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ISSN 2176-1396 A CARREIRA DE UM DOCENTE CONSIDERADO BOM PROFESSOR Ana Paula de Andrade Sbrissia 1 - PUCPR Maria Cristina Kogut 2 - PUCPR Grupo de Trabalho - Formação de Professores e Profissionalização Docente Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O artigo discute a carreira de dois bons docentes abordando a construção de suas carreiras, e teve por objetivo analisar as histórias de vida dos professores. Foi desenvolvido um estudo de caso, participaram do estudo dois profissionais de Educação Física que exercem as suas atividades na escola ou em cargo de gestão direcionadas à Educação Física. Foi utilizado como instrumento de pesquisa uma entrevista semi- estruturada formatada a partir do objetivo do estudo. Os resultados deste artigo apontaram que os dois professores escolheram o curso de Educação Física por gostarem muito de esporte. Eles têm em comum a mesma área de formação continuada, (fisiologia do exercício e treinamento desportivo). Em relação à prática pedagógica na escola, os dois consideram que a experiência profissional é de suma importância para conduzir as situações cotidianas desse ambiente. Consideram o bom professor como aquele que sempre almeja algo melhor e que se dedica muito ao trabalho. Este estudo permitiu compreender que a carreira de um bom professor é a composição das competências e habilidades profissionais elaboradas e aplicadas no cotidiano escolar, e que para se tornar um bom professor é necessário investir em uma formação continuada, fazer da experiência um conhecimento construído através da prática e sempre almejar algo melhor. Conclui-se, portanto que a construção da carreira de um bom professor é um processo que depende das oportunidades que surgem, mas fundamentalmente do empenho e dedicação empreendido pelo profissional tanto em sua formação quanto na sua atuação, quer seja na escola, no clube e em qualquer outro ambiente que se trabalhe. Palavras-chave: Carreira docente. Educação Física. História de vida. Introdução De modo geral, o que caracteriza um bom professor, é seu esforço para organizar e diversificar os conteúdos, aliando a teoria à prática, o domínio do assunto proposto (conceitos, práticas, técnicas e origens históricas), a adaptação do conteúdo de acordo com as necessidades de aprendizagem dos alunos, a demonstração de carinho e atenção, uma visão 1 Licenciada em Educação Física. Graduanda de Pedagogia – email: anapaulasbrissia2009@hotmail.com. 2 Mestre em Educação. Professora do curso de Educação Física da PUCPR – email: cristina.k@pucpr.br. 10238 positiva do ensino e dos estudantes, a capacidade de elogiar e incentivá-los, de construir uma relação de respeito e afetividade que sejam mútuos, conquistando assim um ambiente agradável para as aulas. Todos os aspectos elencados demonstram que o trabalho do professor na escola é importante, mas exige uma formação adequada e uma postura de envolvimento com o conhecimento, o que demanda estudo e uma busca constante. Segundo Salgueiro (2001, p.89) “torna-se necessário um grande esforço para construir a competência docente capaz de responder aos novos desafios”. A partir da percepção da importância do docente na sociedade atual, das implicações na construção da cidadania dos indivíduos, pretende-se nessa pesquisa estudar a carreira de dois docentes considerados bons professores, analisando o histórico de formação profissional, a identidade e experiência deles. Referencial Teórico O processo de desenvolvimento profissional de um docente acontece dentro da escola, de maneira individual e coletiva, pois é assim que o professor adquire experiências e desenvolve competências dentro do ambiente de trabalho. Marcelo (2009) afirma que o conceito de desenvolvimento profissional é um processo de longo prazo, vindo de oportunidades e experiências que produzem os métodos de aprender a ensinar. Segundo Moita (1992 apud KRUG, 2012), quando há uma referência à identidade profissional dos professores pode-se identificá-la como uma montagem compósita, ou seja, uma construção que perpassa desde a escolha pela profissão até a aposentadoria. O autor ainda ressalta que a construção da identidade é feita a partir de saberes científicos e pedagógicos, alicerçados pelas experiências, por opções tomadas e pelas práticas pedagógicas desenvolvidas. Reafirmando que o desenvolvimento da identidade profissional é feito a longo prazo e construído por experiências, Pimenta (1997) confirma que ela não é um dado imutável, mas um processo de construção do sujeito. Pimenta (1997) também defende que existem alguns pressupostos para a construção da identidade profissional, que começam na formação inicial, na percepção do futuro professor como docente, na qual está presente suas representações, crenças e descrenças com relação ao curso. Essas vão aos poucos sendo desvendadas, a partir do momento em que o acadêmico, compartilha opiniões e ideias, enfrentando o desafio de falar e ouvir, simulando sua conduta dentro de uma escola e exercendo o seu papel como professor. 10239 Para Marcelo (2009) a identidade profissional é um processo de aprendizagem ao longo da vida, pois seu desenvolvimento é interminável. Nessa perspectiva devemos considerar que os professores devem sempre se questionar: Quem eu quero ser? E a partir disso buscar saber cada vez mais. A partir disso espera-se que um curso de licenciatura forme um professor que contribua com a profissão, que aceite a natureza docente que de acordo com Pimenta (1997), essa característica ajuda na humanização dos alunos, desenvolvendo neles conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, tornando os saberes e fazeres docentes, uma realidade dos desafios e necessidades do ensino, como uma prática social, o que lhes é colocado constantemente no cotidiano. Segundo Gomes (2010) alguns estudos sobre a constituição do ser professor alegam que a maioria dos docentes adquiriram uma conduta dentro da escola partindo da experiência que tiveram como alunos, fornecendo conteúdos para o eu profissional. Para Irgang (2006) as representações construídas pelos professores ao longo de sua trajetória de vida moldam e produzem um tipo de professor. A autora afirma ainda que temos uma representação do que seja um professor, uma aula, uma avaliação, uma escola, essas imagens configuram-se em saberes ao longo da trajetória do professor, pois tudo que se aprende ao longo da vida escolar é certamente interiorizado como uma experiência. Para Marcelo (2009) deve entender-se o desenvolvimento profissional de professores, na forma como se definem a si mesmos e aos outros. Já Segundo Moita (1992 apud KRUG, 2012) o eu profissional é constituído de identidades diversas, cada qual relacionada com um aspecto e/ou um território. Existem semelhanças entre os autores, pois muitas vezes se espelhando em alguém ou usando como referência as experiências vividas que se começa a construção do eu profissional. Os saberes da construção da identidade profissional do professor são categorizados por Gomes (2010) em três tipos: o da experiência, aprendido pelo professor desde quando aluno; do conhecimento, que é a base da atuação do professor na escola e que auxilia na reflexão sobre a função da escola na atualidade, e os saberes pedagógicos, que lança mão dos conteúdos específicos, indicando os caminhos e necessidades pedagógicas dos alunos. O professor participa de todos os acontecimentos que ocorrem dentro da escola e da sociedade e com isso ele traz para a sala de aula sua bagagem cultural, que é fruto do seu contexto histórico e social. Essa posição é confirmada por Darido (1996), citada por Galvão (2002) que afirma que não se pode deixar de lado o fato de que o professor é fruto de um 10240 contexto histórico e social. E também quandose trata de atuação docente, não se pode desconsiderar a formação acadêmica, pois um bom desempenho na carreira depende de como foi a formação acadêmica. Quando se analisa a ação do professor de Educação Física, deve-se levar em conta que enquanto desempenha sua função dentro da escola, ele torna-se um exemplo para os alunos. Sua conduta pode deixar marcas positivas ou negativas para eles. Ele atua como mediador de conhecimento e deve ter respaldo suficiente para trabalhar com aspectos físicos, motores, sociais e culturais. E de ensinar conhecimentos específicos de sua área o professor torna-se responsável por estimular a formação de alunos críticos, com valores e capazes de questionar sobre diversos assuntos (GALVÃO, 2002). Galvão (2002) citando Libâneo (1984) aponta algumas características que cercam um bom professor. Nas características técnicas, cabe conhecer seus alunos e adaptar o ensino as suas necessidades; dominar o conteúdo refletindo sobre seu planejamento e sua prática, disposição para remanejar o que for preciso em sua metodologia, de maneira que propicie um conhecimento significativo. O bom professor ainda é aberto para trabalhar a teoria e a prática; comunica aos alunos qual é o objetivo específico da aula e fornece feedbacks construtivos ao término da aula. Quanto às características afetivas, um bom professor deixa claro que ele não é bonzinho e sim maduro, a ponto de esclarecer com seus alunos que regras existem para serem cumpridas. O que não impede que, agindo assim, o professor tenha um laço afetivo com seus alunos, pois, a afetividade se torna essencial para que as aulas tenham um clima agradável e prazeroso. Com isso é possível estabelecer o respeito e amizade entre professor e aluno, trazendo como benefício a satisfação no trabalho desse professor, fazendo com que ele demonstre interesse, entusiasmo e motivação com o que ensina. O bom professor também possui características sociopolíticas, que garantem a ele conhecer a realidade social concreta de seus alunos, tendo uma visão crítica da escola e dos conteúdos escolares. Ainda é possível falar do bom professor em sua prática pedagógica, o que torna pertinente a abordagem dos conteúdos escolares nas dimensões: a) conceitual, que aborda regras, técnicas e dados históricos das modalidades; b) procedimental, que diz respeito ao conteúdo ensinado pelo professor, que não deve somente girar em torno das habilidades motoras e do esporte e c) atitudinal que aborda regras, atitudes e valores. Para Silva (1992 10241 apud GALVÃO, 2002) é indiscutível que o professor que reunir a maior parte dessas características dificilmente falhará em sua prática pedagógica. Para Pimenta (1999) a formação de um professor não se dá apenas na formação inicial, mas em uma busca contínua, que se torna necessária para mediar os processos constitutivos da cidadania dos alunos. A autora, ao tratar da formação inicial, afirma que o currículo dos cursos de licenciatura têm se distanciado da realidade escolar no que diz respeito à prática social de educar, e pouco têm contribuído para gerar uma nova identidade do profissional docente. E quando se refere à formação continuada, afirma que os cursos têm sido pouco eficientes para alterar a prática docente e não dão a possibilidade ao professor de construir novos saberes e novas práticas. Para Garrido e Carvalho (1999) a desarticulação entre teoria e prática bem como a separação entre as pesquisas desenvolvidas na universidade e o trabalho nas escolas, resultam em um modelo técnico de currículo proposto para a formação de professores. Nesse sentido Shon (1987 apud GARRIDO; CARVALHO, 1999) ressalta a insuficiência dos quadros teóricos para orientar as práticas docentes. O autor ainda propõe que as Universidades, enquanto promotoras de um saber docente deveriam ensinar os futuros profissionais a refletirem sobre a prática, retomando, descrevendo, problematizando e levantando hipóteses para sanar os problemas frequentes do dia- a dia escolar. O autor salienta e finaliza afirmando que uma formação inicial assim, formaria um profissional investigativo, capacitaria um professor pesquisador, produtor do saber e do saber fazer docente. A relação teoria e prática é um dos aspectos buscados na formação inicial. Lawson (1990 apud DARIDO, 1996) indica que na década de 80 algumas instituições de ensino superior passaram por uma reforma na grade curricular. Ela possibilitou a inserção da teoria e de conhecimento científico seguido das ciências mães que sustentam a teoria da área de Educação Física. Portanto, a Educação Física também é uma ciência, pois agrega ciências pedagógicas e técnicas. A falha no processo de formação inicial apresentada em um estudo feito por Darido (1996) afirmou que os professores formados em uma perspectiva científica, ou seja, depois da inserção de disciplinas teóricas no curso de graduação em Educação Física, se mostraram acomodados, e trabalhavam apenas o quadrado mágico dos esportes, Os professores formados em uma perspectiva tradicional, também considerada como esportivista demonstraram mais interesse pela diversificação das aulas e recorriam mais á direção da escola para discutir assuntos que provocassem melhorias no âmbito escolar e nas aulas de Educação Física. 10242 Sendo assim, torna-se pertinente que a teoria e a prática se complementem na formação inicial, pois as reformas educacionais devem proporcionar transformações significativas no período universitário. Outro aspecto importante diz respeito à experiência. A experiência profissional como a construção que se efetiva ao longo dos anos é resultada da solidificação dos saberes, das práticas e experiências. O professor em sua prática pedagógica resgata aquilo que viveu durante a sua vida escolar e acadêmica e essas são confrontadas ou confirmadas no contexto em que atua e junto aos colegas de trabalho. Mas, segundo Josso (2010) há uma distinção entre experiência e vivência. O autor afirma que se vive uma infinidade de transações e de vivencias; mas elas só atingem o status de experiência a partir do momento que é feito um certo trabalho reflexivo sobre o que passou e sobre o que foi observado. Para Josso (2010) a elaboração da construção das experiências acontece tendo-as, vivendo situações e acontecimentos durante a vida que se tornam significativos. Para o autor, adquirimos experiências, através de vivências, situações e acontecimentos que nós criamos e fazemos acontecer. E o conceito de experiência feito pelo autor se concretiza quando unimos o ter e o fazer. O ter pelo viver situações que não provocamos e o fazer pelas situações que criamos. Esses dois aspectos trazem como resultado a experiência. Desta forma, a experiência profissional é construída, descobrindo por iniciativa própria novas formas de dar aula, se relacionando e trocando ideias com colegas de trabalho mais experientes e descobrindo seu jeito de dar aula através de situações diárias. A experiência profissional é um processo contínuo de aprendizagem profissional, que para Salgueiro (2001) é construída e apropriada pelos professores ao longo de sua trajetória profissional e pessoal, resultantes de sua prática. A construção do conhecimento profissional é muito semelhante à construção da experiência citada anteriormente, pois, assim como ela, o conhecimento é construído na prática cotidiana. Para Tardif e Raymond (2000) os saberes servem de base para o ensino, e podem ser vistos e interpretados de diversas formas. Os autores afirmam que num sentido restrito os saberes docentes são transmitidos por professores eficientes em sala de aula nas atividades propostas para os alunos, na organização da turma e do conteúdo a ser aplicado. Porém, em um sentido amplo esses conhecimentos são transmitidos durante a formação inicial, quando se fundamenta o ato de ensinar no ambiente escolar,e na formação continuada, sendo proveniente de experiências, do domínio do conteúdo a ser ensinado e da cultura profissional e pessoal. 10243 Para Salgueiro (2001) existem quatro tipos de conhecimentos (saberes) que são construídos ao longo da carreira, os disciplinares, curriculares, os profissionais e o da experiência. Portanto, o saber docente está aliado ao conhecimento científico e ao da experiência. Shulman (1987 apud MIZUKAMI, 2004) afirma que os professores têm conhecimento de seus alunos, do currículo, do processo ensino aprendizagem para tomar decisões, mas permanece a dúvida sobre o que os professores sabem sobre suas áreas específicas e como representam essas subáreas durante o ensino. Estudos que investigam como os professores pensam e aprendem a atuar em sua área têm sido frequente ao longo dos anos. Mizukami (2004) aponta que esses estudos indicam que o professor aprende através da própria história como aluno, que é reproduzida ao longo dos anos como professor, que ele aprende a ensinar com a sua formação inicial e continuada, e com situações cotidianas, planejando e remanejando seu planejamento de acordo com eventuais problemas que possam acontecer. A autora ainda afirma que o professor precisa ter habilidades e compreender o que é importante para ele aprender e ensinar, e ressalta que todos os tipos de conhecimento são necessários para a base do ensino e para a atuação profissional. Com isso considera-se que a construção do conhecimento não é fixa nem imutável, tornando-se essencial a percepção de que o processo de construção é contínuo e inacabado. Para delimitar os conhecimentos que o professor deve ter, Shulman (1987 apud MIZUKAMI, 2004) propôs os seguintes conhecimentos: do conteúdo específico que significa o conteúdo da matéria que o professor leciona, o conhecimento pedagógico geral, que explica as teorias do processo de ensinar e aprender, as características dos alunos, os processos cognitivos e procedimentais de como os alunos aprendem. Já para Tardif e Raymond (2000) os saberes são plurais, compósitos e heterogêneos, pois trazem a tona no próprio exercício do trabalho e manifestam-se as diversificações dos conhecimentos do saber- fazer e do saber- ser. Gauthier (1998 apud ALMEIDA; BIAJONE, 2007) aborda o saber disciplinar, que é referente ao conhecimento do conteúdo a ser ensinado. Junto com ele está o saber curricular um saber profissional específico. Esse segundo o autor, não está diretamente relacionado ao saber de uma ação pedagógica, o que diz respeito à parte burocrática e organizacional da escola, e sim, está aliado ao saber de dar aulas, estando relativamente associado ao saber experiencial, quando o professor sente-se mais seguro em ministrar suas aulas, pois já domina o conteúdo proposto e possui habilidades e talentos que são usados na carreira docente. 10244 Tardif (2002 apud ALMEIDA; BIAJONE, 2007) não classifica os saberes de uma forma distinta de Gauthier, o autor explica que a prática docente integra diferentes saberes, que mantém diferentes relações entre eles. Sendo assim a classificação do autor referente ao saberes são: o da formação profissional, que é todo o conhecimento recebido na universidade; os disciplinares que são as grandes áreas de conhecimento, também chamadas como ciências mães; os saberes sociais, transmitidos pela universidade e incorporados na ação docente, e por último os saberes da experiência, são aqueles que os professores mais gostam de citar, o saber que é construído no cotidiano escolar da vida do professor. Para Tardif (2006) os professores estabelecem uma relação com os saberes de transmissores, de portadores ou de objetos de saber. Mas não como produtores de saberes que poderiam impor-se como instância de legitimação social de sua função e como espaço de verdade de sua prática. Procedimento Metodológico A pesquisa trata de um estudo de caso caracterizado como uma pesquisa de história de vida. Esse estudo possibilita a aproximação do pesquisador com o entrevistado, propiciando o ouvir e conhecer a sua história. O estudo também utilizou uma abordagem qualitativa, no qual o conhecimento é possível com a experiência de vida humana, pois uma história de vida na pesquisa qualitativa possibilitará ao entrevistado que relate suas experiências como ela é vivida e definida. Foram participantes do estudo dois profissionais de Educação Física que exercem as suas atividades na escola ou em cargo de gestão, direcionadas à Educação Física. Escolhemos aqueles que apresentaram uma conduta condizente com a do bom professor. O professor 1 atua como gestor da área de educação física escolar após ter lecionado durante um bom tempo em escolas. O professor 2 ocupa um cargo público na área de Educação Física depois de ter construído uma carreira como professor e pesquisador. Foi utilizado como instrumento de pesquisa uma entrevista semi-estruturada formatada a partir do problema e dos objetivos do estudo. Esse tipo de estratégia de pesquisa busca extrair de alguém as informações desejadas. A entrevista foi gravada e esse conteúdo transcrito para que pudesse ser efetuada a análise e discussão do material. Após esse procedimento, a gravação foi eliminada. As informações da entrevista foram ordenadas, analisadas e discutidas partindo dos objetivos específicos da pesquisa, utilizando-se para isso da análise do discurso. Para isso, 10245 foram elencadas as categorias de análise a priori: Opção pela profissão de professor de Educação Física; Formação inicial e continuada; Prática pedagógica na escola e Conceito de bom professor. Resultado e Discussão A primeira entrevista foi realizada com o professor 1, que atua como coordenador do setor de esportes de um colégio particular de Curitiba. Este participante teve o privilégio de ser aluno do colégio, estagiário quando ingressou na faculdade e depois de formado tornou-se professor da instituição e, pela sua competência, hoje atua como coordenador. Os motivos que fizeram o professor ingressar no curso de Educação Física foi o gosto pelo esporte, pois ele teve a sua vida escolar voltada para o esporte como atleta de basquetebol, desde os 10 anos de idade. Ele explicou que não houve ninguém que o inspirasse diretamente para ingressar no curso, mas o seu treinador da época o inspirou em tomar a decisão de se tornar professor. A segunda entrevista foi realizada com o Professor 2, que atualmente ocupa um cargo público na região metropolitana de Curitiba. Este professor se formou em Educação Física em 1986, atuou como Professor de Educação Física em escolas de Curitiba e na região metropolitana. Após fazer o mestrado, começou a dar aula para o Ensino Superior e hoje está atuando em cargo público na área administrativa. Os motivos que fizeram o professor ingressar no curso de Educação Física em primeiro momento foi gostar muito de esporte, e o que influenciou na escolha foram os ídolos do esporte e também de pessoas diretamente ligadas ao esporte. O Professor 1 relatou que sua formação profissional foi muito boa. Naquela época sua formação priorizou o esporte, e que ser técnico esportivo era a sua meta. Mas, a experiência pedagógica com as aulas curriculares que já tinha como estagiário o levaram para a escola. Ele destaca como aspectos significativos na sua formação a seriedade, o respeito, a organização e o compromisso. Ele considera que a faculdade foi o ponto de partida para atuar na escola, e que hoje ele tem como referência alguns conhecimentos daquela época. No entanto outros conhecimentos é preciso buscar paralelamente para o crescimento profissional. Afirmou também que a construção do conhecimento só vem depois de muito estudo pesquisa e principalmente na prática propriamente dita. O professor considera importante a experiência construída através da prática e a forma como os conhecimentossão construídos por meio da teoria. Para se aperfeiçoar em sua área de atuação, ele se especializou em fisiologia do 10246 exercício e treinamento desportivo, que foram novos assuntos e temáticas estudadas que contribuíram para sua formação profissional. O Professor 2 afirma que o que aprendeu na faculdade não foi o suficiente para atuar na escola, porque na Universidade se aprende a base para atuar, mas é necessário se especializar e sempre buscar algo a mais. O professor ressaltou que o aprendizado depende muito do exercício da docência e que a construção da experiência se consegue atuando na escola. Indicou ainda que o conhecimento que ele possui foi fortalecido através dos cursos de Pós-graduação, do mestrado e das experiências vividas atuando na escola. Os dois professores têm em comum a mesma área, pois o Professor 2 também sentiu necessidade de entender melhor a área de atuação e se especializou em fisiologia do exercício e treinamento desportivo. Como já vislumbrava o Ensino Superior, ingressou no mestrado na área de Fisiologia do Exercício. Os dois professores começaram a construir a experiência antes de ingressar na universidade, pois tiveram influencia dos ídolos do esporte e da infância voltada para o esporte. Eles destacam que a experiência só se constrói com a prática, e é através dela que os conhecimentos são construídos. Isso é confirmado por Josso (2010, p. 51) ao afirmar que só se “desenvolve a experiência por meio da experiência”. Por essa razão, os professores sentiram a necessidade de prosseguir com a formação continuada, para aliar as experiências do cotidiano como professores com a busca e aprimoramento dos estudos. Os primeiros anos de trabalho do professor 1 começaram pelo estágio no colégio que trabalha até hoje. Foram 2 anos que deram a ele muita segurança para começar a atuar depois. Quando se formou começou a se envolver como professor nas modalidades específicas do colégio, primeiramente como professor/treinador de basquete e concomitantemente assumiu as aulas de Educação Física. Após isso, recebeu o convite para assumir a coordenação. Reconhecendo que sua experiência e seus conhecimentos foram fundamentais para este processo ter dado certo. Relembrando essa trajetória o professor afirma que a experiência profissional é muito importante para administrar e conduzir a maioria das situações cotidianas de uma escola. Em vários acontecimentos já se tem segurança, pois já sabe qual caminho seguir, o que facilita o processo de resoluções de problemas com pais, alunos e professores. Ele reconhece que a paciência, flexibilidade, respeito, compreensão e principalmente a ética profissional na tomada de decisão no momento certo, propiciaram a construção de uma boa carreira profissional. 10247 O professor 2 relatou que os primeiros anos de trabalho configuraram-se em um processo de aprendizagem, que dependeu muito da estrutura que as escolas ofereceram para que ele começasse a trabalhar. Ele afirma que foi um ponto positivo, pois as instituições em que trabalhou sempre lhe ofertaram boas condições de trabalho. Com relação à experiência, ele indicou que, sem dúvida, é algo muito relevante em cada setor de trabalho, e na sua trajetória de carreira foi algo construído aos poucos. Muitos problemas que apareciam para ele resolver eram resolvidos com mais facilidade, pois tinha conhecimentos e experiências, o que facilitava na resolução de situações com pais, alunos e depois no setor público onde trabalha. Para o Professor 1, o profissional bem sucedido se caracteriza pordedicar-se ao trabalho, pelo respeito e por ser respeitado em suas atitudes, ter um bom relacionamento professor/ Professor e Professor/ aluno. Tudo isso aliado a muito estudo e prática. O professor se considera um profissional bem sucedido, pois ele consegue englobar todos os aspectos citados, e se considera bem sucedido financeiramente pois para ele isso é resultado de todo seu esforço e dedicação. Ele acredita ser visto pelos demais colegas como um profissional correto, justo, com boa capacidade para definir as funções com tomadas de atitudes coerentes. O professor 1 espera continuar da mesma forma, seguir pelo mesmo caminho, alcançar os objetivos propostos. Para isto está sempre se atualizando para dar continuidade ao trabalho e para agregar novidades que surgem continuamente. Quanto ao papel do professor na sociedade atual, ele considera como ser capaz de transmitir e trocar conhecimentos com os alunos. Está consciente da importância de orientá-los em todos os sentidos, na vida acadêmica, social e relacional, com o objetivo de incluí-los na sociedade de hoje, capazes de respeitar a individualidade de cada um, tornando cidadãos capazes no futuro. Um profissional bem sucedido para o Professor 2, é aquele que sempre almeja algo melhor. Começando pela formação continuada, ele fez questão de dizer que poderia até hoje estar trabalhando em uma escola, mas desejou trabalhar com o ensino superior e depois disso outras oportunidades foram aparecendo, inclusive de assumir um cargo público. O professor se considera um profissional bem sucedido, pois tudo o que almejou até agora ele conseguiu com muito esforço e dedicação. Afirma que, em relação à questão financeira, é bem sucedido e que, como o professor 1 isso é resultado do seu trabalho. Pelos demais colegas de trabalho ele acredita ser visto com muito respeito, pois tanto o diretor geral como o secretario do município em que trabalha hoje foram seus alunos, e que devido a isso, por sempre ter feito um bom trabalho na escola, o currículo dele foi escolhido entre muitos. O professor ainda possui alguns sonhos, inclusive na carreira profissional e na 10248 área de saúde. Com relação ao papel do professor na sociedade atual, ele o considera de suma importância, pois as famílias estão delegando a educação dos filhos à escola, e indica ser por isso que na profissão existir o termo educação, afirmado que “nós somos primeiro educadores para a vida e depois para o físico” (professor 2). Os dois professores entrevistados consideram-se bem sucedidos, pois são pessoas dedicadas ao trabalho docente, responsáveis e que sempre almejam algo melhor, pois na sociedade atual o professor precisa ser otimista para orientar os alunos em todos os sentidos da vida, pois antes de ser professor, o docente precisa educar os alunos para o futuro. Conclusão Ao analisar o histórico de formação profissional dos professores entrevistados, os dois professores escolheram o curso de Educação Física por gostarem muito de esporte, não tiveram ninguém que os influenciasse diretamente. Porém, o professor 1 teve sua vida escolar voltada para o esporte, e seu treinador de basquetebol lhe influenciou na escolha de se tornar professor, enquanto que professor 2 teve influência dos ídolos do esporte. O professor 1 relatou que sua formação inicial foi boa, que a prioridade era o esporte e que se tornar técnico era sua meta. Ele considera que a faculdade foi o início para atuar na escola. Tanto é que até hoje ele tem como referencia alguns conhecimentos daquela época. Porém, para crescer profissionalmente é necessário buscar conhecimentos além da faculdade e adquirir experiência através da prática. O professor 2 relata que o que aprendeu na faculdade não foi o suficiente para atuar na escola, pois sempre é necessário buscar algo a mais para ser bem sucedido no que se faz, e assim como o professor 1 ele afirma dizendo que experiência se constrói atuando na escola exercendo a prática docente. O estudo mostrou que para os dois professores é necessário uma formação continuada para atuar na escola, pois a formação inicial contribui para o início de carreira. Quanto às características técnicas dos professores, o estudo mostrou que a prática pedagógica deles iniciou em um processo de aprendizagem. A experiênciasurgiu aos poucos, com situações cotidianas. E as características sócio-afetivas são importantes, pois possibilitam resoluções de problemas com pais, alunos e professores e que esse processo se torna fácil quando se tem paciência, flexibilidade, respeito e compreensão mútua dentro do ambiente de trabalho. 10249 Quanto à autoimagem sobre a competência profissional dos professores, os dois professores consideram-se bem sucedidos. Ambos buscam o aprimoramento constante, buscam novos objetivos, percebem que são reconhecidos pelos pares e o resultado financeiro é fruto do esforço cotidiano. Este estudo permitiu compreender que a carreira de um bom professor é a composição das competências e habilidades profissionais elaboradas e aplicadas no cotidiano escolar. E para se tornar um bom professor é necessário investir em uma formação continuada, fazer da experiência um conhecimento construído através da prática e sempre almejar algo melhor. Conclui-se, portanto que a construção da carreira de um bom professor é um processo que depende das oportunidades que surgem, mas fundamentalmente do empenho e dedicação empreendido pelo profissional tanto em sua formação quanto na sua atuação, quer seja na escola, no clube e em qualquer outro ambiente que se trabalhe. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Patrícia Cristina Albieri; BIAJONE, Jefferson. Saberes docentes e formação inicial de professores de educação física: implicações e desafios para as propostas de formação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 281-295, maio/ago. 2007. DARIDO, Suraya Cristina. Teoria, prática e reflexão na formação profissional em educação física. Revista Motriz, v. 1, n. 2, p. 124-128,1996. Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/ib/efisica/motriz/01n2/1_2_Suraya.pdf>. Acesso em: 4 abr. 2015. GALVÃO, Zenaide. Educação física escolar: a prática do bom professor. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 65-72, 2002. 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