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P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves SÍNDROMES DIARREICAS O hábito intestinal varia entre as pessoas, sendo difícil o estabelecimento de padrões de normalidade. Duas evacuações por dia é o que se considera normal. A mucosa intestinal funciona como uma das interfaces entre os meios externo e interno. Funcionalmente, a mucosa intestinal exige grande permeabilidade, ativa e passiva, o que proporciona o trânsito bidirecional de nutrientes, água e eletrólitos, expondo-se à invasão de microrganismos e de substâncias tóxicas. O cólon tem três funções importantes: → Reabsorção de água; → Manutenção de grande população de bactéria intraluminal; → Controle da eliminação de fezes. O adequado funcionamento do intestino dependerá de: → Capacidade de reabsorver água; → Equilíbrio funcional entre as células epiteliais da mucosa; → Microbiota presente na luz intestinal; → Integridade da mucosa; → Conteúdo intraluminal; → Células imunocompetentes; → Neuromusculatura Alterações no adequado funcionamento provocam alterações do hábito intestinal. DEFINIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DAS DIARREIAS Diarreia significa mudança no hábito intestinal do indivíduo, que implica no aumento das fezes em: → Peso; (> 200 g/dia) → Quantidade da parte líquida; → Frequência de evacuações (> 3X ao dia) A!! Geralmente, mais de uma dessas características estão presentes. A diarreia ocorre quando há excesso de fluido nas fezes, por anormalidades na secreção ou na absorção. CLASSIFICAÇÃO A diarreia pode ser classificada de 3 formas: → Quanto a etiologia; → Quanto ao tempo de evolução; → Quanto ao mecanismo fisiopatológico. QUANTO A ETIOLOGIA Define-se a etiologia em causas: → Infecciosas; e → Não infecciosas. A etiologia das diarreias infecciosas e não infecciosas é extremamente variável, tendo, cada uma, características fisiopatogênicas e clínicas específicas. DIARREIA INFECCIOSA Vírus Os mais prevalentes: → Rotavírus; → Norovírus. → Citomegalovírus (sintomático em imunocomprometidos) Vários agentes virais podem causar quadros diarreicos, mas esses são os mais comuns do grupo que tem predileção pelo tubo digestivo. São transmitidos por água contaminada ou de uma pessoa para outra. Manifestação da diarreia viral: → Em um contexto de gastroenterite aguda; → Fezes aquosa; → Há presença de vômito; → Duração curta: 72 horas. Manifestação no citomegalovírus pode ser persistente (15 – 30 dias) e disentérica P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves Bactéria São a segunda maior causa de diarreia aguda e cada uma tem características individuais. Bactérias mais comuns: → Campylobacter (bactéria gram-negativa); → Clostridium difficile (bactéria gram- positiva); → Clostridium perfringens (bactéria gram- positiva); → Escherichia coli (bastonete gram-negativo); → Salmonella (bastonete gram-negativo); → Shigella (bastonete gram-negativo); → Staphylococcus (coco gram-positivo); → Vibrio cholerae (bacilo gram-negativo); → Yersinia enterocolitica (bacilo gram- negativo). Fungos Candida albicans é o mais comum. Este torna-se patogênico em situações específicas que envolvem: → Imunodepressão; → Uso de corticosteroides e antibióticos. Causa diarreia por: → Inibição da lactase; → Produção de enzima proteolítica que degrada a mucina. A diarreia secundária a essa infecção é aquosa e, às vezes, explosiva. Protozoários Os mais comuns são: → Cryptosporidium; → Giardia lamblia; → Entamoeba histolytica; Nematoide Strongyloides stercoralis DIARREIA NÃO INFECCIOSA As diarreias não infecciosas são também secundárias a etiologias diferentes. Parte delas está descrita nas Tabelas 25.1 e 25.2, ao final do tópico de classificações. QUANTO AO TEMPO DE EVOLUÇÃO É definida pela duração do sintoma, sendo consideradas diarreia: → Agudas: duração ≤ 15 dias; → Persistente: duração entre 15 e 30 dias → Crônicas: duração > 30 dias. A!! Toda diarreia crônica começa como um quadro de diarreia aguda, insidiosa ou exuberante, e, dependendo da regressão espontânea ou da resposta a terapia utilizadas, poderá se prolongar até caracterizar uma diarreia crônica. → O agente/fator etiológico será indicativo da maior ou menor probabilidade de evolução crônica. QUANTO AO MECANISMO FISIOPATOLÓGICO São separadas em 4 tipos: → Osmótica; → Secretória; → Exsudativa; → Motoras. OSMÓTICA Ocorre quando há grande quantidade de moléculas hidrossolúveis no lúmen intestinal, levando à retenção osmótica de água. Tem como causa mais frequente: → Uso de laxativos; → Má-absorção intestinal de carboidratos (intolerância à lactose) Substância irrita lúmen intestinal → Inflamação / resposta inflamatória → Vasodilatação → P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves aumenta permeabilidade → liberação de íons e água. A!! Soluto pouco absorvível na luz intestinal. A!! Cessa com jejum ou supressão do agente. SECRETÓRIA A mucosa intestinal tem a capacidade de secretar fluidos isotônicos. Dentre os estímulos que provocam aumento da secreção dos fluidos isotônicos estão: → Vírus; → Enterotoxinas bacterianas (Vibrio cholerae e Escherichia coli); → Neopolasias (produzem hormônios gastrointestinais - VIP); → Síndrome de Zollinger-Ellinson; → Ácidos: graxos, de cadeia longa (esteatorréia), biliares (ressecção ileal) e catárticos (derivados da antraquinona). Vai haver “sempre” um substrato fazendo com que exista a liberação do fluido osmótico e consequente diarreia. A!! Transporte normal de íons e água: → Secreção e Absorção. A!! Não melhora com jejeum. EXSUDATIVA Exsudação de proteínas do soro, sangue, muco ou pus, a partir de áreas inflamadas, de doenças ulcerativas ou infiltrativas, aumenta o volume fecal e causa diarreia. Nesse grupo, estão incluídas: → Doenças inflamatórias intestinais; → Neoplasias intestinais; → Colite induzida por antibióticos; → Parasitose (giardíase). MOTORA Para que haja absorção o conteúdo intestinal deve: → Ser exposto uma superfície absorvente adequada, por tempo suficiente. → Estar preparado para absorção (digestão completada). Os mecanismos envolvidos na diarreia motora são: → Trânsito acelerado (inadequada mistura do alimento com as enzimas digestivas); → Pouco contato com a superfície absortiva (por ressecção intestinal ou fístulas enteroentéricas). A!! É frequente a existência de mais de um mecanismo envolvido no desencadeamento da diarreia. P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves DIAGNÓSTICO Para diagnosticar a causa da diarreia e solicitar corretamente os exames complementares, são necessárias informações como: → Duração do sintoma; → Associação com outras manifestações; → Idade; → Sexo. PADRÃO DA DIARREIA O padrão da diarreia sugere a sua origem, podendo ser → Alta: causada por doença em intestino delgado; ou → Baixa: causada por doença no intestino grosso. DE ORIGEM ALTA Características: → Grande volume evacuado; → Frequência pequena; → Cessa com o jejum; → Presença de restos alimentares digeríveis nas fezes; → Pode haver esteatorréia (gordura nas fezes) e distensão abdominal. DE ORIGEM BAIXA Características: → Pequeno volume evacuado; → Frequência alta, → Diminui, mas não cessa com o jejum; → Ocorre tenesmo, podendo haver eliminação de muco e desinteria. A!! Não é raro que característicasde diarreia “alta” e “baixa” estejam presentes no mesmo paciente. A diarreia pode ser manifestação de doença funcional, situação em que não é acompanhada de comprometimento sistêmico ou doença orgânica. Evidências de que a diarreia tem causa orgânica: → Ocorrência durante a noite; → Presença de sangue nas fezes; → Hipotrofia muscular; → Esteatorréia; → Queixa de dor abdominal; → Emagrecimento e redução do subcutâneo → Febre; → Adenomegalia; → Massas palpáveis no abdômen; → Sintomas carenciais; → Anemia; P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves HISTÓRIA CLÍNICA Itens essenciais a serem esclarecidos: a. As características do início da diarreia: → Congênita; → Abrupto; → Gradual. b. O padrão de diarreia, contínua ou intermitente. → Determina a localização da causa. c. Duração do sintoma (aguda ou crônica) d. Fatores epidemiológicos, como: → Viagens antes do início da diarreia; → Possível exposição a alimento ou água contaminada; → Doenças em membros da família ou em pessoa da relação do paciente. e. Características das fezes: → Aquosas; → Sanguinolentas; → Esteatorréia. f. Presença ou ausência de incontinência fecal. g. Presença ou ausência de dor abdominal e sua característica. Dor abdominal está frequentemente presente na: → Doença inflamatória intestinal; → Síndrome do intestino irritável; → Isquemia mesentérica. h. Perda de peso; Pode acontecer nas doenças que provoquem diarreia, já que o paciente, geralmente, diminui a ingestão com a intenção de reduzir o sintoma. Porém, perda de peso acentuada pode indicar: → Má-absorção; → Neoplasia; ou → Isquemia. i. Fatores agravantes, como alimentação ou estresse. j. Fatores de melhora, como alterações na alimentação ou remédios. k. Resultados de exames já realizados. l. Fatores iatrogênicos. Devem ser esclarecidos história pregressa de: → Ingestão de medicações; → Radioterapia; → Operações. m. Diarreia factícia, provocada pela ingestão de laxantes, deve ser considerada em todo paciente com o sintoma. Normalmente está associada a: → Desordens na alimentação; → Ganhos secundários; ou → Antecedentes de simulação de doença. P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves n. Presença de doença sistêmica, como: → Hipertireoidismo; → DM; → Doenças do colágeno; → Doenças inflamatórias; → Neoplasias; ou → Síndrome da imunodeficiência adquirida. EXAME FÍSICO O exame físico deve ser completo, para conhecermos a repercussão da diarreia, mas nem sempre sugere, individualmente, o diagnóstico. O mais importante no exame físico é caracterizar a desidratação e a desnutrição, se presentes. Pois relaciona-se com: → Má-absorção; → Doenças inflamatórias; → DM; → Hipertireoidismo; → Esclerodermia. Outros achados no exame físico: → Eritemas; → Úlceras na boca; → Nódulos na tireoide; → Sibilos na ausculta pulmonar; → Artrite; → Ruídos cardíacos; → Hepatomegalia; → Massa abdominal; → Ascite; → Edemas; → Exame anorretal. EXAMES COMPLEMENTARES INESPECÍFICOS HEMOGRAMA Pode sugerir infecção bacteriana: → Há desvio a esquerda. Em infecção crônica: → Podem cursar com neutrofilia, sem desvio a esquerda. Salmonella, E. coli, Yersinia, Campylobacter: → Apresentam neutropenia. Anemia: → Sugere processo crônico ou sangramento oculto. A trombocitose serve como alerta para doença ativa e risco de complicações tromboembólica em portadores de doença intestinal inflamatória (Doença de Crohn e RCUI). UREIA E CREATININA Avaliação da função renal; Em quadros intensos de diarreia a desidratação pode causar insuficiência renal de intensidade variável e, se não tratada a tempo, irreversível. SÓDIO E POTÁSSIO SÉRICO A secreção ativa ou passiva de líquidos para a luz intestinal determinada pela diarreia provoca desequilíbrios hidroeletrolíticos que exigem correção por via oral ou infusão venosa. ALBUMINA SÉRICA Diarreia crônica associada à má absorção pode provocar a queda dos níveis séricos proteína: calprotectina fecal → Corresponde a 60% do conteúdo proteico citoplasmático dos polimorfonucleares neutrófilos. Seus níveis plasmáticos aumentam 5 a 40 vezes na presença de processos infecciosos ou inflamatórios, com níveis ainda mais elevados nas fezes (6 vezes os níveis plasmáticos). Seus níveis fecais são determinados pela ELISA, com valor superior da normalidade de 50 mcg/g. É importante na distinção entre processos funcionais e processos inflamatórios; P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves → Processo inflamatório: valores > 100 mcg/g. Valores elevados indicam fortemente a presença de doença orgânica; Mas, valores dentro da normalidade não determinam a presença de doença funcional, uma vez que doenças orgânicas nas quais não há ativação dos polimorfonucleares neutrófilos podem ter resultados negativos, exemplo: → Doença celíaca; → Carcinoma do cólon. ESPECÍFICOS São direcionados pelas hipóteses diagnósticas levantadas durante a coleta dos dados da história e do exame físico. Segue tabelas: P3 – MÓDULO DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA | Luíza Moura e Vitória Neves ALGORITMO PARA INVESTIGAÇÃO DA DIARREIA CRÔNICA
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