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SUMÁRIO 1. Introdução ..................................................................... 3 2. Anamnese cardiovascular ...................................... 3 3. Exame vascular arterial ........................................... 7 4. Exame vascular venoso .........................................10 5. Edema ..........................................................................12 6. Exame do tórax .........................................................15 Referências Bibliográficas ........................................31 3EXAME CARDIOVASCULAR 1. INTRODUÇÃO A semiologia cardiovascular consis- te em um aparato fundamental para qualquer médico, independentemen- te de sua área de atuação. O conhe- cimento adequado do funcionamento cardíaco aliado à correta interpreta- ção de seus sinais semiológicos for- nece um grande aparato diagnóstico, capaz de guiar o raciocínio clínico do médico diante de determinada quei- xa do paciente. Ainda, ele é capaz de nos indicar a condição do paciente no que tange ao prognóstico e situação de estadiamento de determinadas patologias, podendo nos ajudar a to- pografar lesões anatômicas ou pos- síveis locais de acometimento quan- to ao sistema cardiovascular. Diante disso, faz-se importante que o estu- dante de medicina se habitue ao cor- reto exame do aparelho cardiovascu- lar, sabendo identificar situações de normalidade, bem como possíveis in- dicadores patológicos decorrentes de alterações nesse sistema. Na prática diária, os sintomas mais comuns relacionados ao aparelho cardiovascular são: dor torácica, disp- neia, cansaço, síncope, palpitações e edema. A realização do exame físi- co, aliada à uma anamnese coerente, pode fazer com que o exame cardio- vascular por si só seja suficiente para realizar o diagnóstico de 90% das patologias desse sistema. Provavelmente, você, aluno de medi- cina, deve imaginar que o exame car- diovascular se baseia principalmente na ausculta, o que até pode ser ver- dade em alguns casos. Porém, apesar de valiosas, essas informações não são as únicas a serem obtidas, sendo que vários dados relativos a um exa- me físico mínimo, devem ser obtidos pera uma boa avaliação cardiovascu- lar, os quais estão apresentados na tabela a seguir: EXAME FÍSICO MÍNIMO NECESSÁRIO, ALÉM DA AUSCULTA DO TÓRAX, PARA UMA BOA AVA- LIAÇÃO CARDIOVASCULAR: Avaliação do nível de consciência Fácies Pele Esforço respiratório Extremidades Abdome Pulso venoso Pulso arterial Pressão arterial Análise de caixa torácica Ictus cordis Impulsões cardíacas Tabela 1. Exame físico mínimo necessário, além da ausculta do tórax, para uma boa avaliação cardiovas- cular (Clínica Médica, HC-FMUSP, vol.2, 2ª Ed., 2009, Manole) 2. ANAMNESE CARDIOVASCULAR Além dos dados que estão presen- tes em todas as anamneses, um exa- me clínico cardiovascular adequado 4EXAME CARDIOVASCULAR busca ativamente por manifestações cardíacas. Para isso, é importante que as queixas sejam comparadas com o nível de atividade basal do pacien- te, a qual deve ser mensurada. Isso é importante porque, como muitas doenças cardíacas possuem caracte- rísticas crônicas, não basta simples- mente perguntar se o paciente está conseguindo se locomover normal- mente. Um exemplo disso consiste no uso dessa pergunta para um pa- ciente que a responde de modo posi- tivo. Porém, se o médico investigasse mais profundamente essa questão, o paciente teria dito que há um ano cor- ria maratonas, mas que ultimamente não tem mais forças para realizar uma caminhada sequer. Na visão do pa- ciente, a sua locomoção está normal, mas para nós isso seria um dado de extrema relevância, pois demonstra progressão de doença incapacitante, com importante perda funcional. Outro ponto consiste na caracteri- zação da queixa, bem como a limi- tação que essa causa. Um paciente que se queixa de dispneia deve ser interrogado quanto à intensidade dessa dor (geralmente por meio de uma mensuração de 0 a 10), fatores associado à dor (acontece somente em determinado tipo de movimento?, ao realizar esforços maiores?, limita sua força?), se essa é progressiva, o quanto é incapacitante para realizar atividades (sente-se fraco para andar até qual distância?). Por meio dessa caracterização, podemos estabelecer a gravidade dos sintomas do pacien- te, bem como a sua importância, a fim de que sejam consideradas as próxi- mas etapas do tratamento. A dor torácica consiste em um dos mais graves sintomas referidos pelos pacientes, consistindo na manifesta- ção mais frequente da doença arterial coronariana, grande causa de morte ao redor do mundo. SE LIGA! Dor clássica aos esforços, sen- sação de opressão ou desconforto torá- cico, nos ombros, no dorso, no pescoço ou no braço acompanhando de dor an- ginosa, ocorre em cerca de 50% dos pa- cientes com infarto agudo do miocárdio. Pode haver descrições atípicas, como cãibra, sensação de aperto, dor perfu- rante e, em alguns casos, dor irradiante para os dentes, mandíbula ou maxilares. Uma vez que o paciente se queixa de dor torácica, deve-se ter em mente sempre os diagnósticos eminente- mente fatais, como angina instável, infarto agudo do miocárdio, aneu- risma dissecante de aorta e embolia pulmonar. A caracterização da dor é importante, principalmente nos casos atípicos (considerando que ninguém deixará passar uma dor tipicamente anginosa), pois a falha em identifi- car causas cardíacas de dor torácica pode trazer severas repercussões, sendo que a liberação inapropriada desses pacientes do pronto-socorro 5EXAME CARDIOVASCULAR traz consigo uma taxa de mortalidade de 25%. Em quadros não emergenciais (uma vez que na síndrome coronariana aguda, o paciente procurará ativa- mente o serviço de emergência por dor precordial), deve-se realizar uma pergunta introdutória abrangente, como “O senhor (ou a senhora) sente dor ou desconforto no peito”, deven- do ser investigada a queixa específica do paciente, solicitando para que esse aponte a localização da dor e descre- va os atributos relacionados ao sinto- ma descrito. Segue-se com pergun- tas mais específicas, questionando a relação da dor com esforços físicos, o tipo de atividade que desencadeia a dor, a intensidade da dor, possíveis irradiações, sintomas associados, como dispneia, sudorese, palpita- ções, náuseas etc. Deve-se também questionar se há dor em repouso, se essa dor incomoda o paciente duran- te a noite para dormir, bem como me- didas que aliviem a dor. SE LIGA! Dor na região anterior do tó- rax, de caráter dilacerante, irradiando-se para costas e/ou pescoço, ocorrem nos casos de dissecção aguda de aorta. As palpitações consistem numa per- cepção desconfortável quanto aos batimentos cardíacos. Os pacientes podem se queixar desse sinal de di- versos modos, como se o coração es- tivesse pulando, acelerado, tremendo, batendo forte etc. As palpitações po- dem decorrer de batimentos cardí- acos irregulares, rápido aumento ou redução da frequência cardíaca, bem como de uma contração cardíaca mais vigorosa. É importante salien- tar que as palpitações não são ne- cessariamente sinais de cardiopatias, doenças do coração, como arritmias mais graves (a exemplo da taquicar- dia ventricular), muitas vezes não ge- ram palpitações. SE LIGA! Sinais ou sintomas de ação cardíaca irregular constituem indica- ção de realização de eletrocardiograma (ECG). SE LIGA: Você pode considerar ensinar os pacientes queixosos a medirem sua frequência cardíaca, registrando-a no caso da ocorrência de eventos futuros. SE LIGA! Os indícios obtidos na anam- nese incluem “saltos” ou alternâncias transitórias (possíveis extrassístoles), batimentos cardíacos regulares rápidos e início e término súbitos (possivelmente uma taquicardia supraventricular paro- xística), frequência cardíaca regular rápi- da inferior a 120 batimento por minuto (bpm), principalmente se iniciando e ter- minando de modo mais gradual (possí- vel taquicardia sinusal). A falta dear consiste numa quei- xa comum dos pacientes, podendo 6EXAME CARDIOVASCULAR representar quadros de dispneia, or- topneia ou dispneia paroxística notur- na. A dispneia consiste na percepção consciente e desconfortável da res- piração, incompatível com o nível de esforço realizado pelo paciente. Essa queixa é mais comum nos casos de pacientes com doenças cardíacas ou pulmonares. SE LIGA! A dispneia súbita pode ocorrer na embolia pulmonar, no pneumotórax espontâneo e em quadros de ataques de ansiedade. A ortopneia consiste na dispneia que ocorre com o paciente deitado, melhorando quando esse se senta. De modo geral, pode-se classificá-la numerando-se a quantidade de tra- vesseiros que o paciente utilizar para conseguir dormir, uma vez que esse carece de dormir sentado. Deve-se realizar a certificação de que o pa- ciente utiliza esses travesseiros ex- tras ou dorme em posição ereta em decorrência da falta de ar ao deitar-se e não por outros motivos. A ortopneia ocorre na insuficiência cardíaca (IC) ventricular esquerda ou na estenose mitral, bem como na doença pulmo- nar obstrutiva crônica. A dispneia paroxística noturna con- siste em episódios de dispneia e or- topneia súbitas, que despertam o pa- ciente do sono, cerca de uma ou duas horas após deitar-se. Esse quadro obrigado o paciente a se sentar, ficar em pé ou ir até a janela para respi- rar melhor. Junto ao quadro, pode ha- ver sibilos e tosses associados, sen- do que esses episódios costumam ceder, mas também podem recorrer no mesmo horário, em noites subse- quentes. Quadros desse tipo podem ocorrer na insuficiência cardíaca ven- tricular esquerda ou na estenose mi- tral, podendo ser confundidas com crises asmáticas noturnas. O edema representa o acúmulo exa- gerado de líquido do espaço intersti- cial, ocorrendo absorção de grandes volumes de líquido, podendo cursar com grande aumento de peso (cerca de 10%) até que seja identificável. As causas variam de locais a sistêmicas. Deve-se concentrar a investigação nos quesitos de localização e crono- logia, bem como nas circunstâncias de aparecimento de edema e nos si- nais e sintomas associados. 7EXAME CARDIOVASCULAR 3. EXAME VASCULAR ARTERIAL No tocante ao exame vascular pe- riférico, busca-se avaliar os pulsos arteriais quanto à sua presença ou ausência, bem como a simetria des- ses, como seu enchimento e amplitu- de, uma vez que possíveis diferenças podem estar presentes por conta de obstruções parciais ou por vasocons- trições, bem como por diferenças de fluxo por acometimentos à montan- te, como ocorre na dissecção de aor- ta. É importante ressaltar aqui que o exame de simetria deve ser feito comparando cada pulso com o seu contralateral, podendo avaliar cada pulso separadamente ou comparan- do-os de modo simultâneo. SE LIGA! A simetria dos pulsos pode ser classificada e registrada da maneira roti- neira com o uso das cruzes, sendo utili- zado o seguinte sistema: Pulso normal: (++) Diminuído: (+) Ausente: (-) Não foi possível a verificação: ( ) MAPA MENTAL ANAMNESE CARDIOVASCULAR Busca ativa por queixas ANAMNESE Dispneia Dor torácicaEdema Ortopneia Dispneia paroxística noturna Comparar com o estado basal do paciente Fatores desencadeantes/de melhora ou piora IntensidadeQual o grau de limitação? 8EXAME CARDIOVASCULAR De maneira geral, podemos dizer que os pulsos a serem aferidos os pulsos carotídeos (para esses, deve ser to- mado cuidado especial com os ba- rorreceptores em idosos, que podem estimular bradicardia, bem como há a possibilidade de embolização de pla- cas ateromatosas, podendo levar a um AVC), braquiais, radiais, femorais, poplíteos, tibiais e pediosos. SE LIGA! Para achar o pulso poplíteo, de- ve-se segurar o joelho do paciente com as duas mãos, aprofundando as digitais na fossa poplítea, pesquisando a locali- zação desse pulso, que possui uma loca- lização mais profunda do que os demais. Principalmente no tocante ao pulso carotídeo, temos a presença de im- portantes achados, os quais são su- gestivos, cada um, de determinados quadros patológicos. Os mais impor- tantes e relevantes achados quanto aos pulsos são: • Pulso parvus: amplitude pequena em razão da redução do volume ejetado, podendo ser decorrente de hipovolemia, insuficiência de ventrículo esquerdo, estenose aór- tica ou mitral. • Pulso tardus: amplitude tardia, podendo ser decorrente de este- nose aórtica. • Pulso célere (hipercinético): cir- culação hipercinética, decorrente de insuficiência aórtica, persistên- cia do canal arterial e vasodilata- ção acentuada. • Pulso bisferiens: pulsação sistóli- ca dupla na insuficiência aórtica e miocardiopatia hipertrófica. • Pulso alternante: alteração re- gular na amplitude da pressão de pulso (disfunção grave de ventrí- culo esquerdo). • Pulso paradoxal: redução acen- tuada da pressão arterial sistólica durante a inspiração (> 10mmHg), podendo ser decorrente de tam- ponamento pericárdico e doença pulmonar obstrutiva grave. 9EXAME CARDIOVASCULAR Figura 1. Padrões de pulso arterial carotídeo (Manual de Medicina de Harrison, 19ª Ed., Artmed)] SAIBA MAIS! Existe um exame arterial realizado manualmente a fim de verificar a circulação da mão, deno- minado Teste de Allen. Com ele, pode-se avaliar separadamente o quanto a artéria radial e a artéria ulnar contribuem para a irrigação da mão. Esse teste e realizado da seguinte maneira: com os polegares, oclua as duas artérias em questão no punho do paciente e peça para que ele abra e feche a mão seguidamente até que seja percebida uma palidez palmar. Quando isso ocorrer, libere apenas o fluxo de uma delas e verifica-se se houve perfusão adequada (se a mão voltar ao seu rubor natural). Após isso, repete-se o teste, liberando a outra artéria e trocando também a mão a ser testada. Artéria radial Artéria ulnar Oclusão (trombo) Figura 2. Manobra de Allen. A. Enquanto o médico comprime o pulso radial, o paciente fecha a mão com força, provocando palidez pelo esvaziamento de sangue. B, Ao abrir a mão, a coloração normal volta quando estão normais a artéria ulnar e a arcada palmar. C, Se houver oclusão da artéria ulnar, a mão permanece pálida (adaptada de Fairbainn II). (Porto, Semiologia Médica, 7ª Ed., Guanabara Koogan) Pulso hipocinético Pulso parvus e tardus Pulso hipercinético Pulso bisferiens Pulso dicrótico + alternante 10EXAME CARDIOVASCULAR SE LIGA! Na etapa de exame arterial, pode-se também auscultar o fluxo da artéria carotídea em busca de sopros, mas vamos abordar isso mais adiante. 4. EXAME VASCULAR VENOSO Quando da realização do exame veno- so, tem-se que a distensão das veias jugulares ocorre na insuficiência cardí- aca direita, pericardite constritiva, tam- ponamento pericárdico e obstrução da veia cava superior. Essa distensão é também chamada de turgência jugu- lar, pela qual pode-se avaliar indire- tamente o estado da pressão venosa central, que reflete a dinâmica das câ- maras cardíacas direitas. Essa Turgên- cia consiste em uma distensão decor- rente do aumento de volume, sendo realizado da seguinte maneira: • Eleva-se a cabeceira do leito do paciente para 30º. A partir daí, identifica-se a veia jugular externa dos dois lados, prosseguindo-se com a pesquisa das pulsações ve- nosas jugulares internas • O paciente deve estar em decúbito dorsal, com o tronco inclinado a 30º, ; • Deve ser traçada uma reta da fúr- cula esternal até o pescoço do paciente; • Verifica-se se a visibilidade da veia jugular supera o nível traçado; • Caso a resposta seja positiva, tem- -se que existe um comprometi- mento quanto ao retorno venoso; • No caso de a turgência jugular ul- trapassar o limite superior da li- nha traçada, tem-se a presença da chamada estase jugular. A B Ângulo esternal C Distensão venosa jugular Figura 3. Turgência jugular. A, Mensu- ração do manúbrio esternal ao pescoço; B, A distensão venosa jugular é defini- da quando do ingurgitamento da veia jugular internapara mais de 5cm acima do ângulo esternal a 45º; C, Típica distensão jugular. (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guana- bara Koogan e Goldman-Cecil, Internal Medicine, 26th Ed., Elsevier) 11EXAME CARDIOVASCULAR A distensão das veias jugulares ocor- re na insuficiência cardíaca direita, na pericardite constritiva, no tampona- mento pericárdico e na obstrução da veia cava superior. Geralmente, quan- do inspiramos, a pressão venosa ju- gular diminui (uma vez que a inspira- ção facilita o retorno venoso), mas em casos de pericardite constritiva, por exemplo, ela pode aumentar, gerando o chamado sinal de Kussmaul. Para falarmos sobre as demais alterações quando ao sistema venoso jugular, devemos revisar a curva pressórica relativa à pressão venosa jugular. A primeira elevação que observamos na curva consiste na onda pré-sistó- lica, que reflete o discreto aumento na pressão atrial, o qual é um refle- xo da contração dessa câmara. Essa curva geralmente aparece um pouco antes de B1 e do pulso carotídeo. A queda subsequente denomina-se descenso x, o qual começa com o re- laxamento atrial. Essa queda persiste enquanto o ventrículo direito, o qual está contraído durante a sístole, tra- ciona o assoalho do átrio para baixo. É importante colocar aqui que duran- te a sístole ventricular, o sangue con- tinua a fluir para o átrio direito a partir das veias cavas. Após isso, no ciclo cardíaco, tem-se que a valva tricúspide se encontra fe- chada, sendo iniciado o enchimento atrial, de modo que a pressão no in- terior da câmara direita começa a se elevar mais uma vez, produzindo a onda v, que se apresenta como uma segunda elevação. Quando da aber- tura da valva tricúspide no início da diástole, o sangue do átrio direito flui de modo passivo para o ventrículo di- reito, levando a uma nova queda da pressão atrial direita, gerando uma queda da curva denominada descen- so y. Pode-se pensar de modo simplifica- do nessas oscilações, associando o seguinte raciocínio sequencial: con- tração atrial, relaxamento atrial, en- chimento atrial, esvaziamento atrial. A onda a pode ser considerada a contração atrial e a onda v, o enchi- mento venoso. Os dois colapsos são os mais notáveis no pulso venoso nor- mal, sendo que a depressão abrupta no descenso x na parte final da diás- tole é mais proeminente, ocorrendo um pouco antes de B2. O descenso y ocorre após B2, na fase inicial da diástole. 12EXAME CARDIOVASCULAR As anormalidades detectadas ao exame físico quanto ao pulso venoso jugular são: • Onda a ampla, que pode ser decor- rente de estenose tricúspide, este- nose pulmonar, dissociação atrio- ventricular (o átrio direito contrai com a valva tricúspide fechada). • Onda v ampla, que pode ser de- corrente de insuficiência tricúspide e de defeito septo atrial. • Descenso y abrupto, que pode ser decorrente de pericardite constritiva. • Descenso y lentificado, que pode ser oriundo de uma estenose tricúspide. 5. EDEMA Uma das partes importantes quanto à avaliação do sistema vascular consis- te na verificação da presença de ede- ma. Esse achado, quando relaciona- do a causas metabólicas e cardíacas, é resultado do aumento da pressão hidrostática nos capilares arteriais, a tal ponto que essa supera a pressão oncótica para o vaso, gerando um onda a onda c onda v onda a colapso y colapso x Diástole Sístole ventricular Diástole B1 B2 B1 onda a colapso x colapso yonda v Contração atrial, valva tricúspide aberta Relaxamento atrial com enchimento, valva tricúspide fechada Enchimento venoso, átrio tenso, valva tricúspide fechada Esvaziamento atrial, valva tricúspide aberta AD AD AD AD AD Figura 4. Pulsações veno- sas (Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) 13EXAME CARDIOVASCULAR gradiente pressórico a favor do extra- vasamento de fluido plasmático para o interstício. Em regiões edemaciadas, geralmen- te encontramos a pele local lisa e bri- lhosa. Quando palpamos a região, a digitopressão forma uma depressão local, que se desfaz lentamente. A esse achado chamamos de Sinal de Godet ou do cacifo. Uma vez que se busca pela presen- ça de edema, deve-se comparar os membros quanto à sua simetria, ve- rificando, caso haja edema, se esse acomete somente um membro ou ambos, e, caso acometa os dois, se o edema é simétrico e se apresenta sinais flogísticos (indicativos de infla- mação), como calor, rubor e dor. Geralmente, o edema com causa car- diovascular ou metabólica, geralmen- te obedece a gravidade, sendo que acomete inicialmente extremidades para depois acometer regiões su- periores. Por isso, podemos classifi- car tais edemas em cruzes, de acor- do com a sua extensão, da seguinte maneira: • Edema somente nos pés, até o ní- vel maleolar: + • Edema que se estende até o terço médio da perna: ++ • Edema que acomete o membro in- ferior até o nível do joelho: +++ • Edema que acomete todo o mem- bro superior, da extremidade até a raiz da coxa: ++++ • Edemas que se estendem supe- riormente, além da raiz da coxa, configuram quadro de edema ge- neralizado, caracterizando um es- tado denominado de anasarca. Figura 5. Identificação de edema (+) com evidenciação do sinal do cacifo (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan 14EXAME CARDIOVASCULAR MAPA MENTAL EXAME VASCULAR E EDEMA Enchimento Simetria Presença Arterial EXAME Venoso Edema Pulsos periféricos Pulso carotídeo Pulso alternante Pulso tardus Pulso parvus Pulso paradoxal Pulso célere Pulso bisferiens Hipervolemia Graduação Sinal do cacifo Terço médio da perna Até o nível do joelho Até a raiz da coxa A nível maleolar Anasarca Pressão venosa jugular Hipervolemia Comprometimento do retorno venoso Turgência jugular Onda a ampla Descenso y Onda v ampla Abrupto Lento 15EXAME CARDIOVASCULAR 6. EXAME DO TÓRAX Inspeção A inspeção do tórax tem o seu início no primeiro contato com o paciente, po- dendo colocá-lo deitado em decúbito dorsal para melhor examiná-lo. Como sempre, o examinador deve se posicio- nar em pé, à direita do paciente, bus- cando por abaulamentos, cicatrizes, assimetrias e quaisquer outras anor- malidades que podem estar presen- tes no tórax do paciente. É importante lembrarmos aqui que abaulamentos podem ser decorrentes do aumento do tamanho do coração, bem como decor- rentes de aneurismas da aorta. Palpação Já a palpação consiste basicamente na identificação de frêmitos e do ictus cor- dis. O ictus cordis consiste em uma re- gião geralmente pequena do tórax na qual é possível sentir claramente os ba- timentos cardíacos, decorrente do cho- que do coração com a parede torácica. Essa região pode chegar, em alguns casos, a ser até mesmo visível. Para a sua correta avaliação, deve-se inicial- mente observar o tórax do paciente, averiguando de o ictus é visível (lem- bre-se que essa parte é componente de inspeção). A sua posição habitual se dá, geralmente, no quinto espaço intercostal, na linha hemiclavicular es- querda. Ao buscá-lo, deve-se procurar uma pulsação da pele na região citada e em suas proximidades. Identificando ou não o ictus só pela observação, de- ve-se partir para a palpação propria- mente dita, que consiste em espalmar a mão e buscar sentir a pulsação com a região da transição metacarpofalan- giana da mão. Uma vez identificado, deve-se determinar com exatidão a sua localização com base nas linhas do tórax, avaliar a sua extensão (utilizando como medida as polpas digitais; geral- mente usamos o indicador como medi- da, sendo um valor comum o de duas polpas, ou 2,5cm), classificando a sua intensidade pulsátil por meio do siste- ma de cruzes (+), sendo esse método bastante subjetivo, mas tem-se que um padrão de duas cruzes é conside- rado o normal. Ictus cordis Linha hemiclavicular Linha esternal média Figura 6. Localização do ictus cordis (Bates, Propedêu- tica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) 16EXAME CARDIOVASCULARSE LIGA! Paciente longilíneos possuem o coração mais verticalizado, de modo que o ictus desses pode se encontrar em posições diferentes, mais geralmente no sexto espaço intercostal, a 1 ou 2cm mais próximos à linha média. Enquan- to isso, pacientes mais brevilíneos pos- suem o coração mais horizontalizado, de modo que o ictus desses podem se localizar entre o quarto espaço intercos- tal, lateralizados cerca de 1 ou 2 cm em relação à linha hemiclavicular esquerda. Achar a localização do ictus cordis, bem como classificá-lo quanto à sua extensão é muito importante, pois esse achado pode evidenciar doen- ças miocárdicas que cursam com dila- tação, como quadros de insuficiência cardíaca. Nesses casos, poderemos encontrar um ictus cordis localiza- do além dos limites esperados, bem como com uma extensão aumentada, denunciando a dilatação miocárdica, principalmente quando em decúbito lateral esquerdo esse medir mais do que 3 cm. Enquanto isso, a sobrecar- ga ventricular é mais provável quando o esse possuir medida entre 4 e 5 cm, com o paciente em decúbito dorsal. Em casos em que há dificuldade de se identificar o ictus, pode-se pedir ao paciente para se colocar em decúbito lateral esquerdo para aproximar o co- ração ainda mais da parede torácica e a partir daí, pesquisar a sua localiza- ção através da palpação. Caso ainda assim não o identificar, pode-se pe- dir para o paciente que expire com- pletamente, mantendo a respiração presa por alguns segundos. Pacien- tes do sexo feminino podem requerer que a mama esquerda seja afastada para cima ou para o lado, devendo o examinador solicitar que ela mesma o faça. No caso da não identificação do ictus, mesmo diante das manobras citadas, pode-se descrever no pron- tuário que o paciente possui o ictus não palpável. Figura 7. Identificação e mensuração do ictus cordis (Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) 17EXAME CARDIOVASCULAR Algumas anormalidades que podem ser identificadas quando da palpação do ictus são: • Ictus apical propulsivo, que pode ser decorrente de hipertrofia ven- tricular esquerda. • Deslocamento lateral e inferior do ictus, decorrente de uma dilatação do ventrículo esquerdo • Ictus pré-sistólico proeminente, decorrente de hipertensão, es- tenose aórtica e miocardiopatia hipertrófica. • Ictus sistólico apical duplo, de corrente de miocardiopatia hipertrófica. • Ictus proeminente na borda ester- nal inferior esquerda, decorrente de hipertrofia ventricular direita. • Ictus discinético (abaulamento ex- terno), que pode ser oriundo de aneurisma ventricular, grande área discinética após infarto agudo do miocárdio e miocardiopatia. No tocante à palpação de frêmitos, esses são realizado com a mão espal- mada, dando preferência ao contato da transição metacarpofalangeana da mão com o tórax do paciente, dado o fato de que essa região possui maior sensibilidade, tocando-se os focos de ausculta no precórdio do paciente (elucidaremos cada um na seção de ausculta), a fim de buscar indícios de sopros. Os frêmitos nada mais são do que manifestações sensoriais e, em algu- mas vezes, auditivas, da presença de turbilhonamento do fluxo sanguíneo, geralmente decorrente de sopros. A sua percepção dá-se quando é sen- tida uma vibração ou zumbido, como consequência da turbulência vascu- lar. Uma vez que o frêmito tenha sido identificado, a região em que esse foi sentido deve ser auscultada, buscan- do-se por sopros. Apesar da busca centrar-se nos focos de ausculta, o examinador pode palpar as demais regiões do precórdio, a fim de tornar o seu exame mais sensível. SE LIGA! Os frêmitos geralmente são palpados mais facilmente com o pacien- te na posição que acentua o sopro, como a inclinação do tronco para frente, a fim de aumentar a detecção de insuficiência aórtica. A simples existência de um frê- mito já altera bastante a graduação de frêmitos, como veremos mais adiante. 18EXAME CARDIOVASCULAR Ausculta cardiovascular Por fim, chegamos à última parte da semiologia cardiovascular: a auscul- ta. Ela consiste em uma importante habilidade a ser aprendida, uma vez que conduz diretamente para vários diagnósticos. Antes de tudo, vamos elucidar a ques- tão dos focos de ausculta. É impor- tante colocarmos aqui que, apesar da MAPA MENTAL INSPEÇÃO E PALPAÇÃO CARDIOVASCULAR Frêmitos EXAME DO TÓRAX Inspeção Palpação Paciente em decúbito dorsal Abaulamentos Cicatrizes Assimetrias Examinador à direita do paciente Ictus cordis Focos de ausculta Sopros cardíacos A partir de ++++ 5º espaço intercostal Linha hemiclavicular esquerda Verificar desvios Sobrecarga ventricular Miocardiopatia dilatada 19EXAME CARDIOVASCULAR existência desses locais específicos, o examinador não colocará o estetos- cópio somente nesses locais, deven- do haver uma investigação de todo o precórdio, bem como regiões circun- vizinhas, como a região axilar esquer- da, dorso e pescoço. Outra coisa que devemos ter em mente é que os fo- cos de ausculta não correspondem à localização anatômica das valvas que lhes conferem os seus nomes, sendo apenas projeções sonoras, onde se- ria mais favorável a ausculta de seus sons. O foco pulmonar está localizado no segundo espaço intercostal es- querdo, junto do esterno. Ele possui grande relevância para a análise dos desdobramentos de B2, tanto fisioló- gicos quanto patológicos. Fenômenos sonoros advindos de acometimentos das valvas pulmonares, bem como os sons advindos do seu funcionamento fisiológico, são bem audíveis basica- mente nesse foco, possuindo pouca ou nenhuma irradiação para outros campos. O foco aórtico está localizado con- tralateralmente ao foco pulmonar, ou seja, no segundo espaço intercostal direito, na região justaesternal. Po- rém, cumpre ressaltarmos que muitos dos fenômenos sonoros relacionados à valva aórtica podem ser mais bem auscultados no foco aórtico acessó- rio, localizado entre o terceiro e quar- to espaços intercostais, na região justaesternal. O foco mitral se localiza no quinto espaço intercostal esquerdo, na li- nha hemiclavicular, correspondente ao ictus cordis. Em pacientes com cardiomegalia em estágio avançado, esse foco se desloca lateralmente, em direção à linha axilar anterior. Jus- tamente por isso é importante que o ictus seja localizado antes de se ini- ciar a ausculta, uma vez que na sua região serão mais bem percebidos os fenômenos oriundos de uma valva mitral estenótica ou insuficiente. Já o foco tricúspide está localizado na chamada área paraesternal, nas regiões entre o quarto e o sexto es- paço intercostal, correspondendo à base do apêndice xifoide, ligeiramen- te para esquerda. Fenômenos so- noros advindos da valva tricúspide, como sopro sistólico, decorrente de insuficiência dessa valva, são mais bem auscultados nas proximidades do foco mitral. Além dos focos citados, existem ou- tras regiões estratégicas que podem ser auscultadas, como as regiões la- terais do pescoço, importantes para a caracterização de sopro de esteno- se aórtica, com irradiação seguindo a direção do fluxo sanguíneo ejeta- do pelo ventrículo esquerdo. Temos também as regiões interescapulover- tebrais, principalmente a esquerda, na qual melhor se ausculta o sopro da persistência do canal arterial em recém-nascidos. 20EXAME CARDIOVASCULAR SE LIGA! Vamos reiterar aqui que os focos são apenas referências, de modo que o examinador está livre para auscul- tar toda a região precordial. Para podermos entender os significa- dos da ausculta, precisamos entender o que significam cada um dos sons e, para isso, revisaremos brevemente o ciclo cardíaco. Aos sons cardíacos, denominamos bulhas, sendo que o índice de cada uma delas é posto de acordo com a sua posição em relação à sístole. Durante a diástole, o átrio esquerdo se encontra cheio de sangue, de modo que a pressão em seu interior supe- ra discretamente aquela do ventrículo esquerdo relaxado. Isso propicia umgradiente pressórico que promove a passagem do sangue do átrio es- querdo para o ventrículo homolateral por meio da abertura da valva mitral. Um pouco antes do início da sístole ventricular, a contração atrial provoca um pequeno aumento da pressão nas duas câmaras. Contração atrial Pressão atrial esquerda Pressão ventricular esquerda Figura 9. Pressão atrial quando do enchimento ven- tricular (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) Durante a sístole, tem-se o início da contração ventricular esquerda, de modo que a pressão ventricular su- pera rapidamente a atrial, promoven- do o fechamento da valva mitral. Esse fechamento da valva mitral produz a primeira bulha cardíaca, denominada B1, a qual define a duração da sístole. 2º Espaço intercostal direito – Foco aórtico 2º Espaço intercostal esquerdo – Foco pulmonar Ápice – Foco mitral Borda esternal inferior esquerda – Foco tricúspide 2º Espaço intercostal direito – Foco aórtico 2º Espaço intercostal esquerdo – Foco pulmonar Área ventricular direita – Borda esternal esquerda Área ventricular esquerda – Ápice Epigástrica (subxifoide) Figura 8. Focos de ausculta (Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) 21EXAME CARDIOVASCULAR Fechamento da valva mitral Pressão atrial esquerda Pressão ventricular esquerda B1 Figura 10. Contração ventricular com fechamento da valva mitral (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) A pressão ventricular esquerda con- tinua a aumentar, ultrapassando a pressão da raiz da aorta, induzindo a abertura da valva aórtica. Em condi- ções patológicas, um sopro de ejeção protossistólico (logo após B1) acom- panha a abertura da valva aórtica. Normalmente, a pressão ventricu- lar esquerda máxima corresponde à pressão arterial sistólica. Abertura da valva aórtica Pressão ventricular esquerda Pressão aórtica B1 Ei Figura 11. Abertura da valva aórtica (adaptado de Ba- tes, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) Começa a ocorrer a queda da pressão ventricular à medida que o ventrículo esquerdo ejeta a maior parte do vo- lume sanguíneo armazenado. Quan- do a pressão ventricular esquerda cai abaixo da pressão aórtica, ocorre o fechamento da valva aórtica. Esse fechamento da valva aórtica produz a segunda bulha cardíaca, denomi- nada B2, a qual define a duração da diástole. B1 Ej B2 Fechamento da valva aórtica Pressão atrial esquerda Pressão aórtica Pressão ventricular esquerda Figura 12. Fechamento da valva aórtica (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) Durante a diástole, a pressão ven- tricular continua a cair, alcançando níveis inferiores ao da pressão atrial esquerda, ocorrendo novamente a abertura da valva mitral. Tal evento costuma ser silencioso, mas pode ser audível como um estalido de abertura patológico, caso haja alguma restri- ção à movimentação das válvulas das valvas cardíacas, como ocorre na es- tenose mitral. 22EXAME CARDIOVASCULAR B1 Ej B2 EA Abertura da valva mitral Pressão atrial esquerda Pressão aórtica Pressão ventricular esquerda Figura 13. Ciclo cardíaco completo (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) Após a abertura da valva mitral, ocor- re o enchimento ventricular rápido, com o fluxo de sangue do átrio es- querdo para o ventrículo esquerdo, logo no início da diástole. Em crian- ças e em adultos jovens, pode surgir desse evento uma terceira bulha, de- nominada B3, secundária à desace- leração rápida da coluna de sangue contra a parede ventricular. Quando B3 é auscultada em idosos (fenôme- no denominado como galope por B3), geralmente é um indicativo de altera- ção patológica quanto a uma sobre- carga de volume. B1 Ej B2 EA B3 Período de enchimento ventricular rápido Figura 14. Presença de B3 pós período de enchimento ventricular rápido (adaptado de Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) A quarta bulha (B4) assinala a con- tração atrial, que ocorre após o en- chimento ventricular rápido, a fim de ejetar o restante de sangue contido no átrio esquerdo. Geralmente, ela não é audível em adultos e, quando é auscultada, precede B1 do batimento cardíaco seguinte, refletindo uma al- teração patológica na complacência ventricular. Ou seja: temos uma con- tração atrial em direção a um ventrí- culo rígido, podendo ocorrer em ca- sos de estenose aórtica, hipertensão arterial, miocardiopatia hipertrófica e doença arterial coronariana B1 Ej B2 EA B3 Aumento do enchimento ventricular decorrente de contração atrial B4 Sístole Diástole Figura 15. Presença de B4 (adaptado de Bates, Prope- dêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) SE LIGA! B3 e B4 são melhor ausculta- das com a campânula do estetoscópio. As bulhas devem ser classificadas quanto à sua fonética (normo, hiper ou hipofonéticas), quanto ao seu ritmo (se regular ou arrítmico) e quanto ao seu tempo (em dois ou três tempos). Com isso, em pacientes com exame normal, temos a famosa anotação dos prontuários de Bulhas Rítmicas, 23EXAME CARDIOVASCULAR Normofonéticas em dois tempos, ou BRNF2T. Apesar de termos descrito os even- tos do ciclo cardíaco de acordo com as estruturas do coração esquerdo, sabemos que alterações semelhantes ocorrem com as estruturas do cora- ção direito (átrio e ventrículo esquer- do e valvas tricúspide e pulmonar). Contudo, as pressões direitas são consideravelmente menores quan- do comparadas às correspondentes do lado esquerdo. Junto a isso, tem- -se o fato de que os eventos do lado direito ocorrem um pouco mais tarde do que os do lado esquerdo. Desse modo, em algumas situações, pode- mos auscultar em uma única bulha, dois componentes distintos, sendo o primeiro derivado do fechamento da valva aórtica (A2) e o segundo decor- rente de fechamento da valva pulmo- nar (P2). Durante a inspiração, ocorre o aumen- to do tempo de enchimento do cora- ção direito, de modo a incrementar o volume sistólico ventricular direito, fa- zendo com que a duração da ejeção ventricular direita dure mais do que a esquerda, de modo a retardar o fe- chamento da valva pulmonar, geran- do o chamado desdobramento de B2 em dois componentes audíveis. Uma vez que, como já discutimos an- tes, a ausculta dos sons da valva pul- monar são mais restritos à localização do seu foco, o desdobramento de B2 é melhor percebido nesse foco. Quanto a B1, também temos dois componentes: o som da valva mitral, mais precoce, e o da valva tricúspide, mais tardio. Em comparação com o som oriundo da valva tricúspide, o fe- chamento da valva mitral tende a ser mais hiperfonético, refletindo a alta pressão do coração esquerdo. Logo, como o som tricúspide é mais suave, o desdobramento de B1 é melhor auscultado no foco tricúspide, ao lon- go da borda esternal inferior esquerda. Diferente do desdobramento de B2, o de B1 não varia com a respiração. Ela reflete um discreto e normal as- sincronismo da contração ventricular, podendo ser auscultada em jovens e em crianças. No caso de o desdobra- mento ser muito amplo, levanta-se a suspeita de bloqueio de ramo direito. Para realizar a ausculta, deve-se ter à disposição, um ambiente silencioso, devendo iniciar o exame pela base ou pelo ápice do coração, com o pacien- te sentado ou em decúbito dorsal. Ao auscultar as bulhas, devemos com- parar a sua ocorrência com a dos pul- sos arteriais, podendo-se ter como parâmetro o pulso carotídeo ou radial. Assim, deve-se verificar se B1 ocor- re imediatamente antes da ocorrên- cia do fluxo sanguíneo que resulta no pulso sentido. Deve-se comparar as intensidades de cada bulha, deslocando-se o es- tetoscópio para os demais focos de ausculta, sendo que B2 costuma ser mais hiperfonética na base, enquanto 24EXAME CARDIOVASCULAR B1 costuma o ser na região apical do coração. Por fim, vamos falar dos sopros car- díacos, os quais se diferenciam das bulhas tantopela sua duração quanto pelo seu timbre, decorrentes da turbu- lência do fluxo de sangue de corrente de um acometimento valvar. Valvas estenosadas apresentam orifício es- treitado, reduzindo o fluxo sanguíneo, levando a um sopro característico. O mesmo ocorre quando uma valva não se fecha totalmente, nos casos de valvas insuficientes, o que possibilita o refluxo de sangue, gerando um so- pro regurgitativo. Manobras a serem realizadas para um melhor diagnóstico podem ser utiliza- das, cada uma quando for necessário. Uma delas consiste em deixar o pa- ciente em decúbito lateral esquerdo, aproximando o ventrículo esquerdo da parede torácica. Tal posição tem como finalidade a acentuação de B3 e de B4 de câmaras esquerdas, bem como de sopros mitrais, principal- mente o de estenose. Figura 16. Manobra para ausculta de B3, B4 e sopros mitrais (Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanaba- ra Koogan) Para melhor auscultar sopros aórti- cos, pode-se pedir para o paciente sentado se inclinar um pouco para frente, pedindo-se para que o pacien- te expire completamente e prenda a respiração. Após isso, ausculta-se a região da borda esternal esquerda e do ápice, interrompendo o exame momentaneamente para que o pa- ciente respire normalmente. Figura 17. Manobra para auscultar sopro aórtico (Ba- tes, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) 25EXAME CARDIOVASCULAR Em posição ortostática, o retorno ve- noso para o coração diminui, assim como a resistência vascular perifé- rica, fazendo com que a pressão ar- terial, o volume de ejeção e o volume de sangue no ventrículo esquerdo diminuam. Quando paciente se aga- cha, ocorre justamente o contrário. Essa manobra ajuda a identificar um prolapso de valva mitral, bem como para diferenciar uma miocardiopatia hipertrófica de uma estenose aórtica. Ausculta-se o coração do paciente imediatamente após esse ter se aga- chado ou levantado. A manobra de Valsalva é realizada quando da expiração forçada contra a glote fechada, resultando em um aumento da pressão intratorácica, ocorrendo um aumento pressórico transitório, seguida pela normaliza- ção dessa e queda da pressão arte- rial e do volume ventricular esquerdo durante a fase de liberação. Pode ser utilizada para diferenciar um sopro de uma miocardiopatia hipertrófica, o qual será exacerbado durante a fase de tensão, que seria a elevação inicial transitória, a qual é procedida de uma ultrapassagem do sangue após al- guns segundos. Pode-se utilizar essa manobra para a identificação da in- suficiência cardíaca e da hipertensão pulmonar, sendo que em pacientes com insuficiência cardíaca, os sons de Korotkov são auscultados durante a fase de normalização e não na fase final de ultrapassagem, como seria esperado, correspondendo a um qua- dro de sobrecarga de volume e eleva- da pressão capilar pulmonar. Uma vez que um sopro foi ausculta- do por você, deve-se classificá-lo pri- meiramente como sistólico ou diastó- lico, sendo que para isso o auxílio virá da palpação concomitante do pulso carotídeo ou radial. Sopros que coin- cidem com os pulsos sentidos são classificados como sistólicos, poden- do ocorrer tanto em valvas normais como em valvas lesionadas; já os sopros diastólicos costumam indicar valvopatia cardíaca. SE LIGA! Os sopros sistólicos costu- mam ser meso ou pansistólicos, sendo evidentes no meio ou em toda a sístole, respectivamente, Podendo ser auscul- tados sopros telessistólicos, com maior timbre ao final da sístole. Após isso, deve-se identificar a re- gião precordial na qual o sopro é mais forte, se na base, ao longo da borda esternal ou no ápice, devendo ser executadas manobras como as cita- das para melhorar a sensibilidade do seu exame. De acordo com o timbre que você escuta, determine se o so- pro é constante quanto à sua forma, se é em crescendo ou decrescendo, devendo também ser graduada a sua intensidade. O local de intensidade máxima do so- pro costuma ser guiado pelo seu lo- cal de origem, devendo tal lugar ser 26EXAME CARDIOVASCULAR identificado de acordo com o espaço intercostal e com a linha imaginário do tórax correspondente. Como exem- plo, temos o sopro de valva aórtica, que geralmente é melhor auscultado no segundo espaço intercostal direito. A irradiação ou a transmissão do pon- to de intensidade máxima do sopro reflete o local de origem e a intensi- dade do sopro, assim como o sentido do fluxo sanguíneo. A exemplo, temos os sopros de estenose aórtica, que costumam irradiar para o pescoço, no sentido do fluxo arterial, especial- mente no lado direito. Enquanto isso, na regurgitação mitral, o sopro cos- tuma irradiar para a axila, sugerindo participação de condução óssea. A intensidade de um sopro é gradua- da em uma escala de seis cruzes, com o número de cruzes correspondendo à intensidade do sopro em seu ponto máximo. A partir da tabela a seguir, temos uma orientação quanto à gra- duação dos sopros cardíacos. GRADUAÇÃO DOS SOPROS CARDÍACOS GRAU DESCRIÇÃO + Muito suave, auscultado após o ouvinte ter se “sintonizados”; não é auscultado em todas as posições ++ Baixo, mas auscultado imediatamente após se posicionar o estetoscópio sobre o tórax +++ Moderadamente forte ++++ Forte, com frêmito palpável +++++ Muito forte, acompanhado por frêmito. Pode ser auscultado com o estetoscópio parcialmente fora do tórax ++++++ Muito alto, com frêmito. Pode ser auscultado com o estetoscópio totalmente fora do tórax Tabela 2. Graduação dos sopros cardíacos (Bates, Propedêutica Médica, 11ª Ed., Guanabara Koogan) Quanto ao timbre, podemos classifi- car os sopros como agudos, médios ou graves e, quanto à sua caracterís- tica, como um jato de vapor, rude, ru- flar ou musical. A exemplo do que já falamos, temos como exemplo a se- guinte descrição de um sopro: Sopro diastólico de tom intermediá- rio, ++/6, aspirativo, em decrescen- te, no 4º espaço intercostal esquer- do, com irradiação para o ápice. Tal descrição corresponde a um sopro de regurgitação aórtica. Por fim, para ficar bem claro, pense no ciclo cardíaco que estudamos ante- riormente. Se um sopro é auscultado no foco aórtico, podemos pensar que ele seria de insuficiência ou de este- nose. Para diferenciar, observamos se ele é sistólico ou diastólico. Caso seja sistólico, sabemos que há um problema quanto à abertura da valva 27EXAME CARDIOVASCULAR aórtica, pois essa deveria ser a sua configuração durante a sístole. Desse modo, teríamos um sopro decorrente de uma estenose aórtica. Caso tivés- semos um sopro diastólico, ele seria decorrente de uma insuficiência aór- tica, pois nessa fase, essa valva deve- ria estar fechada e a sua incapacidade de não conseguir fechar por completo gera a regurgitação de sangue, origi- nando o sopro. Brevemente, seguin- do esse raciocínio, temos a tabela a seguir: TIPOS DE SOPROS CARDÍACOS PATOLOGIA FOCO DE AUSCULTA QUANDO? Estenose mitral Mitral Diástole Insuficiência mitral Mitral Sístole Estenose aórtica Aórtico Sístole Insuficiência aórtica Aórtico Diástole Estenose tricúspide Tricúspide Diástole Insuficiência tricúspide Tricúspide Sístole Estenose pulmonar Pulmonar Sístole Insuficiência pulmonar Pulmonar Diástole Tabel 3. Tipos de sopros cardíacos SAIBA MAIS! Existem outros possíveis sons de serem identificados quando da ausculta cardíaca. O Estalido de abertura consiste em um som de tonalidade mais aguda, ocorrendo logo depois de B2 e sendo mais audível na borda esternal inferior esquerda e no ápice, nos casos de estenose mitral. Nesse caso, quanto mais grave for a estenose, mais cur- to será o intervalo entre B2 e o estalido de abertura. Os cliques de ejeção são sons mais agudos, ocorrendo geralmente após B1, sendo mais audíveis na borda ester- nal esquerda, podendo ser observados na dilatação do anel aórtico ou da artéria pul- monar, bem como na estenose de cada um desses vasos nos casos congênitos, sendo que nesse último caso, o clique diminui com ainspiração. Os cliques mesossistólicos se localizam na borda esternal inferior esquer- da, sendo geralmente seguidos de sopro telessistólico no prolapso de valva mitral. Para resumir a questão dos sons da auscul- ta, temos a seguinte figura para ilustrar os acontecimentos que discutimos: Galope atrial ou pré-sistólico (B4) Desdobramento de B1 Clique de ejeção pulmonar ou aórtico Desdobramento de B2 Terceira bulha (B3) Clique mesossistólico Estalido de abertura na estenose mitral Figura 18. Localização temporal dos diversos sons cardíacos e sons adjuntos (adaptado de Goldman-Cecil, Medicine, 26th Ed., Elsevier) 28EXAME CARDIOVASCULAR MAPA MENTAL AUSCULTA Identificação das bulhas AUSCULTA B1 B1 B2 Desdobramentos Focos B2 B3 B4 Fechamento das valvas mitral e tricúspide Fechamento das valvas aórtica e pulmonar Sobrecarga de volume Queda da complacência ventricular Relação com a inspiração Tricúspide Aórtico acessório Aórtico Pulmonar Mitral SAIBA MAIS! Caso você queira ver na prática como funciona o exame cardiovascular, indico aqui dois ví- deos disponíveis no YouTube para que vocês possam se habituar ao exame cardiovascular e para poderem revisar de modo rápido antes de uma prova prática. Os vídeos estão em inglês, mas caso você não fale inglês e tenha lido o nosso material, a simulação fará com que você saiba o que está acontecendo. Link para os vídeos: https://www.youtube.com/wat- ch?v=XU_xeUMJ3Zc&t=118shttps://www.youtube.com/watch?v=Q5-0mSydRR4. 29EXAME CARDIOVASCULAR MAPA MENTAL SOPROS SOPROS CARDÍACOS Valvas Caracterização Insuficiência Estenose Estenose Insuficiência Tricúspide Pulmonar Insuficiência Estenose Insuficiência Estenose Mitral Aórtica Sístole Diástole Sístole Diástole Sístole Diástole Sístole Diástole Axilar Pescoço Irradiação Foco de maior intensidade Insuficiência Mitral Estenose aórtica Decrescendo Foco de intensidade Sistólico/ Diastólico Timbre Crescendo 30EXAME CARDIOVASCULAR MAPA MENTAL GERAL Palpação Exame cardiovascular Ausculta AnamneseInspeção Intensidade Localização Amplitude Fazer comparativos Busca ativa por sintomas Sopros B1 e B2 Sístole e diástole B3 e B4 Insuficiência Estenose Mitral Aórtica Tricúspide Pulmonar Assimetrias Abaulamentos Frêmitos cardíacos Ictus cordisSopros cardíacos Nível 4+ e superiores 31EXAME CARDIOVASCULAR REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bickley, Lynn S. Bates, propedêutica médica / Lynn S. Bickley; Peter G. Szilagyi; tradução Maria de Fátima Azevedo. - 11. ed. - Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015. Porto, Celmo Celeno; Semiologia médica I Celmo Celeno Porto; co-editor Arnaldo Lemos Porto. - 7. ed.- Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. Clínica Médica – HCFMUSP, Vol.2; 1. ed. – São Paulo: Manole, 2009. Goldman-Cecil Medicine, 26th Ed., Elsevier, 2020. Andreoli and Carpenter’s Cecil essentials of medicine / editor-in-chief, Ivor J. Benjamin, edi- tors, Robert C. Griggs, Edward J. Wing, J. Gregory Fitz. - 9th edition. 32EXAME CARDIOVASCULAR
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