescaria do curumim e outros poemas indígenas, de Tiago Hakiy (2015). O autor analisado pertence à etnia Sateré Mawé, habitante da Terra Indí- gena Andirá-Marau, no médio rio Amazonas. Os autores concluem que Tiago 1 TELES, Tayson Ribeiro. Políticas públicas indígenas brasileiras: elevado planejamento e ineficaz implemento. São Paulo: Ixtlan, 2017. 8 Hakiy possui, no texto analisado, uma escrita decolonial, porquanto valoriza a fauna e a flora do território do povo indígena Sateré Mawé, em um movimento que intensifica a ideia de que somos parte integrante da natureza. Por fim, os autores acreditam que textos de autores indígenas devem ser mais utilizados nos ambientes escolares, a fim de valorizarmos a diversidade cultural do Brasil. No Capítulo 5 - A ordem do discurso biomédico: silenciamento, tradu- ção e fala em língua indígena, de autoria de Conrado Neves Sathler e Jéssica Camile Felipe Tivirolli, os autores comentam sobre as relações dos povos Kaiowá, Guarani e Terena com os servidores de um hospital localizado em Dou- rados (MS). Os autores afirmam que não há valorização das línguas indígenas durante os atendimentos médicos de indígenas por servidores não indígenas. Os indígenas são, assim, marginalizados, bem como seus saberes médicos tradicionais não são respeitados dentro do hospital analisado. No Capítulo 6 - Direitos fundamentais indigenas e a proteção constitucional das terras tradicionalmente ocupadas no Brasil, de autoria de Edson Antônio Baptista Nunes, o autor nos faz uma revisão teórica sobre o direito dos povos indígenas brasileiros às terras que eles ocupam tradicionalmente. O autor defende que esse direito é um direito fundamental. No Capítulo 7 - A Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI): um breve capítulo da história recente do indigenismo brasileiro, de autoria de Saulo Ferreira Feitosa e Rosane Freire Lacerda, os autores fazem um retros- pecto da luta do movimento indígena brasileiro no período recente, do fim do século XX até a atualidade, com ênfase na fase de criação da CNPI. Conforme os autores, o entulho do indigenismo fundado na colonialidade, herdado pela Funai do SPI, ainda influencia certas políticas governamentais, revelando a necessidade de descolonização tanto das práticas dos agentes estatais quanto da própria estrutura do Estado brasileiro. No Capítulo 8 - A complexidade do reconhecimento jurídico de comunidades indígenas não aldeadas e não viventes em terras indígenas oficialmente reconhecidas pelo estado, de minha autoria, eu engendro uma reflexão sobre como o Estado brasileiro faz para reconhecer os direitos dos indígenas que não vivem em comunidades indígenas reconhecidas legalmente. Eu foco no dilema da autodeclaração indígena, da questão fenotípica e da heteroidentificação dos indígenas. No Capítulo 9 - Os índios e o novo constitucionalismo latino-americano: perspectivas previstas pela constituição brasileira de 1988 na era da tecnodi- versidade, de autoria de Eduarda Aparecida Santos Golart, Ingra Etchepare Vieira e Valéria Ribas do Nascimento, as autoras problematizam se a nossa Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é uma Constituição forjada no âmbito do que se chama de Novo Constitucionalismo Latino-A- mericano, um movimento que inspirou Constituições na América Latina que reconhecem a diversidade dos povos, incluindo os indígenas como elementos basilares das nações, a exemplo das Constituições da Bolívia e do Equador. No 9 Capítulo 10 - Os refugiados ambientais de Belo Monte: a violação dos direitos à cidadania indígena, de e autoria de Alex Gaspar de Oliveira e Eliane Cristina Pinto Moreira, os autores analisam alguns impactos ocasionados aos povos indígenas do Pará a partir da construção da Hidroelétrica de Belo Monte. Os autores concluem que os indígenas impactados foram alçados à categoria de refugiados ambientais e, a partir disso, praticamente perderam suas cidadanias indígenas. Nesse sentido, deve o Estado agir em prol de reparar isso. No capítulo 11 - Visão sistêmica: percepções da ecologia e cidades inte- ligentes, de autoria de Carlos Alberto Machado Gouveia, Nádia Leite Medeiros e Eujácio Lopes Filho, os autores problematizam como as nossas cidades podem ser mais conectadas e inteligentes a partir da ótica do desenvolvimento sus- tentável ou durável, perpetuando o resgate dos costumes, culturas indígenas e conhecimentos que foram esquecidos com a vinda das pessoas para o ambiente urbano, de produção, de integração com natureza, como o biomimetismo, na arquitetura integrada com os ambientes pensando na sustentabilidade. Nesse sentido, eles analisam o formato das aldeias dos povos do Xingu. No Capítulo 12 - “Vamos brincar de índio”: BNCC e apropriação cultural indígena nos anos iniciais do ensino fundamental, de autoria de Sadrack Oliveira Alves e Márcio Evaristo Beltrão, os autores investigam na Base Nacional Comum Curricular perspectivas que podem incentivar uma abordagem positiva dos povos indígenas e suas culturas nas escolas de ensino fundamental, no sen- tido de valorizá-las (as culturas indígenas) e não apenas de caricaturá-las e estigmatizá-las, como ocorrem quando, em certas ocasiões, nos fantasiamos de indígenas, por exemplo. No Capítulo 13 - O desenvolvimento de metodologias ativas no ensino de Administração para os indígenas do estado do Acre, de autoria de Müller Padilha Gonçalves, Dion Alves de Oliveira e Simone de Freitas Ferreira Alves, os autores teorizam ser possível no ensino de temas de Administração para comunidades indígenas do/no estado do Acre, fazer uso de Metodologias Ativas de Ensino. Os autores afirmam que tais metodologias tornam o ensino mais atrativo para os indígenas e promovem mais atividades práticas, havendo interação com as práticas culturais dos indígenas.No Capítulo 14 - Do acesso à permanência: reflexões sobre as políticas afirmativas para indígenas estudan- tes no ensino superior, de autoria de Berenice Schelbauer Do Prado, a autora analisa detidamente, inclusive com estatísticas, o implemento da política de cotas para ingresso nas instituições educacionaisde ensino superior brasileiras, em relação aos cotistas na/da “categoria” indígenas. A autora conclui que de 2013 a 2018 aumentou o número de indígenas nas instituições de ensino superior. Segundo a autora, porém, muito ainda precisa ser feito/garantido pelo Estado aos indígenas, bem como não se sabe se todos os indígenas que ingressam no ensino superior saem dele formados. 10 Por fim, no Capítulo 15 - Indigenous rights, necropolitics and the “daily genocides” of Brazil’s native and traditional peoples, de autoria de Erick da Luz Scherf, Marcos Vinicius Viana da Silva e José Everton da Silva, os autores narram que há, atualmente, no Brasil, uma tentativa diária de exterminar os povos indígenas e outras comunidades indígenas ou tradicionais do país e tal tentativa é liderada por forças neoliberais e necropolíticas, com o desejo de subjugar o ambiente e explorar os recursos naturais que ainda estão disponí- veis em certos territórios que outrora foram protegidos por leis ambientais. Desejo ao(à) leitor(a) uma excelente leitura. Rio Branco, Acre, 19 de abril de 2021 (Dia dos Povos Indígenas). Tayson Ribeiro Teles O Organizador 11 O CURRÍCULO ESCOLAR DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL COMO COLONIALIDADE DO PODER DA CULTURA EUROPEIA CRISTÃ Cleuma Roberta de Souza Marinho1 José Adnilton Oliveira Ferreira2 INTRODUÇÃO Nesse estudo aborda-se a educação escolar indígena no Brasil a partir do contexto do currículo escolar na colonização, apresentando algumas interfaces do processo de inferiorização dos povos indígenas que se deu principalmente por meio da hegemonia branca europeia, como efeito da colonização, que engendrou relações culturais, sociais, econômicas e de educação. Para tanto, realizou-se revisão bibliográfica do cabedal existente, partindo-se de autores que trazem uma abordagem crítica sobre a temática. O referido estudo está estruturado da seguinte forma: na introdução apresenta-se a justificativa, o objetivo e o problema referente ao objeto de estudo em questão. O desenvolvimento teórico inicia-se com a análise da edu- cação colonial no Brasil, com foco no fortalecimento das estruturas de poder sobre as populações indígenas. Logo após, problematiza-se a colonialidade de poder eurocêntrica na educação do Brasil e sua dominação etnocêntrica sobre os povos indígenas através do currículo escolar; e, por fim, apresentam-se as conclusões do estudo. A educação colonizadora inicia em 1549, quando chega à América Por- tuguesa a primeira missão jesuítica enviada de Portugal por D. João III, com- posta por missionários da Companhia de Jesus. Faustino (2010, p. 98) “salienta que com a vinda dos portugueses ao Brasil deu-se o início do processo de colonização, o qual teve por objetivo expandir o sistema mercantil português utilizando a mão de obra escrava dos indígenas.” O colonialismo português se expressa de forma cruel e desumana por suas vertentes de dominação política, administrativa e econômica. Configura-se, assim, uma relação política e econômica na qual uma nação é subjugada por outra. Dessa forma, todo o cabedal cultural, social e religioso dos indígenas era considerado como abominável para uma sociedade que se pressupunha pura e cristã, ocorrendo assim um processo civilizatório 1 Mestra em Comunicação, Linguagem e Cultura (UNAMA). Professora de ensino especial e superior. CV: http://lattes.cnpq.br/4584243301199119 2 Doutorando em Ciência da Educação (UnB). Professor da Faculdade Estácio de Sá (Macapá- -AP). CV: http://lattes.cnpq.br/2068358243656514 http://lattes.cnpq.br/4584243301199119 http://lattes.cnpq.br/2068358243656514 12 Tayson Ribeiro Teles (org.) e de aculturação que objetivava construir um novo padrão de comportamento para os indígenas: o ser dócil e submisso. Neste contexto, o instrumento de controle mais eficaz da colonialidade foi a educação. Para que os indígenas participassem da mão de obra, estes deveriam ser civilizados a partir da educação. Isto é, O ‘selvagem’ deveria ser ‘civilizado’ para aceitar a situação de exploração e submissão a que estava sendo sujeitado. Nesse projeto, a educação escolar exerceu um papel fundamental. Acreditava-se que, por meio da instrução e catequese, os índios abandonariam sua forma ‘primitiva’ de viver e se integrariam à ‘civilização’ (FAUSTINO, 2010). A referida autora afirma ainda que o processo educacional para o aten- dimento aos indígenas ocorreu de maneira com que eles fossem educados na fé cristã com o intuito de fazer da cultura europeia a referência a ser seguida. Assevera, ainda, que a lógica de supremacia do colonizador buscou extirpar outras culturas consideradas inferiores, incapazes e consideradas não puras. Enfatiza que cabia aos padres jesuítas propagar o cristianismo euro- cêntrico, ou seja: [...] inserir, nas culturas pagãs do novo mundo, noções de civilidade, de ordem, de disciplina, de respeito à hierarquia e a observância aos dogmas cristãos. Em algumas regiões, os jesuítas aprenderam e decodifica- ram a língua indígena, traduzindo textos doutrinários que foram usados na instrução e catequização (FAUS- TINO, 2010, p. 32). A colonialidade mostra uma estrutura social em uma relação de infe- rioridade com uma cultura europeia cristã que se sobrepõe a outras culturas respaldada nas discriminações sociais codificadas como étnicas e antropológicas, constituindo uma estrutura de poder. Para Quijano (2005, p. 121), “essa colonia- lidade se refere a um padrão de poder que permeia as relações intersubjetivas entre colonizador e colonizado, e que reflete nas formas de valorização do conhecimento, na divisão racial do trabalho criada para justificar a hegemonia branca eurocêntrica.” A EDUCAÇÃO COLONIAL NO BRASIL COMO FORTALECIMENTO DAS ESTRUTURAS DE PODER SOBRE AS POPULAÇÕES INDÍGENAS O processo educacional no Brasil colônia se inicia com a necessidade de inserir, converter e catequizar a civilização indígena à fé católica, atribuindo-lhe também a função de vassalo da monarquia, principalmente como forma de 13 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil domínio da população colonizada, usando de alicerce as diferenças de raça, sexo e etnia para a naturalização das diferenças. Nesse contexto: A progressiva monetarização do mercado mundial que os metais preciosos da América estimulavam e permitiam, bem como o controle de tão abundan- tes recursos, possibilitou aos brancos o controle da vasta rede pré-existente de intercâmbio que incluía, sobretudo China, Índia, Ceilão, Egito, Síria, os futuros Orientes Médio e Extremo. Isso também lhes permitiu concentrar o controle do capital comercial, do trabalho e dos recursos de produção no conjunto do mercado mundial. E tudo isso foi, posteriormente, reforçado e consolidado através da expansão e da dominação colonial branca sobre as diversas populações mundiais (QUIJANO, 2005, p. 232). Dessa forma, o capitalismo europeu controlou e explorou outras popu- lações, inclusive indígenas, impondo-lhes, no processo de colonização, novos costumes, ritos e identidades. Portanto, para Santos (2010, p. 35), “as hierarquias são consequências das diferenças e, sendo assim, as diferenças são veladas e naturalizadas a partir de uma escala baseada na inferiorização do que difere do padrão dominante.” Afirma ainda que a supressão da diversidade cultural dos outros povos, pela exclusão e silenciamento de toda riqueza neles presente, visou atender aos interesses do capitalismo, fato que ocorreu por meio da dominação política, econômica e militar nas sociedades colonizadas. A educação, então, foi uma das principais formas que o colonizador buscou para dominar os povos indígenas, já colocados em uma escala inferior da sociedade. Cabe reiterar que essa dominação não ocorre por meio passivo ou romântico, mas sim pela violenta segregação e inferiorização dos indígenas e pelo extermínio de muitos povos originários, com suas línguas e culturas. Godelier(1981, p. 186), ao reportar-se à legitimidade da classe dominante, afirma que, “[...] todo poder de dominação se compõe de dois elementos indis- soluvelmente entrelaçados que lhes dão força: a violência e o consentimento.” A busca de legitimidade marcou o início do processo de desconstrução da identidade cultural das populações indígenas, com o envio de missioná- rios religiosos que passaram a agrupar os ameríndios em missões, reduções e aldeamentos, para lhes apresentar a fé católica. Através da catequização foram disseminando os padrões de convivência e os modelos de produção que eram interessantes ao colonizador: “[...] o padrão de poder baseado na colonialidade implicava também um padrão cognitivo, uma nova perspectiva 14 Tayson Ribeiro Teles (org.) de conhecimento dentro da qual o não-europeu era o passado e desse modo inferior, sempre primitivo” (QUIJANO, 2005, p. 228) As primeiras experiências começam com a colonização portuguesa, no início do século XVI, num contexto em que o poder político-econômico e a evangelização eram inseparáveis e em que, como já destacado, a educação tinha o papel de ajudar a perpetuar as desigualdades e naturalizar as diferenças entre colonizador e colonizado. Logo que chegaram ao Brasil, os padres jesuítas lançaram as bases da catequização, com a criação das primeiras casas, as casas de bê-á-bá, dando início à educação colonial em seu sentido restrito, por meio da atuação em escolas de ler, escrever e contar e, posteriormente, em seus colégios na cidade de Salvador. Nesse prisma: Estas casas, ou residências ou ainda recolhimentos, recebiam os meninos índios para serem catequiza- dos e instruídos e se destinavam também a abrigar os padres aqui na colônia, bem como os órfãos vindos de Portugal e os da terra, a fim de lhes dar assistência e formação religiosa. [...] A vinda de órfãos de Portugal contribuiu grandemente como um motivador a mais para a já necessária construção de casas (residências ou recolhimento) e representou um reforço na conversão dos índios, uma vez que os jesuítas utilizaram como estratégia de catequese e instrução os órfãos para atrair os meninos índios (MENARDI, 2010, p. 159). Pode-se contextualizar a relação entre os povos indígenas e os europeus nesses moldes explicitados que caracterizaram um processo de desconstrução da identidade das populações indígenas, ou seja, que se queria produzir uma população indígena “civilizada” adaptada aos moldes europeus. Dessa forma, os jesuítas empenharam-se na instrução da leitura, e do estudo interpretativo do catolicismo, pois assim se poderia compreender melhor o mundo supostamente desconhecido pelos nativos. “Os jesuítas perceberam que não seria possível converter os índios à fé católica sem que soubessem ler e escrever, os nativos poderiam de fato ser inseridos no mundo cristão” (AZEVEDO, 1978, p. 56). Para Aranha (1996, p. 78), “essa ação contribui para que haja um choque entre os valores pregados pela cultura nativa e os do colonizador.” O sociólogo Gilberto Freire, na obra Casa-grande e senzala, afirma que os primeiros mis- sionários substituíram as ‘cantigas lascivas’, entoadas pelos índios, por hinos à Virgem e cantos devotos. Segundo Aranha (1996, p. 20), “não raro os padres ridicularizam a figura do pajé e os ensinamentos da tribo e condenam a poli- 15 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil gamia, pregando a forma cristã de casamento, e dessa maneira começam a abalar o sistema comunal primitivo.” Aqui se percebem algumas das ações missionárias com o intuito de boicotar a cultura dos povos indígenas e empregar o modo de vida do branco europeu cristão, moldando o nativo segundo a civilização ocidental cristã, mais especificadamente a cultura portuguesa. Entretanto, os jesuítas eram contra a exploração dos índios, pois quando estes eram escravizados morriam de fome e doenças. Mas, infelizmente a escola serviu como mecanismo de aculturação dos povos indígenas. Vê-se que: Quando a escola foi implantada em área indígena, as línguas, a tradição oral, o saber e a arte dos povos indígenas foram discriminados e excluídos da sala de aula. A função da escola era fazer com que estudantes indígenas desaprendessem suas culturas e deixas- sem de serem indivíduos indígenas. Historicamente, a escola pode ter sido o instrumento de execução de uma política que contribuiu para a extinção de mais de mil línguas (FREIRE, 2004, p. 23). “A escola, organizada com um modelo curricular pedagógico alheio as cosmologias indígenas, foi imposta com o explícito intuito colonizador, integracionista e civilizador” (BANIWA, 2013, p. 12). A violência foi um dos componentes utilizados para o alcance de tais objetivos. Afirma Godelier (1981) que dentre os componentes do poder o mais forte não é a violência, e, sim, o consentimento do dominado em relação a sua dominação e sujeição. Afinal, há a ideia de que: [...] as representações “ilusórias” que os homens têm de si próprios e do mundo, e que “legitimam” uma ordem social existente nascida sem elas, fazendo assim aceitar as formas de dominação e de opressão do homem pelo homem que esta ordem contém e sobre as quais repousa (GODELIER, 1981, p. 189) (Grifos nossos). Outro elemento da educação colonizadora foi a segregação. Para isso criou-se todo um aparato escolar, composto pelos colégios e as escolas-internato. Por meio da força e do poder emanados pela metrópole, as crianças indígenas foram retiradas das aldeias e enclausuradas nos colégios com o fito de se tor- nar mais fácil a missão de destruir suas identidades e subjetividades, pois os ameríndios não conceberam a escola como parte de seu cotidiano, sendo ela totalmente estranha à sua cultura. 16 Tayson Ribeiro Teles (org.) Enclausurados, longe do contato com seus semelhantes, tornaram-se mais frágeis, o que facilitou o trabalho do colonizador. A razão principal da implantação dos colégios estava em mantê-los isolados dos seus semelhantes para favorecer a aprendizagem da cultura eurocêntrica, já que a educação imposta era totalmente descontextualizada da realidade em que viviam. Porém, “bas- tava que eles voltassem ao convívio com outros que, mesmo aqueles que eram batizados, retornavam aos seus costumes e crenças” (HENRIQUES, 2007, p. 54). Ainda a respeito desse assunto, tem-se a pertinente reflexão de Fanon (1979, p. 27): Não se desorganiza uma sociedade, por mais primitiva que seja, com tal programa se não está decidido desde o início, isto é, desde a formulação mesma deste programa, a destruir todos os obstáculos encontrados no caminho. O colonizado que resolve cumprir este programa, torna-se o motor que o impulsiona, está preparado sempre para a violência [...]. A homogeneização dos povos indígenas foi outro artifício para a destrui- ção dos obstáculos encontrados no caminho dos colonizadores. A diversidade étnica foi ignorada e os indígenas concebidos como um só povo que deveria ser extinto ou assimilado. Para isso, a educação colonizadora contribuiu como um aparato político e pedagógico que tinha como finalidade a extinção de suas línguas e a negação de suas culturas, bem como a aprendizagem da língua e da cultura europeias obrigatória a todo o continente dominado pelo europeu (GROSFOGUEL, 2008). Esse processo foi intenso no estado colonial português e motivado no intuito de destruir a identidade dos povos indígenas. Dentre as estratégias utilizadas inicialmente destacam-se: o currículo hegemonicamente branco eurocêntrico inicialmente a partir da alfabetização das crianças (ensinar a ler, escrever e contar - cálculos matemáticos) e o ensino da doutrina cristã, que ocorriam nas missões volantes; as casas para a doutrina dos índios não batizados e os colégios, que abrigavam meninos portugueses, mestiços e índios batizados, e onde “a educação tinha um caráter mais abrangente e estava voltada para a formação de pregadores (índios convertidos aocristianismo) que ajudavam os jesuítas na conversão de outros índios” (RIBEIRO, 1984, p. 127). A metodologia jesuítica de ensino baseava-se em uma estrutura curricular e no código pedagógico chamado Ratio Studiorum, um manual que continha conjuntos de normas e/ou regras para ajudar e nortear as atividades de cunho pedagógico dos professores e na organização e administração escolar dentro dos colégios da ordem jesuítica. “Os jesuítas construíram uma ampla ‘rede’ de escolas elementares e colégios e o fizeram de modo muito organizado e contando com um projeto 17 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil pedagógico uniforme e bem planejado, sendo o Ratio Studiorum a sua expressão máxima” (SANGENIS, 2004, p. 93). Assim, o Ratio preceitua a formação intelec- tual clássica estreitamente vinculada à formação moral embasada nas virtudes religiosas, nos bons costumes e hábitos saudáveis a sociedade, explicitando de forma detalhada as modalidades curriculares das instituições escolares; o acompanhamento do desenvolvimento da aprendizagem e a promoção dos alunos; condutas e posturas respeitosas que os conduziam (professores) até os que aprendiam (alunos). Sabe-se que: O manual contém 467 regras, cobrindo todas as ativi- dades dos agentes envolvidos ao ensino. Iniciava pelas regras do provincial, depois do reitor, do prefeito de estudos, dos professores de modo geral, de cada matéria de ensino; incluía também as regras da prova escrita, a distribuição de prêmios, do bedel, dos alunos e por fim as regras das diversas academias. Além das regras e das normas, o Ratio apresenta os níveis de ensino (Humanidades, Filosofia e Teologia) e as disciplinas que os alunos deveriam cumprir (TOYSHIMA; COSTA, 2012, p. 3). Nota-se que o referido manual pedagógico vislumbrava um currículo de educação literária e humanística. Primado pela organização do ensino curricular, das regras e normas impostas aos professores. “Destaque-se que para tanto não era requerido apenas o exercício intelectual por meio do uso da memória, justamente porque o exercício de interpretações também era uma exigência no decorrer do estudo” (SANGENIS, 2004, p. 65). Mesmo com toda a estrutura, organização e regras pedagógicas e admi- nistrativas, a educação jesuítica não satisfazia o Marquês de Pombal, primeiro- -ministro de Portugal de 1750 a 1777, porque as escolas da Companhia de Jesus atendiam aos interesses da fé, enquanto Pombal se preocupava em atender os interesses do Estado. Essa discordância de objetivos fez com que os jesuítas fossem expulsos das terras brasileiras em 1759. Assim, a missão educacional e civilizatória, inicialmente sobre responsabilidade dos missionários jesuítas, teve como foco a submissão dos indígenas às normas da metrópole portuguesa, “domestican- do-os” e disponibilizando-os ao mercado de trabalho braçal. A sobreposição da cultura eurocêntrica sobre a indígena era o principal foco da escolarização, ou seja, civilizar o povo indígena para torná-lo cristão, cidadãos a serviço da coroa portuguesa. Por intermédio da educação negaram-se os saberes, as formas de organização social, política, econômica e religiosa e 18 Tayson Ribeiro Teles (org.) internalizou-se a do colonizador, fazendo com que perdessem suas identidades, tornando-se fracos, inseguros e mais dóceis para a dominação. A COLONIALIDADE DE PODER EUROCÊNTRICA ATRAVÉS DA CATEQUIZAÇÃO JESUÍTICA NA EDUCAÇÃO DO BRASIL E SUA DOMINAÇÃO ETNOCÊNTRICA SOBRE OS POVOS INDÍGENAS “O colonizador europeu impôs aos povos indígenas a sua cultura, os seus modos de ver o mundo, o seu conhecimento, a sua epistemologia; assim, moldou e formatou consciências, colonizou o pensamento por meio de uma única lógica, a eurocêntrica.” Santos (2007, p. 38) denomina esse fato como epistemicídio, ou seja, a morte das diversas formas de saberes dos povos indí- genas que sustentavam suas visões, leituras e interpretações do mundo e que faziam parte de suas histórias e culturas. O entendimento dessas questões está, segundo Mignolo (2011), na colo- nialidade do poder, que, por meio da colonização epistemológica eurocêntrica e etnocêntrica foi se constituindo no processo de formação do sistema moderno colonial, tendo a Europa como centro privilegiado de produção e avaliação do conhecimento. Razão pela qual, as cosmologias e os saberes indígenas foram subalter- nizados, invisibilizados e resumidos a superstições, folclore, entre outros. É a colonização da memória, que ocorreu por meio da negação da língua, pois os povos indígenas eram proibidos de falá-la na escola; dos conhecimentos, aproveitou-se apenas o que era útil ao capital; e a religião foi atacada, com a imposição de um único Deus. Inicialmente, a população colonizada foi distinguida pelas características fenotípicas e, posteriormente, a cor da pele adotada como único critério para categorização racial da população. Desta maneira, cabe-nos pensar sobre a categoria raça e as devidas reflexões e discussões sobre a terminologia. O termo raça vem possivelmente do italiano razza, e pode ser descrito como raça ou linhagem. Podemos identificar que a terminologia começou a ser usada e serviu para se estabelecer a supremacia racial branca sobre povos espalhados pelo mundo colonizado. Consequentemente, naturalizaram-se as diferenças que foram construídas socialmente, gerando a discriminação e o preconceito, pois “raça e identidade racial foram estabelecidas como instru- mentos de classificação social básica da população” (QUIJANO, 2005, p. 228) Desse modo, o uso do termo raça se destinou e foi utilizado como meio de organização social e econômica pelo colonizador para hierarquizar e subal- 19 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil ternizar outros povos, como a civilização indígena. Processo esse usado justi- ficativa para a opressão das sociedades colonizadas. Mas, cabe destacar no âmbito biológico o seguinte: A descoberta de que do ponto de vista biológico não existe raça não significa que as pessoas mudam suas representações sociais de acordo com as últimas des- cobertas científicas, nem tampouco significa que elas não utilizem essa categoria no seu dia-a-dia. Ao con- trário, a despeito da genética revelar que as diferenças entre um negro, um branco e um oriental são ínfimas a ponto de não fazer sentido falar em raça, as pessoas continuam a efetuar classificações e hierarquizações entre os seres humanos em virtude de traços morfo- lógicos (BERNARDINO, 2004, p. 19). A partir do paradigma cientifico, com o advento da evolução dos estudos da biologia, comprova-se que o ser humano se deve colocado na condição de “raça” única. Dessa maneira, cairá por terra a legitimidade do termo raça como forma de classificar a humanidade. Isso, porquanto: Combinando todos esses desencontros com os progres- sos realizados na própria ciência biológica (genética humana, biologia molecular, bioquímica), os estudiosos desse campo de conhecimento chegaram à conclusão de que a raça não é uma realidade biológica, mas sim apenas um conceito aliás cientificamente inoperante para explicar a diversidade humana e para dividi-la em raça. Ou seja, biologicamente e cientificamente, as raças não existem (MUNANGA, 2003, p. 3). Posto isto, somente no início do século XX, os resultados dos estudos criticamente fundamentados na genética humana levaram a uma ruptura terminológica com a noção de raças humanas. A obra “A invenção das raças”, do geneticista Barbujani (2007), apresenta argumentos que demonstram que só há uma raça humana, que nossa espécie não é uma miscelânea de grupos, biologicamente muito distintos, e mais: somos jovens no planeta e viemos da África. Mas, sociedades subalternizadas no passado, como indígenas e africanas, sofreram vertiginosamente como colonizados dentro da categorização racial, no panorama colonizador eurocêntrico. Nesse sentido, voltaremos paracausa indígena, para compreendermos o processo de inferiorização das populações indígenas. Na colonização bra- sileira, que iniciou no século XVI, foi necessário implementar mecanismos 20 Tayson Ribeiro Teles (org.) pelo colonizador, dentre eles a criação da categoria raça. O conceito de raça foi criado pelo colonizador para classificar os dominados e desta forma sub- jugá-los e inferiorizá-los. Dessa maneira, é estabelecida a hegemonia da raça branca sobre as não brancas. Para Quijano (2005, p. 102), a ideia de raça “é uma construção mental que expressa a experiência básica da dominação colonial e que desde então permeia as dimensões mais importantes do poder mundial [...] o euro- centrismo”. Por meio da categoria raça as diferenças entre europeus e não europeus foram naturalizadas e universalizadas. Portanto, na colonialidade do poder, o referido autor descreve este processo de dominação como algo específico da modernidade. A nova identidade atribuída pelos europeus colocou, numa mesma categoria, culturas diversas e, considerando que as instituições que serviam de representação para as identidades nacionais podiam também ser aplicadas aos grupos indígenas (língua, território tradicionalmente ocupado, história comum), porque não dizer, nações diferentes. Na América, a ideia de raça foi uma maneira de outorgar legitimidade às relações de dominação impostas pela conquista. A posterior constituição da Europa como nova identidade depois da América e a expansão do colonialismo europeu ao resto do mundo conduziram à elaboração da perspectiva eurocêntrica do conhe- cimento e com ela à elaboração teórica da ideia de raça como naturalização dessas relações coloniais de dominação entre europeus e não-europeus (QUIJANO, 2005, p. 229). Podemos notar que houve a imposição de um modelo de currículo escolar padronizado por uma única cultura que impôs um processo de naturalização e de dominação europeia que passava pela desconstrução da identidade cul- tural dos indígenas e pela imposição do modo de vida europeu. As divindades dos indígenas deveriam ser abandonadas, devendo esses aceitar o batismo e a iniciação no Cristianismo. Os modelos sociais de convivência nas antigas aldeias passaram a ser repelidos pelos colonizadores que precisavam inserir os indígenas no modelo de servidão dos Estados europeus para, assim, disporem de sua mão-de-obra. Os modelos técnicos de produção, através dos quais os indígenas tradi- cionalmente se relacionavam com o meio ambiente também precisavam ser substituídos, pois as suas roças de subsistência não dariam conta do volume de produção necessário à empresa da colonização conforme as ambições dos exploradores europeus. 21 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil A classificação social colonial produziu novas identidades baseadas, inicialmente, na cor da pele. Assim emergiram índios, negros, mestiços, oli- váceos e amarelos como raças dominadas e consideradas inferiores. “A raça dominadora e superior autodenominou-se branca e, em meados do século XVIII, passou a chamar-se europeu” (QUIJANO, 2005, p. 19). Ao operar a desconstrução identitária das populações indígenas, iniciada no século XVI, com a chegada dos europeus, criou-se uma nova identidade aos grupos humanos ali existentes, generalizando-os como índios. Essa classificação homogeneizante estabeleceu uma nova identidade a partir da qual os índios, dali em diante assim chamados, passaram a ser representados na interação com o colonizador europeu. A catequização foi um elemento de profunda importância na descons- trução da identidade indígena, pois, na América, e especialmente no Brasil, entre o século XVI e XIX, cristianizar, catequizar e civilizar eram parte de um mesmo processo de sobreposição dos modelos europeus aos modelos indígenas, sendo os três momentos considerados não apenas sucessivos, mas praticamente sinônimos quando aplicados à questão indígena. Contudo, foi ao longo do século XIX que se desenvolveu uma perspectiva biológica (comportamental) para se categorizar a espécie humana. Nesse período: [...] impôs-se a perspectiva que buscava nas diferenças físicas entre os homens indícios de caráter e de perso- nalidade, o que terminava por localizar, no contexto da cientificidade, a explicação biológica material do atraso tecnológico de muitas sociedades humanas. Legitimando domínios, tutelas e, eventualmente, exter- mínios em massa, não faltaram trabalhos preocupados em demonstrar o atraso histórico das culturas não-o- cidentais (FERREIRA NETO, 1997, p. 320). Para a consolidação da colonialidade do poder, a articulação de todas as formas históricas de controle do trabalho por meio da regulação, exploração e monitoramento da produção-apropriação-distribuição de produtos associadas a relação capital-salário e do mercado mundial, configurou um moderno padrão global de controle do trabalho, constituído por uma nova, original e singular estrutura de relações de produção: o capitalismo mundial. “Assim, cada raça foi controlada por meio de uma forma específica de trabalho, tornando-se uma maneira de controle dos colonizados” (QUIJANO, 2005). Esses princípios se mantiveram nos séculos de colonização, reforçados pela atuação das ordens religiosas como jesuítas, beneditinos, franciscanos, carmelitas, lassalistas e salesianos, e retomados pelo Estado brasileiro no iní- cio do século XX. Como afirma Henriques (2007), até o início do século XX o 22 Tayson Ribeiro Teles (org.) indigenismo brasileiro vivenciou uma fase de total identificação com a missão católica e o Estado dividiu com as ordens religiosas, mais uma vez, a respon- sabilidade pela educação formal dos índios com o intuito de transformá-los em “cidadãos”. A escola catequizadora, transmissora/reprodutora da cultura europeia e etnocêntrica, cumprem a sua parte enquanto aparelho ideológico do Estado. Verifica-se, nesse diapasão: [...] noções elementares da língua portuguesa (leitura e escrita) e estímulo ao abandono das línguas nativas, além de se introduzir uma série de pequenas alterações no cotidiano de um povo indígena, a partir de formas de socialização características de sociedades que têm na escola seu principal veículo de reprodução cultural. O modelo de governo idealizado, e que foi em certos casos com certeza implementado, procurava atingir a totalidade das atividades nativas, inserindo-se em tempos e espaços diferenciados dos ciclos, ritmos e limites da vida indígena (SOUZA LIMA, 1995, p. 191) (Grifos nossos). O Estado deu continuidade ao projeto pedagógico que vinha sendo ope- racionalizado pelas ordens religiosas baseado na extinção das línguas nativas e de suas formas de organização social e temporal que envolve outros mundos, considerado pela educação colonizadora como primitivas, selvagens, dentre outros adjetivos que os inferiorizavam. Exsurge que: O órgão do Governo criado em 1967 foi a Fundação Nacional de Assistência ao Índio (Funai) que substi- tuiu o Serviço de Proteção ao Indio (SPI). A educação colonizadora contou com parcerias de instituições internacionais como o Summer Institute of Linguistics (SIL), para a realização de pesquisas com o objetivo de registro de línguas indígenas; à identificação de sistemas de sons; bem como a elaboração de alfabetos e análises das estruturas gramaticais (HENRIQUES, 2007, p. 68). A referida instituição também estudava a língua indígena com a fina- lidade de traduzir a Bíblia para os índios. Todas essas ações foram voltadas, segundo o citado autor, para “a preparação de material de alfabetização nas línguas maternas e de material de leitura, o treinamento do pessoal docente, 23 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil tanto da Funai, como de missões religiosas, e a preparação de autores indíge- nas.” (HENRIQUES, 2007, p. 15). Dessa maneira, os povos indígenas passaram a ser alfabetizados na sualíngua materna e na língua portuguesa. Quando atingiam o domínio deste idioma, o ensino passava a ser realizado exclusivamente em português, era um “bilinguismo de transição” (HENRIQUES, 2007, p. 16). A língua indígena servia para facilitar o processo de integração do índio à cultura da sociedade não índia, pois, quando aprendia o português deixava de falar sua língua, simultaneamente, abandonava seu modo de vida e sua identidade diferenciada. No intuito de garantir o sucesso do ensino bilíngue, passou-se a formar jovens nas aldeias para desempenhar a função de tradutor entre os alunos monolíngues e o professor não indígena, o qual ensinava o português e as demais matérias escolares, todas proferidas na língua hegemônica. A escrita da língua indígena, ensinada no primeiro ano escolar, servia de passagem para o aprendizado do português e para a introdução, entre os indígenas, de conhecimentos e visões de mundo eurocêntricos. Nesse foco: Esse papel será instrumentalizado pelo discurso de valo- rização da diversidade linguística dos povos indígenas, com a proposição da utilização das línguas maternas no processo de alfabetização para grupos que não faziam uso da língua portuguesa, visando facilitar o processo de integração à sociedade nacional. Assim, o ensino bilíngue é estabelecido como prioridade e busca-se implantá-lo nas escolas indígenas por meio de mate- riais produzidos para a alfabetização e da capacitação de índios para assumirem função de alfabetizadores em seus respectivos grupos (HENRIQUES, 2007, p. 14). De acordo com Ribeiro (2017), o espanto não está na morte de inúmeros índios, uma vez que, contra eles se travou uma guerra de extermínio sem para- lelo na história, de duração multissecular, com muita perversidade e conduzida eficazmente com a utilização das armas de fogo. A autora afirma que a sociedade brasileira contrabandeou ideologias europeias como fruto de sua colonização, per- petuando a colonialidade do poder. Tais ideologias foram consolidadas enquanto patrimônio cultural como herança da velha Europa colonizadora. MÉTODO A pesquisa adotou metodologicamente a abordagem de um estudo descritivo, apoiado no referencial das ciências sociais, da pedagogia e antro- 24 Tayson Ribeiro Teles (org.) pologia interpretativista, através do levantamento bibliográfico. Para a análise compreensivo-interpretativa da análise de dados que foram realizadas a partir da técnica da análise de conteúdo pela proposta por Bardin (2002). O processo de análise de conteúdo na triangulação de dados, confrontan- do-os em diferentes fontes, e aproximando o modelo dos aportes teórico-epis- temológicos que dentre os tipos de pesquisa bibliográfica, preferencialmente optou-se por estudo descritivo, por compreender que atende aos objetivos definidos neste estudo, que aborda o contexto da educação escolar dos povos indígenas no Brasil como expressão da colonialidade do poder da cultura europeia cristã. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica com foco no acervo cultural e epistemológico sobre a colonialidade que se entende aqui como um padrão de poder que permeia as relações intersubjetivas entre colonizador europeu e o colonizado no caso dos povos indígenas. A questão norteadora da investi- gação: como ocorre o currículo escolar dos povos indígenas no Brasil como colonialidade do poder da cultura europeia cristã? A pesquisa Bibliográfica ou Quantitativa e suas principais características, entre elas, seu caráter descritivo. Uma pesquisa bibliográfica consiste em ser também descritiva, podendo ser definida como aquela que “observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los” (JARDILINO, ROSSI, SANTOS, 2000). A pesquisa bibliográfica implica em que os dados e informações necessárias sejam obtidos a partir do levantamento de autores especializados através de livros, artigos científicos e revistas especializadas, entre outras fontes. “A pesquisa bibliográfica procura explicar um problema a partir de referências teóricas publicadas em documentos” (CERVO; BERVIAN, 1996). Em outras palavras, quando os dados coletados são oriundos da “própria bibliografia”, significa que a técnica utilizada para elaboração do tema em desenvolvimento é a pesquisa quantitativa (TOZONI-REIS, 2009). CONSIDERAÇÕES FINAIS Os complexos processos educacionais e de currículo e de transculturação evidenciam uma a partir de uma escola, estruturada como uma organização curricular escolar que se concentrou na desconstrução violenta da cultura indígena por meio da ação intencional dos colonizadores em transformar os indígenas em colonos submissos, obedientes e escravos para que servissem de instrumentos à lógica do capital em processo de implantação. Destaca-se que as violências e violações contra os povos indígenas não são apenas resquícios do passado. Os grupos indígenas atuais, descendentes daqueles colonizados por esse processo, continuam a conviver com diversas atrocidades no Estado Republicano Democrático Brasileiro e um currículo escolar que não traduz sua verdadeira cosmologia indígena. 25 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil Faustino e Silva (2003, p. 30), discorrem que em 1889 houve a Proclamação da República o qual acalentou a necessidade de renovar a sociedade brasileira e consequentemente, novos olhares passaram a ser direcionados à educação indígena. Segundo as autoras supracitadas “[...] estudiosos são unânimes em afirmar que começou a se desenvolver uma política menos desumana e mais abrangente no sentido de proteger os povos indígenas das barbáries cometidas nos séculos anteriores”. Entende-se que o processo de colonização ocorreu eminentemente legitimado na base etnocêntrica europeia a partir da imposição do currículo que massificou toda uma educação indígena e que ocorreu de forma gradativa, sedimentada e implantada primeiramente pelos padres jesuítas nos dois pri- meiros séculos da colonialidade de poder da monarquia portuguesa, processada pela doutrina católica como forma de inferiorização étnica, religiosa e social de toda amálgama indígena para corroborar com a hegemonia cultural europeia. Diante desse contexto histórico algumas inquietações precisam nos mobilizar enquanto historiadores da História da Educação. Como descolonizar o pensamento contemporâneo? Como a história da educação pode influenciar o processo de retomada da autonomia dos sujeitos indígenas, em um processo educativo verdadeiramente indígena e colocando-os como protagonistas na busca da emancipação humana por meio da conscientização? Por fim, a quem interesse essa colonialidade do currículo escolar aos povos indígenas? Quem legitima hoje esse modelo curricular? Por certo, a construção do conhecimento por meio de uma reflexão crítica acerca da estrutura social que perpetua a colonialidade, a relação de inferioridade com culturas que invadem e transformam a realidade educacional num processo histórico de aculturação, tornar-se-á a retomada do compromisso ético da educação com a perspectiva da emancipação humana no sentido de estabelecer uma ação dialógica que problematize e proponha efetivamente mudanças na realidade social. REFERÊNCIAS ARANHA, M. L. de A. História da Educação e da Pedagogia: geral e Brasil. São Paulo: Moderna, 1996. AZEVEDO, F. de. A transmissão da cultura: a cultura brasileira. São Paulo, Melho- ramentos, 1978. BANIWA, G. Educação escolar indígena no Brasil: avanços, limites e novas perspec- tivas. 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Curitiba: IESDE BRASIL, 2009. 28 ENTRE SILVESTRES E EXÓTICOS: OS ANIMAIS DENTRO DA CULTURA CHIQUITANA Denildo da Silva Costa3 INTRODUÇÃO Sobre etnia Chiquitana, (TOMICHÁ, 2002 e 2012; PUHL, 2011), define uma nomenclatura genérica, representando a união de dezenas de povos e culturas unificadas em missões religiosas jesuítas no final dos séculos XVII e XVIII, região central da América do Sul. Nas palavras de Tomichá (2002), o processo foi formado por grupos indígenas pertencentes a seis famílias linguísticas diferentes, houve homogeneização de povos que eram aliados e inimigos entre si. Esse processo é composto por relações interétnicas que os constituem culturalmente hoje, compartilhados pela fronteira internacional política territorial entre República federativa de Brasil e o Estado Plurinacional da Bolívia, onde suas aldeias e comunidades estão no departamento de Santa Cruz (Bolívia) e estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Brasil). Em ter- ritório Matogrossense principalmente nas cidades de Vila Bela da Santíssima Trindade, Cáceres, Pontes e Lacerda e Porto Esperidião. Referente às populações autóctones publicou-se a obra: o Selvagem, Magalhães (1876) assim descrito sobre alguns costumes: Quem visita uma aldeia selvagem quase visita um museu vivo de zoologia na região onde está localizada a aldeia; araras, papagaios de todos os tamanhos e cores, macacos de diversas espécies, porcos, quatis, mutuns, veados, avestruzes e até sucuris, jibóias e crocodilos [...]. O cherimbabo do índio (o animal que ele cria) é quase um membro da família. (MAGALHÃES, 1876. p. 33). Vander Veldem (2011) apresenta a palavra xerimbabos, denominação do litoral tupi para a prática de animais silvestres trazidos desde jovens e criados na interação entre humanos em aldeias. Erikson (2012) define relações sim- bólicas complexas que os ameríndios estabelecem entre os lugares de que se apropriaram (seu habitat) e os seres vivos (animais, plantas e humanos) que ali estão ou transitam. Os animais são tratados igualmente como seus novos fami- liares humanos, incluindo a convivência íntima até os rituais de sepultamento, nos quais Erikson apresenta em detalhes as relações com os Matis, indígenas Amazônicos: “há uma dedicação especial, onde os mamíferos são alimentados no 3 Mestre em Ciências Ambientais (UNEMAT). Docente na rede pública de educação básica (Vila Bela da Santíssima Trindade – MT). CV: http://lattes.cnpq.br/8461506995455809 http://lattes.cnpq.br/8461506995455809 29 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil peito e depois, como pássaros e bebês humanos, recebem comida pré-mastigada e oferecida pela boca” (p. 22) Vander Veldem (2011) em obras da etnia Karitiana (Rondônia), descreve o conceito de grupo e animais exóticos, nos quais definem: cachorro é como filho, destacando relações de familiaridade / consanguinidade que o autor afirma cortar as fronteiras entre humanos e não-humano. Sobre a mesma etnia, o autor afirma que para comer é preciso caçar, xerimbabos não são carne. Entre os chiquitano, os xerimbabos são considerados membros da família com maior preferência por pássaros. Durante a pesquisa etnográfica em seis comunidades nos municípios de Vila Bela da Santíssima Trindade – Brasil e San Ignácio de Velasco - Bolívia, entre os anos de 2015 a 2020, foram cataloga- das sete espécies diferentes, a maioria representada pela família Psittacidae: Arara canindé (Ara ararauna); Papagaio verdadeiro (Amazonas aestiva – figura 01); Pequeno Maracanã (Diopsittaca nobilís- figura 01); Periquito de peito ama- relo (Brotogeris chiriri); Maracanã(Primolius maracana); Ema (Rhea americana) e Tucanuçu (Ramphastos toco), três espécies de mamíferos: Veado-mateiro (Mazana americana); Queixada (Tayassu pecari) e macaco-prego (Sapajus apella). Não há registro de répteis, anfíbios e algumas espécies de pássaros representam maus presságios, como pássaros da ordem Falconiformes e Stri- giformes (aves de rapina), representados por gaviões e corujas. Figura 01 Xerimbabos Chiquitano Figura 01 – Aves Silvestres: Papagaio verdadeiro (Amazonas aestiva) e Pequeno Maracanã (Diopsittaca nobilís; Aves exóticas: Pato doméstico (Anas platyrhynchos domesticus) e Galinhas (Gallus gallus domesticus). 30 Tayson Ribeiro Teles (org.) Os pássaros são preferidos para manter relacionamentos xerimbabos, mas algumas espécies, especialmente as aves de rapina: gaviões, gaviões e corujas, simbolizam crenças que trazem prenúncios ruins, maus presságios e morte. Essas espécies são retiradas ou afastadas da convivência, como a espécie coruja Suidara (Tyto alba), denominada mortal, seu canto ou sobrevoo das casas é interpretado como um sinal de morte aos moradores ou de alguém da família. Há um animal noturno especial, acredita-se que seja um pássaro que assobia alto e único, sinal da presença de espíritos malignos próximo as moradias, todos os objetos para repouso (bancos e cadeiras) que estão no espaço são viradas ao contrário, durante período noturno, segundo as crenças, para espíritos que não fazem o bem aos vivos não fiquem nas proximidades. Nimuendajú (1987) e Silva (2015) analisam essas mitologias malignas, animais noturnos e inimigos de estrelas luminosas, também descritas em várias culturas indígenas. A entidade protetora dos animais é o Jenarrir-ti: a personificação antro- pomórfica, com corpo humano e pelagem animal, sempre aparece montada em uma anta (Tapirus terrestre) ou porco do mato (Pecari tajacu). Qualquer violação das regras cria uma dívida negativa entre o ser humano e o ser, existe uma preocupação com o respeito em manter um bom relacionamento e pro- teção com a entidade. A CAÇA Exclusivamente masculinas, as caçadas relatadas pelos missionários eram realizadas por todos os grupos: os caçadores e coletores dependiam das estações, pois os grupos sedentários iniciavam os processos de caça após a semeadura no campo, percorriam grandes distâncias para reunir grandes esto- ques de proteína animal para o abastecimento de consumo sazonal. Auxiliado por variedades de armas de caça (arcos e flechas específicas para animais, macanas e boleadoras), utilizando estratégias em cercados de rebanho, auxílio na queima controlada e perseguição com auxílio de cães. O beneficiamento da carne era defumado até que todo o líquido (na textura de madeira seca) se perdesse, armazenado e depois transportado para os espaços de moradia, consumido in natura no momento da caça e triturado na forma de farinha para produzir sopas para consumir acompanhado com mandioca (Burgos, 1728; Fernández, 1996; Schmid, 1988 e Knogler, 1970). Segundo Riester (1976), os Hichis (vivem fora das aldeias) não têm corpo humano, são antropomórficos, vivem em montanhas, rios, matas e animais. Uma caçada bem-sucedida só ocorre com a autorização do Jenarrir-ti (dono do animal) que regula a quantidade de alimento necessária para a família, exigindo uma caçada com habilidade e precisão. Caso contrário, deixando um 31 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil animal ferido, os Hichi lançam punições malignas como escassez de alimento até enfermidade. Atualmente as caçadas são organizadas individualmente em forma de sondagem (espera o animal em um local específico: árvore com frutificações, barreiros “locais com concentração de sódio no solo atraindo animais” e fonte de água para dessedentação) ou coletivamente e com a ajuda de cães para orien- tar as investidas. Tudo de acordo com as épocas do ano, o amadurecimento dos frutos, os hábitos das espécies animais e sua localização onde executam estratégias adequadas. A caça de Caititus (Pecari tajacu) é organizada por auxílio de cães que varrem a mata, assim que são localizados, os animais são encurralados em uma toca (árvore oca, enterrada no solo), o caçador acompanha a matilha e abate o animal com objetos como: foice, facão, lança ou arma de fogo. Durante o processo de subtração da carne e retirada do couro, as vísceras do animal abatido são compartilhadas com os cães que auxilio na caça, uma recompensa pelo sucesso na caçada. Uma das estratégias de treinar os cães para a caça é o compartilhamento da caça com os mesmos que ao consumir aprendem com o odor do animal abatido, aprendendo a se identificar nas próximas caçadas. Atualmente encontram dificuldades para manter rituais de caça, a presença de gado (bovinocultura) na região dificulta muito, animais silvestres adentram ao meio dos rebanhos, impossibilitando a concretização e abate, sem falar nas proibições impostas por fazendeiros que trancam os acessos. É importante notar que os caçadores são guiados pelos ciclos cosmológicos, datas religiosas e ciclos biológicos das espécies. Animais com filhotes ou em reprodução não são mortos. Uma prática muito comum, depois da caça ou da pesca, é dividir os recursos com as pessoas mais próximas. Mauss (2003) descreve isso como um fenômeno social de reciprocidade denominado Dom. QUELONIOS: JABUTI UM SER ESPECIAL Pezzuti (1998) define que, durante séculos, as tartarugas têm sido fonte de proteína na dieta de populações humanas que vivem em lugares hostis e ambientes isolados, e ainda hoje em várias partes do mundo. Os Testudinidae são quelônios terrestres adaptadas à vida nas matas e campos da região, representado pelo Jabuti / peta, conhecido em outras regiões do Brasil como jabuti Piranga (Chelonoidis carbonarius Spix), por sua cor vermelha, seu manejo entre os chiquitano são: alimento (carne e ovos), medicamento (casca) e objeto utensílio (casca). A coluna vertebral do animal é usada para remédio para problemas de coluna humano (exemplar animal do sexo feminino para homens e masculino para mulheres), os ossos são usados 32 Tayson Ribeiro Teles (org.) como chá ou curtimento em bebidas alcoólicas, casco (carapaça) para mulheres com hemorragias menstruais. Há crença de que a onça-pintada (Panthera onca) não consegue devorar o jabuti, por ser um animal lento, pensativo e muito inteligente, conseguindo até enganar o felino. Há uma relação de pacto entre caçador indígena e o quelônio, uma vez encontrado um jabuti durante caçada, realiza-se um pedido de sucesso onde a amarra no local, uma vez o pedido concedido “ocorrências boas na caça” volta-se e desamarra para não promover azar, presságios ou castigos no futuro. Sobre o conhecimento da espécie, os chiquitano definem os jabutis: com reprodução em fevereiro, todos nascem sozinhos, nidificam em buraco de catete (porco do mato), os ovos podem ser consumidos na forma de farofa. A identifica- ção do gênero sexual do animal: casco ereto é feminino, casco profundo e curvo é masculino. Animal que resiste até seis meses sem beber água. Existem muitas lendas para explicar sua biologia e comportamento animal, uma revela que o motivo de morar em um casco porque ele não abriu mão de sua moradia para receber visitas de amigos. É um animal que possui hábitos noturnos e diurnos, para sua caça existem cães especializados, a classificação das espécies, estão em pequenos (pretos) que vivem ao campo e as maiores (vermelhas e amarelas) nas flores- tas. O órgão mais apreciado para consumo é o fígado (farofa), geralmente são arremessados ao chão para que o referido órgão dilate e aumente de tamanho. ANIMAIS DOMÉSTICOS Animais domésticos foram introduzidos pelos contatos interétnicos (cães, gatos, patos, galinhas, jumentos, cavalos e bois) são animais de múl- tiplas proficuidades auxiliando nos trabalhos cotidianos e algumas espécies são reservas de estoque vivo para alimentação. Uma prática muito comumé adoção de animais filhotes que por vários motivos (rejeição da genitora, morte ou abandono) acabam sob os cuidados íntimos pessoais humano, são batizados de Guacho, ato que se cria um laço afetivo entre humanos e animais. As roças e o extrativismo nos bosques auxiliam muito no provimento de alimentações para esses animais de criação. Algumas comunidades/aldeias existem pecuária extensiva em pequenas quantidades, onde cada família possui seu rebanho. CONSIDERAÇÕES FINAIS Há necessidade de estudar as etnias, suas crenças e práticas para com- preender seu universo de envolvimento com a fauna local. Entre os Chiquitano, 33 Língua(gens), Literaturas, Culturas, Identidades e Direitos Indígenas no Brasil as aves são prediletas, apresenta admirações entre sentimentos de adoração a recusa de presságios ruins. A etnia nos apresentou enormes relações sentimentais com animais silvestres e com animais exóticos, esses últimos como rica fonte alimentar para soberania alimentar (estoque vivo de alimento). REFERÊNCIAS BURGOS, F. Bericht/welchen na majestat den koning von spanier im jahr 1703. R. P. 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Na atualidade, esses relatos são apropriados por quem de fato tem autoridade para usufruí-los. Os mitos são o fulcro das narrativas de autoria indígena, cole- tadas por meio dos relatos mnemônicos. A literatura, para esses escritores, é uma forma de dialogar com a sociedade hegemônica e mostrar o outro lado da história. Essa escrita funciona, ainda, como instrumento de manutenção das identidades indígenas. Diante disso, o objetivo deste trabalho é discutir o mito a partir da leitura da narrativa indígena Com a noite veio o sono (2011), de Lia Minápoty. Lia Minápoty é uma representante das muitas mulheres indígenas que se reafirma na literatura. De origem Maraguá, nasceu na aldeia Yãbetue’y, na área indígena Maraguapagy, no rio Abacaxis-AM. É uma das jovens lideranças das mulheres Maraguá, atuante e palestrante da causa indígena. Além de escritora também leciona para crianças de sua aldeia. Para efeito de sistematização do trabalho, o configuramos da seguinte forma: Inicialmente, buscamos conceituar as características do mito com o apoio de estudiosos da área, em seguida, procuramos aplicar esses conceitos na análise da narrativa indígena escolhida. Por fim, com base na metodologia proposta por Erwin Panofsky (2017), analisamos como a narrativa mitológica é incorporada nas composições imagéticas da obra. 4 Doutorando em Letras: Estudos Literários (UFPR). CV: http://lattes.cnpq.br/5006822830827676 5 Mestra em Letras e Artes (UEA). CV: http://lattes.cnpq.br/5755763045522163 http://lattes.cnpq.br/5006822830827676 http://lattes.cnpq.br/5755763045522163 36 Tayson Ribeiro Teles (org.) MITO E LITERATURA: CONCEITUAÇÃO E DIÁLOGOS Definir o mito é uma tarefa difícil, já que se apresenta muitas vezes como um objeto ilimitado, sujeito a muitas interpretações, de diferentes áreas do conhecimento. Na literatura, há pouco tempo, o mito tem ganhado notorie- dade. Os mitos encontram resguardo na literatura pelas vias do ato de narrar. Lembremo-nos da herança clássica que chegou até nós pelo viés literário. Na visão de Eliade (2016), a herança clássica foi “salva” pelos poetas, pelos artistas e filósofos. Os deuses e seus mitos foram transmitidos à Renascença e ao século XVII, pelas criações literárias e artísticas. Conforme Krüger (2005, p.
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