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Fisiopatologia, Quadro Clínico e diagnóstico da Pancreatite Aguda | Larissa Gomes de Oliveira 1 FISIOPATOLOGIA, QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO DA PANCREATITE AGUDA A PANCREATITE AGUDA é definida como uma condição inflamatória aguda do pâncreas, com acometimento variável das estruturas peripancreáticas e órgãos à distância, cuja a origem depende da autodigestão tecidual pelas próprias enzimas pancreáticas. Diferente da pancreatite crônica que sintomas ainda podem ser sentidos depois resolução da causa, a pancreatite aguda curada, não deixa sequelas pancreáticas. Nos casos mais graves, a pancreatite aguda se comporta como uma doença multissistêmica e leva à Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS), com alta letalidade. De antemão é necessário identificar: 1. Pancreatite Aguda Edematosa ou Intersticial ou Leve: Representa 80% a 90% dos casos onde mostra edema do pâncreas, sem áreas extensas de necrose, sem complicações locais ou sistêmicas e de curso autolimitado em 3/7 dias. 2. Pancreatite Aguda Necrosante ou Necro-hemorrágica ou Grave: Contém extensa necrose parenquimatosa, hemorragia retroperitoneal, um quadro sistêmico grave e uma evolução de 3/6 semanas. Maior letalidade. QUADRO CLÍNICO Na pancreatite aguda, o patologista detecta uma reação inflamatória aguda difusa do pâncreas, associada a áreas de necrose gordurosa (marco da doença), tanto ao longo do parênquima do órgão quanto nos tecidos peripancreáticos. Nos casos mais graves, formam-se extensas áreas de necrose glandular, com ruptura vascular e focos de hemorragia. Os sinais costumam variar, mas o sintoma mais comum desta forma da doença, além da icterícia, é a dor progressiva na parte superior do abdômen, que se torna constante e piora com o passar dos dias. A dor causada pela forma aguda da pancreatite também pode: Irradiar para a região das costas, piorar minutos após comer ou beber, especialmente no caso de alimentos com altas quantidades de gordura. Além disso, o paciente pode ficar sudorético. A frequência de pulso fica entre 100 e 140 bpm. A respiração é rápida e curta. A pressão arterial pode alternar entre alta e baixa, com hipotensão postural significativa. Fisiopatologia, Quadro Clínico e diagnóstico da Pancreatite Aguda | Larissa Gomes de Oliveira 2 Os pulmões podem apresentar movimentos diafragmáticos reduzidos e evidência de atelectasias. Os pacientes podem ter íleo paralítico, resultando em diminuição dos sons intestinais e distensão abdominal. Outros sintomas também podem surgir, como: Sensibilidade e inchaço na região abdominal, Gases, Fezes com cor de argila, Soluço, Indigestão, Amarelamento brando da pele e Surgimento de erupções ou lesões na pele. No exame físico observa variação na dependência da gravidade da doença. Achados sistêmicos incluem febre, sinais de desidratação, taquicardia e, em casos mais graves, choque e coma. O derrame pleural à esquerda é comum (pela extensão da inflamação para a hemicúpula diafragmática esquerda) e pode contribuir para a dispneia. O abdome na pancreatite aguda revela desde dor leve à palpação até sinais de irritação peritoneal com descompressão dolorosa (Blumberg) nos casos mais graves. Distensão abdominal, devido ao “íleo paralítico” em consequência à inflamação intra-abdominal, é um achado comum, especialmente nos casos mais graves. Na radiografia, a distensão pode ser de delgado e/ou de cólon. Obstrução do ducto biliar principal em razão de coledocolitíase ou edema da cabeça do pâncreas pode ocasionar icterícia (geralmente leve). A icterícia ocorre em cerca de 10% dos casos e não necessariamente indica pancreatite aguda biliar. Alguns sinais cutâneos podem acontecer na pancreatite aguda, de forma incomum, como: → Sinal de Grey-Turner: Equimose em flancos → Sinal de Cullen: Equimose periumbilical → Sinal de Fox: Equimose na base do pênis ETIOLOGIA As duas principais causas de pancreatite aguda no adulto são a ocorrência de litíase biliar (passagem de cálculos pelo colédoco) e o consumo de álcool. Juntas, essas duas etiologias correspondem a quase 80% dos casos. Além disso, existem outras causas menos frequentes, como: Hipertrigliceridemia, Drogas Medicamentos, Infecções (Vários agentes infecciosos são potenciais causadores de pancreatite aguda, mas a frequência com que estas ocorrem é desconhecida. O diagnóstico etiológico nesses casos é complexo e depende da definição do quadro de pancreatite paralelamente à definição da existência da infecção). LITÍASE BILIAR A migração de cálculos biliares é a principal causa de pancreatite aguda. O mecanismo pelo qual os cálculos provocam a pancreatite aguda é desconhecido, mas as hipóteses são: 1. Passagem do cálculo resulta em edema transitório da papila, logo, em discreta obstrução ao esvaziamento do ducto pancreático principal; 2. Durante a passagem do cálculo através da ampola, há refluxo de bile em virtude de obstrução transitória. ÁLCOOL Fisiopatologia, Quadro Clínico e diagnóstico da Pancreatite Aguda | Larissa Gomes de Oliveira 3 De modo geral, se considera que os pacientes que apresentam pancreatite aguda por álcool apresentam, na maioria das vezes, evidências funcionais ou morfológicas de pancreatite crônica, de tal maneira que é inadequado falar em pancreatite aguda, mas, sim, em pancreatite crônica agudizada. FISIOPATOLOGIA A pancreatite aguda é uma inflamação do pâncreas, caracterizada como uma doença inflamatória decorrente da ativação anormal de enzimas pancreáticas e liberação de uma série de mediadores inflamatórios, atingindo, além do pâncreas, os tecidos peripancreáticos, podendo inclusive afetar outros órgãos. O processo inflamatório se inicia pela lesão das células acinares, que passam a liberar enzimas pancreáticas ativas para o interstício que começa o processo de autodigestão. Um estímulo lesivo à célula acinar provoca a fusão dos grânulos contendo zimogênio com as vesículas lisossomais, que contêm a enzima catepsina B. Essa catepsina B é capaz de converter o tripsinogênio em tripsina dentro da célula acinar, culminando na ativação de todos os zimogênios (enzimas sintetizadas na forma inativa dentro das células). As vesículas de fusão, em vez de migrarem para a borda luminal da célula, migram para a borda intersticial, sendo liberadas no estado ativo no interstício pancreático, dando início ao processo auto digestivo. Um aumento na concentração intracelular de cálcio também parece capaz de promover a auto ativação do tripsinogênio em tripsina, participando na origem da pancreatite. Das enzimas liberadas: • Fosfolipase A e Lipase: São responsáveis pela auto digestão da gordura pancreática e peripancreática. • Ácidos graxos: Formam complexos com o cálcio (saponificação), contribuindo para a hipocalcemia da pancreatite. • Elastase: É a responsável pela lesão do tecido intersticial e pela ruptura da parede vascular. • Tripsina: Ativa o sistema de cininas, bem como o sistema da coagulação pela via intrínseca (responsável pela formação de microtrombos nos vasos pancreáticos, que podem contribuir para a necrose). O sistema complemento também é ativado, atraindo para o local neutrófilos e macrófagos, que, produzem novos mediadores inflamatórios. Um exagero neste processo leva à Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS). Além disso, ocorrem danos à microcirculação e favorece a translocação de bactérias agravando a situação na pancreatite aguda., levando a: → Dano à microcirculação: Causada pela liberação de enzimas. As alterações microcirculatórias como microtrombose, vasoconstrição, estase capilar, redução da Fisiopatologia, Quadro Clínico e diagnóstico da Pancreatite Aguda | Larissa Gomes de Oliveira 4 saturação de oxigênio e isquemia progressiva podem ocorrer. Tais fenômenos produzem um aumento na permeabilidade capilar e edema da glândula. A lesão vascular pode levar à insuficiênciamicrocirculatória e aumento do dano ao tecido. → Translocação bacteriana: A quebra da barreira intestinal é ocasionada pela hipovolemia (e isquemia) e por shunts arteriovenosos induzidos pela pancreatite. A principal via de translocação bacteriana é através do cólon transverso, já que este segmento intestinal está próximo ao pâncreas e pode ser afetado pelo processo inflamatório peripancreático. DIAGNÓSTICO Para o diagnóstico de pancreatite aguda, utilizam-se os seguintes critérios: 1. Dor abdominal: persistente, de forte intensidade, localizada no andar superior do abdome, com irradiação para o dorso e associada a náuseas e vômitos; 2. Amilase e/ou lípase: ≥ 3 vezes o limite superior da normalidade 3. Achados tomográficos compatíveis com pancreatite aguda. É necessário dosagem sérica de amilase e lipase (estarão 3x maiores do limite normal). Métodos de imagem, como a Tomografia Computadorizada de Abdome, são úteis nos casos duvidosos, podendo confirmar o diagnóstico de pancreatite ao demonstrarem a presença de edema/necrose do parênquima pancreático. ➔ Amilase Sérica: Esta enzima pancreática costuma se elevar já no primeiro dia do quadro clínico (2/12h após o início dos sintomas), mantendo-se alta por 3/5 dias. O normal da amilase sérica geralmente é abaixo de 160 U/L. A amilase pode estar normal nos casos de pancreatite alcoólica, pois o parênquima pancreático já está destruído, exaurido de suas enzimas. Os níveis de amilase podem estar falsamente reduzidos na hipertrigliceridemia quando os triglicerídeos aumentam, aumenta também um fator solúvel que inibe a amilase). Pouco específico para PA. ➔ Lipase Sérica: Padrão ouro. Esta outra enzima pancreática se eleva junto com a amilase na pancreatite aguda, porém, permanece alta por um período mais prolongado (7/10 dias). Em geral, essas condições também não aumentam mais que 3 vezes o limite da normalidade (normal: até 140 U/L; 3x o normal: > 450 U/L, variando conforme o método laboratorial usado). ➔ Tomografia Computadorizada Contrastada: Como a TC pode ser normal em 15% a 30% dos casos de pancreatite “leve”, ela é o melhor método de imagem para avaliar a presença de complicações de pancreatite aguda, sendo indicada no caso grave. O ideal é a TC helicoidal, que é capaz de revelar imagens com maior definição da captação do contraste endovenoso. O melhor momento para a realização de TC na pancreatite aguda grave é após o terceiro dia do início do quadro (após as primeiras 72h, que é quando as complicações como a necrose Fisiopatologia, Quadro Clínico e diagnóstico da Pancreatite Aguda | Larissa Gomes de Oliveira 5 costumam estar bem estabelecidas, sendo mais fácil observá-las). Deve-se evitar a TC contrastada em pacientes que evoluem com injúria renal aguda pela pancreatite grave. A TC pode mostrar aumento focal ou difuso do pâncreas, borramento da gordura peripancreática e perirrenal, coleções líquidas peripancreáticas, pseudocistos e áreas não captantes de contraste indicativas de necrose. ➔ Ultrassonografia: Não específico, porém, é o método de escolha para o diagnóstico da litíase biliar, a causa mais comum de pancreatite aguda, podendo assim orientar a conduta posterior. Por isso, está sempre indicada. ➔ Radiografia simples: É um importante exame a ser pedido nos pacientes com quadro de abdome agudo, principalmente na dúvida entre um abdome cirúrgico ou não. O RX de tórax pode revelar derrame pleural à esquerda ou atelectasia em bases pulmonares; em casos mais graves pode haver um infiltrado bilateral compatível com SDRA (Síndrome de angústia respiratória do adulto). A pancreatite aguda pode determinar várias alterações no RX de abdome, assim como outras causas de abdome agudo inflamatório: 1. Alça sentinela (íleo localizado). 2. Sinal do cólon amputado: Paucidade de ar no cólon distal à flexura esplênica, devido a um espasmo do cólon descendente. 3. Dilatação das alças (íleo paralítico inflamatório). 4. Aumento da curvatura duodenal (aumento da cabeça do pâncreas). 5. Irregularidades nas haustrações do transverso, devido ao espasmo difuso. OBS: as alterações intestinais da pancreatite aguda são decorrentes da extensão do exsudato inflamatório pancreático para o mesentério, mesocólon transverso e peritônio.
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