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/ DEFINIÇÃO A trajetória da inserção da população negra na educação formal, os limites e barreiras à ascensão dos negros no Brasil, os usos do conceito de raça na escola, o racismo na educação formal, a legislação educacional antirracista no Brasil, raça, classe e gênero em perspectiva interseccional na educação. PROPÓSITO Refletir sobre os avanços e retrocessos em torno do acesso da população negra à educação formal durante a escravidão e no pós-abolição. OBJETIVOS / (Fonte: NatBasil / Shutterstock) MÓDULO 1 Identificar as ações políticas e sociais que limitaram o acesso de escravos e libertos à educação formal no Brasil (Fonte: NatBasil / Shutterstock) MÓDULO 2 Reconhecer o caráter histórico das políticas afirmativas instituídas no Brasil e o protagonismo dos movimentos negros (Fonte: NatBasil / Shutterstock) MÓDULO 3 Analisar os debates sobre as desigualdades raciais no contexto escolar (Fonte: NatBasil e Vector Posters and Cards / Shutterstock) / Identificar as ações políticas e sociais que limitaram o acesso de escravos e libertos à educação formal no Brasil INTRODUÇÃO Assista ao vídeo de introdução do tema, realizado por Ricardo Fernandes – professor da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro. BRASIL COLONIAL / A ESCOLA No Brasil, a escola (enquanto instituição e, seu produto, a escolarização) sempre foi um espaço privilegiado para grupos sociais bem definidos. Criada em 1540 pelo padre ‒ posteriormente tornado santo ‒ Inácio de Loyola, a Companhia de Jesus foi uma resposta da Igreja Católica à Reforma Protestante visando a defesa e a propagação da fé que, segundo a ordem, abarcaria a catequese e a escolarização. null (Fonte: Wikimedia Commons) Inácio de Loyola. SEGUNDO INÁCIO DE LOYOLA, O ESTUDO DAS LETRAS NÃO TERIA OUTRO SENTIDO, SENÃO O DE APROXIMAR A ALMA DO SEU CRIADOR. Foi sob os auspícios de Dom João III, rei de Portugal, que a missão chefiada pelo padre Manoel da Nóbrega desembarcou em Salvador acompanhando a expedição do recém- nomeado governador-geral Tomé de Sousa. Na Bahia, os jesuítas criaram um colégio que se tornaria o centro intelectual da Colônia por mais de 200 anos. javascript:void(0) / AUSPÍCIOS Proteção, favor, recomendação. Apoio financeiro, material, técnico etc., para que se realize uma obra ou evento; patrocínio. null (Fonte: Victor Frond / Arquivo Nacional) Colégio dos Jesuítas. Ainda na segunda metade do século XVI, os jesuítas se espalharam por outras partes da América portuguesa, estabelecendo colégios em Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, além de residências em Ilhéus, Porto Seguro e em Vitória do Espírito Santo. Os jesuítas se especializaram num modelo de ensino baseado na incorporação de símbolos e rituais da cultura local de cada povo. Além disso, dedicavam-se à tradução e elaboração de gramáticas específicas de cada língua local, servindo de recurso didático. IMPORTANTE Em 1697, o jesuíta Pedro Dias, quando ainda estava na Bahia, escreveu o livro A Arte da Língua de Angola que, como já dito anteriormente, serviria como recurso para o ensino dos jesuítas e, ao mesmo tempo, uma tentativa de unificação dos falares bantu. Antes dele, o jesuíta angolano Manuel de Lima escreveu, em 1580, os livros Catecismo na Língua dos Ardas e Doutrina Cristã, traduzidos pelo padre jesuíta Baltazar Fernandes para a língua africana. Tudo isso serviria como recurso para o ensino dos africanos que ingressassem no Brasil. No contexto em que a entrada de escravos ainda era incipiente (entre 1582 e 1690, foi estimado que 29.538 africanos tenham desembarcado na Bahia), a pretensão dos jesuítas parecia ter alguma viabilidade. javascript:void(0) / A ARTE DA LÍNGUA DE ANGOLA null (Fonte: Amazon.com) Livro A Arte da Língua de Angola. A ação dos jesuítas tinha como público-alvo as populações indígenas. Em relação à população negra, a escolarização e a catequização se limitavam aos escravos das propriedades jesuíticas, uma vez que, aos demais, o acesso à educação era extremamente difícil, como lembra o padre Serafim Leite, historiador da Companhia de Jesus: OS ESCRAVOS NEGROS NÃO ERAM LIVRES PARA BUSCAREM A INSTRUÇÃO MÉDIA E SUPERIOR, E CLARO ESTÁ QUE OS SENHORES NÃO OS COMPRAVAM PARA OS MANDAR AOS ESTUDOS E FAZER DELES BACHARÉIS OU SACERDOTES. (LEITE, 1938-1950:144) Dessa forma, não havendo um impedimento legal para que a população negra escravizada tivesse acesso à educação formal, na prática era algo quase inacessível, considerando a brutalidade do regime escravista e as (Fonte: Netmundi) Execução de punição por flagelo, por Jean- Baptiste Debret. / condições com que eles eram tratados e vistos pela sociedade em geral como mão de obra para os serviços braçais que dispensavam o uso do intelecto. Soma-se a isso as ideias correntes na época sobre a incapacidade dos negros para aprender e a inaptidão para as ciências e as letras. NÃO FOI PRECISO UMA LEI IMPEDINDO O ACESSO DE ESCRAVOS AOS BANCOS ESCOLARES. BASTAVA NÃO HAVER UM MECANISMO LEGAL QUE ESTIMULASSE E CRIASSE TAL OPORTUNIDADE, OU SEJA, O NÃO DITO ATRAVÉS DO SILÊNCIO DAS LEIS GRITAVA E ERA BEM COMPREENDIDO POR TODOS. No entanto, alguns escravos conseguiam acesso à educação formal e aprendiam a ler e a escrever nas propriedades onde trabalhavam. Isso acontecia, às vezes, pela necessidade do serviço que eles desempenhavam, por livre iniciativa dos proprietários, que contratavam os professores régios para ensinar aos seus filhos e, naquele ambiente, o escravo passava a ter contato com o mundo da escrita e da leitura, ainda que de forma precária. javascript:void(0) / PROFESSORES RÉGIOS Com a expulsão dos jesuítas do Brasil em 1759, no âmbito das Reformas Ilustradas promovidas pelo Marquês de Pombal, houve uma grande lacuna no processo de escolarização da Colônia, uma vez que as escolas estavam praticamente restritas às dos jesuítas. Naquele mesmo ano, Pombal criou o cargo de professores régios, nomeados pela Coroa para suprir esse espaço. Outras vezes, a aprendizagem se dava por inciativa do próprio escravo, em contato com outras pessoas livres que lhes ensinava rudimentos da leitura e da escrita. De todo modo, o que havia era uma política que negava o acesso do cativo à educação através da completa ausência de referência a essa situação na legislação da época. Muitos africanos trazidos como escravos já falavam português e, em alguns casos, sabiam ler e escrever. Da mesma forma, a maioria dos escravos muçulmanos que foram trazidos para o Brasil sabiam ler e escrever em árabe e passaram não só a ensinar a língua para outros escravos nascidos aqui, como também encontraram formas de aprender o português. SAIBA MAIS Em 1469, os portugueses invadiram a região do golfo da Guiné. A partir daí, estenderam seus domínios por um amplo território da África Ocidental e Oriental. Esse domínio favoreceu a implantação da política de catequização a partir de ordens religiosas católicas, como os franciscanos e os jesuítas, que procuravam ensinar os modos de vida europeus, como a língua, a cultura e a religião. REFLEXÃO / Veja a seguir um anúncio divulgando aulas de português, publicado em 1821. Pense sobre as seguintes questões: O que esse anúncio significava na época? Para quem ele era direcionado? Como uma pessoa negra poderia ter acesso a esse conhecimento naquele tempo? null (Fonte: Fundação Biblioteca Nacional, 2020) Diário do Rio de Janeiro (RJ) / Ano 1821/Edição 0900021. BRASIL IMPÉRIO null (Fonte: Wikipedia) Independência ou morte, Pedro Américo, 1888. A ESCOLARIZAÇÃO DO NEGRO APÓS A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL Após a Independência do Brasil (1822), a situação da escolarização para a população negra pouco mudou. A Constituição de 1824, que vigorou por mais de 150 anos, indicava que a instrução primária era gratuita para todos os cidadãos. O que parecia ser uma posição igualitária e progressista era o endurecimento, a partir da carta magna, de um impeditivopara a / população escrava e para os africanos de maneira especial acessarem a educação escolar, uma vez que não eram reconhecidos como detentores dos direitos de cidadão. SAIBA MAIS Os escravos eram considerados instrumentum vocali, não eram humanos, eram instrumentos, não poderiam ser considerados pessoas e, consequentemente, sujeitos de direitos. Assim sendo, não tinham direitos de integridade física, à liberdade ou a qualquer outro direito civil básico. (ALVES, 2005) A primeira lei voltada para o setor educacional do país e que tratou sobre educação pública, foi a Lei 15 de outubro de 1827. No entanto, ela se omitia à educação escolar da população negra. Esta lei ficou em vigência por mais de cem anos, até 1946. Ao longo de todo o período do Brasil Império, a proposta de ensino visava a construção de uma comunidade imaginada a partir do modelo eurocêntrico de ensino, que desprezava as demais formas de conhecimento, privilegiando tanto o acesso à escola quanto a representatividade dos conteúdos às classes mais abastadas de maioria branca. COMUNIDADE IMAGINADA Comunidade Imaginada é um conceito criado pelo historiador e cientista político Benedict Anderson (1936-2015) que define o descolamento do ensino da comunidade, apresentando uma realidade nacional que deve ser amada, que é europeia e é hegemônica culturalmente. Além do mais, o alcance da escolarização continuou bastante limitado por questões estruturais. Num país com ampla maioria da população vivendo em áreas rurais e com grandes distâncias a serem percorridas, as poucas escolas e os poucos professores eram insuficientes. Esses aspectos são importantes para que entendamos as limitações de acesso das populações pobres, majoritariamente formadas por negros livres e libertos. javascript:void(0) / SE AS DISTÂNCIAS GEOGRÁFICAS E O CARÁTER ELITISTA DO MODELO EDUCACIONAL EM VOGA JÁ LIMITAVAM O ACESSO À EDUCAÇÃO FORMAL, OUTROS FATORES COMO O TIPO DE TRABALHO DESTINADO À GRANDE PARCELA DA POPULAÇÃO NEGRA, LIVRE OU ESCRAVA, COMPLICAVA AINDA MAIS. O trabalho braçal, fosse nas áreas rurais ou nos centros urbanos, era quase que totalmente exercido por essa parcela da população, numa rotina extenuante que, por si só, era um forte impeditivo de acesso à educação formal. Isso não se restringe aos adultos. Meninos e meninas recém-saídos da infância já serviam como domésticos, trabalhadores rurais ou em qualquer serviço de rua. CONCURSO DE COMPOSIÇÃO ENTRE ESCOLARES NO DIA DE SANTO ALEXIS A aquarela do pintor francês Jean-Baptiste Debret, com data provável de 1839, uma fina crítica social à escravidão e seu legado no Brasil. Intitulada de Concurso de composição entre escolares no dia de Santo Alexis, o tema principal que nomeia a pintura ocupa o fundo da tela, onde se veem crianças brancas com papéis nas mãos apresentando-os a transeuntes. Em primeiro plano, Debret mostra uma criança negra, descalça e maltrapilha que, com uma outra escrava adulta (que tem nas mãos alguns livros), segue uma menina da elite, provavelmente em direção à escola. / null (Fonte: History Archive) Concurso de composição entre escolares no dia de Santo Alexis (DEBRET, 1839). A PINTURA É UMA DENÚNCIA DO FOSSO QUE SEPARAVA, NUM MESMO AMBIENTE, CRIANÇAS EM SITUAÇÕES SOCIAIS DISTINTAS. O PRINCÍPIO LENTO E RESISTENTE DA ESCOLARIZAÇÃO DOS HOMENS NEGROS null (Fonte: Maquiladora / Shutterstock) O Ato Adicional à Constituição, de agosto de 1834, determinava que as Províncias passariam a ser as responsáveis por organizar, definir e prover o ensino primário em suas respectivas localidades. Esse ato contribuiu ainda mais para a desestruturação da educação formal no país, uma vez que muitas províncias não estavam preparadas financeiramente nem tecnicamente para isso. Especialmente aquelas mais afastadas da Corte, como as províncias do Norte (que incluía o atual Nordeste), aumentando o fosso e limitando o acesso pela população negra. / Nesse contexto da descentralização, várias províncias agiram, efetivamente, no sentido de segregar o acesso de escravos e libertos à escola: Minas Gerais foi a pioneira, ainda no ano de 1835, determinando que somente as pessoas livres poderiam frequentar as escolas públicas. Seguem, com o mesmo teor, as províncias de Goiás (1835) e Espírito Santo (1835). O decreto do Rio Grande do Norte (1836) repetia o mesmo tipo de impedimento sobre a admissão de alunos que não fossem livres, porém destacava que as professoras poderiam receber escravas, com a ressalva de que fosse apenas para ensinar as prendas domésticas. Embora o decreto confirmasse a ideia em vigor na época, a de inaptidão dos negros para as letras e predisposição para os trabalhos braçais, não deixa de ser um acanhado avanço que, mesmo assim, pouco durou. Em 1837, a permissão para aprender prendas domésticas foi revogada. Outras províncias continuaram a criar seus estatutos de ensino com o mesmo perfil impeditivo aos escravos e, quase sempre, aos libertos também. A discussão sobre a importância do acesso à educação para a população escrava e liberta só voltou à cena em meados da década de 1860, com as discussões em torno da construção da Lei do Ventre Livre. Um dos principais responsáveis por provocar esse debate foi Aureliano Cândido Tavares Bastos. null (Fonte: bluelela / Shutterstock) EDUCAÇÃO TAVARES BASTOS Crítico da escravidão, Tavares Bastos associava a presença do regime no Brasil à ignorância da população livre. Dizia ele: AURELIANO CÂNDIDO TAVARES BASTOS (1839-1875) javascript:void(0) / Foi um político, escritor e jornalista brasileiro. É considerado um precursor do federalismo, por causa de sua luta contra a centralização administrativa durante o Segundo Reinado. null (Fonte: Academia Brasileira) Tavares Bastos. O QUE HAVEIS DE OFERECER A ESSES ENTES DEGRADADOS QUE VÃO SURGIR DA SENZALA PARA A LIBERDADE? O BATISMO DA INSTRUÇÃO. O QUE RESERVAIS PARA SUSTER AS FORÇAS PRODUTORAS ESMORECIDAS PELA EMANCIPAÇÃO? O ENSINO, ESSE AGENTE INVISÍVEL QUE, CENTUPLICANDO A ENERGIA DO BRAÇO HUMANO, É SEM DÚVIDA A MAIS PODEROSA DAS MÁQUINAS DE TRABALHO. (BASTOS, 1996, p. 254) Ele via a educação como a chave de mudança para a população que, em breve, livrar-se-ia da escravidão. Os debates em torno da Lei do Ventre Livre giravam sobre o que fazer com os ingênuos. Na perspectiva antiescravista e emancipadora de Tavares Bastos, a população saída do cativeiro deveria passar pela educação formal, oferecida pelo Estado, como forma de estar apta para a vida em sociedade. O jogo político em torno da construção da lei, no entanto, não foi favorável e seus resultados foram pífios. A classe de proprietários escravistas, dos maiores aos menores, ainda se / agarrava aos fiapos da escravidão para defender a diferenciação social. FOI NO CONTEXTO DE UMA JÁ ACENTUADA CRISE DO ESCRAVISMO DA DÉCADA DE 1870 QUE MUITAS PROVÍNCIAS, TALVEZ INFLUENCIADAS POR ESSE DEBATE DE TAVARES BASTOS, APROVARAM A CRIAÇÃO DOS PRIMEIROS CURSOS NOTURNOS, O QUE É VISTO COMO A PRIMEIRA TENTATIVA, AINDA QUE BASTANTE TÍMIDA ‒ POIS, EM MUITOS LUGARES, CONTINUOU VALENDO A INTERDIÇÃO PARA ESCRAVOS ‒ DE POSSIBILITAR O ACESSO DO TRABALHADOR, MAJORITARIAMENTE NEGRO, NA EDUCAÇÃO FORMAL. SOMENTE EM 1878, UM DECRETO PERMITIU A MATRÍCULA DE NEGROS LIBERTOS MAIORES DE QUATORZE ANOS NOS CURSOS NOTURNOS. REFLEXÃO / Veja a seguir o trecho de um documento do ano de 1872, que apresenta algumas informações sobre o plano de ensino da Escola Noturna de Adultos: null (Fonte: Memória Biblioteca Nacional, 2020) Relatório do ano de 1872 apresentado à Assembleia Geral em aditamento ao 8 de maio de 1872. Reflita sobre a frustração de ser impedido de adquirir esses conhecimentos que, apesar de básicos, eram negados às pessoas simplesmente por causa da cor de sua pele. PRINCIPAIS REFORMAS EDUCACIONAIS E SEUS IMPACTOS NA EDUCAÇÃO DE ESCRAVOS, LIBERTOS E PESSOAS NEGRAS LIVRES A REFORMA LEÔNCIO CARVALHO (1879) Derrubou o veto sobre a frequência dos escravosnas escolas públicas, levando alguns escravizados a frequentarem escolas profissionais e, a partir daí, multiplicar o que aprendiam com outros negros em espaços informais, às vezes na própria senzala. A REFORMA RIVADÁVIA CORREIA (1911) Foi um ponto de inflexão nos pequenos avanços da reforma anterior, pois implantou a realização de exames admissionais e a cobrança de taxas nas escolas, limitando o acesso da javascript:void(0) javascript:void(0) / maior parcela da população à educação formal. CARLOS LEÔNCIO DA SILVA CARVALHO (1847-1912) Foi um advogado, professor e político brasileiro que defendia a educação de adultos, os cursos noturnos e inserção de escravos nas escolas. RIVADÁVIA DA CUNHA CORREIA (1866-1920) Ministro da Justiça e dos Negócios Interiores, criou o vestibular em 1911. O fim da escravidão legou àquela população recém-saída do cativeiro e, por consequência, aos seus descendentes, um ocultamento. Incorporada no conjunto da sociedade brasileira, teve suas necessidades específicas limitadas e seus direitos sociais silenciados, sendo posta à margem da jovem República. POLÍTICOS E SENHORES DE ESCRAVOS, EM SUA MAIORIA, SEMPRE SE POSICIONARAM CONTRÁRIOS AO ACESSO DE ESCRAVOS E LIBERTOS À EDUCAÇÃO FORMAL. PARA ELES ERA INIMAGINÁVEL VER SEU ESCRAVO OU UM EX-ESCRAVO (LIBERTO) DIVIDINDO OS / MESMOS ESPAÇOS FÍSICOS (ESCOLA) E SIMBÓLICOS (CONHECIMENTO) COM SEUS FILHOS. A alforria conquistada pelo escravo, na maioria das vezes, não era sinal para a mudança de tratamento. Ser liberto ainda era ser considerado de segunda classe, o que levava muitos senhores a conservarem o tratamento hierarquizado que consistia, entre outras coisas, em ter privilégios sobre o acesso a determinados espaços. Como veremos a seguir, foi com a insistente e longa luta dos movimentos negros que essa população conseguiu avanços mais significativos no campo educacional brasileiro. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. APESAR DA POLISSEMIA QUE CARACTERIZA O TERMO CULTURA, SEU SENTIDO ETIMOLÓGICO ELEMENTAR SOBREVIVEU AO LONGO DO TEMPO. ASSINALE, ENTRE AS OPÇÕES A SEGUIR, AQUELA QUE MELHOR DEFINE ESSE SENTIDO. A) Em seu sentido etimológico elementar, cultura significa arte erudita, sentido que sobrevive até hoje, pois entendemos como cultura apenas as sofisticadas manifestações estéticas. B) Em seu sentido etimológico elementar, cultura remete às práticas agrícolas e ao acúmulo do trabalho das gerações anteriores no trato com a terra. De alguma forma, a associação entre cultura e repertório coletivo sobrevive até hoje. C) Em seu sentido etimológico elementar, cultura significa tolerância e respeito aos costumes diferentes, o que fez com o que o conceito já nascesse vocacionado para a alteridade, não admitindo a possibilidade de etnocentrismos. D) Em seu sentido etimológico elementar, cultura significa o conjunto de artimanhas acionado pelos poderosos para mentir e enganar os mais pobres. Por isso, Marx e Engels, formuladores / do conceito ideologia, são os grandes representantes dos estudos antropológicos no mundo ocidental. 2. NO TRATADO HISTÓRIAS, HERÓDOTO ELABOROU UMA FORMA DE LIDAR COM AS MANIFESTAÇÕES CULTURAIS QUE CHEGOU ATÉ A MODERNIDADE. ASSINALE ENTRE AS OPÇÕES ABAIXO AQUELA QUE MELHOR APRESENTA ESSE LEGADO. A) Para Heródoto, apenas as manifestações culturais gregas eram dignas de serem narradas, premissa que fundou a postura etnocêntrica característica da colonização moderna. B) Para Heródoto, apenas as manifestações religiosas dos bárbaros eram dignas de serem narradas, justamente por serem semelhantes às manifestações cristãs. C) Para Heródoto, interessava apenas os conflitos políticos travados entre cidades gregas, o que fez com que seu texto tivesse clara dimensão etnocêntrica e preconceituosa. D) Heródoto produziu uma retórica da alteridade. Seu interesse era colocar lado a lado os grandes feitos de gregos e bárbaros, igualmente dignos de lembrança. Ganhou força, assim, a ideia de que culturas diferentes também são dignas de serem estudadas. GABARITO 1. Apesar da polissemia que caracteriza o termo cultura, seu sentido etimológico elementar sobreviveu ao longo do tempo. Assinale, entre as opções a seguir, aquela que melhor define esse sentido. Parabéns! A alternativa "B " está correta. À luz da discussão desenvolvida por Alfredo Bosi, o termo cultura, originalmente, refere-se às técnicas agrícolas e remete ao acúmulo do trabalho humano na terra ao longo do tempo. 2. No tratado Histórias, Heródoto elaborou uma forma de lidar com as manifestações culturais que chegou até a modernidade. Assinale entre as opções abaixo aquela que melhor apresenta esse legado. Parabéns! A alternativa "D " está correta. / O texto de Heródoto é marcado pela preocupação de traduzir a alteridade, o bárbaro, para o grego, fundando a ideia de que existem culturas diferentes dignas de serem observadas e estudadas. (Fonte: NatBasil e Vector Posters and Cards / Shutterstock) Reconhecer o caráter histórico das políticas afirmativas instituídas no Brasil e o protagonismo dos movimentos negros BRASIL REPÚBLICA: A ESCOLHA DO PROTAGONISMO Até o momento, o desenvolvimento deste estudo nos deu a mesma e tradicional impressão trazida da escola: quem conta a história dos homens negros é o outro, são padres, historiadores, políticos... A voz afrodescendente esteve distante: não que não existisse, contudo era silenciada, esbranquiçada, como pudemos ver com os Rebouças ou Machado de Assis. Ainda que tenhamos apresentado homens negros que se valeram das oportunidades e espaços para se manifestar, seus discursos ‒ mesmo o abolicionista ‒ não se posicionaram como uma luta pessoal, mas como uma luta pelos outros. Com a República, a ampliação das possibilidades de acesso permitiu a formação de movimentos singulares, que nos deram a oportunidade de conhecer essa história através do lugar correto de fala, ou seja, dos grupos que ali viveram! / VAMOS CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE ISSO? DEVEMOS LEMBRAR QUE A CONSTITUIÇÃO DE 1891 FOI PARTICULARMENTE CRUEL COM ESTA POPULAÇÃO, UMA VEZ QUE CRIOU MECANISMOS DE CONTROLE SOCIAL FORTEMENTE DIRECIONADOS PARA O COMPORTAMENTO E AS TRADIÇÕES DESSAS COMUNIDADES. OU SE VIVIA COMO OS BRANCOS, COMO DETERMINAVA A CIVILIZAÇÃO, OU ESTARIAM EXCLUÍDOS. / INTRODUÇÃO Vejamos o que diz o jornal O Alfinete, trinta anos após a Abolição: O MOVIMENTO NEGRO E A DITADURA VARGAS O Movimento Negro sofreu um duro golpe durante a ditadura Vargas. Ao dissolver os partidos políticos existentes e proibir a criação de novos, o decreto de dezembro de 1937, baixado pelo / presidente Getúlio Vargas, impactou negativamente no ainda incipiente acesso de negros ao ensino oficial ao proibir atividades de grupos como as do Movimento Negro, visto como perigoso pelo regime. null (Fonte: Biblioteca Nacional, 2020) Grupo tirado em frente à sede da Delegação da F. N. B. [Frente Negra Brasileira]. ABDIAS DO NASCIMENTO Em 1944, Abdias do Nascimento, militante e intelectual negro, criou no Rio de Janeiro o Teatro Experimental do Negro, que buscava promover os valores da cultura negra e o combate ao preconceito racial, mascarado pelo ideal de democracia racial. null (Fonte: Integralismo) Abdias do Nascimento. Esse foi o primeiro movimento a defender a criação de uma legislação antirracista e a denunciar escolas que não aceitavam alunos negros e livros infantis e didáticos que alimentavam o preconceito racial em seus textos e imagens. O grupo ainda teve profunda participação na elaboração de um manifesto com reivindicações dos movimentos negros para serem incorporadas na Constituição de 1946. AQUELE FOI O PRIMEIRO DOCUMENTO A TRATAR SOBRE PROPOSTAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS COMO COMPENSAÇÃO DAS DESIGUALDADES DERIVADAS DA javascript:void(0) / ESCRAVIDÃO. ALI, TAMBÉM, SE APRESENTAVA UMA PAUTA DE REIVINDICAÇÕES DE NEGROS PARA NEGROS NA EDUCAÇÃO. AÇÕES AFIRMATIVAS Entende-se por ações afirmativas o conjunto de medidas especiais voltadas a gruposdiscriminados e vitimados pela exclusão social ocorrida no passado ou no presente. As ações afirmativas são preventivas e reparadoras no sentido de favorecer indivíduos que historicamente são discriminados. (MEC, 2020) A proposta acabou não recebendo o apoio dos constituintes que insistiam na defesa de que havia democracia racial no país e esse tipo de lei provocaria divisões que, até então, segundo eles, não existiam. A LEI 10.639/03 E SEUS (DES)CAMINHOS Apenas no ano de 2003 foi instituída a mais ampla legislação antirracista no sistema educacional do Brasil, a lei 10.639/03. A ideia era de que o racismo precisava ser combatido a partir da escola, curricularizando a história e a cultura da África e dos afrodescendentes. Essa lei, no entanto, teve um longo caminho, vejamos mais sobre os principais marcos que contribuíram para sua formação: / 1950 I Congresso do Negro Brasileiro, ainda em 1950, promovido pelo Teatro Experimental Negro, no Rio de Janeiro. Ali se discutiu, entre outras coisas, a possibilidade de inclusão da História da África e dos africanos, da luta dos negros no Brasil e da sua participação na formação da sociedade e da cultura brasileiras nos programas escolares. 1961 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 deu um passo nesse sentido ao condenar qualquer tratamento desigual por motivo de convicção filosófica, política ou religiosa, bem como a quaisquer preconceitos de classe ou de raça. 1964 Com o golpe militar de 1964 e a instauração da ditadura no Brasil, o Movimento Negro teve perdas em suas ações devido às constantes perseguições aos seus membros. 1970 / Somente nos anos de 1970 o movimento negro conseguiu se rearticular, muito influenciado pelas conquistas então obtidas pelo movimento negro nos Estados Unidos e na luta de Rosa Parks, Martin Luther King, Malcom X e os Panteras Negras pelos direitos civis. Os anos 1970 também foram os mais duros no enfrentamento da ditadura no Brasil, quando os militares chegaram a infiltrar pessoas dentro do recém-criado MNU (Movimento Negro Unificado) para espionar as ações. Nesse período, os militares usaram o mito da democracia racial como política de Estado e o ato de questionar o racismo no país era visto como subversivo. 1980 Quando começaram as manifestações em torno da redemocratização, no início dos anos 1980, as manifestações antirracistas se confundiam com o movimento Diretas Já, apontando que a democracia só poderia vigorar com a inclusão dos negros de fato na sociedade. 1986 Na convenção nacional O negro e a Constituinte, em 1986, foi aprovada a proposta para que a Constituição Federal, em discussão naquele momento, definisse a educação como meio de combate ao racismo e à discriminação, bem como tornasse obrigatório o ensino de história das populações negras no Brasil. javascript:void(0) / MANIFESTAÇÕES Pode parecer atual, mas a fotografia abaixo é de 1981. null (Fonte: Biblioteca Virtual Consuelo Pondé, 2020) Revista MNU, n° 4, jul./ago. de 1981. p. 5. MAIS UMA VEZ A PROPOSTA DO MOVIMENTO NEGRO FICOU DE FORA. OS CONGRESSISTAS ALEGARAM QUE SE TRATAVA DE UMA QUESTÃO ESPECÍFICA E QUE POR ISSO DEVERIA SER TRATADA NUMA LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR. Porém, a Constituição Cidadã, aprovada em 1988, implementou algumas reivindicações do Movimento Negro: 1. Reconheceu a Educação de Jovens e Adultos como direito para quem não teve acesso à escolarização; / 2. Classificou o racismo como crime inafiançável e imprescritível (posteriormente, a lei 7716/1989 definiu os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor); 3. Reconheceu a diversidade da composição da população brasileira, indicando a necessidade de que o currículo escolar contemplasse tal discussão; 4. Legalizou o direito de posse da terra às comunidades quilombolas e definiu a criação da Fundação Cultural Palmares. Mesmo com os avanços e o respaldo constitucional, na prática, as mudanças na política educacional da década de 1990 foram pequenas. A lei 9.394/96 das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não incorporou nenhum tratamento específico à questão racial nas escolas. JÁ OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS TRATARAM A TEMÁTICA RACIAL DILUÍDA DENTRO DE UMA GRANDE ÁREA DENOMINADA DE PLURALIDADE CULTURAL, SEM CURRÍCULO ESPECÍFICO E QUE DEVERIA SER ABORDADO DE FORMA TRANSVERSAL NAS DIVERSAS DISCIPLINAS, ESVAINDO ALGUMAS DAS REIVINDICAÇÕES MAIS IMPORTANTES DO MOVIMENTO NEGRO, COMO A CRIAÇÃO DE UMA DISCIPLINA SOBRE A HISTÓRIA DA ÁFRICA E A INCORPORAÇÃO DAS DISCUSSÕES RACIAIS DE FORMA MAIS OBJETIVA. / No mesmo período, o Movimento Negro pautava suas lutas em torno do acesso do negro ao Ensino Superior, estimulando a criação de cursos pré-vestibulares para esse público. LEI DE COTAS Outra frente encampada pelo movimento, ainda no final dos anos 1990, foi a luta pelas cotas no Ensino Superior. IMPORTANTE A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), durante a reitoria de Nilcea Freire, foi a primeira universidade do país a criar um sistema de cotas em vestibulares por meio de uma lei estadual que estabelecia 50% das vagas do processo seletivo para alunos egressos de escolas públicas cariocas, mas foi a Universidade de Brasília (UnB) a pioneira em criar e implantar uma política de ações afirmativas para negros em seu vestibular de 2004. NILCEA FREIRE null (Fonte: Wikipedia) Nilcea Freire, 2007. Agência Brasil. As ações que eram tomadas de forma individualizada pelas universidades federais e estaduais fortaleceram-se com a lei 12.711/2012, conhecida como Lei de Cotas, a qual destina metade javascript:void(0) / das vagas das universidades, institutos e centros federais de educação para estudantes oriundos de escolas públicas. Sem a possibilidade de as instituições públicas absorverem a totalidade da secular demanda da população negra por ensino superior, foi criado um mecanismo de concessão de bolsas de estudo para afrodescendentes em faculdades privadas: o PROUNI. A distribuição das vagas, tanto no sistema de cotas quanto no de bolsas, leva em conta critérios raciais e sociais. A APROVAÇÃO DAS COTAS RACIAIS NÃO OCORREU SEM POLÊMICA. A AÇÃO FOI JUDICIALIZADA DIVERSAS VEZES POR GRUPOS POLÍTICOS E ENTIDADES QUE QUESTIONAVAM A VALIDADE E A NECESSIDADE DA INICIATIVA, COM ARGUMENTOS QUE RETOMAVAM PREMISSAS DO MITO DA DEMOCRACIA RACIAL. ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL Num contexto mais amplo de políticas públicas antidiscriminatórias e reparadoras, inclui-se o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado em 2003, também após longa polêmica. O estatuto abarca os diversos setores da sociedade e instrui procedimentos para atuar na diminuição das desigualdades e na adoção de políticas afirmativas para a população negra. / Atualmente, tem sido rotineiro o recurso, por parte da Justiça, ao Capítulo III do Estatuto, que versa sobre o direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício dos cultos religiosos. O racismo mal resolvido no país tem se manifestado em crimes de diversas formas contra participantes, religiosos ou locais de culto de religiões de matriz africana. No campo simbólico, é preciso destacar a Marcha Zumbi contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida, em 1995, marco do tricentenário da morte de Zumbi dos Palmares. A marcha, devido à sua repercussão pública, foi uma das primeiras estratégias dos movimentos negros para deslocar o foco das atenções da data da Abolição da Escravatura, 13 de maio, para o dia 20 de novembro, em razão do Dia Nacional da Consciência Negra. null (Fonte: Rodrigo S Coelho / Shutterstock) Celebração do Dia da Consciência Negra, 2019. Rodrigo S Coelho. A TEMÁTICA DA REPARAÇÃO PARA OS DESCENDENTES DOS ESCRAVIZADOS SEMPRE ESTEVE EM VOGA, MAS NUNCA FOI UNANIMIDADE, NEM MESMO DENTRO DO MOVIMENTO NEGRO NO BRASIL. Sob inspiração dos debates sobre reparação que ocorrem nos Estados Unidos desde o fim da segregação racial, alguns membros dos movimentos negros, na década de 1990, discutiram aviabilidade de propor ações reparatórias de cunho financeiro para a população negra. Outros, porém, foram contrários a essa pauta, alegando que o pagamento monetário provocaria um posterior silenciamento e esquecimento sobre a escravidão e suas consequências, além de que, ao contrário dos Estados Unidos que adotam a política de One- javascript:void(0) / drop rule, no Brasil haveria uma enorme dificuldade em estabelecer os critérios de identificação de cor, devido às múltiplas formas com que as pessoas negras se reconhecem. ONE-DROP RULE O modelo americano é com base no fenótipo, uma gota de sangue negro garante os direitos de cota. IMPORTANTE Ao final, prevaleceram como estratégia as reivindicações de medidas reparatórias de caráter social e educacional, na forma de ações afirmativas. RESUMINDO A trajetória nos mostrou que a atuação dos movimentos negros foi fundamental para a construção e implementação de políticas de ações afirmativas no Brasil, especialmente no campo educacional. Vimos, também, que o foco na educação não foi por acaso, mas historicamente sempre foi visto pelos movimentos negros como o principal mecanismo que poderia favorecer a diminuição das desigualdades econômicas e sociais entre brancos e negros no Brasil. REFLEXÃO Você, estudante que está acompanhando este tema, pode estar pensando: javascript:void(0) / (Fonte: Roman Samborskyi / Shutterstock) Caro, conforme anunciado no início do módulo, a proposta é que você possa definir o caráter histórico. Neste sentido, conforme aprendemos com a História, seu discurso não é uma verdade, mas uma análise, a escolha de documentações, a investigação de um determinado ponto de vista. A História do Brasil Republicano foi vista e revista diversas vezes, trata-se do discurso político, do conhecimento de dinâmicas gerais. A definição que pretendemos, que escolhemos, não é essa. Definimos aqui investigar e entender a construção histórica do discurso do movimento negro ao longo dos séculos XX e XXI no que tange à educação. Que discurso é esse, que movimentos homens e mulheres negras organizaram e defenderam no Brasil pós-abolição? A proposta é conhecermos os fundamentos de suas lutas e as ações tomadas ao longo destes últimos 150 anos. VERIFICANDO O APRENDIZADO A PAIDEIA ATENDIA AOS MESMOS CRITÉRIOS DE INCLUSÃO/EXCLUSÃO DA DEMOCRACIA ATENIENSE. ASSINALE ENTRE AS ALTERNATIVAS ABAIXO AQUELA QUE MELHOR RELACIONA A PAIDEIA E A DEMOCRACIA NA ANTIGUIDADE GREGA. A) Entre os gregos, já existia o projeto de inclusão geral e irrestrita, o que garantia às mulheres e aos estrangeiros o mesmo acesso à educação e à atividade política. B) Entre os gregos, a Educação, chamada de Paideia, era restrita ao espaço rural, uma vez que era destinada ao ensino de técnicas agrícolas, fundamentais para a sobrevivência material daquela sociedade. C) Entre os gregos, a Educação, chamada de Paideia, era considerada como o preparo para o exercício da cidadania na pólis democrática, sendo, por isso, condicionada aos mesmos critérios de exclusão da cidadania: restrita a homens nascidos em Atenas. / D) Entre os gregos, a Educação, chamada de Paideia, era restrita aos iniciados nos mistérios religiosos, sendo voltada, por isso, à formação dos oráculos, que naquela sociedade atuavam com conselheiros dos governantes. 2. A MODERNIDADE TROUXE UMA GRANDE NOVIDADE EPISTEMOLÓGICA QUE MUDOU ESTRUTURALMENTE A FORMA COMO O MUNDO OCIDENTAL TRATAVA A TRANSMISSÃO DOS SABERES. ASSINALE ENTRE AS ALTERNATIVAS A SEGUIR AQUELA QUE MELHOR APRESENTA ESSA TRANSFORMAÇÃO ESTRUTURAL. A) A modernidade recuperou o legado da antiguidade, fazendo da Educação o preparo para a vida política. B) A modernidade deslocou o centro da autoridade do conhecimento de Deus para o método, o que foi incorporado por Descartes no livro Discurso sobre o método. C) A modernidade deslocou o centro da autoridade do método para a figura divina, o que foi incorporado por Tomás de Aquino e Santo Agostinho em seus tratados teológicos. D) A modernidade deslocou o centro da autoridade do conhecimento de Deus para as artes, o que foi incorporado pelos artistas renascentistas. GABARITO A Paideia atendia aos mesmos critérios de inclusão/exclusão da democracia ateniense. Assinale entre as alternativas abaixo aquela que melhor relaciona a Paideia e a democracia na antiguidade grega. Parabéns! A alternativa "C " está correta. A Paideia grega era vista como o preparo para o exercício da cidadania, atendendo aos mesmos critérios de exclusão da democracia, contemplando apenas homens nascidos em Atenas. Precisamos lembrar que a sociedade ocidental se considera herdeira da sociedade greco-romana. Nesse sentido, o papel da Paideia é central na percepção dos conceitos que construímos. / 2. A modernidade trouxe uma grande novidade epistemológica que mudou estruturalmente a forma como o mundo ocidental tratava a transmissão dos saberes. Assinale entre as alternativas a seguir aquela que melhor apresenta essa transformação estrutural. Parabéns! A alternativa "B " está correta. A modernidade fez do método a grande autoridade do conhecimento, ocupando o lugar que na Idade Média era de Deus. A noção de modernidade baseia sua visão ao considerar que uma grande e indiscutível ruptura foi recuperada, ao mesmo tempo em que a razão e sua condução seria a verdade a ser desenvolvida. (Fonte: NatBasil e Vector Posters and Cards / Shutterstock) Analisar os debates sobre as desigualdades raciais no contexto escolar INTRODUÇÃO Vimos a posição dos negros na história do Brasil, no que tange à educação, depois, buscamos a voz dos movimentos negros e suas ações efetivas ao longo dos séculos XX e XXI. Precisamos, a partir de agora, pensar como essas demandas se manifestam na escola hoje. / Neste vídeo você conhecerá um pouco da história de homens e mulheres negros, mostrando suas lutas, dificuldades enfrentadas por conta da cor de sua pele e o processo de superação. EDUCAÇÃO E DESIGUALDADES SOCIAIS E RACIAIS A primeira questão, a raça, já foi detectada como um fator de exclusão, identificação e luta. Mas, será que a única definição do sujeito e as manifestações da exclusão na escola se dão somente pela percepção de sua etnia? Claro que não. / NA ESCOLA, A DIFÍCIL QUESTÃO ÉTNICA VEM ACOMPANHADA DAS QUESTÕES DE GÊNERO ‒ A VIOLÊNCIA RACISTA É DIFERENTE NO QUE SE REFERE A HOMENS E MULHERES ‒ E QUESTÕES ECONÔMICAS. Neste caldeirão é que identificaremos os locais e as vertentes desses debates, assim como, principalmente, tentaremos entender a escola em meio a uma sociedade marcada por conflitos. Observe os gráficos abaixo: null (Fonte: IBGE) IBGE, 2018. O gráfico aponta para uma evidente desigualdade entre pessoas brancas e negras (pretos e pardos) que se faz materializar pelos dados referentes ao analfabetismo no Brasil atual. CENSO DE 1872 Tal situação não é nova. O Censo de 1872 foi o primeiro a ser realizado nacionalmente, um ano após a Lei do Ventre Livre, mas ainda em plena vigência da escravidão, e mostra uma sociedade com o marcador racial evidenciado nas desigualdades educacionais em que o analfabetismo era a regra. O Brasil tinha 81,43% da sua população livre (brancos e pessoas de cor) analfabeta. Em relação à população escrava, a exclusão era ainda maior, uma vez que a condição de escravo praticamente o impedia de ter acesso à escolarização: apenas 1.403 escravos sabiam ler e escrever, em todo o Brasil, sendo: / null (Fonte: tereza ferreira / Shutterstock) Mapa brasileiro dividido por região. Num recorte específico para a Bahia, os números não se alteravam tanto em relação ao cenário nacional: no censo de 1872, 79,44% da população livre era analfabeta. Excluindo os menores de 5 anos, o analfabetismo alcança 75,88%, ou seja, de cada dez pessoas, só duas sabiam ler e escrever. Nesse conjunto, pretos e pardos constituíam apenas 8,06%. Já os dados de 1890, dois anos após a Abolição e com a República recém-implantada,mostram que pretos e pardos na Bahia estavam alfabetizados em um percentual aproximado de 14,8%, e em 1940, o grupo alcançou 20,6%, ou seja, em 50 anos de implantação da República o número de alfabetizados entre pretos e pardos cresceu apenas 5%. null (Fonte: Katarinanh / Shutterstock) Mapa dos estados brasileiros. Pelo exposto até aqui, dois pontos ressaem da discussão: 1 O primeiro é que raça é um marcador importante para se entender o passado e o presente do Brasil. 2 O segundo, mostra que não dá para refletir sobre educação sem considerar as desigualdades sociais e raciais. Antes de avançar, vejamos os principais conceitos que ajudam a interpretar as relações étnico- raciais no Brasil: / RAÇA RAÇA, GÊNERO E CLASSE RACISMO RAÇA Diversos intelectuais e militantes dos movimentos negros, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, são contrários ao uso do termo raça. Defendem que, além de não haver raças biológicas, o termo raça reifica uma categoria política abusiva. REIFICA Reifica vem do verbo reificar. O mesmo que: coisifica. (DICIO, 2020) Outros tantos pesquisadores, porém, continuam utilizando o termo raça como uma categoria social. Isso se deve a alguns fatores: 1. A existência de grupos que se identificam e são identificados a partir de marcadores derivados da ideia de raça; 2. A sociedade brasileira ainda possui hierarquias e desigualdades que correspondem a esses marcadores. javascript:void(0) / RAÇA, GÊNERO E CLASSE De acordo com Guimarães (1999), o intelectual Thales de Azevedo, em 1955, já chamava atenção para a Interseccionalidade, raça e classe, afirmando que, no Brasil, os pobres são pretos e os ricos são brancos. Tal discrepância, segundo ele, era consequência do passado escravista. INTERSECCIONALIDADE Interseccionalidade é o estudo da sobreposição ou intersecção de identidades sociais e sistemas relacionados de opressão, dominação ou discriminação. (DE MORAES; DA SILVA, 2017, p. 58-75) EMBORA ESSE TIPO DE DISCURSO, QUE CULPA EXCLUSIVAMENTE O PASSADO PELOS PROBLEMAS DO PRESENTE, SEJA UM EQUÍVOCO POR ISENTAR AS GERAÇÕES ATUAIS DA REPONSABILIDADE PELA PERSISTÊNCIA DAS DESIGUALDADES, NÃO DEIXA DE CONTRIBUIR PARA AS REFLEXÕES SOBRE AS MAZELAS DA ESCRAVIDÃO QUE NÃO SE ENCERRAM NO 13 DE MAIO DE 1888. javascript:void(0) / Nesse contexto, as desigualdades apresentam um peso extremamente relevante quando se inclui a questão de gênero na análise. Conquanto a questão da emancipação feminina esteja em pauta, ela se torna mais viável de ser alcançada por mulheres brancas e de classe média e alta do que por mulheres pobres, geralmente negras. Dessa forma, raça, classe e gênero se sobrepõem numa miríade de situações que implicam de forma concreta a vida dessas pessoas. A escola faz parte dessa vida concreta e é impactada pelas questões apontadas. RACISMO A ideia de que a sociedade brasileira era formada por indivíduos multiétnicos em que não haveria conflitos derivados da cor das pessoas, as quais viviam numa espécie de paraíso racial nos trópicos, foi a base do mito da democracia racial. O próprio Gilberto Freyre não conseguiu interpretar a sociedade de sua época e perceber que as múltiplas formas da população negra se identificar ou ser identificada as aproximava ou distanciava do mundo da escravidão e de suas consequências. EXEMPLO As sutilezas da língua portuguesa, ainda hoje, são exploradas no processo formal ou informal de autoidentificação racial, muitas vezes incluindo o sufixo inho ‒ moreninho, por exemplo, para se referir a alguém da cor preta ‒, ou, como identificou o pesquisador Livio Sansone (2003), utilizando-se de uma das mais de trinta formas do negro ser identificado ou se referir à própria cor, eram tentativas de branqueamento para driblar as manifestações concretas do racismo no dia a dia das pessoas. Assim, o uso de identificadores de cor, como cabo-verde, sarará, mulato, pretinho etc., a depender da situação, pode tanto disfarçar um racismo quanto ser a tentativa de se encaixar aos padrões de uma sociedade que enaltece a branquitude como valor e referência. Para o pesquisador Silvio de Almeida (2018), há três concepções do racismo: / RACISMO INDIVIDUAL Se apresenta como uma atitude pessoal do indivíduo. RACISMO INSTITUCIONAL Que considera o racismo apenas o resultado de um mau funcionamento das instituições. RACISMO ESTRUTURAL É parte da sociedade e está presente nos variados espaços em que naturaliza, deslegitima ou banaliza as desigualdades de cunho racial. ACRESCENTA-SE A ESTES UM QUARTO MODELO DE RACISMO, QUE INTEGRA O COTIDIANO BRASILEIRO DE FORMA BASTANTE AMPLA: O RACISMO RECREATIVO. Segundo Adilson Moreira (2019), trata-se de uma prática que utiliza o humor para hostilizar minorias raciais. É um mecanismo de propagação de manifestações racistas sob o argumento “É só uma piada”. O racismo é a manifestação do ódio para com o outro. Um ódio que pode ser mais ou menos disfarçado. / O racismo, enfim, por ter diversas faces e, muitas vezes, ser disfarçado, quase imperceptível, mina todo o tecido social e se encarna nos diversos espaços. A escola, como parte desse conjunto, não está imune a ele. É o que discutiremos a seguir. Veja a seguir, este vídeo que aborda uma situação do cotidiano escolar, na qual o racismo e o preconceito surgem disfarçados de piada e humor. POBREZA E VIOLÊNCIA CONTRA NEGROS: “VIDAS NEGRAS IMPORTAM!” / ASSASSINATOS Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), no Brasil, sete em cada dez pessoas assassinadas são negras. Na faixa etária de 15 a 29 anos, são cinco vidas perdidas para a violência a cada duas horas. De 2005 a 2015, enquanto a taxa de homicídios por 100 mil habitantes teve queda de 12% para os não negros, entre os negros houve aumento de 18,2%. Segundo pesquisa realizada em 2017 pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e pelo Senado Federal, 56% da população brasileira concorda com a afirmação de que “A morte violenta de um jovem negro choca menos a sociedade do que a morte de um jovem branco”. (Fonte: Zmiter / Shutterstock) ATENÇÃO Conforme dados recentemente divulgados pelo UNICEF, de cada mil adolescentes brasileiros, quatro vão ser assassinados antes de completar 19 anos. Se nada for feito, serão 43 mil brasileiros entre os 12 e os 18 anos mortos de 2015 a 2021, três vezes mais negros do que brancos. Entre os jovens, de 15 a 29, nos próximos 23 minutos, uma vida negra será perdida. Esses dados revelam como o racismo está presente na sociedade e como a população negra está mais exposta à violência. Quando tratada pela grande mídia e pelos governos, na (Fonte: Rommel Canlas / Shutterstock) / p g p g , maioria das vezes, esconde-se o perfil racial das vítimas de violência, igualando todos sob números que são representados na expressão abstrata de violência urbana. Da mesma forma, raramente, as notícias sobre a violência associam o perfil racial ao problema da desigualdade de renda. Tanto a ONU quanto os movimentos negros no Brasil têm provocado uma série de debates nos últimos anos em relação ao que denominam de encarceramento em massa da população negra. Intelectuais e ativistas norte-americanos têm discutido isso já há algum tempo, porém, mais recentemente é que tem ganhado espaço nos debates políticos e jurídicos no Brasil, especialmente quando dados do sistema carcerário nacional vêm à tona. FILTRAGEM RACIAL Homens jovens afrodescendentes correm maiores riscos de serem apreendidos na rua por ocasião da filtragem racial, ou seja, a prática da abordagem de pessoas tidas como suspeitas usando o critério racial. Os índices apontam que a violência policial e as mortes são alarmantemente mais altas quando homens negros se encontram com agentes de polícia, levando-os à detenção, encarceramento e sujeitos a penas maiores com mais frequência, incluindo prisão perpétua e pena de morte nos locais onde são adotadas. / A FILTRAGEMÉ AGRAVADA QUANDO SE TRATA DE ALGUÉM QUE NÃO TEM BOA APARÊNCIA, GERALMENTE UM NEGRO POBRE, COMPROVADA PELAS ROUPAS, TIPO DE EMPREGO (OU SER DESEMPREGADO), LOCAL ONDE MORA, GRAU DE ESCOLARIDADE (OU TER UMA ESCOLARIZAÇÃO PRECÁRIA). Mulheres e meninas negras, por sua vez, sofrem discriminações múltiplas com base na condição socioeconômica e/ou de gênero. Em muitos países, mulheres afrodescendentes têm acesso limitado a educação, trabalho e segurança. Além de enfrentar os problemas dos homens negros, elas encontram-se mais vulneráveis à violência de gênero, ao rebaixamento intelectual e estão expostas ao feminicídio. (Fonte: Diego Cervo / Shutterstock) Embora os negros e negras sejam 54% da população brasileira, são 64% das pessoas privadas de liberdade. Os brancos e brancas, sendo 46% da população total, são 35% das pessoas no sistema carcerário. O perfil racial dos privados de liberdade é uma consequência da filtragem racial, que implica na abordagem, investigação e indiciamento de mais pessoas negras que brancas proporcionalmente, ou seja, o negro, pela sua cor, já passa por um processo seletivo da boa aparência durante as abordagens policiais. Mas (Fonte: kittirat roekburi / Shutterstock) / não só: essas abordagens normalmente são direcionadas para os bairros periféricos, onde a maioria dos moradores são negros, ou em atividades em que predominem esse público, como bailes funks, festas de hip-hop ou pagode, as boates e bares dos subúrbios. IMPORTANTE Os dados do IBGE para o ano de 2019 apontam que a população negra superou o número de pessoas brancas nas universidades públicas, alcançando 50,3%. No entanto, a taxa de jovens negros entre 18 e 24 anos cursando o ensino superior é de 56%, enquanto a de brancos é de 79%. A violência que afeta de forma majoritária a população negra tem impactos negativos na educação desse público de diversas formas, algumas delas invisibilizadas, por exemplo, o aluno negro que mora na periferia e precisa estudar à noite nem sempre consegue manter uma frequência na escola ou, mesmo, condições de se matricular. Muitas vezes, ele teme ser confundido com um bandido e teme pela sua segurança na volta para casa. Outras tantas vezes, suas condições econômicas são empecilhos, pois o custo do transporte e o material escolar ultrapassam o parco orçamento. As condições de trabalho sugam suas energias e ele dispõe de pouco tempo livre. PARCO Característica do que é poupado ou econômico. (DICIO, 2020) Não é possível desconsiderar os problemas estruturais de se ter escola funcionando nas proximidades de casa ou que haja transporte público com regularidade e segurança. Esse conjunto de dificuldades no acesso e na permanência na escola ou universidade se agrava javascript:void(0) / quando se considera a questão de gênero, na qual a mulher, muitas vezes, exerce o papel de dona de casa e mãe, mesmo trabalhando fora. NO MERCADO DE TRABALHO, OS DADOS SÃO MAIS ALARMANTES. O IBGE CONSTATOU QUE, INDEPENDENTEMENTE DO NÍVEL DE INSTRUÇÃO, O SALÁRIO DE BRANCOS É SUPERIOR EM OCUPAÇÕES FORMAIS E INFORMAIS. O RENDIMENTO MÉDIO DE NEGROS E PARDOS É DE R$1.608, CONTRA R$2.796 DE BRANCOS. Entre os 10% da população com os maiores rendimentos, apenas 27,7% eram negros ou pardos. Por outro lado, os negros ou pardos representavam 75,2% do grupo formado pelos 10% da população com os menores rendimentos. O rendimento médio domiciliar per capita da população branca (R$1.846) era quase duas vezes maior do que o da população negra ou parda (R$934). ATENÇÃO O IBGE ainda mostra que, enquanto 15,4% dos brancos do país estão na faixa da pobreza, 32,9% dos negros compõem a parcela de brasileiros que vivem com o equivalente a US$5,50 por dia. Na linha da extrema pobreza, com rendimento de até US$1,90 por dia, estão 3,6% dos brancos e 8,8% dos negros e pardos. / Por fim, vale lembrar o que o importante sociólogo Florestan Fernandes (1978), disse sobre a soma dessas desigualdades que afetam primordialmente a população negra: HÁ UM GENOCÍDIO INSTITUCIONALIZADO, SISTEMÁTICO, EMBORA SILENCIOSO. AÍ NÃO ENTRA NEM UMA FIGURA DE RETÓRICA NEM UM JOGO POLÍTICO. (...) A ABOLIÇÃO, POR SI MESMA, NÃO PÔS FIM, MAS AGRAVOU O GENOCÍDIO; ELA PRÓPRIA AGRAVOU O GENOCÍDIO; ELA PRÓPRIA INTENSIFICOU-O NAS ÁREAS DE VITALIDADE ECONÔMICA, ONDE A MÃO DE OBRA ESCRAVA AINDA POSSUÍA UTILIDADE. E, POSTERIORMENTE, O NEGRO FOI CONDENADO À PERIFERIA DA SOCIEDADE DE CLASSES, COMO SE NÃO PERTENCESSE À ORDEM LEGAL. O QUE O EXPÔS A UM EXTERMÍNIO MORAL E CULTURAL, QUE TEVE SEQUELAS ECONÔMICAS E DEMOGRÁFICAS. (FERNANDES, 1978) POBREZA E RACISMO EM PERSPECTIVA DIDÁTICA NA ESCOLA Diversas pesquisas sobre relações raciais na escola apontam problemas de relacionamento das crianças negras no espaço escolar. Esses problemas se originam muito mais cedo do que comumente se discute. / Uma pesquisa apontou que crianças negras de 4 a 6 anos, na etapa da Educação Infantil, portanto, já apresentam na escola uma identidade negativa sobre si mesmas, enquanto que na mesma pesquisa foi observado que crianças brancas, na mesma idade, manifestaram um sentimento de superioridade e, não raro, posturas preconceituosas. Sem a intervenção dos professores, as atitudes preconceituosas entre crianças nessa idade acabavam sendo recorrentes nas escolas pesquisadas (CAVALLEIRO, 2000). Para além das práticas educativas ou da ação direta de professores, crianças brancas e negras trazem para a escola um amplo repertório de comportamentos e experiências de vida do lugar em que moram e da relação que possuem com sua família. Crianças negras, pobres e periféricas tendem a se ver com um olhar negativo, diante da experiência de vida dos seus colegas de classe brancos e de classes mais privilegiadas. É o sentimento de inferiorização pelo tipo de roupa que vestem, pela merenda e material escolar que carregam e pelo relato de suas vivências cotidianas. A DIFERENÇA E O DIFERENTE, QUANDO NÃO RECEBEM O DEVIDO TRATAMENTO PEDAGÓGICO, DEIXAM DE SER VISTOS COMO VALORES E PASSAM A SER ENCARADOS COM ESTRANHAMENTO, PRODUZINDO DISTANCIAMENTO E, MUITAS VEZES, EXCLUSÃO. Da mesma forma, há um forte impacto das condições de trabalho dos pais em relação à afetividade das crianças. Crianças cujos pais possuem um regime de trabalho precário e que ocupa longas horas do dia tendem a internalizar mais o sentimento de inferioridade. Considerando que no Brasil a grande massa de trabalhadores precarizados são negros, é / possível somar mais esse item na lista de condições externas que produzem a inferiorização dessa população a partir da autoimagem. Embora as questões raciais apareçam muito cedo nas escolas, há uma dificuldade desse tema receber o devido tratamento. Muitas vezes, limita-se à abordagem da cultura e da religiosidade negras em datas específicas que, não raro, descambam para a folclorização, incrementando o preconceito. ATENÇÃO Há uma tendência em encarar o comportamento discriminatório ou mesmo racista da criança como bullying ou, tão grave quanto, desvalorizar as dificuldades de autoaceitação, empoderamento e construção da autoestima da criança negra. Com mais de quinze anos, a lei 10.639/03, tem alcançado poucos avanços. Outro elemento didático que cria estereótipos e ainda contribui para o estabelecimento de atitudes racistas é o livro didático. Durante muito tempo, a população negra foi representada nos livros didáticos e paradidáticos de forma estereotipada (o exotismo das danças e comidas típicas; os músculos do capoeirista; a sensualidade da sambista; a preguiça do trabalhador, entre tantos outros exemplos encontrados nas representações do negro em músicas, imagens e na literatura) e, muitas vezes, inferiorizada. EXEMPLO Nos livros de História, por exemplo, resumia-se a presença do negro na escravidão, estigmatizando a sua história a um contexto de violência e humilhação, no qual muitas crianças e jovens periféricos convivem diariamente e que não lhes serve de referêncianuma perspectiva de alternativa de vida. Conforme Silva (2005), os estereótipos não só afetam a autoestima como produzem preconceitos. A deficiência do material didático pode fazer do professor um reprodutor inconsciente de estereótipos. Os movimentos negros, como vimos, principalmente a partir dos anos 1980, reivindicaram mudanças que, mesmo com a lei 10.639/03, ainda são insuficientes. Há um processo de resistência e insurgência / de alunos negros diante do desconforto provocado pelo material didático, pelo currículo e pela didática da escola: a evasão. Muitas vezes tratada como uma consequência das condições materiais de vida ou de trabalho, a evasão também é uma forte reação de alunos negros diante de um modelo de educação que não lhe enxerga enquanto sujeito e que, quando o inclui, é de forma estereotipada. Nem todo aluno negro sabe e quer se ver como o capoeirista, jogador de futebol ou cantor de pagode. Da mesma forma, muitas meninas negras se incomodam por serem lembradas como dançarinas para as datas comemorativas do folclore e do Dia da Consciência Negra. A sexualização do corpo negro é histórica e ainda hoje é possível de se notar, mesmo dentro do contexto escolar. (Fonte: DiversityStudio / Shutterstock) A formação de estereótipos e, consequentemente, a discriminação, materializada na piada, nos risos e apelidos, muitas vezes se dá a partir das melhores intenções da escola, porém sem uma reflexão e um entendimento mais profundo das questões raciais. Aliás, há uma negação, em muitos estabelecimentos educacionais, da existência de racismo em seus espaços. Quando muito, tratam casos desse tipo como brincadeira de mau gosto ou, mais na moda, bullying. POR FIM, HERANÇA DE UM PASSADO ESCRAVISTA, MAS QUE AS GERAÇÕES POSTERIORES ATUARAM NO SENTIDO DE / EVITAR GRANDES MUDANÇAS, A MANUTENÇÃO DE PRIVILÉGIOS COM BASE NA COR ESTÁ NAS RAÍZES DAS DESIGUALDADES QUE SE ESPALHAM NO CONTEXTO SOCIAL E ECONÔMICO ENTRE BRANCOS E NEGROS NO BRASIL. Os limitados investimentos na educação, bem como o desigual acesso à estrutura de oportunidades, mantêm essa desigualdade. Nos últimos vinte anos se ampliaram as discussões em torno da construção e implantação de políticas sociais para, ao menos, mitigar as diferenças no país. Foi nesse contexto que as políticas afirmativas ganharam corpo, agregando vozes vindas de diversos segmentos sociais, da militância à academia, e se consolidaram no país. O ESTADO BRASILEIRO, NO ENTANTO, AINDA TEM DESAFIOS ENORMES PARA ENFRENTAR NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS DE IGUALDADE RACIAL, ESPECIALMENTE NO QUE TANGE À MULHER NEGRA PERIFÉRICA. ESSES MARCADORES AINDA LIMITAM A ASCENSÃO ECONÔMICA E SOCIAL DESSE GRUPO A PARTIR DA EDUCAÇÃO. / VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. UM DOS PROJETOS QUE ATUALMENTE PAUTAM A CULTURA PEDAGÓGICA É A RACIONALIDADE NEOLIBERAL. ASSINALE ENTRE AS ALTERNATIVAS A SEGUIR A QUE MELHOR DEFINE OS EFEITOS DA RACIONALIDADE NEOLIBERAL NA CULTURA ESCOLAR. A) No plano da Educação, a razão neoliberal fortaleceu a razão iluminista ao continuar definindo a Educação como um projeto de emancipação coletiva por meio das luzes do conhecimento científico. B) No plano da Educação, a razão neoliberal fortaleceu a lógica pedagógica medieval, à medida que reabilitou o prestígio público da Igreja Católica. C) No plano da Educação, a razão neoliberal esvaziou a razão iluminista, à medida que passou a tratar a Educação como um produto a ser consumido individualmente. D) No plano da Educação, a razão neoliberal esvaziou a razão iluminista, à medida que passou a tratar a Educação como um projeto coletivo de emancipação por meio do conhecimento científico . 2. AS PERSPECTIVAS PÓS-COLONIAIS E DECOLONIAIS TORNARAM-SE MUITO IMPORTANTES NO DEBATE PEDAGÓGICO CONTEMPORÂNEO. ASSINALE, ENTRE AS ALTERNATIVAS A SEGUIR, AQUELA QUE MELHOR DEFINE ESSAS PERSPECTIVAS. A) As perspectivas pós-colonial e decolonial criticam o uso da racionalidade como instrumento de dominação colonial, propondo então a emancipação de saberes historicamente dominados e silenciados. / B) As perspectivas pós-colonial e decolonial criticam a dominação colonial no plano político e econômico, silenciando o que se refere ao plano epistemológico. C) As perspectivas pós-colonial e decolonial reforçam a narrativa iluminista da racionalidade universal e, por isso, estão pouco preocupadas com outros projetos epistemológicos para além daqueles desenvolvidos na Europa. D) As perspectivas pós-colonial e decolonial reforçam a narrativa iluminista da racionalidade universal e, por isso, estão muito preocupadas com outros projetos epistemológicos para além daqueles desenvolvidos na Europa. GABARITO 1. Um dos projetos que atualmente pautam a cultura pedagógica é a racionalidade neoliberal. Assinale entre as alternativas a seguir a que melhor define os efeitos da racionalidade neoliberal na cultura escolar. Parabéns! A alternativa "C " está correta. A razão neoliberal deixou de tratar a Educação nos termos iluministas, segundo os quais a atividade pedagógica era o motor do progresso coletivo. O neoliberalismo a aproxima da condição das dinâmicas econômicas, como muitas outras, em que o Estado não tem responsabilidade direta e sua valorização deve ser estabelecida na dinâmica de valores (financeiros) e na disposição de investimento. A ação do Estado deve ser garantir vínculos mínimos a sujeitos para serem integrados nas dinâmicas econômicas. 2. As perspectivas pós-coloniais e decoloniais tornaram-se muito importantes no debate pedagógico contemporâneo. Assinale, entre as alternativas a seguir, aquela que melhor define essas perspectivas. Parabéns! A alternativa "A " está correta. As perspectivas decolonial e pós-colonial consistem em críticas à dimensão epistêmica do poder colonial. Trata-se da discussão de temáticas localizadas versus discursos hegemônicos com a educação sendo uma forma de rompimento de amarras históricas e representativas. Na Educação, os sujeitos são solicitados a se reconhecer e a se rebelar contra sistemas que foram naturalizados em suas dinâmicas sociais. / CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS A escravização, a exploração dos sujeitos, as violências associadas ao racismo e os processos de exclusão têm marcas profundas em nossa história. A maior parte da população brasileira é negra ou descendente, mas sua história, seu posicionamento nas escolas, seus papéis sociais ainda são vistos como se estivéssemos nos referindo a uma minoria. Negros não são uma minoria, são uma população historicamente excluída, sem direito à educação ou à sua escola. Qual é o primeiro passo para ajudar na mudança desse cenário? Saber como aconteceu, e isso você aprendeu no primeiro módulo. Depois, permitir que sua voz possa ser ouvida, ela existe, só não aprendemos a ouvi-la e, no segundo módulo, nós tivemos a experiência de conhecer suas lutas e perspectivas. Por fim, ver que esse problema não foi superado, está vivo, presente, e se quisermos uma solução, precisamos tratar disso, e foi o que fizemos no terceiro módulo. REFERÊNCIAS ABREU, Márcia. Escrever e pensar sobre o Novo Mundo: escrever e pensar no Novo Mundo. In: DUTRA, Eliana de Freitas; MOLLIER, Jean-Yves. (orgs.). Política, nação e edição: o lugar dos impressos na construção da vida política no Brasil, Europa e Américas nos séculos XVIII - XIX. São Paulo: Annablume, 2006. / AÇÕES AFIRMATIVAS. In: Educação para as relações étnico-raciais, Etnico-racial.mec. Consultado em meio eletrônico em: 05 mai. 2020. ALFINETE, O. Publicado em: 22. set. 1918. In: Imprensa Negra Paulista, USP, 2020. Consultado em meio eletrônico em: 05 mai. 2020. ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. Coleção Feminismos Plurais. São Paulo: Pólen, 2018. ALVES, Fernando de Brito. Cidadania e Escravidão. In: Jus.com.br. Publicado em: mai. 2005. BARROS, Surya Pombo de. 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